REl - 0600575-71.2020.6.21.0128 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/06/2023 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

 

Juntada de documentos em grau recursal

Ainda em sede preliminar, cumpre registrar a viabilidade dos documentos apresentados com o recurso.

Sobre o tema, este Regional, sempre em juízo de exceção, tem se pautado pela potencialização do direito de defesa no âmbito dos processos de prestação de contas, especialmente quando se trata de documento simples que dispense a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares, não apresentando prejuízo à tramitação processual.

O posicionamento encontra respaldo no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência deste Tribunal Regional (Rel n. 060094628, Acórdão, Relatora Des. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 74, Data: 28/04/2023; REl n. 060045821, Acórdão, Relator Des. Federal Luís Alberto D`Azevedo Aurvalle, julgado em 18.10.2022; REl n.060029877, Acórdão, Relator Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, julgado em 21.09.2022, exemplificativamente).

Com essas considerações, tenho que é possível conhecer, em caráter excepcional, dos documentos anexados ao recurso (ID 44988587 e seguintes), que, embora em número considerável, têm o potencial de sanar as irregularidades detectadas mediante simples leitura, sem necessidade de nova análise técnica.

 

Mérito

Eminentes colegas.

O juízo a quo desaprovou as contas e determinou o recolhimento do valor de R$ 14.200,00 (quatorze mil e duzentos reais) ao Tesouro Nacional, em razão da ausência de detalhamento individualizado dos gastos e da falta de comprovação da propriedade do imóvel objeto da despesa registrada como locação (ID 44988581), in verbis:

(...)

Consoante depreende-se do Relatório de Despesas Efetuadas, documento ID 57435216, e dos documentos fiscais juntados aos autos não foi observada a disciplina do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/2019 no que tange à descrição detalhada das seguintes despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC:

1) Publicação no Jornal O Mensageiro, ocorrida no dia 09/11/2020, no valor de R$ 1.349,00 para a qual foi emitida a nota fiscal n. 31701889, documento ID 57435233, em cuja descrição do serviço consta “Eleições 2020 Arno da Silva Prefeito”

2) Publicação no Jornal O Mensageiro, ocorrida no dia 09/11/2020, no valor de R$ 1.651,00, para a qual foi emitida a nota fiscal n. 31701960, documento ID 57435235, em cuja descrição do serviço consta “Eleições 2020 Arno da Silva Prefeito”;

3) Nota Fiscal n. 342, emitida por Simoni Tatiana Saldanha ME, em 06/11/2020, no valor de R$ 5.000,00, documento ID 57435237, em cuja descrição dos serviços consta apenas “vídeos para campanha 2020”;

4) Nota Fiscal n. 35, emitida por Eder Francisco Lodi, em 05/11/2020, no valor de R$ 5.000,00, documento ID 57435241, em cuja descrição dos serviços consta “Produção de Programas de Rádio destinados a Propaganda Gratuita”.

Deste modo, foi solicitado o detalhamento individualizado dos gastos, com especificações de quantitativos, medidas e a quem se destinaram tais serviços, além da comprovação da efetividade dos mesmos através da juntada, aos autos, dos materiais produzidos e publicações realizadas, de acordo com o art. 60, § 3º da Resolução TSE 23.607/2019.

Contudo, o prestador manteve-se inerte, restando impedida a verificação da regularidade dos gastos eleitorais com os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, art. 53, II, c, da Resolução TSE 23.607/2019, impondo desta forma, a devolução dos valores relativos aos itens acima, no total de R$ 13.000,00, ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, §1º, da supracitada Resolução.

Ainda, tendo sido identificada a despesa com locação de imóvel comercial para o que foi apresentado um recibo de pagamento de aluguel, no valor de R$ 1.200,00, com parcas informações, solicitou-se a apresentação de comprovação de propriedade/posse do imóvel pela beneficiária da despesa bem como a discriminação da finalidade da referida locação.

Outrossim, o prestador manteve-se silente não deixando alternativa diversa da imputação de devolução do valor de R$ 1.200,00 ao Tesouro Nacional, pela impossibilidade de aferição da regularidade do gasto com os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC nos termos supracitados.

O Ministério Público Eleitoral emitiu parecer pela desaprovação das contas, considerando a existência de vícios graves e insanáveis, que contrariam dispositivos centrais da Lei nº 9.504/97, referentes à prestação de contas de campanha, bem como da Resolução nº 23.607/2019 do Tribunal Superior Eleitoral.

Por todo o exposto, DESAPROVO as contas prestadas pelos candidatos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, ARNO DA SILVA e ERNANI BACKES, relativas às Eleições de 2020 do Município de Ernestina-RS, com fundamento no art. 74, III, da Resolução 23.607/2019.

Determino o recolhimento do valor total de R$ 14.200,00 (quatorze mil e duzentos reais) ao Tesouro Nacional.

 

Os recorrentes deixaram de juntar documentos e esclarecimentos, quando intimados para tanto, alegando “motivos de saúde” - bem como o pedido de dilação de prazo apresentado -, alegação essa rejeitada pelo juízo a quo em razão de ausência de “comprovação efetiva de que o estado de saúde do peticionante impossibilitou o cumprimento do prazo” (ID 44988578).

Em sede de recurso, argumentam que não haveria necessidade de apresentar outros documentos além daqueles já acostados aos autos em razão do rito simplificado da prestação de contas em questão.

Ocorre que a adoção do procedimento simplificado não dispensa o registro de todas as receitas e despesas eleitorais, de modo a permitir à Justiça Eleitoral a fiscalização integral da movimentação financeira de campanha, consoante evidenciam os arts. 64, § 1º, e 65, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 64. A prestação de contas simplificada será composta exclusivamente pelas informações prestadas diretamente no SPCE e pelos documentos descritos nas alíneas "a", "b", "d" e "f" do inciso II do art. 53.

§ 1º A adoção da prestação de contas simplificada não dispensa sua apresentação por meio do SPCE, disponibilizado na página da Justiça Eleitoral na internet.

 

[…].

 

Art. 65. A análise técnica da prestação de contas simplificada será realizada de forma informatizada, com o objetivo de detectar:

I - recebimento direto ou indireto de fontes vedadas;

II - recebimento de recursos de origem não identificada;

III - extrapolação de limite de gastos;

IV - omissão de receitas e gastos eleitorais;

V - não identificação de doadores originários, nas doações recebidas de outros prestadores de contas.

(Grifei.)

 

Da mesma forma, os documentos contábeis devidos nas contas simplificadas não se restringem àqueles descritos nas als. "a", "b", "d" e "f" do inc. II do art. 53 da citada Resolução, pois, havendo o recebimento de valores de origem pública, reclama-se, além da anotação contábil, a demonstração escorreita da destinação da verba por meio de documentos idôneos, consoante estipula o art. 64, § 5º, da multicitada Resolução, aplicável à hipótese:

Art. 64. (…).

[…].

§ 5º Na hipótese de utilização de recursos provenientes do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), além das informações transmitidas pelo SPCE, na forma do caput, o prestador de contas deverá apresentar os respectivos comprovantes dos recursos utilizados, na forma do disposto no § 1º do art. 53 desta Resolução.
 

 

Por conseguinte, a tese levantada não encontra guarida na legislação pátria.

Em sede recursal, os prestadores de contas juntaram documentos, vídeos e áudios com finalidade de comprovar os gastos eleitorais (ID 44988587 e seguintes), na forma do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Da análise dessa documentação, verifica-se que as irregularidades que conduziram ao juízo de desaprovação das contas restaram sanadas mediante a comprovação da prestação dos serviços contratados na campanha eleitoral de 2020.

Conforme bem apontado no parecer ministerial, as cópias das edições publicadas no Jornal O Mensageiro (ID 44988588) confirmam a veiculação da propaganda em seis edições. Da mesma forma, a declaração fornecida pelo veículo de imprensa (ID 44988587) indica que as notas fiscais fornecidas correspondem às publicações nas datas e edições especificadas (ID 44988587).

Já os vídeos de ID 44988590, 44988591, 44988592, 44988593, 44988594 demonstram que, efetivamente, houve a prestação dos serviços de produção de audiovisuais para campanha. Outrossim, os áudios de ID 44988596, 44988597, 44988598, 44988599, 44988600, 44988601, 44988602, 44988603, 44988604, 44988605, 44988606, 44988607, 44988608, 44988609 e 44988610 comprovam a produção de programas de rádio destinados à propaganda gratuita.

Assim, os elementos juntados aos autos comprovam a efetiva prestação dos serviços vinculados à campanha eleitoral, nos termos no art. 60 da resolução de regência.

Por fim, a matrícula do imóvel, ficha cadastral, fatura de energia elétrica e cópias do contrato de locação (ID 44988611, 44988612, 44988613, 44988614) certificam que a locadora Denize Schmitz dos Santos é a legítima proprietária do imóvel objeto da locação comercial.

Destarte, imperiosa é a reforma da sentença, para o fim de aprovar as contas e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

No ponto, não obstante o Ministério Público Eleitoral ter opinado pelo provimento parcial do recurso e a aprovação das contas com ressalvas, ao argumento de que as falhas somente foram sanadas em segundo grau de jurisdição, entendo que, uma vez superadas as irregularidades, ainda que em sede recursal, não subsiste nenhuma falha que impeça a aprovação das contas.

Assim, com vênia ao entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral e considerando a redação do art. 74 da Resolução TSE n. 23.607/19, tenho que a aprovação das contas é medida que se impõe.

Ante o exposto, voto por conhecer dos documentos apresentados e por dar provimento do recurso para aprovar as contas de ARNO DA SILVA e ERNANI BACKES, candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Ernestina nas Eleições de 2020, afastando a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.