PC-PP - 0600121-53.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/08/2023 às 16:00

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes Colegas.

Cuida-se da prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO DEMOCRACIA CRISTÃ – DC e seus responsáveis abrangendo o exercício financeiro de 2020.

A Secretaria de Auditoria Interna – SAI, após os procedimentos de verificação da movimentação contábil partidária e análise dos argumentos e documentos apresentados (ID 44805328), concluiu pela existência das irregularidades consubstanciadas na ausência das seguintes peças: a) balanço patrimonial; b) demonstrativo de uso de recursos do Fundo Partidário no incremento da participação política das mulheres; c) certidão de regularidade profissional do contabilista; e d) comprovante de remessa da escrituração contábil da Receita Federal do Brasil, acrescentando, ainda, a existência de contas bancárias não declaradas.

A obrigatoriedade de apresentação do balanço patrimonial encontra-se prevista no art. 32 da Lei n. 9.096/95 e art. 28 da Resolução TSE n. 23.604/19, de sorte que, ausente tal peça, restam não satisfeitos os comandos legais:

 

Art. 32. O partido está obrigado a enviar, anualmente, à Justiça Eleitoral, o balanço contábil do exercício findo, até o dia 30 de junho do ano seguinte.

 

Art. 28. O partido político, em todas as esferas de direção, deve apresentar a sua prestação de contas à Justiça Eleitoral anualmente até 30 de junho do ano subsequente, dirigindo-a ao:

[...]

§ 3º A prestação de contas é obrigatória mesmo que não haja o recebimento de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, devendo o partido apresentar sua posição patrimonial e financeira apurada no exercício.

(Grifei.)

 

Quanto ao demonstrativo de utilização dos recursos do Fundo Partidário na criação e na manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, o dever de apresentação da peça vem encartado no art. 29, § 1º, inc. XIII, da Resolução TSE n. 23.604/19:

 

Art. 29. O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e deve ser composto das informações declaradas no sistema SPCA e dos documentos juntados nos autos da prestação de contas.

§ 1º A prestação de contas dos partidos políticos será composta com as seguintes informações geradas automaticamente pelo sistema SPCA:

[...]

XIII - Demonstrativo de utilização dos recursos do Fundo Partidário na criação e na manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres; e

(Grifei.)

 

A falta deste relatório implica carência de detalhamento das aplicações efetuadas na criação e manutenção de programas de promoção e participação política das mulheres, mediante o manejo de verbas do Fundo Partidário destinadas, em parte, especificamente para este fim.

Todavia, de acordo com o item “V” do parecer conclusivo da SAI, o partido não recebeu recursos do FP, de maneira que, embora ausente o demonstrativo, não há recursos e, ato contínuo, aplicação de valores no incremento da participação das mulheres na política, devendo o ponto ser afastado.

No que toca à necessidade de juntada do comprovante de regularidade profissional do contabilista responsável, a agremiação deixou de atender à ordem disposta no art. 29, § 2º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.604/19, devendo ser mantido o apontamento:

 

§ 2º Após a autuação do processo de prestação de contas, na forma do art. 31, o partido político deve providenciar, em até 5 (cinco) dias, a juntada dos seguintes documentos:

[...]

III - Certidão de Regularidade do CFC do profissional de contabilidade habilitado;

(Grifei.)

 

Atinente ao comprovante de remessa à Receita Federal do Brasil da escrituração contábil digital, o partido não colacionou ao feito a peça, ao arrepio do descrito no art. 29, § 2º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.604/19, prejudicando o controle dos limites e isenções fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, conforme entendimento plasmado no art. 25 do mesmo diploma legal.

A escrituração contábil digital corresponde à versão digital dos Livros “Diário” e “Razão” e seus auxiliares, nos termos do art. 26 da Resolução TSE n. 23.604/19, in verbis:

 

Art. 26. A escrituração contábil digital compreende a versão digital:

I - do Livro-Diário e de seus auxiliares; e

II - do Livro-Razão e de seus auxiliares.

§ 1º A escrituração contábil digital deve observar o disposto nesta resolução e nos atos expedidos pela RFB e pelo CFC.

§ 2º Na escrituração contábil digital, os registros contábeis devem:

I - identificar:

a) a origem e o valor das doações e das contribuições;

b) as pessoas físicas com as quais o órgão partidário tenha transacionado, com a indicação do nome e do CPF do doador ou do contribuinte ou do CNPJ, em se tratando de partido político; e

c) os gastos de caráter eleitoral, assim considerados aqueles definidos no art. 26 da Lei n. 9.504/97;

II - especificar detalhadamente os gastos e os ingressos de recursos de qualquer natureza.

 

Como se depreende, por meio desse documento eletrônico são lançadas todas as operações patrimoniais ocorridas, incluídas as doações estimáveis em dinheiro, revelando-se, portanto, instrumento imprescindível à atividade de fiscalização desempenhada pela Justiça Eleitoral.

A despeito da determinação legal da adoção da escrituração digital, este Tribunal já entendeu que a omissão do referido documento representa impropriedade formal quando for possível efetuar a análise técnica das contas a partir de outros elementos disponíveis, mormente por meio da digitalização dos livros contábeis gerados pelo sistema específico da Justiça Eleitoral (TRE-RS – REl n. 963, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DEJERS de 04.9.2019).

Na hipótese concreta, entretanto, não houve o referido suprimento por outros meios, tendo a unidade técnica atestado a manutenção da glosa.

Dessa forma, a irregularidade sob análise, não saneada por outros meios, configura falha grave e capaz, por si só, de gerar a desaprovação das contas, na linha da jurisprudência:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO 2018. ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL DIGITAL. LIVROS DIÁRIO E RAZÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DA REMESSA À RECEITA FEDERAL. OBRIGATORIEDADE. PREJUÍZO À ANÁLISE DAS CONTAS. RECURSOS RECEBIDOS PELO PARTIDO. AUSENTE IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. TRANSPARÊNCIA DAS CONTAS PREJUDICADA. PENALIDADE DE MULTA. PATAMAR MÁXIMO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas de partido político, apresentada pelo diretório estadual e seus responsáveis, relativamente ao exercício financeiro de 2018.

2. Ausência do comprovante de remessa à Receita Federal da escrituração contábil digital. Trata-se da versão digital dos Livros “Diário” e “Razão” e seus auxiliares, nos termos do art. 26 da Resolução TSE n. 23.546/17. Instrumento imprescindível para a atividade de fiscalização desempenhada pela Justiça Eleitoral. Obrigatoriedade de apresentação expressa nos arts. 29, inc. I, e 66, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17. A irregularidade em liça, não saneada por outros meios, configura falha grave e capaz, por si só, de gerar a desaprovação das contas, na linha da jurisprudência.

3. Recebimento de recursos em espécie sem identificação do doador. O art. 13, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.546/17 dispõe que se consideram de origem não identificada os recursos recebidos pelo partido em que o nome ou inscrição no CPF ou CNPJ do doador não tenha sido informado. A jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral. Por consequência, o recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional é medida impositiva, porquanto corolário inafastável do recebimento pelo órgão partidário de quantia de origem não identificada, de acordo com o previsto no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

4. O prejuízo à confiabilidade e transparência das contas, relacionado à ausência de escrituração contábil, impõe a aplicação da penalidade de multa no patamar máximo legal de 20% sobre a quantia irregular, nos termos do art. 49, caput, da Resolução TSE n. 23.546/17 (art. 37 da Lei n. 9.096/95).

5. Reconhecida a utilização de recursos de origem não identificada ou esclarecida, cabe a análise da previsão contida no art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17 (art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95) e este Tribunal tem entendido pelo afastamento da penalidade ao fundamento de que a medida somente teria sentido no curso do processamento, porquanto, uma vez julgadas as contas, tal prova sequer teria espaço para ser realizada por força da preclusão processual. Ademais, em face da possível dificuldade do prestador de esclarecer a origem dos valores, culminaria em penalidade perpétua.

6. Desaprovação das contas. Recolhimento ao Tesouro Nacional. Aplicação de multa.

(TRE-RS. PC-PP 0600590-70.2019.6.21.0000, Relator: Miguel Antônio Silveira Ramos. Data de Julgamento: 10.12.2021. Publicação: DJE/TRE-RS, edição n. 11/2022, fls. 37v.)

(Grifei.)

 

Por derradeiro, a unidade técnica apontou a existência de contas bancárias em nome da agremiação não declaradas no feito contábil, contrariando o estabelecido no art. 29, § 1º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19 sobre o dever de juntar ao feito a relação de contas abertas em instituições financeiras.

A omissão prejudica sobremaneira o controle das contas partidárias, bem como a transparência do feito, visto que impede o exame da real destinação dos valores transmitidos à agremiação, de modo que o vício ostenta gravidade suficiente a atrair o juízo de desaprovação das contas anuais do partido.

O relatório conclusivo da SAI não registrou o ingresso de valores, tampouco operações bancárias, embora tenha referido a existência de contas não relacionadas, de maneira que não há valores a serem recolhidos ou sobre os quais deva incidir  multa, sanções previstas no art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Dessarte, mantidas as irregularidades relatadas pela SAI, as contas devem ser desaprovadas, na forma do art. 45, inc. III, al. "a", da Resolução TSE n. 23.604/19.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas do exercício financeiro de 2020 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DEMOCRACIA CRISTÃ, nos termos da fundamentação.

É como voto, senhora Presidente.