REl - 0600305-35.2020.6.21.0132 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/07/2023 às 14:00

VOTO

Preliminarmente, consigno que não prospera a alegação pelo recorrente de que a intimação por oficial de justiça da oitiva de testemunhas de seu interesse foi indevidamente negada pelo juízo a quo. Em sua petição inicial, o recorrente requereu a oitiva de quatro testemunhas (ID 44938179). O despacho designando a audiência de instrução expressamente consignou que “as testemunhas devem comparecer independente de intimação” (ID 44938249), de acordo com o rito do art. 22, inc. V, da Lei Complementar n. 64/90. A audiência de instrução foi realizada sem a oitiva das testemunhas do recorrente, sendo que no termo da reunião judicial ficou registrado que “os autores desistem da oitiva de suas testemunhas” (ID 44938274).

Em pedido posterior, o recorrente solicitou a intimação, via oficial de justiça, das testemunhas Aurora do Nascimento Silveira e Sérgio do Nascimento Silveira e prazo adicional para encontrar a pessoa de Jacó Schepp (ID 44938277). O mesmo pedido foi reiterado (ID 44938281), sob a alegação de cerceamento de defesa. A Juíza Eleitoral concedeu o prazo de 15 dias para a parte providenciar a intimação das testemunhas e indeferiu a intimação via oficial de justiça (ID 44938282). O recorrente não obteve êxito em localizar as testemunhas e solicitou prazo de 30 dias (ID 44938286), o que foi deferido pelo juízo (ID 44938288). Posteriormente, houve uma nova solicitação de prazo de 30 dias para cumprir diligências (ID 44938292), a qual estou indeferida sob fundamento de preclusão (ID 44938295).

Não há que se falar em cerceamento de defesa, pois a magistrada,  após audiência de instrução, acatou pedidos da parte recorrente por duas vezes, oportunizando mais prazo para a intimação das testemunhas e realização de diligências (ID 44938282 e ID 44938288), o que não foi cumprido pelo recorrente, isentando o órgão judiciário pela não-realização da prova. O deferimento sucessivo de prazos não se coaduna com o rito célere de ações eleitorais.

Relativamente à intimação por oficial de justiça, o rito do art. 22, inc. V, da LC n. 64/90 é claro ao estabelecer que em AIJE cabe às partes trazer a juízo as testemunhas arroladas, independentemente de intimação. Nesses casos, a intimação por oficial de justiça é excepcional e pode ser realizada com a aplicação subsidiária do art. 455 do CPC, conforme entendimento do TSE, in verbis:

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO FEDERAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. UTILIZAÇÃO DE VALORES NÃO DECLARADOS. RECURSOS ILÍCITOS. FONTE VEDADA. ESTRUTURAÇÃO. UTILIZAÇÃO DE CONTAS DE PASSAGEM. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. CONFIGURAÇÃO. RECURSO IMPROCEDENTE. CASSAÇÃO DE DEPUTADO FEDERAL. INELEGIBILIDADE. ART. 22 DA LC 64/90. RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ACÓRDÃO PARCIALMENTE MANTIDO. SÍNTESE DO CASO 1. (...)

8. O art. 22, V, da Lei Complementar 64/90 prescreve, como ônus das partes, as providências necessárias ao comparecimento das suas testemunhas arroladas, independentemente de intimação. Contudo, o § 4º, IV do art. 455 do CPC prevê tratamento diferenciado para a intimação das testemunhas arroladas pelos órgãos estatais em juízo, estabelecendo a intimação judicial quando as testemunhas forem arroladas pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública. Não há vedação à aplicação suplementar do CPC, nos moldes da Res.-TSE 23.478.

9. Improcede a alegação dos recorrentes de juntada de documentos pelo Ministério Público após a apresentação da defesa e a alegação de violação do contraditório, já que foi oportunizado após a juntada de todos os documentos durante a instrução. (…)

(RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL nº 060158509, Acórdão, Relator(a) Min. Sérgio Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 108, Data: 10/06/2022)

 

Ademais, como bem consignado no parecer ministerial, o art. 455 do CPC postula que “a intimação de testemunha por via judicial poderá ser feita se a testemunha convocada pelo advogado mediante carta com aviso de recebimento não comparecer à audiência, o que não foi o caso dos autos, pois ausente demonstração de envio de carta com aviso de recebimento às testemunhas acerca da audiência de instrução e também ausente a recusa delas de comparecer em juízo (ID 45376803)”.

No mérito, o recorrente pede a cassação do diploma e a declaração da inelegibilidade dos candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice-prefeito de Erval Seco, Leonir Koche e Vilmar Viana Farias, respectivamente, e do candidato a vereador Lucas Camargo Manfio, por prática de abuso de poder econômico, captação ilícita de sufrágio e violação à isonomia entre os candidatos, com base em dois áudios enviados em conversa do aplicativo WhatsApp.

O primeiro áudio, abaixo transcrito, tem como emissor Jacó Schepp, que o enviou a Hélio Parnow:

Não, cara, eu me decepcionei, sabe que, aí não tenho mais outros familiares, só tenho a tia Aurora lá no Arco-Íris e os dois filhos dela, um meio, os dois são meio deficientes, né, o mais novo é deficiente, obeso aquele um, e o outro que é o soropositivo lá, também, os três têm título, ah, o professor Gilmar passou lá, daí eu liguei pra tia, vamo dar um apoio e tal, não, sim, nós vamos votar neles, tá loco, o professor é gente buena, trabalhamo junto, não sei o quê, daí na sexta, no sábado, foram lá com 800 pila, compraram os três, oitocentos conto, um vereadorzinho Manfio lá e mais não sei mais quem, uma catrefa, professor, uma vagabundagem da pior espécie, né, esses 300 e poucos voto aí, eles compraram todos, eu acho, e tu sabe que o pobre se vende né, o pobre é bicho bobo, jaguarada ôme, ganharam aí na mão grande, como dizem.

 

Hélio assinou declaração afirmando que recebeu o referido áudio via Whatsapp em seu telefone (ID 44938287), porém isso apenas comprova a recepção do áudio e sua autenticidade.

O segundo áudio, abaixo transcrito, tem como emissor Sérgio do Nascimento Silveira:

Mas eu acho que foi pro piá do Irto que ele vendeu o voto dele, mas o piá é bom, família boa, quem não ganhou foi o Paulo Heemann, né, que era outro que merecia ganhar, mas ele não compra voto, né, ou de repente não quis investir muito.

 

O conteúdo dos áudios não é prova “cabal” da ocorrência do ilícito, como alega o recorrente (ID 44938309),  visto que se trata de declarações produzidas unilateralmente e que apenas se referem a eventuais fatos, sem juízo algum de certeza. Obviamente que não se descarta a existência da compra de voto e nem o seu caráter reprovável, nos termos do declarado pelas pessoas de Jacó Schepp e Sérgio do Nascimento Silveira, porém são insuficientes como meios de prova, como bem apontado na sentença.

Em audiência de instrução, as testemunhas Juliéte Pilger do Amaral Post (vizinha de Sérgio e de Aurora) e Gabriela Regina Albarello de Quadros (noiva de Lucas Camargo Manfio) foram ouvidas como informantes, e não trouxeram fatos incriminadores à conduta dos recorridos durante a sexta-feira e o sábado, véspera da eleição (ID 44938274).

Em síntese, a prova trazida aos autos não é suficiente para ensejar um juízo de condenação. Consoante parecer ministerial juntado aos autos, “os áudios consistem em relatos de terceiros, que afirmam ter conhecimento da compra de votos. Toda a prova dos autos se resume a isso. Não houve produção de prova testemunhal, imagens, captação de diálogos entre os supostos envolvidos ou apreensão de valores que pudessem confirmar a alegada captação ilícita de sufrágio” (ID 45376803).

Por derradeiro, devido à ausência de indícios, a captação ilícita de sufrágio e o abuso do poder econômico ficam descaracterizados no caso.

DIANTE DO EXPOSTO, afasto a matéria preliminar e, no mérito, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença de improcedência da ação.