PCE - 0603190-59.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/08/2023 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

GUSTAVO CORREA, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas eleições 2022, apresentou sua prestação de contas, relativa à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

A Secretaria de Auditoria Interna – SAI, examinando a contabilidade, apontou como não superadas irregularidades consistentes na utilização de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC para pagamento de gastos não eleitorais e de recursos de origem não identificada – RONI.

Passo à análise dos apontamentos.

 

Da utilização irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

Segundo detectado pelo órgão técnico, o prestador efetuou o pagamento de R$ 1.100,00 a reAuto Elétrica Pardal Ltda., relativo à “compra de peças para serviço de manutenção de carro locado”, gasto esse não arrolado dentre aqueles permitidos pelo art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

A despesa foi identificada no documento de ID 45462639, p. 76, como “manutenção carro locado” e identifica a placa EJD7178. Tal veículo pertence a Wellinghton Figueiredo, descrito como "I/GM CAPTIVA SPORT V6FWD" (ID 45462772).

O documento fiscal em questão indica a aquisição de peças para automóvel (ID 46452514) e contém, nas informações complementares, “NFe referente a OS D#210922105439 / PLACA - IPD-1J33 / MODELO – 207S W XR S / KM atual – 110975”.

A placa IPD-1J33, informada na nota fiscal referente às peças adquiridas, não está entre aquelas informadas relativamente aos veículos locados pelo prestador, que são as seguintes: IRK3695, EJD7178, ISH9D81, lançadas no Demonstrativo de Despesas (ID 45462631).

Diante da divergência de dados, não é possível saber se se trata de manutenção de veículo do candidato ou veículo locado.

De qualquer sorte, o § 6º do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 menciona as despesas de natureza pessoal do candidato que não podem ser consideradas como gasto eleitoral. Confira-se (sem grifo no original):

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal da candidata ou do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha;

 

Da mesma forma, a manutenção de veículo locado para a campanha eleitoral não está contemplada no rol de despesas eleitorais do art. 35, a saber:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26) :

I - confecção de material impresso de qualquer natureza, observado o tamanho fixado no § 2º, inciso II do art. 37 e nos §§ 3º e 4º do art. 38 , todos da Lei nº 9.504/1997 ;

II - propaganda e publicidade direta ou indireta, por qualquer meio de divulgação;

III - aluguel de locais para a promoção de atos de campanha eleitoral;

IV - despesas com transporte ou deslocamento de candidata ou de candidato e de pessoal a serviço das candidaturas;

V - correspondências e despesas postais;

VI - despesas de instalação, organização e funcionamento de comitês de campanha e serviços necessários às eleições, observadas as exceções previstas no § 6º do art. 35 desta Resolução;

VII - remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviço a candidatas ou candidatos e a partidos políticos;

VIII - montagem e operação de carros de som, de propaganda e de assemelhados;

IX - realização de comícios ou eventos destinados à promoção de candidatura;

X - produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, inclusive os destinados à propaganda gratuita;

XI - realização de pesquisas ou testes pré-eleitorais;

XII - custos com a criação e a inclusão de páginas na internet e com o impulsionamento de conteúdos contratados diretamente de provedor da aplicação de internet com sede e foro no país;

XIII - multas aplicadas, até as eleições, às candidatas ou aos candidatos e partidos políticos por infração do disposto na legislação eleitoral;

XIV - doações para outros partidos políticos ou outras candidatas ou outros candidatos;

XV - produção de jingles, vinhetas e slogans para propaganda eleitoral.

 

Veja-se que as despesas com o transporte em si estão autorizadas pela legislação, mas isso não engloba a manutenção do veículo, em especial troca de peças. Com efeito, inaceitável que o candidato alugue um veículo com recursos públicos e devolva-o consertado sem efetuar qualquer desconto no valor contratado.

Assim, utilizados recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC para pagamento de despesa não eleitoral, resta configurada a aplicação irregular de verba pública, ensejando o recolhimento da quantia malversada ao Tesouro Nacional, como disposto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 79.(...)

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança. (grifo nosso)

 

Nesse sentido, menciono precedente desta Corte que analisou caso semelhante nas eleições 2022:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. 3º SUPLENTE. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS. DESPESAS COM IMPULSIONAMENTO JUNTO AO FACEBOOK PARCIALMENTE SANADAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS DESPESAS COM SISTEMA DE ALARME E MONITORAMENTO DE IMÓVEL LOCADO. IRREGULARIDADE MANTIDA. GASTOS COM PESSOAL EM DESACORDO COM O DISPOSTO NO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. IRREGULARIDADES QUE REPRESENTAM ELEVADO VALOR. PRECEDENTES. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato eleito ao cargo de 3º suplente de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

3.3) Gastos referentes à locação de imóvel sanados, pois o contrato firmado descreve o objeto da locação, o preço contratado e o prazo da avença, que coincide com o período eleitoral, havendo ainda a demonstração de que o local foi utilizado como comitê de campanha, conforme publicação na rede social Instagram, indicada pelo prestador. Todavia, não restou comprovada a despesa com o sistema de alarme e monitoramento. Revelada desproporção entre o valor da locação do imóvel e o valor do sistema de alarme e monitoramento, possivelmente relacionada com um dos itens descritos na nota fiscal. Ademais, o candidato não demonstrou satisfatoriamente a necessidade de tais serviços, não se prestando para tanto a alegação genérica de que o local fora alvo de invasões e furtos. Irregularidade mantida. 3.4) Gastos relacionados a transporte e fretamento devidamente justificados, em razão da juntada de recibos.

[...]

6. Desaprovação, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19. Determinado o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional.

(Prestação de Contas Eleitorais n. 0602053-42.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, julgado em 01.12.2022). (Grifo nosso)

 

Logo, configurada a aplicação irregular de recursos públicos, impõe-se a restituição ao erário do montante de R$ 1.100,00.

 

Da utilização de recursos de origem não identificada – RONI

Também foram identificadas, mediante realização de procedimento de circularização e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, despesas não arroladas na prestação de contas, caracterizando o recebimento e a utilização de recursos de origem não identificada para custeio dos gastos relacionados na tabela abaixo, no total de R$ 1.038,35 (ID 45485532):


 

O prestador apresentou manifestação para cada uma das notas fiscais, afirmando desconhecer a natureza das despesas, as quais não teriam sido autorizadas pela sua campanha eleitoral e que, portanto, não devem compor o processo de prestação de contas eleitoral.

Ocorre que, como observado pela área técnica, as notas fiscais correspondentes continuam ativas na base de dados da Fazenda Estadual, não tendo o prestador demonstrado quaisquer iniciativas tendentes ao cancelamento ou à retificação dos documentos para o fim de excluir o seu CNPJ.

Assim, considerando a validade plena de documentos relativos a gastos não contabilizados, resta caracterizada a omissão de registro de despesas, em infração ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que a prestação de contas deva conter informações referentes a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

Nesse sentido, menciono julgado das eleições gerais de 2022, semelhante ao caso que ora se examina:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DOS RELATÓRIOS FINANCEIROS. MERA IMPROPRIEDADE. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADAS ¿ RONI. NOTAS FISCAIS NÃO DECLARADAS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESA. INFRAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 53, INC. I, AL. "G", DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. MONTANTE INSIGNIFICANTE. REGULARIDADE DAS CONTAS NÃO COMPROMETIDA. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

3. Recursos de origem não identificada. Notas fiscais não declaradas relacionadas ao abastecimento de combustíveis. O DANFE não é, não substitui, e não se confunde com uma nota fiscal eletrônica. A existência de outras despesas contratadas com o mesmo fornecedor impede que se realize o batimento dos gastos para verificação de perfeita coincidência entre o valor das despesas e os pagamentos efetuados. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, nos termos do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Havendo o registro da transação comercial nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas, que deve laborar para o cancelamento da nota fiscal, conforme previsto nos arts. 59 e 92, §§ 5º e 6º, da Resolução mencionada. Os elementos constantes nos autos não são aptos a sanar as irregularidades relativas à duplicidade de emissão de registros por fornecedor de combustíveis. Caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

4. As despesas resultantes das notas fiscais omitidas e cujo cancelamento não foi devidamente comprovado implicam sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata. Caracterizados os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. A soma das falhas corresponde a 0,93% da receita declarada e se mostra insignificante diante dos valores totais geridos pela candidata em sua campanha eleitoral. Assim, como as incorreções não têm aptidão para comprometer a regularidade das contas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é caso de aprovação com ressalvas da contabilidade.

6. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060311180, Acórdão, Relator Des. DES. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 12.12.2022.) (Grifei.)

 

Na mesma linha do precedente, as despesas resultantes das notas fiscais omitidas, no valor total de R$ 1.038,35, implicam, por consequência, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação de despesa eleitoral não contabilizada, caracterizando o recurso como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, reconheço a omissão de despesas no valor de R$ 1.038,35, importância que deve ser recolhida ao Tesouro Nacional pelo prestador de contas.

Em conclusão, e na mesma linha do parecer ministerial, considerando-se que o total das irregularidades, no valor de R$ 2.138,35, representa 1,26% do montante de recursos recebidos pelo candidato, de R$ 170.000,00, possível a aprovação das contas com ressalvas, a qual não dispensa a restituição da quantia de R$ 2.138,35.

 

Dispositivo

Ante o exposto, voto por aprovar com ressalvas as contas de campanha de GUSTAVO CORREA, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas eleições gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 2.138,35 (dois mil cento e trinta e oito reais e trinta e cinco centavos) ao Tesouro Nacional.

É o voto.