REl - 0600002-27.2020.6.21.0130 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/07/2023 às 14:00

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de recurso do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA – PSDB do Município de São José do Norte e de seus dirigentes partidários contra sentença do Juízo da 130ª Zona Eleitoral, que indeferiu o pedido de regularização de contas não prestadas, relativas ao exercício 2012.

As contas foram julgadas não prestadas nos autos do processo n. 1097.2013.621.0130, feito no qual se verificou a não apresentação dos Livros Diário e Razão, bem como o recebimento de recursos de origem não identificada, na quantia de R$ 2.989,30.

Por ocasião do presente pedido de regularização, a agremiação apresentou os Livros Diário e Razão (ID 103953029 e ID 103953030) e, no ponto, a sentença considerou sanada a falha, mas indeferiu o pedido em razão da ausência de identificação dos doadores ou comprovação do recolhimento dos recursos de origem não identificada.

Os recorrentes sustentam, em síntese, a nulidade da sentença.

1. Da violação da ampla defesa e do contraditório

Os recorrentes, no grau de origem, requereram a expedição de ofício à agência bancária n. 0860.88 do Banrisul, para apresentação dos documentos comprobatórios da origem das transferências bancárias realizadas em 02.01.2012, em montante de R$ 890,00, cujo extrato apresentado omite a contraparte.

O pedido foi indeferido ao argumento de que “competia ao Partido, única e exclusivamente, a obrigação de manter a escrituração contábil da agremiação partidária do exercício financeiro, de forma a demonstrar a origem das receitas e aplicações dos recursos, ademais, competia a ele, única e exclusivamente, esclarecer e comprovar a origem dos recursos apontados como irregulares, não podendo terceirizar esta função à instituição bancária.”.

Os recorrentes alegam que tal indeferimento fere os princípios da ampla defesa e do contraditório, e pugnam pela decretação da nulidade da sentença, invocando os arts. 373, § 1º, e 380, ambos do Código de Processo Civil, que transcrevo:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:

(...)

§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. Art. 380. Incumbe ao terceiro, em relação a qualquer causa:

I - informar ao juiz os fatos e as circunstâncias de que tenha conhecimento;

II - exibir coisa ou documento que esteja em seu poder

 

Sem razão os recorrentes.

Os dispositivos invocados não lhes socorrem, pois não há nos autos comprovação de que a grei partidária tenha buscado, junto à instituição financeira, os documentos necessários à identificação dos depositantes das receitas, e tampouco que de tal busca tenha resultado recusa injustificada de parte do banco.

Ademais, como acertadamente registra a decisão hostilizada, a obrigação de manter a escrituração contábil recai, única e exclusivamente, sobre a agremiação.

Não acolho o argumento, portanto. A diligência - ou a prova de sua impossibilidade - cabia à agremiação - os demais partidos políticos de São José do Norte, apenas a título de exemplo, igualmente tinham como obrigação prestar contas anuais relativamente ao exercício de 2012. 

2. Da inobservância ao rito da regularização das contas anuais

Sustentam os recorrentes que, por indeferir o pedido de oficiamento à instituição bancária proposto pelo partido, caberia ao juízo determinar a intimação da agremiação para que recolhesse o valor apontado como irregular. Aduzem que a ordem de encaminhamento dos autos diretamente ao Ministério Público feriu o rito previsto para o processamento da regularização das contas.

Uma vez mais não lhes assiste razão.

A matéria está disciplinada na Resolução TSE n. 23.604/19, art. 58, § 2º, inclusive citado em parte na irresignação:

Art. 58. Transitada em julgado a decisão que julgar as contas não prestadas, os órgãos partidários podem requerer a regularização da situação de inadimplência para suspender as consequências previstas no art. 47.

(…)

§ 2º Caso constatada impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário, do Fundo Especial de Financiamento de Campanha ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 12 e 13, o órgão partidário e seus responsáveis devem ser notificados para fins de devolução ao erário, se já não houver sido demonstrada a sua realização.

§ 3º Recolhidos os valores mencionados no § 2º ou na ausência de valores a recolher, o Juiz Eleitoral ou o Tribunal, conforme o caso, deve decidir sobre o deferimento ou não do requerimento apresentado, aplicando ao órgão partidário e a seus responsáveis, quando for o caso, as sanções previstas nos arts. 48 e 50 ou aquelas aplicáveis à época das contas que se pretende regularizar, caso sejam relativas a exercícios anteriores a 2018.

§ 4º Na hipótese de a decisão prevista no parágrafo anterior impor o recolhimento de valores e/ou a aplicação de sanções, a situação de inadimplência do órgão partidário e dos seus dirigentes somente deve ser levantada após o efetivo recolhimento dos valores devidos e o cumprimento das sanções impostas na decisão prevista no § 3º.

 

Com efeito, no caso dos autos houve a constatação de recursos de origem não identificada (hipótese prevista no texto do art. 13, mencionado), impondo-se a notificação do órgão partidário e  de seus dirigentes, para fins de devolução ao erário, e o despacho de ID 45459951 cumpre a prescrição legal, integrado pelo seguinte teor:

Vistos.

Intimem-se os requerentes para que, no prazo de 20 dias, manifestem-se sobre o teor do parecer conclusivo (ID 2833442), oportunidade em que poderão ser juntados documentos complementares e/ou comprovado o recolhimento ao erário dos valores apontados como de origem não identificada (R$ 2.989,30).

 

Ora, a comprovação da regularidade das falhas apontadas nas contas deveria acompanhar a própria propositura do presente pedido de regularização, o que não ocorreu. Diante da intimação para sanar irregularidades por meio de documentos complementares ou comprovar o recolhimento, mediante o despacho reproduzido, os recorrentes optaram por peticionar o oficiamento à instituição bancária - aliás descabida, conforme fundamentado.

Para mais, da leitura dos parágrafos 3º e 4º do supracitado artigo, resta evidente a possibilidade de imposição de recolhimento de valores igualmente na decisão final do pedido de regularização de contas não prestadas, e aqui, para evitar tautologia, valho-me de excerto do parecer do órgão ministerial:

Ainda que referido dispositivo efetivamente autorize a intimação do partido para recolher os valores relacionados a “impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário, do Fundo Especial de Financiamento de Campanha ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 12 e 13”, os parágrafos subsequentes àquele permitem compreender que também é possível que a imposição de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional venha com a sentença que julga a regularização das contas, tal como realizado pelo juízo de origem. Enquanto o §3º do art. 58 da Resolução TSE nº 23.604/2019 dispõe sobre a decisão a ser proferida quanto ao “deferimento ou não do requerimento apresentado, aplicando ao órgão partidário e a seus responsáveis, quando for o caso, as sanções previstas nos arts. 48 e 50”, o §4º do art. 58 esclarece que “Na hipótese de a decisão prevista no parágrafo anterior impor o recolhimento de valores e/ou a aplicação de sanções, a situação de inadimplência do órgão partidário e dos seus dirigentes somente deve ser levantada após o efetivo recolhimento dos valores devidos”. Ou seja, é plenamente possível que a decisão sobre a regularização das contas imponha o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

Embora seja prevista a possibilidade de que tal recolhimento seja antecipado, a sua utilidade só será verificada na hipótese em que a prestação de contas tenha elementos para que seja julgada regularizada, ocasião em que todas as pendências já estarão satisfeitas no momento do seu julgamento. Evidentemente que este não é o caso do recorrente, razão pela qual não há que se falar em inobservância do rito e tampouco de nulidade a macular a sentença.

 

Portanto, observado o rito legal, descabe declarar a nulidade da sentença.

Em resumo, os recorrentes não se desincumbiram dos ônus a eles inerentes no presente feito de regularização, de modo que os argumentos recursais devem ser afastados, impondo-se a manutenção da sentença pelos seus próprios fundamentos.

Diante do exposto, VOTO por negar provimento ao recurso.