RevCrim - 0600060-27.2023.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/06/2023 às 14:00

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes colegas.

Inicialmente, cumpre estabelecer que a ação de Revisão Criminal tem por objeto “permitir que a decisão condenatória passada em julgado possa ser novamente questionada” (PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal, 13ª ed. 2010, p. 906).

Segundo o Supremo Tribunal Federal, a “revisão criminal, instrumento posto à disposição do condenado, tem como finalidade precípua conciliar, de um lado, a exigência de juridicidade da prestação jurisdicional e, de outro, a necessária segurança jurídica decorrente dos pronunciamentos emanados do Estado-Juiz, mediante observância de hipóteses de cabimento taxativamente previstas no ordenamento jurídico e que traduzam situações efetivamente graves que, em tese, possam autorizar a excepcional desconstituição da coisa julgada material.” (STF - Revisão Criminal RvC 5475 – Amazonas, Rel. Min. Edson Fachin, Plenário, 06.11.2019).

ROGÉRIO CENTENARO teve seu recurso parcialmente provido e foi definitivamente condenado por acórdão deste Tribunal, proferido no Recurso Criminal RC 309-92.2012.6.21.0103, à pena de 01 ano de reclusão, em regime inicial aberto (substituída por 01 prestação pecuniária de 10 salários mínimos nacionais e 01 prestação de serviços à comunidade, à razão de 01 hora de tarefa por dia de condenação), e multa de 5 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo, pela prática do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE).

O acórdão foi publicado no dia 27.8.2020 (ID 45445927 – fl. 2) e transitou em julgado em 05.8.2022 (ID 45446182 – fl. 30).

Pelo presente instrumento, pretende o autor a revisão da decisão condenatória, aduzindo, em síntese, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva e a contrariedade da decisão condenatória em relação a texto expresso em lei e à evidência dos autos, devido à desproporcionalidade da pena fixada ao Requerente em comparação às aplicadas a outros réus da mesma ação penal. Em virtude do exposto, requer (a) o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva, declarando-se extinta a punibilidade do revisionando; (b) subsidiariamente, seja revisada a pena fixada ao revisionando, com a exclusão da pena de multa; (c) a concessão de liminar, suspendendo a execução da pena; e, (d) em razão dos fatos expostos, seja reconhecido, por este Tribunal, o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos pelo Requerente.

Em relação ao pleito de concessão de liminar suspendendo a execução da pena, registro que foi por esta Relatora indeferido, conforme já constou no relatório (decisão ID 45453317).

Quanto aos demais pedidos, melhor sorte não socorre o Requerente.

Prossigo.

Em primeiro lugar, de plano, afasto a alegação da ocorrência de prescrição da pretensão punitiva. Ao contrário do afirmado pelo Requerente, tal circunstância já havia sido analisada minuciosamente no acórdão impugnado (ID 45445923 – fl. 13), cujo excerto a seguir transcrevo:

Não há prescrição a ser reconhecida.

Explico.

Nos termos do pacificado pela Súmula n. 497 do STF, quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação.

A pena definitiva aplicada ao recorrente restou fixada em 01 ano para cada um dos dois fatos pelos quais foi condenado.

A data do recebimento da denúncia, em 15.10.2012 (fls. 724-737), foi o primeiro marco interruptivo da prescrição.

Na sequência, a data da publicação da sentença condenatória, em 27.09.2016, foi o segundo (fl. 5154).

Como o recorrente nasceu em 08.10.1983 (doc. anexo), não incide a causa de redução prevista no art. 115 do Código Penal.

Portanto, visto que entre o primeiro e o segundo termos interruptivos da prescrição e entre o último e a presente data (06/07/2020) transcorreram menos de quatro anos (CP, arts. 109, inc. V, 110, § 1°, e 117, incs. I e IV), a pretensão punitiva não se encontra prescrita.

 

Cabe registrar que o acórdão foi publicado no dia 27.8.2020 (ID 45445927 – fl. 2), interrompendo novamente a prescrição, consoante pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que a seguir transcrevo:

“Nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o Acórdão condenatório sempre interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja mantendo, reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta” (HC 176.473/RR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/04/2020).

 

Portanto, não há prescrição a ser reconhecida.

De igual modo, não assiste razão ao Requerente ao alegar que o acórdão deu azo à hipótese do art. 621, inc. I, do CPP, o qual estabelece que a revisão dos processos será admitida quando a sentença condenatória for contrária a texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos.

Para sustentar sua alegação, o revisionando aduz que tal pressuposto se consolidou em virtude da suposta desproporcionalidade da pena fixada ao Requerente em comparação às aplicadas a outros réus da mesma ação penal (Algacir Menegat, Osnildo Luis de Godoi, e Ademir Perineto).

Sem razão.

A exasperação aplicada aos réus acima referidos deu-se de forma extremamente fundamentada (item 5.1 do acórdão - ID 45445925 – fls. 26-28), balizando-se na sedimentada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a seguir colacionada:

HABEAS CORPUS. ART. 157, § 2.°, I E II, POR DUAS VEZES, NA FORMA DO ART. 71, E ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. (1) IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO ESPECIAL. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. (2) MAJORANTES. QUANTUM DE ACRÉSCIMO. SÚMULA Nº 443 DESTA CORTE. ILEGALIDADE MANIFESTA. (3) CONTINUIDADE DELITIVA. QUANTUM DE AUMENTO. NÚMERO DE INFRAÇÕES. (4) NÃO CONHECIMENTO. ORDEM DE OFÍCIO.

1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial.

2. Em se tratando de roubo com a presença de mais de uma causa de aumento, o acréscimo requer devida fundamentação, com referência a circunstâncias concretas que justifiquem um aumento mais expressivo, não sendo suficiente a simples menção ao número de majorantes presentes para o aumento da fração. Súmula n.º 443 desta Corte. Ilegalidade flagrante.

3. É pacífica a jurisprudência deste Sodalício, em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplicando-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4, para 4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7 ou mais infrações. Na espécie, observando o universo de 2 (duas) infrações cometidas pelo réu, por lógica da operação dosimétrica, deve-se considerar o aumento de 1/6 (um sexto).

4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, no tocante à Ação Penal n.° 050.09.087780-2, Controle n.° 1.684/09, da 11.ª Vara Criminal Central/SP, a fim de reduzir a reprimenda do paciente para 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 3 (três) dias de reclusão, mais 16 (dezesseis) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença e do acórdão.

(HC 265.385/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 08/04/2014, DJe 24/04/2014) (Grifei.)

 

Verifica-se, por conseguinte, que, nos termos do sedimentado pelo STJ, a exasperação se dará pela seguinte correlação: a) 1/6 de aumento quando forem praticadas duas infrações; b) 1/5 para três; c) 1/4 para quatro; d) 1/3 para cinco; e) 1/2 para seis; f) 2/3 para sete ou mais ilícitos. E estes foram os critérios utilizados na exasperação das penas de Algacir Menegat, Osnildo Luis de Godoi, e Ademir Perineto.

Além disso, a irresignação do Requerente mostra-se completamente destituída de qualquer razão, na medida em que o acórdão deu parcial provimento ao seu recurso, reduzindo a pena imposta na sentença ao grau mínimo previsto para a conduta delituosa tipificada no art. 299 do Código Eleitoral, combinado com o art. 284 do mesmo diploma legal, ou seja, 1 (um) ano de reclusão. Transcrevo os normativos:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

 

Art. 284. Sempre que este Código não indicar o grau mínimo, entende-se que será ele de quinze dias para a pena de detenção e de um ano para a de reclusão.

 

De igual modo, mostra-se inviável o acolhimento do pedido subsidiário de exclusão da pena de multa, visto que esta decorre de imposição legal.

Não se identificam, portanto, razões que justifiquem o afastamento do trânsito em julgado da decisão condenatória, motivo pelo qual deve ser julgada improcedente a Revisão Criminal

Concluindo, como não houve descriminalização da conduta pela qual o autor da Revisão Criminal foi condenado e não houve a aplicação da pena de prisão, deve ser julgada improcedente a Revisão Criminal.

Em face do exposto, VOTO pela improcedência da presente ação revisional.

É como voto, Senhora Presidente.