REl - 0600155-94.2021.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/08/2023 às 16:00

VOTO

Senhora Presidente. Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de três dias, previsto no art. 30-A, § 3º, da Lei n. 9.504/97, e atende aos demais requisitos legais, razão pela qual dele conheço.

A preliminar de recebimento do recurso com efeito suspensivo já foi tratada em decisão de lavra da Desa. Eleitoral Kalin Cogo Rodrigues (ID 45012370), a qual apontou que o apelo possui efeito ope legis, por força do § 2º do art. 257 do Código Eleitoral,  motivo pelo qual afasto a prefacial.

Ao mérito.

Trata-se de recurso interposto pelo vereador ÉMERSON FERNANDO LOURENÇO em face de sentença na qual o juízo a quo entendeu procedente a representação, ao fundamento de que presentes despesas ilícitas com relevância suficiente para a caracterização da prática prevista no art. 30-A da Lei n. 9.504/97:

Art. 30-A Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.

§ 1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, no que couber.

§ 2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado.

§ 3º O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

(Grifei.)

 

O art. 30-A da Lei das Eleições trata da captação e dos gastos ilícitos de recursos, ambos com finalidade eleitoral.

Portanto, para a aplicação do artigo em comento, o ingresso e o dispêndio do recurso financeiro na campanha eleitoral há de ser realizado em desacordo ao disposto na Lei n. 9.504/97, especificamente no que concerne às regras reguladoras da arrecadação e dos gastos de recursos durante a campanha.

Nesses termos, a ilicitude poderá estar na forma de recebimento de recursos que seriam, em princípio, lícitos – por exemplo, valores que não tenham transitado pela conta obrigatória do candidato, consoante o art. 22, caput, da Lei n. 9.504/97, ou, ainda, no recebimento de recursos ilícitos em si mesmos, como doação efetuada por concessionário ou permissionário de serviço público, ou oriundos de fonte vedada, conforme o art. 24 do mesmo diploma, desde que comprovada a gravidade e o impacto no prélio eleitoral.

O comando legal visa evitar o desequilíbrio da disputa entre os candidatos. De modo reflexo, há o prestígio da transparência na arrecadação e nos gastos dos concorrentes que participam do processo eleitoral, com obediência às normas da lei eleitoral.

Ao caso concreto.

O apelo aqui tratado se dá em face de sentença na qual, em síntese, o magistrado concluiu pela ilicitude dos gastos com combustível realizados pelo recorrido e não declarados na contabilidade de campanha, tudo em face da ausência de negativa da defesa, somada aos depoimentos juntados ao feito e aos indícios de aporte financeiro, proveniente de facção criminal.

Transcrevo, no que importa, trecho da sentença exarada na origem, atinente à carência de registro das despesas com combustível, no acervo contábil do vereador:

Os gastos com combustível foram investigados pela prova testemunhal e embora apresentou-se uma prova titubeante e não direta ao fato, mas, de qualquer forma, tem-se admitido pela defesa esses gastos.

A conclusão não é a mesma que se dá ao caso da doação.

Repetindo, que embora as testemunhas ouvidas não tenham prestado um depoimento objetivo e concreto quanto ao caso do representado ou seu comitê, o fato é incontroverso.

Resume-se o que declararam as testemunhas ligadas ao posto de gasolina que foi objeto de investigação e busca apreensão.

Willian Rodrigo Machado, que trabalhava no Posto 2011 chefe de pista, disse que é uma prática comum a utilização de vales diariamente, que “estes vem somente com o valor pago e que recebem no caixa. Sobre as carreatas mencionou que naquele momento eram várias e que os clientes abasteciam no posto, além disso alguns clientes tinham o adesivo de políticos, como tinham clientes que abasteciam todo dia ali e com adesivos do Fernando, de outros vereadores e da Prefeita eleita”.

Outro frentista do mesmo posto de gasolina, Lucas de Souza, que não conhecia o representado, “estava presente no dia da operação, relata que o Sargento que comandou...chegou falando, que era coisa sobre compra de votos. ….Não se recorda sobre a carreata, teve ou não. Sobre os vales diz que na prática o cliente vai até um funcionário do posto pedir um vale, passa o cartão, vamos dizer de cinquenta reais, coloca-se a data do dia, então tem que retornar até o final da tarde para abastecer com o vale, só que não é pedido nada de documento da pessoa que fez esse vale. Simplesmente abastece com esses vales e leva até os caixas. Então passam no computador que já está pago, dando baixa'.

Assim, existente o procedimento no posto de gasolina e não negado pela defesa os gastos.

Tal proceder, assim, regula-se pelas exigências da legislação eleitoral, necessitando transparência através de declaração e documentação da atividade financeira, principalmente com movimentação em conta informada.

É evidente que não se tratam de gastos pessoais.

A questão crucial nesse fato é, portanto, a falta de declaração e de movimentação na conta bancária, o que faria lícito o ato, transparente, sério, hígido, não sendo assim aponta para a má-fé, especialmente quando mal explicado, maculando a conduta na campanha eleitoral do candidato, aqui representado.

Nessa questão dos gastos realizados com combustível a decisão de segundo grau apontou a irregularidade.

A defesa, como dito, não negou os gastos, limitando-se na tentativa de justificar que se tratavam de gastos pessoais e que parte apenas foi irregular.

É o que basta, não se tendo sequer a declaração das receitas que seriam utilizadas e tampouco o trânsito em conta.

Na contestação apresentada nesta representação, não se traz prova alguma sobre o que se alega, apenas sendo apresentado um recibo que se refere ao fato da doação, já apreciado.

Verificado que no expediente de prestação de contas (expediente 0600569-29.2020-6.21.071) que não constam registros de movimentação de despesas com combustíveis, tampouco constam despesas com a carreata realizada pelo então candidato.

O que a legislação eleitoral exige é simplesmente declaração, documentação e movimentação financeira transparente, de fácil comprovação.

Portanto, presentes gastos ilícitos resulta a cassação do diploma, na forma do § 2o do artigo 30-A da Lei 9.504/97.

(Grifei.)

 

Em sua irresignação, o recorrente sustenta que a decisão exarada não vem alicerçada em fundamentos cabais quanto à ilicitude da procedência dos valores utilizados na aquisição de combustível durante a campanha eleitoral. Nessa linha, defende que os gastos com combustível, no caso, são considerados despesas de natureza pessoal e não se sujeitam à prestação de contas. Assevera ser desproporcional a pena de cassação do diploma do candidato diante do reduzido valor envolvido, R$ 1.434,00 (um mil, quatrocentos e trinta e quatro reais). Suscita que não restou comprovada a origem ilícita dos recursos versados no pleito eleitoral. Afirma que não está demonstrada a existência de má-fé, afronta à moralidade do pleito ou influência no resultado das eleições. Atribui incoerência ao julgado, visto que, tendo o mesmo caderno probatório como base, o magistrado a quo entendeu insuficiente o acervo para concluir pela cassação do seu diploma na AIJE n. 0600633-39.2020.6.21.0172.

Nada obstante, o representado não trouxe ao feito provas quanto ao alegado uso pessoal de veículo, a justificar o dispêndio com combustível não declarado na prestação de contas. Entretanto, de forma a corroborar o aduzido pelo recorrente, consta do ID 45012799 testemunho do guarda municipal Edson Monteblanco, no qual confirma a utilização particular de automóvel pelo candidato.

De outro vértice, o douto Procurador Regional Eleitoral registrou que a presente representação teve por lastro investigação realizada para identificar eventuais candidatos ligados a organizações criminosas atuantes no Rio Grande do Sul. As informações obtidas na operação foram repassadas ao Núcleo de Inteligência do Ministério Público, recaindo, sobre o recorrente, suspeita de recebimento de apoio da facção conhecida como “Os manos”.

Indica o órgão ministerial que o representado possui passagem pelo sistema carcerário, período em que ficou confinado em galeria do Presídio Central de Porto Alegre controlada pelo grupo “Os manos” e, já no pleito de 2016, havia percebido valores provenientes da aludida facção, por meio de Pedro Arenhart, empresário do ramo de peças veiculares, o qual possui vínculo com a organização criminosa e aparece em transações financeiras com Juliano Biron, líder da célula criminal.

Nesse contexto, assevera que, por ocasião do pleito de 2020, foi observada a captação pelo recorrente de valores ilícitos oriundos do crime organizado, visando ao custeio de combustível em sua campanha eleitoral. Tais recursos não foram declarados pelo candidato em sua prestação de contas (n. 0600569-29.2020.6.21.0172), de sorte que sua origem não restou demonstrada, ainda que tal dispêndio seja autorizado pela regra eleitoral, à exceção das despesas com veículo de uso do próprio concorrente, as quais não se sujeitam à contabilidade eleitoral.

Primeiramente, consigno que o processo de prestação de contas de campanha do representado, citado no parecer ministerial – com trâmite, inclusive, junto ao egrégio Tribunal Superior Eleitoral –, foi arquivado, após decisão em sede de agravo de instrumento, sendo mantida sua desaprovação. Todavia, ainda que reconhecida a omissão contábil, não houve a imposição de recolhimento do montante gasto com combustível, na medida em que o comando não foi determinado pelo magistrado a quo, diante da incerteza quanto aos valores vertidos, nos seguintes termos:

Foi identificada a grande movimentação de valores gastos em combustíveis (apenas exemplificativamente totalizando R$ 1.604,94) que, embora não considerados gastos eleitorais, por ausência das condições explicitadas no Art. 35, § 11 da Res. 23.607/2019, denotam a presença de grande movimentação de valores cuja origem é incerta.

Em resposta ao apontamento efetuado pelo Parquet, o prestador alega que os gastos com combustíveis teriam sido aplicados, utilizando-se de veículo Ford Fiesta para transporte de equipamento de som, e de veículo VW Kombi para transporte de militantes e do próprio candidato, razão pela qual não necessitariam de passar pela conta-corrente.

Quanto ao transporte do candidato, certamente, não sendo considerado gasto eleitoral, é, dentre outros, despesa pessoal não passível de prestação de contas.

Já quanto ao transporte de equipamento de som e de militantes, sim, os gastos com combustíveis são considerados gastos eleitorais, consoante o art. 3, inc. IV da Res. já mencionada.

Assim, embora o Sr. Examinador tenha afastado a condição de gasto eleitoral das despesas com combustíveis, não faculta a lei que valores sejam movimentados paralelamente às contas oficiais do Candidato para pagamento de tais dispêndios. Entender diferente seria considerar autorizada pelo ordenamento a possibilidade da existência do “célebre” caixa 2, situação que, justamente, a análise das contas busca fervorosamente combater.

Teríamos, assim, em se tratando de recursos de origem não identificada com valor passível de verificação o seu recolhimento ao Tesouro Nacional nos termos do art. 32 já mencionado.

No entanto, não tendo sido possível quantificar o valor gasto com transporte pessoal do candidato para, dentre os comprovantes de pagamento de combustíveis, estabelecer o valor considerado gasto eleitoral não transitado pela conta-corrente, considero a existência de recurso de origem não identificada, mas deixo de determinar o recolhimento do montante, ora incerto, ao Tesouro Nacional. (Grifei.)

 

Entretanto, visando aprofundar a investigação quanto às finanças do representado, foi expedido mandado de busca e apreensão em seu comitê de campanha, o qual trouxe a lume novos documentos, contemplando expensas com combustível não registradas no caderno contábil do recorrente, na soma de R$ 1.455,84 (um mil, quatrocentos e cinquenta e cinco reais e oitenta e quatro centavos), dentre outros.

Os dispêndios apurados com o material apreendido, segundo parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, foram quitados com valores de procedência ilícita, consubstanciados em “vales-combustível” no Posto 2011, com o fito de abastecer os automóveis que participaram de carreata em prol do candidato, na qual estavam presentes indivíduos vinculados à organização criminosa "Os manos".

Com efeito, não há controvérsia quanto à despesa com combustível, no montante citado (R$ 1.455,84), não declarada pelo recorrente no feito de contas eleitorais. Todavia, como exarado na sentença de primeira instância, não é possível aferir sua origem.

O Parquet trouxe à baila indícios apontando que a ilicitude das cifras percebidas pelo recorrente, e não registradas no seu acervo contábil de campanha, não decorre apenas de sua ligação com o grupo criminoso, mas também da participação dos líderes da facção na sua carreata, o que, em realidade, teria motivado a sua omissão da prestação de contas, atinente ao pleito de 2020.

Entretanto, tais indícios não encontram amparo no acervo probatório, não ostentando força suficiente a acarretar a severa sanção de cassação do mandato.

Se não, vejamos.

No que toca aos depoimentos dos funcionários do Posto 211, local onde teria sido utilizado o valor supostamente advindo do crime organizado, embora comprovem a utilização de “vales-combustível” pelos candidatos, não são suficientemente concisos, a ponto de ratificar a hipótese vertida no parecer ministerial.

Quanto a esse aspecto, chamo a atenção para o testemunho, em audiência judicial, de William Rodrigues Machado Flores, funcionário do posto, o qual relata ser comum a utilização dos mencionados vales (ID 45012735, aos 2min38seg), bem como a ocorrência de várias carreatas no local, nas quais a testemunha atendia a clientes com adesivo de outros candidatos também (ID 45012736).

A mesma testemunha, em depoimento à Promotoria de Justiça (ID 45012625), deixou claro que os vales não apresentavam descrição quanto à sua origem, e que o mesmo só teve conhecimento de que os portadores dos vales participariam da carreata em prol do recorrente quando o fato era mencionado por eles, sem, contudo, identificar o pagador da ordem de abastecimento.

A oitiva da testemunha Lucas Ruan de Souza, frentista, caminha na mesma linha, porquanto, em síntese, confirma a utilização rotineira dos “vales-combustível” e que somente teve ciência do seu uso para que o portador do vale participasse da carreata em favor do representado, na medida em que relatado pelo cliente. Possui similar desfecho o depoimento de Tiago Henrique Câmara, representante legal do posto.

Prossigo.

Em que pese o vereador tenha passagem pelo sistema prisional, alocado em galeria controlada por facção criminosa, o argumento firmado pelo órgão ministerial não sinaliza, objetivamente, a existência de conluio deste com os demais condenados, do mesmo modo que, fosse conduzido à ala distinta do Presídio Central, recaindo em área comandada por outra organização, não seria possível da mesma forma concluir, terminantemente, pela sua ligação com esta.

Assim, cumprida a pena a ele imposta, o representado participou com êxito do pleito de 2016, alcançando a vereança no Município de Novo Hamburgo/RS, cargo para o qual foi reconduzido no pleito de 2020, ocupando, atualmente, a cadeira de presidente da Câmara de Vereadores.

No que tange à participação de membros da facção criminosa “Os manos” na carreata, conforme ID 45012618, é inegável sua ocorrência, a qual restou confirmada por fotos do evento.

Malgrado a incontroversa adesão de alguns integrantes da célula criminal à carreata, em proveito do recorrente, ela não faz prova, por si só, da realização de créditos ilícitos à sua campanha eleitoral.

É dizer, qualquer indício de ilicitude que possa ter a atividade do representado, ligado ou não à facção criminosa, por si não caracteriza que a fonte de aportes, durante o período eleitoral, seja decorrente desta atividade, sem elemento de prova direto.

Quanto à questão da influência destes criminosos no eleitorado, conquanto possa de fato existir, ela não é matéria afeta ao delito disposto no art. 30-A da Lei n. 9.504/97.

Exposta desta forma a moldura fático-probatória, não ostenta força suficiente – visto que calcada em provas indiciárias – a atrair o juízo de cassação de mandato.

Concluo.

Doutrina e jurisprudência são uníssonas ao entender que o art. 30-A visa proteger a lisura e moralidade dos pleitos eleitorais, dado que os ensinamentos doutrinários apontam que a norma defende “a higidez das normas relativas à arrecadação e gastos eleitorais” e “a lisura da campanha eleitoral” (Zílio, Rodrigo Lopez. Direito Eleitoral. 9. ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora JusPodivm, 2023., p. 830 e seg.), e a jurisprudência do TSE refere que o bem jurídico tutelado pelo art. 30-A é a moralidade das eleições (TSE, RO n. 1540, rel. Min. FELIX FISCHER, DJE 01/06/2009).

O referido julgado deixou assentado, ainda, que o juízo de procedência da representação por captação e gastos ilícitos de recursos deve ser pautado pelos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade, pois “a sanção de negativa de outorga do diploma ou de sua cassação (§ 2° do art. 30-A) deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão perpetrada ao bem jurídico protegido”.

A partir de então, a praxe de julgamento da Justiça Eleitoral – no que se refere ao sancionamento pela desobediência ao art. 30-A – tem passado invariavelmente pela realização de juízo de ponderação diante do quadro fático probatório. Tal raciocínio presta-se, por vezes, para afastar a pena de cassação (TRE/RS, RE n. 254-30, Relator Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 02.08.2017; TRE/RS; RE n. 451-58, Relator Dr. Sílvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 02.08.2017) e, noutras, para aplicar a reprimenda mais gravosa (TRE/RS, 0600035-95.2021.6.21.0028, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 16.12.2022).

E há critérios para mensurar a gravidade da conduta.

A jurisprudência do TSE indica que, para a aplicação da severa pena de cassação do registro ou diploma, devem estar evidenciados dois requisitos, ou seja, a comprovação da arrecadação ou gasto ilícito, bem como a relevância da conduta praticada:

Representação. Arrecadação ilícita de recursos.

1. Comprovada, por outros meios, a destinação regular dos saques efetuados em espécie na conta bancária específica, ainda que em dissonância com o disposto no § 1º do art. 21 da Res.-TSE nº 23.217/2010, resta evidenciada a possibilidade de controle dos gastos pela Justiça Eleitoral.

2. Este Tribunal tem decidido pela aplicabilidade dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no julgamento das contas de campanha, quando verificadas falhas que não lhes comprometam a regularidade.

3. Para a cassação do diploma, nas hipóteses de captação ou gastos ilícitos de recursos (art. 30-A da Lei nº 9.504/97), é preciso haver a demonstração da proporcionalidade da conduta praticada em favor do candidato, considerado o contexto da respectiva campanha ou o próprio valor em si.

Agravo regimental não provido.

(Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 274641, Acórdão de 18/09/2012, Relator Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 199, Data 15/10/2012, Página 3)

 

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÃO 2010. REPRESENTAÇÃO. LEI N° 9.504/97. ART. 30-A. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. CASSAÇÃO. DIPLOMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PROVIMENTO. 1. Na representação instituída pelo art. 30-A da Lei n° 9.504/97, deve-se comprovar a existência de ilícitos que possuam relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição. 2. No caso dos autos, as omissões relativas a determinados gastos de campanha não possuem gravidade suficiente para ensejar a cassação do diploma do recorrente, na medida em que no ficou comprovada a utilização de recursos de fontes vedadas ou a prática de caixa dois. 3. Recurso ordinário provido.

RECURSO ORDINÁRIO n° 393-22.2011.6.04.0000/AM Relator Min. DIAS TOFFOLI. Julgado em 01.08.2014)

 

Ainda, a ponderação há de ser feita no momento do sancionamento da conduta, pois a caracterização da infração do art. 30-A independe de prova da lesão. E o TSE consolidou o entendimento de que é desnecessária a prova da potencialidade da conduta para influir no resultado do pleito, pois a exigência tornaria “inócua a previsão contida no art. 30-A, limitando-o a mais uma hipótese de abuso de poder”. Para a Corte Superior, “o bem jurídico tutelado pela norma revela que o que está em jogo é o princípio constitucional da moralidade (CF, art. 14, incidência do art. 30-A da Lei n. 9.504/97”, sendo necessária a prova da proporcionalidade (relevância jurídica) do ilícito praticado pelo candidato, e não da potencialidade do dano em relação ao pleito eleitoral.

A procedência da demanda reclama a demonstração inequívoca da “existência de ilícitos que extrapolem meras irregularidades na prestação de contas do candidato” (TSE – RO 194710/AC, Relator: Min. José Antônio Dias Toffoli, DJE de 11.10.2013), porquanto, “na conformação da conduta ao art. 30-A da Lei n. 9.504/1997, deve-se levar em consideração a relevância jurídica do ilícito no contexto da campanha, orientada pelo princípio da proporcionalidade” (TSE - AC: 39481/MT, Relator: Min. Gilmar Ferreira Mendes, DJe de 11.09.2015).

Nesse sentido, colho as seguintes ementas:

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÃO 2010. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. LEI Nº 9.504/97, ART. 30-A. DIPLOMA. CASSAÇÃO. PROVIMENTO.

1. O recurso cabível contra a decisão que envolve a perda do diploma em eleições federais e estaduais é o ordinário. Na espécie, é admissível o recebimento do recurso especial como ordinário, por aplicação do princípio da fungibilidade. Precedentes.

2. Na linha da jurisprudência firmada por esta Corte, para a incidência do art. 30-A, § 2º, da Lei nº 9.504/97, é necessária a aferição da relevância jurídica do ilícito, porquanto a cassação do mandato ou do diploma deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão ao bem jurídico protegido pela norma.

3. In casu, a quantia movimentada irregularmente corresponde a apenas 2,7% (dois vírgula sete por cento) do total de recursos, utilizados na campanha eleitoral, não sendo suficiente para ensejar a cassação do diploma.

4. Recurso ordinário provido."

(TSE - REspe n. 6-82/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 14.3.2014.) Grifei.

 

Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilícita de recursos. Abuso do poder econômico.

1. Segundo a jurisprudência do Tribunal, para que seja imposta a sanção de cassação em razão da prática do ilícito previsto no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, faz-se necessária a comprovação da proporcionalidade da conduta em relação à penalidade a ser imposta.

2. Ademais, para a configuração do abuso do poder econômico, faz-se necessária, em se tratando de eleições municipais de 2008, a comprovação do requisito de potencialidade.

3. Ainda que reconhecida a utilização de linha de telefone pertencente a sindicato - cujo número foi informado para fins de comunicações processuais da Justiça Eleitoral -, não ficaram evidenciadas outras circunstâncias a indicar a gravidade ou potencialidade da conduta, de modo a configurar os ilícitos dos arts. 30-A da Lei das Eleicoes ou 22, caput, da Lei Complementar nº 64/90.

Agravo regimental não provido."

(TSE - AgR-REspe n. 9565164-06/CE, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 9.10.2012.) Grifei.

 

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÃO 2010. REPRESENTAÇÃO. LEI Nº 9.504/97. ART. 30-A. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. CASSAÇÃO. DIPLOMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PROVIMENTO.

1. Na representação instituída pelo art. 30-A da Lei nº 9.504/97,

deve-se comprovar a existência de ilícitos que possuam relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição.

2. No caso dos autos, as omissões relativas a determinados gastos de campanha não possuem gravidade suficiente para ensejar a cassação do diploma do recorrente, na medida em que não ficou comprovada a utilização de recursos de fontes vedadas ou a prática de caixa dois.

3. Recurso ordinário provido.

(TSE - RO 39322/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 21.8.2014.) Grifei.

 

Fica estampada, da análise, a ausência de gravidade das circunstâncias, as quais estão despidas de força suficiente para interferir na liberdade do voto e desequilibrar a disputa eleitoral.

Acrescento que o vício, ainda que fosse demonstrado, não causou prejuízo à isonomia entre candidatos, dado que a aludida vantagem, supostamente oriunda de fonte ilícita, não restou espelhada nos números nas urnas, na medida em que o candidato logrou 2.695 votos contra os 4.041 obtidos pelo primeiro colocado, e apenas 49 votos a mais que o concorrente subsequente a ele. De sorte que não há falar em desequilíbrio entre os players, durante a corrida eleitoral.

Assim, embora os valores utilizados no adimplemento das despesas com combustível não tenham sido declarados, de forma a ensejar irregularidade capaz de macular a transparência das contas eleitorais, isso não significa, necessariamente, que houve arrecadação ou gasto ilícito de campanha, os quais possuem contornos diversos, abrangendo o recebimento de recursos de fonte vedada, movimentação de “caixa 2” ou gastos irregulares, com incidência sobre a legitimidade do pleito, o que não se verifica na espécie.

Dessa forma, a reduzida expressão percentual do valor trazido nos fatos, R$ 1.455,84, em uma campanha que girou em torno de R$ 44.000,00, sequer autorizaria a desaprovação das contas, tendo em consideração a diretriz jurisprudencial estabelecida no TSE e nesta Corte Regional no sentido de que falhas inferiores a 10% do recursos manejados não têm o condão de macular a integridade e fidedignidade da contabilidade como um todo.

A própria alusão, no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, a um número de mais de 250 automóveis, não condiz com o valor envolvido, tampouco com os depoimentos carreados, visto que tal quantidade de veículos demandaria uma cifra muito maior e não passaria despercebida nas oitivas.

Dessarte, constata-se a fragilidade do acervo probatório trazido aos autos para comprovar a gravidade e a relevância jurídica dos fatos, de modo a atrair a incidência das gravosas sanções previstas no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, impondo-se a reforma da sentença que julgou procedente a ação.

Ante o exposto, voto pelo provimento do recurso interposto por ÉMERSON FERNANDO LOURENÇO, para reformar a sentença e julgar improcedente a representação.

É como voto, Senhora Presidente.