PCE - 0602524-58.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2023 às 14:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas apresentada por ALFREDO CASTILLOS DE LOS SANTOS, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022.

No item 4.1 do parecer conclusivo emitido pela unidade técnica, foi constatada inconsistência nas despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) com relação aos fornecedores nominados na tabela abaixo:

Quanto à fornecedora CLARISSA RASCADO BARRETO, a unidade técnica verificou em parecer conclusivo (ID 45517486) que “o débito bancário consta sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento, não consta CPF ou CNPJ no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, assim como não foi apresentado documentação bancária comprovando o destinatário dos recursos conforme art. 38 da resolução TSE 23.607/2019”.

No que diz respeito ao fornecedor INTERFACE MULTIMÍDIA LTDA., o parecer conclusivo mostra (ID45517486), além da falha com relação à forma de pagamento, que “a documentação apresentada não possui descrição detalhada da operação, sendo necessário a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço em conformidade com art. 60 da Resolução TSE 23.607/2019”.

O candidato apresentou esclarecimentos e comprovantes com o objetivo de reverter as falhas apontadas, conforme se verifica do ID 45492238 ao ID 45492654. Entretanto, a unidade técnica entendeu que as justificativas apresentadas, tecnicamente, não possuem o condão de alterar as falhas, especialmente no quesito “débito bancário sem identificação”, uma vez que nos extratos bancários eletrônicos disponibilizados pelo TSE não consta a contraparte nos cheques descontados.

Após o parecer conclusivo, o candidato manifestou-se novamente nos autos por meio da petição ID 45518692, juntando vídeos (ID 45518693 a 45518697), a fim de corroborar sua defesa.

Pois bem.

A irregularidade é incontroversa - existência de gastos com recursos públicos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) em inobservância aos meios de pagamento elencados no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 -, pois houve pagamentos no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por meio de 02 cheques nominais, cada um no valor de R$ 5.000,00, porém, não cruzados.

Assim, o meio de pagamento não foi o preconizado no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que “os gastos eleitorais de natureza financeira (...) só podem ser efetuados por meio de: (I) cheque nominal cruzado; (II) transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; (III) débito em conta; ou (IV) cartão de débito da conta bancária”.

No caso em tela, sendo o pagamento realizado por meio de cheque nominal não cruzado, restou inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha.

A legislação eleitoral contempla os arts. 38 e 60, caput, e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 para análise conjunta das despesas. O primeiro artigo elenca os meios pelos quais os pagamentos devem ser efetuados, e o segundo contempla um rol de documentos complementares à comprovação dos gastos eleitorais.

Dessa maneira, a Justiça Eleitoral construiu uma análise circular das despesas, contando para isso com dados das instituições financeiras, dos prestadores de contas e dos terceiros contratados para atestar a origem e o destino dos valores.

Assim, ao não terem sido cruzados os cheques, permitiu-se o saque na “boca do caixa”, sem o devido depósito em conta, inviabilizou-se o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha, pois se impede o controle social, na medida em que é impossível identificar o beneficiário do cheque no extrato do Divulgacandcontas.

A matéria em exame foi amplamente debatida nesta Corte, conforme ementa abaixo que bem evidencia o entendimento sufragado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE. APROVADAS COM RESSALVAS. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA-FEFC. IRRESIGNAÇÃO UNICAMENTE QUANTO À DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE OS BENEFICIÁRIOS DAS CÁRTULAS E OS EMITENTES DAS NOTAS FISCAIS. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS IDÔNEOS A COMPROVAR A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas prestação de contas de candidatos à majoritária, referentes às eleições municipais de 2020, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em face do uso irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Insurgência delimitada à determinação de restituição ao erário, não estando a sentença sujeita à modificação na parte em que aprovou as contas com ressalvas, uma vez que a matéria não restou devolvida à apreciação do Tribunal nas razões de apelo.

3. A norma que regulamenta a forma de pagamento das despesas eleitorais está prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos de natureza financeira devem ser pagos por meio de cheque cruzado e nominal ao fornecedor. Incontroverso, na hipótese, o descumprimento, cabe a análise se, por um lado, essa conduta por si só, conduz à determinação de recolhimento dos valores apurados ao Tesouro Nacional ou, por outro lado, se existem documentos idôneos capazes de comprovar os gastos efetuados por meio dos cheques objeto da glosa.

4. A atual jurisprudência do TSE supera o entendimento até hoje vigente neste colegiado, estabelecendo, em síntese, que a devolução de valores oriundos de recursos públicos ao Tesouro Nacional somente é cabível nas hipóteses de ausência de comprovação da utilização dos recursos ou utilização indevida, comandos estabelecidos no § 1º do art. 79 da já citada Resolução TSE 23.607/19.

5. A análise da microfilmagem dos cheques estabelece que os beneficiários das cártulas foram pessoas estranhas aos fornecedores identificados e que apresentaram as notas fiscais e as declarações tendentes a estabelecer vinculação com os já citados cheques. As regras contidas na Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem que os gastos de campanha devem ser identificados com clareza e estabelecendo elos seguros entre os beneficiários dos pagamentos e os serviços prestados. É a chamada rastreabilidade, isto é, os pagamentos devem ser atestados por documentos hábeis a demonstrar o serviço prestado pelo beneficiário e sua vinculação com a despesa, o que não ocorreu no caso concreto.

6. O contexto probatório não revela nenhum documento fiscal idôneo emitido pelos beneficiários dos cheques e tampouco contrato ou prova de prestação de serviços a justificar os pagamentos feitos. Ausente a vinculação entre os beneficiários dos cheques e os emitentes das notas fiscais, bem como a inexistência de provas, por documentos idôneos, de prestação de serviços por parte dos beneficiários das cártulas, resta descumprida a regra posta no art. 60, e parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19. Circunstância que atrai a incidência do disposto no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, como determinado na sentença.

7. Provimento negado.

(Rel n. 0600464-77.2020.6.21.0099, Relator designado: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, julgado na sessão de 06.7.2021.) (Grifo nosso)

 

Nesse sentido, o que constou no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45523163):

Assim, independentemente da discussão acerca da comprovação dos gastos e/ou da descrição detalhada dos serviços prestados, tem-se que devem ser mantidos os apontamentos da Unidade Técnica, dadas as irregularidades na aplicação dos recursos do FEFC, decorrentes do descumprimento dos critérios estabelecidos pelo art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019, ensejando a obrigação de devolução ao erário das quantias referentes aos pagamentos irregulares, na forma do artigo 79, §1º da mesma resolução.

 

Assim, diante da não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 10.000,00, que corresponde a 39,15% da receita total declarada pelo candidato (R$ 25.539,98), tornando imperativa a desaprovação das contas e o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, de acordo com o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas, com base no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 10.000,00.