PC-PP - 0600205-20.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/08/2023 às 16:00

VOTO

Preliminarmente, não conheço da documentação anexada à petição de ID 45481679, pois preclusa a oportunidade de juntada de novas provas.

Em que pese a fase instrutória tenha sido estendida nos presentes autos, inclusive com o recebimento de documento após o parecer conclusivo, não se pode prolongar indefinidamente a juntada de novos documentos, sob pena de quebra do princípio da celeridade e da preclusão dos atos processuais.

Ademais, no caso, a admissão dos novos documentos demandaria reapreciação pelo órgão técnico, hipótese em que esta Corte não tem admitido o conhecimento de nova documentação.

Mérito

O Diretório Estadual do REPUBLICANOS apresenta contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2021, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) deste Tribunal, examinando a contabilidade, apontou irregularidades concernentes ao recebimento de recursos oriundos de (2) fontes vedadas no montante de R$ 1.804,00, (3) recursos de origem não identificada no total de R$ 3.721,60 e, com relação ao (4) Fundo Partidário, não aplicação na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política feminina, do valor de R$ 1.698,98.

Passo ao exame das falhas relatadas.

Do recebimento de recursos de fonte vedada

No item 2 do Exame da Prestação de Contas (ID 44990060), foi apontado o recebimento de recursos de fontes vedadas no valor de R$ 1.804,00.

A agremiação não se manifestou a respeito da irregularidade apontada nem após o parecer conclusivo, nem com a juntada posterior de documentos. Contudo, em cumprimento ao despacho de ID 45018837, foi certificado nos autos (ID 45124791) que LUIZ IRINEU SCHENKEL estava filiado a outro partido e MARCELO VALDUGA não estava filiado à sigla quando das doações.

Assim, permaneceu a irregularidade em relação aos contribuintes abaixo elencados, pois não estavam filiados à grei partidária na data em que fizeram as contribuições, no valor total de R$ 1.804,00:

A percepção pelo partido político de recursos oriundos de tais fontes é expressamente vedada pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Nos mesmos termos, a Resolução TSE n. 23.604/19 assim prescreve:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Logo, como regra, o partido político é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive mediante publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário.

Note-se, porém, que na parte final do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95 é estabelecida uma exceção à vedação que, justamente por se tratar de uma salvaguarda, deve ser interpretada restritivamente no sentido de que, “quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação”, a operação será lícita.

Esse é o entendimento adotado por esta Corte, conforme resposta apresentada à Consulta n. 0600076-83.2020.6.21.0000, de relatoria do Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, julgada em 08.6.2020, na qual questionada a licitude de doações oriundas de filiados à agremiação diversa daquela destinatária dos recursos, proferida nos seguintes termos:

[…]

Nos termos do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação.

 

Assim, considera-se como de fonte vedada a importância de R$ 1.804,00, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nessa hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

 

Recebimento de recursos de origem não identificada

No item 3 do Exame da Prestação de Contas (ID 44990060), a SAI apontou o ingresso de recursos de origem não identificada, no valor de R$ 3.721,60, pois a agremiação não se manifestou em relação a esse item, nem após o parecer conclusivo (ID 45451077), nem com a juntada de documentos a posteriori, permanecendo este apontamento na íntegra.

Trata-se de recurso proveniente de doação do Diretório Municipal de Porto Alegre, receita indicada nos extratos bancários por meio do CNPJ do Diretório, porém sem individualização do CPF do doador originário, impossibilitando, assim, a identificação da real origem do recurso.

Concluo, assim, no mesmo norte da linha do parecer da unidade técnica, pela impossibilidade de identificação da origem do recurso, e determino o recolhimento do valor tido como irregular ao Tesouro Nacional:

Assim, não sendo possível atestar a real procedência do valor total de R$ 3.721,60, resta configurado o ingresso de recursos de origem não identificada, sujeitos a recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme disposto no artigo 14 da Resolução TSE n. 23.604/2019.

 

Aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Partidário

No item 4.2 do Exame da Prestação de Contas (ID 44990060) e do parecer conclusivo (ID 45451077), foi demonstrada a aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Partidário, no valor total de R$ 165.441,10.

A agremiação manifestou-se na petição sob ID 45393433 e acostou novos documentos de ID 45451482 a 45451502, afastando as falhas apontadas, de modo que a unidade técnica retificou o parecer conclusivo de ID 45451077, para considerar como regulares os gastos realizados com recursos do Fundo Partidário no valor de R$ 165.441.10.

Conforme apontado no item 4.5 do Relatório de Exame de Contas (ID 45133931) e reiterado no parecer conclusivo (ID 45451077), o partido não demonstrou a aplicação mínima de 5% de verbas do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, imposta pelo inc. V do art. 44 da Lei n. 9.096/95.

Consoante tabela apresentada pela unidade técnica no parecer conclusivo:

Considerando o total de recursos recebidos do Fundo Partidário (R$ 235.979,58) e o mínimo de 5% estabelecido para cota de gênero, o partido deveria destinar R$ 11.798,98.

O diretório apresentou demonstrativo de gastos (ID 45018653) de R$ 17.281,30 destinado à cota de gênero, assim aplicado:

a) R$ 4.200,00 - valor regularmente destinado à conta bancária 12946-9 da agência 1889 do Banco do Brasil (FP mulher). Em que pese o valor não tenha sido utilizado durante o exercício financeiro em exame, a unidade técnica observará a sua aplicação no exercício subsequente, sendo vedada a aplicação para finalidade diversa (art. 44, § 5º, da Lei n. 9.096/95);

b) R$ 5.900,00 - valor regular na aplicação de recursos por meio da conta do Fundo Partidário Ordinário (c/c 129014-2, agência 1899, Banco do Brasil);

c) R$ 250,00 - documento fiscal ID 44974919, em que não constar expressamente a finalidade da aplicação em programas de promoção e difusão da participação política das mulheres;

d) R$ 6.931,30 - possuem irregularidades na comprovação de despesas, além de não conter “expressamente a finalidade da aplicação”, em desacordo com o art. 22, § 5º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Remanesce, portanto, não comprovada a correta aplicação da diferença de R$ 1.698,98 (R$ 11.798,98 - R$ 4.200,00 – R$ 5.900,00 = R$ 1.698,98).

No ponto, transcrevo os seguintes artigos da Emenda Constitucional n. 117, de 05 de abril de 2022:

Art. 2º Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Art. 3º Não serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Em que pese a incidência da Emenda Constitucional n. 117 resultar no afastamento do disposto no § 1º do art. 22 da Resolução TSE n. 23.604/19, no sentido do não recolhimento de tal quantia ao Tesouro Nacional, o entendimento desta Corte é de que, independentemente do recolhimento de valores, a Justiça Eleitoral mantém o dever de aferir a regularidade do uso das verbas públicas.

Por fim, repiso a advertência referida no parecer conclusivo, a qual deverá ser observada para a próxima prestação de contas, sobre a “(…) existência de conta aberta do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, com saldo de R$ 8,02, a qual foi analisada no exame das contas eleitorais de 2020 (...)”, e que “(…) o banco deve encerrar essa conta bancária, transferindo a totalidade do saldo existente para o Tesouro Nacional, informando o fato à Justiça Eleitoral”.

 

Do Julgamento das Contas

Assim, as irregularidades constatadas alcançam a quantia de R$ 7.224,58 (R$ 1.804,00 + R$ 3.721,60 + R$ 1.698,98), que representa 2,06% do total examinado na presente prestação de contas (R$ 350.218,67), ou seja, menos de 10% da receita do exercício, viabilizando a aprovação das contas com ressalvas, por aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira do entendimento do egrégio TSE e deste Tribunal.

Outrossim, a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário é consequência específica do recebimento de recursos de fonte vedada no montante de R$ 1.804,00, nos termos do art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95:

ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DIRETÓRIO ESTADUAL. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE FONTE VEDADA. ART. 36, II, DA LEI 9.096/1995. ESPECIFICIDADE DA NORMA. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. APLICAÇÃO. 1. O TRE/SC desaprovou as contas do Diretório Estadual do Democratas (DEM), relativas ao exercício de 2016, com a imposição de sanção de suspensão do recebimento de novas cotas do Fundo Partidário pelo período de 2 (dois) meses com a determinação de recolhimento do valor de R$ 21.800,00 (vinte e um mil e oitocentos reais) ao Tesouro Nacional, bem como a transferência de quantia referente às sobras financeiras da campanha eleitoral de 2016. 2. A rejeição das contas consubstanciada em doação proveniente de fonte vedada (art. 31 da Lei dos Partidos Políticos) enseja a suspensão de cotas do Fundo Partidário prevista no art. 36, II, da r. norma, sopesados, no caso concreto, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 3. Trata–se de sanção específica sem que a norma geral, definida pelo art. 37, caput, tenha lhe revogado o conteúdo, na linha do art. 2º, § 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Logo, a ressalva do art. 36, II permanece hígida, inclusive diante da gravidade que constitui o partido em receber recursos legalmente proscritos.4. Agravo Regimental conhecido e desprovido.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060001294, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Relator designado Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 214, Data: 23.10.2020.)

Entretanto, considerando que a receita de fontes vedadas de R$ 1.804,00 representa 0,51% da movimentação em exame (R$ 350.218,67), tenho por não aplicar a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do exercício financeiro de 2021 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO REPUBLICANOS, e determino que a agremiação faça o recolhimento ao Tesouro Nacional das seguintes importâncias:

a) R$ 1.804,00, a título de recebimento de recurso de fonte vedada;

b) R$ 3.721,60, a título de recursos de origem não identificada.