REl - 0600173-02.2020.6.21.0124 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/07/2023 às 14:00

VOTO

Senhora Presidente, Eminentes colegas.

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular e tempestivo, comportando conhecimento.

Nesse sentido, esclareço que estou superando a preliminar de não conhecimento do recurso suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, com base na inobservância do princípio da dialeticidade, por não ter o recorrente, supostamente, impugnado especificamente os fundamentos da sentença, conforme exigem o art. 932, inc. III, do CPC e o Enunciado da Súmula n. 26 do Tribunal Superior Eleitoral.

Isso porque o recorrente formulou pedido expresso de reforma da sentença, para que as contas sejam aprovadas sem qualquer ressalva, sob o argumento de que houve erro do profissional de contabilidade, o qual não utilizou os comprovantes que lhe foram enviados, bem como de que suas receitas e despesas são regulares e que poderia provar o alegado, mediante juntada de relatório de despesas atualizado.

Assim, a pretensão deduzida pela parte, ainda que inserida em um contexto argumentativo mais amplo, aparentemente dissociado das razões de decidir adotadas na sentença, atende minimamente ao requisito da dialeticidade, bem como demonstra o interesse recursal na alteração do resultado do julgamento, viabilizando o conhecimento do recurso.

Superada essa questão prefacial, adentro no exame do mérito.

 

Mérito

A prestação de contas do recorrente foi desaprovada, pois constatada a utilização de recursos de origem não identificada, no montante de R$ 10.323,50 (dez mil, trezentos e vinte e três reais e cinquenta centavos), dos quais R$ 2.774,50 (dois mil, setecentos e setenta e quatro reais e cinquenta centavos) são decorrentes de omissão relativa às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral e R$ 7.549,00 (sete mil, quinhentos e quarenta e nove reais), de divergência entre os extratos bancários e os registros no SPCE, verificados na conta de campanha e não declarados.

Em suas razões, o recorrente apenas alega que “por um erro formal irrelevante cometido por parte da empresa de contabilidade deixou de transferir os recibos e comprovantes de doações e despesas realizadas por esse candidato no decurso de sua campanha, ocasionando esse dano enorme em sua prestação de contas que poderá ser sanada com a juntada do relatório de despesas atualizado”. Sustenta a regularidade de despesas e receitas, pois realizadas com recursos próprios ou doações legais, e pugna pela juntada de comprovantes.

Pois bem.

O recorrente não juntou nenhum documento hábil a comprovar que os R$ 10.323,50 (dez mil, trezentos e vinte e três reais e cinquenta centavos), constatados como recurso de origem não identificada, são oriundos de recursos próprios ou doações legalmente realizadas por terceiros em prol de sua campanha; que seus gastos foram regulares; e que, consequentemente, houve equívoco do profissional de contabilidade por ele incumbido de fazer a declaração de contas.

No caso dos autos, o extrato final de prestação de contas foi entregue “zerado” pelo recorrente e sua equipe (contador e advogado), isso é, foi declarado que não houve receitas nem despesas durante todo o período de campanha eleitoral.

Entretanto, no parecer conclusivo (ID 45082755), o examinador identificou seis omissões, no total de R$ 2.774,50 (dois mil, setecentos e setenta e quatro reais e cinquenta centavos), relativas às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante circularização em confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais:

1. Em 03-10-2020, Fornecedor Nova Geração Ltda, valor R$ 800,00.

2. Em 22-10-2020, Fornecedor Andreia Magnus Bonho, valor R$ 199,00.

3. Em 06-11-2020, Fornecedor Artemais Gráfica Ltda, valor R$ 1.276,00.

4. Em 11-11-2020, Fornecedor Andreia Magnus Bonho, valor R$ 99,50.

5. Em 11-11-2020, Fornecedor Nova Geração Ltda, valor R$ 300,00.

6. Em 13-11-2020, Fornecedor Artemais Gráfica Ltda, valor R$ 100,00.

 

Igualmente, foram identificadas divergências entre a movimentação financeira registrada no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro), entregue “zerada”, e a aferida nos extratos eletrônicos, que apontou movimentação bancária de R$ 7.549,00 (sete mil, quinhentos e quarenta e nove reais), na conta “Doações para a Campanha”, Banco Unibanco, Conta 752622, Agência 5326:

1. Em 12-11-2020, houve aporte de R$ 1.200,00.

2. Em 13-11-2020, houve duas compensações de cheque de R$ 300,00 e de R$ 800,00.

3. Em 27-11-2020, houve aporte de R$ 1.376,00.

4. Em 01-12-2020, houve compensação de cheque de R$ 100,00.

5. Em 07-12-2020, houve compensação de cheque de R$ 500,00 e dois aportes de R$ 298,50 e de R$ 500,00.

6. Em 14-12-2020, houve duas compensações de cheque de R$ 99,50 e de R$ 199,00, e dois aportes de R$ 200,00 e de R$ 200,00.

7. Em 15-12-2020, houve compensação de cheque de R$ 200,00.

8. Em 16-12-2020, houve saque de R$ 300,00.

 

Assim, havendo despesas emitidas contra o CNPJ de campanha do recorrente, sem que este as tenha registrado na prestação de contas, infere-se pela irregularidade de tais transações, visto que inviável à Justiça Eleitoral verificar a origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento dos referidos gastos, fato que poderia ser afastado pela apresentação de documentação pertinente, o que não ocorreu, no caso.

Logo, ausente qualquer esclarecimento por parte do recorrente quanto a essas falhas, os valores envolvidos, no total R$ 10.323,50 (dez mil, trezentos e vinte e três reais e cinquenta centavos), como reconhecido na sentença, caracterizam o uso de recursos de origem desconhecida, que devem ser obrigatoriamente transferidos ao Tesouro Nacional, consoante disposto no art. 14, caput, c/c o art. 32, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

(...)

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(…)

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

(…).

 

É bem verdade que, não havendo outras contas bancárias em nome do recorrente, somente parte dos valores constantes do extrato bancário da conta Banco Unibanco referem-se a recursos recebidos pelo candidato (aportes) que compuseram a sua receita, cuja origem não comprovada enseja sua qualificação como de “recurso de origem não identificada”; os demais são despesas realizadas pelo recorrente, e algumas coincidem com o valor das registradas nas notas fiscais eletrônicas pelos fornecedores apontadas no parecer conclusivo, a indicar que lhes serviram de pagamento, razão pela qual poderiam ter sido decotadas do montante final de irregularidades. Contudo, sem que haja afirmação do candidato nesse sentido, seguida ao menos de um início de prova documental, tal conclusão por esse juízo não se mostra recomendável, sob pena de se tomar uma suposição como verdade, resultando em um juízo superficial.

Assim, permanece a conclusão de que as falhas infringem o art. 53, incs. I, als. "g", II, "a", da Resolução TSE n. 23.607/19 e de que os R$ 10.323,50 (dez mil, trezentos e vinte e três reais e cinquenta centavos) devem ser considerados como de origem não identificada, a teor do art. 14 da mesma Resolução.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É como voto, Senhora Presidente.