PC-PP - 0600161-35.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2023 às 14:00

VOTO

O Diretório Estadual do PARTIDO PROGRESSISTAS apresenta contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2020, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) deste Tribunal, examinando a contabilidade, apontou irregularidades concernentes ao recebimento de recursos oriundos de (a) Fontes Vedadas, no montante de R$ 33.451,00 [R$ 1.300,00 (item 2.1) + R$ 32.151,00 (item 2.2)] e (b) do Fundo Partidário, no montante de R$ 69.006,49 [R$ 39.052,81 (item 4.2) + R$ 29.953,68 (item 4.5)].

Passo ao exame das falhas relatadas.

Do recebimento de recursos de fonte vedada

No item 2.1 do Parecer Conclusivo (ID 45464567), a unidade técnica demonstrou que a agremiação recebeu da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul o valor de R$ 1.300,00, consoante tabela que segue:

 

Em sua defesa, o partido alegou que as contribuições eram oriundas de filiados do partido que exerciam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2020, e comprovou o recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional (ID 45336397 – p. 36).

Quanto ao ponto, transcrevo o teor do art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações orçamentárias do Fundo Partidário e do FEFC;

Embora o recolhimento tenha sido feito, a falha, ou seja, recebimento de doação de pessoa jurídica, no valor de R$ 1.300,00, permanece e deve ser registrada.

Ademais, no item 2.2 do parecer conclusivo (ID 45464567), foi apontado o recebimento de recursos de fontes vedadas no valor de R$ 32.151,00.

A percepção, pelo partido político, de recursos oriundos de tais fontes é expressamente vedada pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, in verbis:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Nos mesmos termos, a Resolução TSE n. 23.604/19 assim prescreve:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Logo, como regra, o partido político é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário.

Note-se, porém, que, na parte final do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, é estabelecida uma exceção à vedação que, justamente por se tratar de uma salvaguarda, deve ser interpretada restritivamente no sentido de que, “quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação”, a operação será lícita.

Esse é o entendimento adotado por esta Corte, conforme resposta apresentada à Consulta n. 0600076-83.2020.6.21.0000, de relatoria do Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, julgada em 08.6.2020, na qual questionada a licitude de doações oriundas de filiados a partido diverso daquele destinatário dos recursos, proferida nos seguintes termos:

[…]

Nos termos do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação.

 

Regularmente intimada, a agremiação manifestou-se a respeito da irregularidade apontada apenas declarando que “Helenise Avila e Juchem e Jaime Cerbaro possuíam filiação partidária ao MDB (…) e (…) que a legislação exige que sejam filiados a partidos políticos, não exigindo que seja filiado, necessariamente, à agremiação que recebeu os valores” (ID 45336397, pág. 38), restando silente com relação aos outros contribuintes.

 

Nesse diapasão, deixo de acolher a justificativa do prestador de que a filiação do contribuinte a qualquer partido político o coloca sob a guarida da exceção do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, uma vez que o entendimento desta Corte é bastante claro no sentido de que o doador tem de ser filiado ao partido político beneficiário da doação.

Assim, permanece a irregularidade com relação aos contribuintes elencados na Tabela acima, pois não estavam filiado à agremiação partidária na data em que realizaram as contribuições, no valor total de R$ 32.151,00.

Pelo exposto, considera-se como de fonte vedada a importância de R$ 32.151,00, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19, litteris:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nessa hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

 

Por derradeiro, considero como oriundo de fontes vedadas o somatório de R$ 33.451,00 (item 2.1 + item 2.2), embora deva ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 32.151,00,  equivalente ao item 2.2, pois já restituído o valor relativo ao item 2.1.

 

 Aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Partidário

No item 4.2 do parecer conclusivo (ID 45451077), foi demonstrada a aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Partidário para pagamentos de multa, juros e/ou encargos, no valor total de R$ 39.052,81, conforme tabela abaixo:

 

O art. 17, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19 traz vedação quanto ao uso dos recursos do Fundo Partidário:

Art. 17. Constituem gastos partidários todos os custos e despesas utilizadas pelo órgão do partido político para a sua manutenção e para a consecução de seus objetivos e programas.

(...)

§ 2º Os recursos do Fundo Partidário não podem ser utilizados para a quitação de multas relativas a atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros.

 

É justamente a hipótese dos autos, isto é, gastos irregulares descritos no montante de R$ 39.052,81, cujos valores deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, na forma do art. 58, §2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Ainda no que se refere a irregularidades na aplicação do Fundo Partidário, segundo consta no item 4.5 do parecer conclusivo (ID 45451077), o partido não demonstrou a aplicação mínima de 5% de recursos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, imposta pelo inc. V do art. 44 da Lei n. 9.096/95, conforme tabela apresentada pela unidade técnica no parecer conclusivo:

 

Considerando o total de recursos recebidos do Fundo Partidário (R$ 2.130.800,00) e o mínimo de 5% destinado à cota de gênero, o partido deveria destinar R$ 106.540,00, tendo comprovado a destinação de R$ 76.586,32 (R$ 106.540,00 – R$ 76.586,32 = R$ 29.953,68).

Restou, portanto, não comprovada a correta aplicação da diferença de R$ 29.953,68, conforme o texto do art. 22, § 3º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

No ponto, transcrevo os seguintes artigos da Emenda Constitucional n. 117, de 05 de abril de 2022:

Art. 2º Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

Art. 3º Não serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Em que pese a incidência da Emenda Constitucional n. 117/22 resulte no afastamento do disposto no § 1º do art. 22 da Resolução TSE n. 23.604/19, no sentido do não recolhimento de tal quantia ao Tesouro Nacional, o entendimento desta Corte é de que, independente do recolhimento de valores, a Justiça Eleitoral mantém o dever de aferir a regularidade do uso das verbas públicas.

 

Do Julgamento das Contas

Assim, as irregularidades constatadas alcançam a quantia de R$ 102.457,49 (R$ 1.300,00 (item 2.1) + R$ 32.151,00 (item 2.2) + R$ 39.052,81 (item 4.2) + R$ 29.953,68 (item 4.5), que representa 5,73% do total examinado na presente prestação de contas (R$ 1.785.460,41), ou seja, menos de 10% da receita do exercício, viabilizando a aprovação das contas com ressalvas, por aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira do entendimento do egrégio TSE e deste Tribunal.

Outrossim, nos termos da reiterada jurisprudência desta Corte e do TSE, o juízo de aprovação das contas com ressalvas impede a incidência da suspensão das quotas do Fundo Partidário:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. COMISSÃO PROVISÓRIA ESTADUAL. EXERCÍCIO 2019. GASTOS IRREGULARES COM RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 18, § 4º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.546/2017. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DE FONTE VEDADA. CONTRIBUIÇÃO PARTIDÁRIA DE PESSOAS FÍSICAS EXERCENTES DE FUNÇÃO OU CARGO PÚBLICO DE LIVRE NOMEAÇÃO OU EXONERAÇÃO. MONTANTE DE IRREGULARIDADES RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO JUÍZO DE APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANTIDO O DEVER DE RECOLHIMENTO DO VALOR INDEVIDAMENTE RECEBIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A APLICAÇÃO DE MULTA E A SUSPENSÃO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de Comissão Provisória Estadual de Partido Político referente ao exercício financeiro de 2019. Parecer conclusivo pela desaprovação. Apontadas falhas pela unidade técnica quanto à existência de gastos irregulares com recursos do fundo partidário e recebimento de recursos de fontes vedadas relativo à contribuição partidária de pessoas físicas que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração.

2. Apresentados os documentos fiscais que identificam os gastos, porém, os pagamentos foram feitos a pessoa distinta daquela indicada na nota fiscal, a título de ressarcimento. A Resolução TSE 23.546/2017 determina que os pagamentos devem ser efetuados diretamente aos fornecedores, com ¿a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário. A Lei 13.877, de 27 de setembro de 2019, alterou a Lei 9.096/95, ao acrescentar o art. 44-A e o seu respectivo parágrafo único. A inovação normativa autoriza o ressarcimento de despesas cuja documentação apresentada permita o rastreamento da efetiva utilização da verba pública. No caso, as despesas foram contraídas em datas anteriores a publicação da lei. Ademais, mesmo que os gastos fossem feitos após a alteração da lei, as despesas em análise são incompatíveis com a modalidade de ressarcimento autorizada pela Lei 13.877/19.

3. O pagamento efetuado por cheque nominal não cruzado infringe o disposto no art. 18, § 4º, da Resolução TSE n. 23.546/17. Entretanto, cuida-se de falha sanada, uma vez que consta no extrato bancário que a cártula foi compensada e não sacada. O objetivo do cruzamento é justamente a compensação do cheque e não o seu desconto em caixa, objetivo alcançado de forma diversa. Todavia, permanece a irregularidade quanto ao pagamento da despesa para pessoa distinta da constante na nota fiscal.

4. Recebimento de recursos oriundos de fonte vedada. Contribuições de pessoas físicas exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração ou de cargo ou emprego público temporário, sem comprovação de estarem filiados ao partido, em desacordo ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95. Matéria incontroversa.

5. O montante das irregularidades representa 5,24% de toda a receita arrecadada, mostrando-se razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal. Mantido o dever de recolhimento do valor indevidamente recebido ao Tesouro Nacional. Afastada a aplicação da sanção de multa de até 20% sobre a importância apontada como irregular, assim como a suspensão das quotas do Fundo Partidário, nos termos da jurisprudência deste Tribunal e do Tribunal Superior Eleitoral.

6. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - PC: 06001417820206210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 20.06.2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 22.06.2022.) (Grifo nosso)

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do exercício financeiro de 2020 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PROGRESSISTAS e determino que a agremiação faça o recolhimento ao Tesouro Nacional do somatório de R$ 71.203,81, das seguintes importâncias:

a) R$ 32.151,00 (item 2.2), a título de recebimento de recursos de Fonte Vedada;

b) R$ 39.052,81 (item 4.2), a título de Recursos de Origem Não Identificada.