PC-PP - 0600201-17.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/08/2023 às 16:00

VOTO

Trata-se de apresentação das contas do Diretório Estadual do PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA do Rio Grande do Sul, relativas ao exercício financeiro do ano de 2020, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

Em parecer conclusivo, a unidade técnica apontou irregularidades remanescentes, referentes ao recebimento de verbas de fonte vedada e à aplicação irregular do Fundo Partidário.

À análise.

1. Recebimento de recursos de fontes vedadas

Quanto à primeira irregularidade, o órgão técnico contábil verificou recebimento de contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político em exame, as quais exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2020, em afronta à vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução TSE n. 23.604/19, art.12, inc. IV e § 1º:

Lei 9.096/1995:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de: (…)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Resolução TSE n. 23.604/2019:

Das Fontes Vedadas

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

IV - autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

(…)

 

Os doadores e as correspondentes doações estão discriminados na tabela que segue:

 

Em sua manifestação, o partido não contesta o recebimento dos valores e informa apenas que “as fontes apontadas no valor de R$ 3.146,00 referem-se à contribuição espontânea de companheiros filiados ao PDT, as fichas de Chaiene Sanchotene de Almeida, Claudio Gauss de Oliveira e Yngrid Lessa da Costa estão anexas”.

Observo que os documentos de filiação, referidos pelo prestador, consistem em fichas de preenchimento internas, no âmbito da agremiação, ou seja, é documento despido de aptidão para comprovar o vínculo pretendido, de forma que não merecem amparo as afirmações trazidas em sede de alegações finais, no sentido de que a filiação partidária “é um ato interna corporis, e a ficha de filiação é, segundo o Estatuto do PDT é ato formal revestido de legalidade para que o eleitor, passe a ser integrante da agremiação partidária. Tanto a assertiva é verdadeira que basta este documento para que vote e seja votado em qualquer instância partidária”.

Equivocado.

A prova de filiação deve ser validada pela Justiça Eleitoral, por meio de certidões expedidas pela página do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, na internet, com informações extraídas do Sistema FILIA, cuja atualização é incumbência do partido, conforme os termos do caput do art. 19 da Lei n. 9.096/95, em redação dada pela Lei n. 13.877/19:

Art. 19.  Deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos, a relação dos nomes de todos os seus filiados, da qual constará a data de filiação, o número dos títulos eleitorais e das seções em que estão inscritos.            

 

Nessa linha, precedentes desta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO 2018. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. RECEITAS DE FONTE VEDADA. DOAÇÕES DE AUTORIDADES PÚBLICAS. PRELIMINAR. TEMPESTIVIDADE. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. COMPROVAÇÃO. DOCUMENTO UNILATERAL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA TSE N. 20. FALHAS DE ELEVADO PERCENTUAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. MULTA E SUSPENSÃO DE QUOTAS REDUZIDAS. PROVIMENTO PARCIAL. 1. O Diretório Municipal teve suas contas do exercício de 2018 desaprovadas em razão do recebimento de valores de fontes vedadas, consistentes em doações realizadas por detentores de cargos demissíveis ad nutum, de chefia e de direção, tendo sido determinado o recolhimento do valor irregular, acrescido de multa de 10% (dez por cento), bem como a suspensão do recebimento de quotas oriundas do Fundo Partidário pelo prazo de 1 (um) ano. 2. Preliminar. Entende-se como tempestivo o recurso, sobretudo ante a ausência de dados precisos acerca da intimação do recorrente da decisão relativa aos embargos de declaração. O conjunto de circunstâncias não pode prejudicar a análise do recurso, mormente para que não ocorra injustificável prejuízo à parte. 3. Incontroverso que as doações foram oriundas de autoridades públicas, assenta-se o debate na caracterização das doadoras na condição de filiadas ao partido político. O Tribunal Superior Eleitoral, a fim de dirimir conflitos relativos a esta questão específica, editou o enunciado da Súmula n. 20. Na mesma linha é a jurisprudência desta Corte, no sentido de que o registro da filiação no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral é que confere caráter público e formaliza a vinculação dos cidadãos aos partidos políticos. 4. No caso dos autos, não há nenhum elemento com reconhecimento público ou comprovadamente produzido em data anterior ao ajuizamento da prestação de contas que comprove a tese de que as doadoras já estavam filiadas à agremiação no exercício de 2018, de modo que as contribuições recebidas configuram recursos oriundos de fontes vedadas. 5. O recorrente pleiteia a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, o qual prevê concessão de anistia. O Plenário desta Corte, em sessão de julgamento no ano de 2019, declarou a inconstitucionalidade desse dispositivo e, ante a ausência da indicação de outros elementos hábeis a justificar a revogação do precedente, cabe manter a jurisprudência estável, íntegra e coerente, bem como observar a orientação do plenário do órgão. 6. O recebimento de recursos de fontes vedadas equivale a 32,47% da arrecadação, cabendo manter a desaprovação das contas, a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional e a suspensão de repasse de verbas do Fundo Partidário. Redução da multa para o patamar de 7% e readequação da suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para o período de 4 (quatro) meses. 7. Parcial provimento do recurso.

(Recurso Eleitoral n. 060004047, Acórdão, Relator Des. OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DOS RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECEBIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO DE FONTES VEDADAS. APORTE DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. NÃO DESTINAÇÃO DE PERCENTUAL DA VERBA PÚBLICA A PROGRAMAS DE INCENTIVO À PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. FALHA DE VALOR INFERIOR A 10% DOS RECURSOS AUFERIDOS NO PERÍODO EM EXAME. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM AÇÕES DE FOMENTO À INTEGRAÇÃO FEMININA, NO EXERCÍCIO SUBSEQUENTE. INVIABILIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. 1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente ao exercício financeiro de 2019. Parecer conclusivo pela desaprovação e pelo recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Irregularidades atinentes à aplicação inadequada de verbas do Fundo Partidário, ao recebimento de contribuições de fonte vedada, ao ingresso de recursos de origem não identificada e à falta de destinação de parcela de receita advinda do Fundo Partidário a programas de promoção da participação feminina na política. Parecer ministerial, igualmente, pela rejeição das contas. 2. Despesas indevidas com verbas do Fundo Partidário. a) Falta de comprovação dos serviços prestados por advogado ao partido. Juntados aos autos documentos idôneos, como procurações outorgando poderes ao profissional, recibos de transferências bancárias e notas fiscais eletrônicas. Inegável a atuação do procurador no feito. Mácula sanada. b) Gastos irregulares junto a empresas comerciais. Falta de correspondência entre os dados constantes nos extratos bancários e nos recibos de prestação de serviço, sem evidência do efetivo cumprimento do acordado e do vínculo do trabalho com a atividade partidária. Desatendimento ao art. 18 da Resolução TSE n. 23.546/17. Não demonstrada a necessária triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, que permite a aferição da regularidade na aplicação de recursos públicos. Reconhecida a falha apontada. c) Assinalado o recebimento de verba pública, repassada pelo diretório municipal do partido, na conta destinada a ¿outros recursos¿, em contrariedade ao art. 6º da Resolução TSE n. 23.546/17, impossibilitando a conferência do direcionamento da receita. Demonstrada nos autos a origem dos valores na conta bancária destinada ao Fundo Partidário na esfera municipal e sua posterior transferência à sede regional para atendimento de despesas com locação de imóvel, fim válido e adequado, nos termos do art. 44, inc. X, da Lei n. 9.096/95. Operação amparada por contrato devidamente assinado pelas partes e reconhecido em cartório, revestido de requisitos suficientes à sua convalidação. Falha sanada. 3. Recebimento de valores de fonte vedada. Existência de contribuições de não filiados ao partido politico, exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, e de pessoa jurídica, incorrendo na proibição disposta no art. 12, incs. II e IV, da Resolução TSE n. 23.546/17. Malograda a intenção do partido de enquadrar as doações na exceção disposta no § 1º do art. 12 da Resolução TSE n. 23.546/17 ao juntar aos autos ficha de filiação dos supostos colaboradores, pois as peças não fazem prova do alegado, visto tratar-se de documento unilateral, desprovido de fé pública. Confirmada, no entanto, no sistema da Justiça Eleitoral, a filiação de um dos doadores ao partido. Exclusão do contribuinte comprovadamente filiado à agremiação. Restituição dos valores oriundos das fontes vedadas remanescentes. 4. Recursos de origem não identificada ¿ RONI. Doação identificada com o CNPJ do próprio diretório estadual, inviabilizando a conferência da fonte originária da receita. Reconhecida a irregularidade e o dever de recolhimento. 5. Ausência de aplicação dos recursos do Fundo Partidário no fomento à participação feminina na política, conforme a previsão do art. 22 da Resolução TSE n. 23.546/17. Omissão na abertura de conta bancária específica para os recursos públicos destinados à ATM ¿ Ação da Mulher Trabalhista. Não comprovado o alegado investimento do percentual mínimo legal de 5% (cinco por cento) das verbas do Fundo Partidário na criação ou manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres. Obrigatoriedade de aplicação desses valores no exercício subsequente, vedada sua utilização para finalidade diversa, nos termos do art. 22, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17. 6. Falhas em montante inferior a 10% da arrecadação, tornando possível o juízo de aprovação com ressalvas por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Imposição de recolhimento dos valores irregulares ao erário. Determinação de emprego dos repasses do Fundo Partidário na conta destinada aos programas de incentivo à participação política feminina, no exercício subsequente ao trânsito em julgado da presente decisão. Diretriz jurisprudencial deste Regional, alinhada ao entendimento do TSE, assentando que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não incide a pena de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário prevista no art. 36 da Lei n. 9.096/95. 7. Aprovação com ressalvas.

(Prestação de Contas n. 060019714, Acórdão, Relator Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 23.9.2022.). (Grifei.)

Neste norte, configurado o recebimento e a utilização de recursos de fonte vedada, impõe-se a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 3.146,00 (três mil, cento e quarenta e seis reais), de acordo com o art. 14, §1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

2. Irregularidades na aplicação do Fundo Partidário

2.1 Ausência de comprovação de gastos

A Secretaria de Auditoria Interna – SAI, por ocasião do exame das contas, indicou despesas irregulares na aplicação do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, o denominado Fundo Partidário, em montante de R$ 177.217,02. Após esclarecimentos da agremiação, o órgão técnico contábil emitiu parecer conclusivo e apontou irregularidades remanescentes na importância de R$ 20.989,43 – parte desse valor, R$ 20.600,72, decorrente de ausência de comprovação dos gastos, segundo especificações constantes da tabela que segue:

 

De fato, é irretocável a conclusão do órgão técnico, pois a documentação acostada pelo prestador afastou boa parte das irregularidades, e restam apenas os 13 itens acima esmiuçados, uma vez que (a) os comprovantes bancários de pagamentos estão desacompanhados de prova da contratação dos gastos correspondentes (itens 1, 2 e 6); (b) o orçamento de serviço para troca de motor não especifica o bem a ser consertado, e veio aos autos desacompanhado de documento fiscal (itens 3, 4 e 5); (c) há documentos fiscais sem as descrições detalhadas dos serviços prestados e  desacompanhados de contratos para prestação de serviço, bem como sem comprovações de execução (itens 7 e 8); as guias de pagamento de IPTU estão desacompanhadas de prova do vínculo do imóvel à atividade partidária (itens 9 a 13).

Nos termos da legislação regente, as citadas operações não foram comprovadas. Veja-se a Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 18. A comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo dele constar a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou pela razão social, o CPF ou o CNPJ e o endereço, e registrados na prestação de contas de forma concomitante à sua realização, com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

(...)

§ 7º Os comprovantes de gastos devem conter descrição detalhada, observando-se que:

I - nos gastos com publicidade, consultoria e pesquisa de opinião, os respectivos documentos fiscais devem identificar, no seu corpo ou em relação anexa, o nome de terceiros contratados ou subcontratados e devem ser acompanhados de prova material da contratação;

II - os gastos com passagens aéreas serão comprovados mediante apresentação de fatura ou duplicata emitida por agência de viagem, quando for o caso, e os beneficiários deverão atender ao interesse da respectiva agremiação e, nos casos de congressos, reuniões, convenções, palestras, poderão ser emitidas independentemente de filiação partidária segundo critérios interna corporis, vedada a exigência de apresentação de qualquer outro documento para esse fim (art. 37, § 10, da Lei nº 9.096/95); e

III - a comprovação de gastos relativos à hospedagem deve ser realizada mediante a apresentação de nota fiscal emitida pelo estabelecimento hoteleiro com identificação do hóspede.

 

Desse modo, a irregularidade por ausência de comprovação de gastos alcança a soma de R$ 20.600,72, como já indicado.

2.2 Pagamento de juros e multas decorrentes de inadimplência

Ademais, a análise técnica verificou o pagamento de juros e de multas, com parte das verbas oriundas do Fundo Partidário, em desobediência à regra eleitoral expressa no art. 17, § 2º, da Resolução de regência, pela qual “os recursos do Fundo Partidário não podem ser utilizados para a quitação de multas relativas a atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros”.

A quitação deu-se em despesas com a Prefeitura de Porto Alegre, o DMAE, o FGTS, e também com empresas - CEEE, Claro, Tiny Software Ltda, Vivo, Oi S.A..

Totaliza R$ 388,71 e desatende à vedação expressa de prática verificável objetivamente. Flagrante a desobediência, portanto.

2.3. Aplicação de recursos na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres

No ponto, convém destacar excerto da acurada análise da Secretaria de Auditoria Interna deste Tribunal:

Realizada a análise técnica quanto à regularidade na distribuição e na aplicação de recursos oriundos do Fundo Partidário, à verificação do percentual de gastos irregulares em relação ao total de recursos, à observância dos limites previstos no art. 44 da Lei 9.096/1995 e à pertinência e validade dos comprovantes de receitas e gastos, conforme previsto no art. 36, incisos II, V e VI, da Resolução TSE 23.604/2019, faz-se os seguintes apontamentos:

(…)

4.4 Aplicados os procedimentos técnicos de exame, foram observados gastos efetuados em desacordo com o art. 17, §2º, art. 18 e art. 29, V, c/c o art. 36, § 2º, todos da Resolução TSE 23.604/2019.

Em sua manifestação, o partido apresentou documentação complementar (ID 45412881 a ID 45413050), a qual foi analisada e reduziu o montante das irregularidades para R$ 20.989,43, conforme discriminado na Tabela 2, ao final deste relatório.

4.5 O partido não demonstrou a aplicação mínima de 5% de recursos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, inobservando o disposto no inciso V do artigo 44 da Lei 9.096/1995. Considerando o recebimento de R$ 1.120.000,00 em recursos do Fundo Partidário pela agremiação no exercício de 2020, o mínimo a aplicar seria R$ 56.000,00 (5% do total de recursos do Fundo Partidário recebidos no exercício financeiro). Em consulta aos extratos bancários referentes a conta n. 616282801, agência 839, do Banrisul, verificou-se que a agremiação destinou o total de R$ 49.332,00 (4,4%) para essa finalidade. Restou, portanto, não comprovada a correta aplicação da diferença de R$ 6.668,00 (R$ 56.000,00 - R$ 49.332,00), conforme o texto do art. 225 , § 3º, da Resolução TSE 23.604/2019. (Grifei.)

Em suma, o partido deveria destinar 5% dos recursos recebidos do Fundo Partidário, R$ 56.000,00, mas cumpriu o equivalente a R$ 49.332,00, ou seja, deixou de destinar R$ 6.668,00 daquilo que lhe impõe a legislação para a criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, conforme disposto no art. 44, inc. VI, da Lei n. 9.096/95, em falha que originariamente traria consequências, pois a grei deveria transferir a diferença apurada para conta bancária específica, destinada ao programa de promoção e difusão da participação política das mulheres, a ser utilizada no exercício financeiro subsequente, sendo vedada sua aplicação em finalidade diversa, sob pena de acréscimo de 12,5% do valor total devido, em atenção ao determinado pelo art. 22, § 3º, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 22. (…).

§ 3º O partido político que não cumprir o disposto no caput deve transferir o saldo para conta bancária de que trata o inciso IV do art. 6º, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, de modo que o saldo remanescente deve ser aplicado dentro do exercício financeiro subsequente, sob pena de acréscimo de 12,5% (doze inteiros e cinco décimos por cento) do valor previsto no caput, a ser aplicado na mesma finalidade (art. 44, § 5º, da Lei nº 9.096/95).

Contudo, o advento da Emenda Constitucional n. 117/22, ao mesmo tempo que lançou status constitucional à previsão legal de fomento da participação feminina na política, (lamentavelmente) determinou a não aplicação de sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do Fundo Partidário, aos partidos que deixaram de observar a correta destinação de tais verbas, antes da sua promulgação.

Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral entendeu por anistiada a aplicação de sanções aos partidos políticos que tenham descumprido a ação afirmativa de gênero:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO. EXERCÍCIO DE 2017. BAIXO PERCENTUAL IRREGULAR. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ANISTIA. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 117/2022. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. (...) 15. Sobre a anistia advinda da Emenda Constitucional (EC) nº 117/2002, o TSE tem assinalado que, embora se aplique aos feitos ainda não transitados em julgado, seus efeitos alcançam somente a sanção que porventura seria aplicada à grei que tenha descumprido a respectiva ação afirmativa (PC nº 0601765–55/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 6.5.2022). (...) 17. Quanto à insuficiência de recursos na participação da mulher na política, com a promulgação da EC nº 117/2022, deverá o partido utilizar o valor de R$ 266.315,21 (duzentos e sessenta e seis mil, trezentos e quinze reais e vinte e um centavos) nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado. Precedentes. (...) (PC n. 060043404, Acórdão, Relator Min. Carlos Horbach, Publicação: DJE, Tomo 44, Data: 20.3.2023.) (Grifei.)

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INEXISTÊNCIA. ORIGEM DAS DOAÇÕES RECEBIDAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO–PROBATÓRIO. SÚMULA 24/TSE. PROMOÇÃO DAS CANDIDATURAS FEMININAS. APLICAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL 117/2022. PERCENTUAL ÍNFIMO DE IRREGULARIDADES. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (...) 4. A inobservância da determinação legal de aplicação de recursos do Fundo Partidário para difusão e promoção da participação política feminina foi anistiada pela Emenda Constitucional 117/2022, promulgada em 5/4/2022. (...) (AgR-AREspE n. 8592, Acórdão, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Publicação: DJE, Tomo 60, Data: 04.4.2023.) (Grifei.)

E, em idêntica linha de entendimento, decisões desta Casa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. ELEIÇÕES 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. DESPESAS REALIZADAS POR ASSESSOR POLÍTICO. REEMBOLSO PELA AGREMIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ART. 44–A, DA LEI N. 9.096/95, POR ANALOGIA. ARTIGO COM APLICAÇÃO CIRCUNSCRITA ÀS PRESTAÇÕES DE CONTAS DE EXERCÍCIO FINANCEIRO. GASTOS DE SERVIÇOS CONTÁBEIS E DE ADVOCACIA. COMPROVADAS AS DESPESAS. POSSIBILIDADE DE ARRECADAÇÃO DE RECURSOS EXCLUSIVAMENTE PARA A QUITAÇÃO DE DESPESAS JÁ CONTRAÍDAS E NÃO PAGAS ATÉ O DIA DO PLEITO, NOS TERMOS DO ART. 33, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. APLICAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. FALHAS NO REPASSE DE QUOTAS DE GÊNERO E ÉTNICAS. EC 117/22. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES AO ERÁRIO. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS IRREGULARIDADES REMANESCENTES. VIABILIDADE DE APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. (...) 6. Falhas no repasse de quotas de gênero e étnicas. Segundo preceito estabelecido na ADPF n. 738, “O volume de recursos destinados a candidaturas de pessoas negras deve ser calculado a partir do percentual dessas candidaturas dentro de cada gênero, e não de forma global. Isto é, primeiramente, deve–se distribuir as candidaturas em dois grupos – homens e mulheres. Na sequência, deve–se estabelecer o percentual de candidaturas de mulheres negras em relação ao total de candidaturas femininas, bem como o percentual de candidaturas de homens negros em relação ao total de candidaturas masculinas. Do total de recursos destinados a cada gênero é que se separará a fatia mínima de recursos a ser destinada a pessoas negras desse gênero”. Impossibilidade de imposição de devolução dos valores ao erário aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 117/22. (…) 8. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional. (PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060041372, Acórdão, Relator Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 49, Data: 20.3.2023.) (Grifei.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. RESPONSÁVEIS. RECEBIMENTO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO EM PERÍODO DE SUSPENSÃO DO REPASSE. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. OMISSÃO DE CONTA BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO DO PERCENTUAL MÍNIMO EM PROGRAMAS DE PROMOÇÃO E DIFUSÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. AUSÊNCIA DE REGISTRO DE DÍVIDAS. ALTO PERCENTUAL. MULTA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. (...) 6 Ausência de aplicação mínima de 5% em programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, em desacordo com o art. 22, caput e § 3º, da Resolução TSE n. 23.546/17. No ponto, após a análise dos documentos apresentados pelo partido, a falha foi reduzida. Embora persista a irregularidade quanto à aplicação dos recursos do Fundo Partidário em práticas de incentivo à participação feminina na política, afastado o recolhimento ao Tesouro Nacional, em observância à EC n. 117/22. (...) 9. Desaprovação. Aplicada Multa. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional. (PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL n. 060021450, Acórdão, Relator Des. Luis Alberto D`Azevedo Aurvalle, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 248, Data: 01.12.2022.) (Grifei.)

Portanto, presentes as irregularidades indicadas, relativas à aplicação das verbas do Fundo Partidário, julgo que a quantia de R$ 20.989,43 (R$ 20.600,72 + R$ 388,71), atinente aos gastos sem comprovação e às despesas com multas e juros, deve ser devolvida ao Tesouro Nacional, nos termos do § 2º do art. 58 da Resolução citada, e deixo de determinar o recolhimento da quantia de R$ 6.668,00 ao Tesouro Nacional, em observância à Emenda Constitucional n. 117, de 05 de abril de 2022.

Por fim, destaco que as irregularidades, R$ 24.135,43 (R$ 3.146,00 + R$ 20.989,43), representam somente 2,25% do total de R$ 1.075.171,03 arrecadados pela agremiação no ano de 2020, e este Tribunal, ao interpretar os arts. 36 e 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, posicionou-se no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse do Fundo Partidário quando houver aprovação com ressalvas de contas, em prestígio aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade fora aprovada (ainda que não integralmente). Dito de outro modo, não é razoável, ou proporcional, equiparar a aprovação com ressalvas à desaprovação, para efeitos de sancionamento.

Cito, a propósito, o seguinte precedente:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. UTILIZAÇÃO INCORRETA DO SISTEMA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. PERCEPÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FALHA EQUIVALENTE A 9,08% DO TOTAL DE RECURSOS AUFERIDOS NO PERÍODO EM EXAME. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INVIABILIDADE DA APLICAÇÃO DE MULTA E DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. (...). 6. Falhas que representam 9,08% dos recursos auferidos no exercício financeiro. Hipótese que, na esteira da jurisprudência firmada no Tribunal Superior Eleitoral, viabiliza a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar a severa penalidade de desaprovação das contas, admitindo o juízo de aprovação com ressalvas quando a baixa representação percentual das irregularidades não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário. 7. O art. 36 da Lei n. 9.096/95 trata das sanções aplicadas aos partidos quando constatada a violação de normas legais ou estatutárias, enquanto o art. 37 da mesma lei estabelece o regramento para o caso de desaprovação das contas. Trata-se de normas distintas, independentes entre si e que não se confundem. O primeiro artigo vige até os dias atuais com a mesma redação da data da promulgação e nunca sofreu alterações, ao contrário do segundo, que foi sucessivamente modificado pelo Congresso Nacional por meio das Leis n. 9.693/98 e n. 13.165/15. A nova redação do art. 37 da Lei n. 9.096/95 dispõe que a desaprovação das contas enseja, como única penalidade, a devolução da quantia apontada como irregular acrescida de multa, circunstância que prejudica eventual interpretação de que, no caso de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, poder-se-ia aplicar pena mais severa. Desde a edição da Lei dos Partidos Políticos, ao interpretar o art. 36, o TRE-RS assentou que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não há fixação da pena de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário aos partidos políticos, nada obstante a previsão legal disponha a cominação dessa sanção. Diretriz alinhada ao entendimento do TSE no mesmo sentido. A sanção é desconsiderada por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente, situação incompatível com a fixação de penalidade. 8. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC 0600288-75, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 15.6.2020, DJE de 23.6.2020.) (Grifei.)

Diante do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do exercício financeiro de 2020 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA DO RIO GRANDE DO SUL, e determino o recolhimento do valor de R$ 24.135,43 (vinte e quatro mil, cento e trinta e cinco reais e quarenta e três centavos) ao Tesouro Nacional, com fulcro no art. 14, § 1º, e no art. 58, § 2º, ambos da Resolução TSE n. 23.604/19.

Fica autorizado o desconto de futuros repasses do Fundo Partidário na hipótese do § 1º do art. 41 da Resolução TSE n. 23.709/22.