REl - 0600723-33.2020.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/06/2023 às 14:00

VOTO

Da Preliminar de Violação ao Princípio da Dialeticidade

Os recorridos, em contrarrazões, argumentam ter ocorrido violação ao princípio da dialeticidade recursal, postulando seja o apelo inadmitido, por ausência de impugnação específica dos fundamentos da decisão hostilizada.

Na linha propugnada pela Procuradoria Regional Eleitoral, que bem examinou o ponto, conforme trecho abaixo, não há de prosperar a prefacial:

Conforme se pode ver da peça recursal, a inconformidade está bem delineada. Não há dúvida de que a controvérsia trazida ao conhecimento desse e. Tribunal diz respeito à interpretação da prova, que o juízo a quo reputou insuficiente, conclusão a que os autores se opõem. Considerar que a ausência de comprovação dos fatos alegados (conforme sustentado pelos recorridos) equivale ao não enfrentamento adequado dos fundamentos da sentença, de forma a provocar a inadmissão do recurso por afronta ao princípio da dialeticidade, consistiria em negação do princípio do contraditório e do direito ao duplo grau de jurisdição.

Por essas razões, a preliminar deve ser afastada.

 

Deveras, ainda que no apelo a articulação dos fatos, do direito e da razão do pedido de reforma careça de técnica apurada, é possível, de sua leitura, depreender-se que o objetivo é dar interpretação diversa ao conjunto fático-probatório constante dos autos, que foi reputado frágil na instância de piso.

Logo, é certo que a devida reanálise dos elementos probatórios constantes dos autos poderá conduzir à reforma da sentença, tal como pretende o recorrente, de modo que não se vislumbra ofensa ao princípio da dialeticidade.

Portanto, deve ser afastada a preliminar.

Da Preliminar de Intempestividade da Contestação e da Revelia

Os recorrentes alegam que “a apresentação das contestações pelos réus Gênova, Leandro, Elder, Vilmar, Jussiê, Élio e Gerno aos 06/02/2021, se mostra intempestiva, sendo imperioso o reconhecimento da revelia dos mesmos”, mas reconhecem que a defesa ofertada por LEONEL ADLER ocorreu no prazo assinado.

Ocorre que a data de juntada aos autos dos avisos de recebimento das cartas de notificação foi 01.02.2021, relativamente a VILMAR SOARES DA SILVA, GÊNOVA ANTONIA GIEHL, LEANDRO GOMES, GERNO ADELAR ALTMANN, ELDER KNAPP, JUSSIÊ RAFAEL ALBUQUERQUE BERWIG, LEONEL ADLER e ELIO GILBERTO LUZ DE FREITAS (IDs 44947492, 44947494, 44947496, 44947506, 44947504, 44947502, 44947500 e 44947498), não 26.01.2021, como afirmam os recorrentes, de sorte que inexiste intempestividade.

Não fosse isso, considerando que, como reconhecido pelos recorrentes, a contestação de LEONEL ADLER não foi tardia, a eventual revelia quanto aos demais impugnados não teria o condão de produzir o efeito de se presumir verdadeiras as alegações formuladas na inicial quando um dos litisconsortes impugnou os fatos, em face do disposto no art. 345, inc. I, do CPC.

Demais disso, com amparo no art. 345, inc. II, do CPC, a jurisprudência é firme no sentido de que, em ação que visa à cassação de mandato eletivo, “não se perfaz a produção dos efeitos da revelia, em virtude dos interesses públicos indisponíveis e relevantes tutelados” (TSE; RO n. 0603024-56.2018.6.07.0000, Acórdão, Relator: Min. Og Fernandes, DJE de 26.10.2020).

Portanto, a preliminar deve também ser rejeitada.

 

Do Mérito.

No mérito, os recorrentes alegam que ÉLIO GILBERTO LUZ DE FREITAS e GERNO ADELAR ALTMANN, reeleitos para os cargos de prefeito e vice-prefeito de Santo Antônio do Planalto, utilizaram bens, recursos e servidores públicos para favorecimento da campanha eleitoral deles, inclusive recursos captados ilicitamente, em conjunto com os demais recorridos, candidatos e candidatas ao cargo de vereador e vereadora, LEONEL ADLER, ELDER KNAPP. VILMAR SOARES DA SILVA, JUSSIÊ RAFAEL ALBUQUERQUE BERWIG e GÊNOVA ANTONIA GIEHL, circunstância que teria desequilibrado o pleito, tornando o seu resultado ilegítimo.

Insta salientar, primeiramente, que a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por ilegitimidade passiva, em relação a LEANDRO GOMES, tendo em vista o candidato não ter se sagrado eleito ou figurado dentre os suplentes, não foi objeto de impugnação no apelo, de maneira que resta preclusa a questão.

Demais disso, na peça recursal (ID 44947667) foi admitido inexistir prova de ato ilícito em relação a LEONEL ADLER, conforme o seguinte excerto:

A contestação ofertada pelo Réu Leonel Adler, refere, com razão, não existir com a inicial nenhum documento, mensagem (de texto ou de áudio) que comprove as alegações da inicial em face do mesmo. De fato, os Autores não receberam nenhuma prova material dos fatos ao réu atribuídos, posto que receberam apenas denúncias verbais, não replicadas pelas testemunhas quando das suas oitivas em audiência, mormente porque não foram ouvidas todas as testemunhas arroladas na inicial, em razão da limitação imposta em decorrência da pandemia do Covid-19.

 

Dessa maneira, os próprios recorrentes atestam que o acervo probatório relativo ao candidato LEONEL está limitado a declarações verbais não confirmadas em juízo e que não há provas sobre os fatos, tal como considerou a sentença.

Desse modo, ausente impugnação sobre a conclusão sentencial, o conhecimento de tal matéria não foi devolvido a este Tribunal (tantum devolutum quantum apelatum), impondo-se a manutenção da sentença de improcedência da demanda em relação a LEONEL ADLER.

Quanto ao mais, adianto que, na esteira da manifestação ministerial, o recurso não merece provimento.

Passo a analisar a moldura fática delineada nos autos, de acordo com a individualização da conduta dos recorridos constante do apelo.

I – GÊNOVA ANTONIA GIEHL (NEGA)

Os recorrentes sustentam que há prova material de prática de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, consistente no seguinte print:

Em alegações finais, os recorrentes afirmaram que essa conversa teria ocorrido entre a testemunha Nelci e Eliane Strauss.

Contudo, referida testemunha, em depoimento, negou a conversa com Eliane Strauss, eleitora que teria sido cooptada, a qual sequer foi arrolada pelos recorrentes para testemunhar em juízo.

Saliento, ainda, que aqui se trata de mera imagem, porquanto o suposto conteúdo do aplicativo de mensagens não foi registrado em ata notarial, não foi realizada perícia no aparelho original e tampouco estão as mensagens corroboradas por prova testemunhal ou de qualquer outra natureza, sequer pelas declarações de uma das próprias interlocutoras indicadas.

Portanto, tal print é elemento frágil, isolado e imprestável como prova do suposto ilícito.

Com propriedade, a Procuradoria Regional Eleitoral apontou:

À falta de aferição do print de mensagem de WhatsApp, cumpre referir, soma-se a prova testemunhal que não confirmou o fato narrado em relação à candidata GÊNOVA, que seria a pessoa indicada como “Nega” e que teria pago cem reais em troca do voto de Eliane, de modo que não há como se embasar um juízo de procedência e a consequente cassação do mandato.

Nesse contexto, a tese dos recorrentes se funda em presunção, o que resta insuficiente para configurar a conduta delituosa atribuída à impugnada.

 

Inexiste, assim, razão para a reforma da sentença sobre o ponto.

 

II – ELDER KNAPP

Os recorrentes aduzem que os ilícitos praticados por ELDER KNAPP estariam comprovados pela imagem acima reproduzida e pelas mensagens de áudio extraídas de WhatsApp trocadas entre as testemunhas Nelci dos Santos Oliveira e Carla Elisabete Koffan de Oliveira.

Nesse diálogo, consoante degravação realizada pelos recorrentes, Nelci teria dito: “Quem que te deu Carla duzentos e cinquenta, foi o Knapp ou o Basílio? Tem que ir lá buscar o resto né, se ele te prometeu tem que ir atrás” (ID 44947473), e Carla, então, falado: “Aquele dia que tu tava junto aqui ele me deu 250,00, daí ele disse se ganhasse ele ia me trazer mais, pode dizer para ele que to esperando, que não venha que não venha se fazer de leitão para mamar deitado” (ID 44947474), tendo Carla afirmado: “O knapp né, aquele que me prometeu... trazer o porco, é esse que eu quero”.

Juntam os recorrentes “apanhado de fotografias de inúmeras mensagens trocadas entre eleitores, que circularam largamente na comunidade, no qual é possível compreender que o réu Elder tinha a prática recorrente de “compra de votos”, através de oferecimento de cestas básicas, dinheiro, e outras vantagens”.

Argumentam que, em juízo, as testemunhas Nelci e Carla “visivelmente ‘combinadas’ em suas respostas, e certamente temerosas com a repercussão negativa que seus depoimentos lhes acarretariam, ora negam as conversas, ora negam o conteúdo das conversas, ora dizem que se tratou de uma “brincadeira”, e ora dizem que a conversa se deu de tal forma em virtude de uma delas se encontrar alcoolizada”, fato que decorreria de se sentirem constrangidas pela presença dos réus à audiência, entretanto, “mesmo que em juízo tais testemunhas não tenham replicado o conteúdo das inúmeras mensagens trocadas entre elas por aplicativo de mensagens, a prova material encontra-se anexa à inicial e é clara ao demonstrar a captação ilícita de sufrágio e o abuso de poder econômico”.

Ora, como assentado anteriormente, o mero print de tela de conversa de WhatsApp, não corroborado por qualquer outro meio de comprovação, não constitui prova idônea para sustentar a condenação em AIME.

O mesmo se aplica à “coletânea” de mensagens que teriam circulado na comunidade (ID 44947481), nas quais não é possível aferir com segurança mínima as circunstâncias de suas produções, compartilhamentos e a identidade dos participantes.

Além do mais, a conversa supostamente travada entre Nelci e Carla não restou confirmada pelas declarações prestadas em juízo pelas supostas interlocutoras, que rechaçaram a autenticidade de seu conteúdo.

Nelci (ID 44947643, 44947644 e 44947645) negou o diálogo, disse que sequer lembra conhecer Carla e que nunca autorizou a divulgação de suas conversas no WhatsApp.

Por sua vez, Carla (ID 44947646, 44947647 e 44947648) disse não saber sobre os áudios e que fazia brincadeiras porque “estava na cerveja”. Contudo, declarou conhecer Nelci, que é sua cunhada.

Em que pese o nervosismo demonstrado pelas testemunhas e a contradição na referência à relação entre as testemunhas, a veracidade dos áudios é negada por ambas, de modo que os arquivos são imprestáveis como meio de prova, porquanto sem ratificação mínima por qualquer outro meio.

Outrossim, as mensagens não estão atestadas em Ata Notarial ou mecanismo similar dotado de fé pública que possa comprovar sua autenticidade.

Cumpre ressaltar que a prova em análise consiste em arquivos avulsos, cada um com uma pequena fala de um pretenso diálogo entre as eleitoras.

Pela fragmentação das falas, não é possível depreender com segurança a identidade dos participantes, a época e o contexto em que produzidos os áudios.

Logo, não se verifica prova suficiente e idônea a ensejar um juízo de procedência da demanda em relação a ELDER KNAPP.

 

III – VILMAR SOARES DA SILVA (CHICO)

Os recorrentes sustentam que a prova de atos de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico praticados por VILMAR SOARES DA SILVA, conhecido como CHICO, residiria em mensagem de voz trocada por WhatsApp entre as testemunhas Nelci e Carla, na qual a última, conforme degravação, teria afirmado:

“Ah e o Chico mandou a Rosa me dar 100 pila também.” (ID 44947476)

 

Vê-se, pois, que, a partir das mesmas razões aduzidas no tópico anterior, é notadamente frágil a prova e desprovida de qualquer outro meio ou instrumento de corroboração de sua autenticidade.

O conteúdo da conversa, que não tem liame nítido com o pleito eleitoral, sequer foi confirmado pelos depoimentos prestados em juízo. Além disso, a suposta pessoa chamada Rosa não foi arrolada como testemunha.

Nesse contexto, é patente a carência de prova sobre o ato ilícito imputado a VILMAR SOARES DA SILVA.

 

IV – JUSSIÊ RAFAEL ALBUQUERQUE BERWIG

Segundo os recorrentes, as práticas de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico por JUSSIÊ RAFAEL ALBUQUERQUE BERWIG, de alcunha “TUTA”, encontram-se demonstradas nos autos por meio de mensagens de voz e texto trocadas por WhatsApp entre a testemunha Nelci e o eleitor Luciano da Luz, que dariam conta da existência de doação, efetivada pelo recorrido a Luciano, de caixa de luz, fiação elétrica e mão de obra para instalação, a qual teria sido prestada por servidor público municipal.

Reproduzo, a seguir, a degravação das mensagens  produzida pelos recorrentes (ID 44947435):

. Nelci 1 (áudio)

Luciano: - “Me deu dó do coitado do Tuta, eu queria que ele vencesse a eleição pra vereador.”

 

. Nelci 2 (áudio)

Luciano: - “Ele me deu uma baita mão eu queria que ele ganhasse pra vereador.”

 

. Nelci 3 (áudio)

Luciano: - “Fez tudo uma entrada de luz pra mim e um pouco em dinheiro.”

 

. Nelci 4 (áudio)

Luciano: - “Fez tudo, de botar a caixinha de luz, os fio, tudo.”

 

. Nelci 5 (áudio)

Luciano: - “Sim, lá tinha um fio puxado do pai porque a caixinha tava podre daí a Coprel tirou o relógio.”

 

. Nelci 6 (áudio)

Luciano: - “E ele e o Moisés disseram assim, se eu ganhar daí tem mais mil e eu arrumo as outras duas luz mas se eu perder daí morre por aqui mesmo.”

 

O conjunto probatório, no ponto, consiste exclusivamente nas referidas mensagens de voz, sobre as quais se aplicam os aspectos já examinados nos tópicos anteriores em relação à imprestabilidade probatória de supostos áudios do Whatsapp acostados sem autenticação mínima sobre suas origens e o contexto em que produzidos.

Ademais, a prova se mostra sem consistência ante o testemunho de Nelci, a qual não confirmou o conteúdo dos áudios, tampouco foi requerida a oitiva de Luciano para testemunhar a respeito.

Desse modo, inexiste prova suficiente para a reforma da sentença em relação a JUSSIÊ RAFAEL ALBUQUERQUE BERWIG.

 

V – ÉLIO GILBERTO LUZ DE FREITAS e GERNO ADELAR ALTMANN

No tocante aos candidatos reeleitos para os cargos de prefeito e vice-prefeito de Santo Antônio do Planalto, os recorrentes alegam a existência de provas robustas de que ÉLIO GILBERTO LUZ DE FREITAS e GERNO ADELAR ALTMANN praticaram captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico e político.

Como prova das alegações, apontam as seguintes mensagens de áudio extraídas do aplicativo WhatsApp e assim degravadas pelos apelantes:

. Nelci 8 (áudio)

Luciano: – “ganhei 100,00 da Ana também para botar gasolina”.

 

. Nelci 10 (áudio)

Luciano: - “o Márcio disse que hoje tavam lá no posto incomodando a Ana lá que ele falou que eu pedi a casa para ele.”

 

. Nelci 11 (áudio)

Luciano: – “Dai disse que a Ana disse para ele, te vira meu, ninguém mandou você ir contra o Elio... pra em vez de ir votar pro Elio não.”

 

**** ANA é a esposa do candidato a Prefeito Élio, primeira dama do Município

 

Fazem referência também à “prova documental consistente em mensagens escritas trocadas entre eleitores por aplicativo de mensagens, que circularam largamente no Município de Santo Antônio do Planalto”.

Nesse contexto, retomo os aspectos antes analisados sobre as mensagens acostadas desacompanhadas de Ata Notarial ou perícia, ressaltando que Neci negou a participação no diálogo; Luciano não foi ouvido em Juízo; e que inexistem outros elementos que sinalizem para a compra de votos em favor da chapa majoritária vitoriosa, mediante atuação de “ANA”, esposa de ÉLIO.

Por sua vez, as “mensagens escritas trocadas entre eleitores” (ID 44947481) consistem em uma aparente colagem de textos de mensagens, sem qualquer identificação complementar, não sendo possível aferir com segurança mínima as circunstâncias de suas produções, compartilhamentos e a identidade dos participantes.

Portanto, trata-se de elementos frágeis e de reduzido valor probatório, desgarrados das demais provas vertidas ao feito, sobretudo da testemunhal, de sorte que não se encontra minimamente demonstrada a captação ilícita de sufrágio.

Segundo o egrégio TSE, “a incidência do art. 41-A da Lei nº 9.504/97 exige prova inconteste da ilicitude consistente na promessa de bem ou vantagem pessoal capaz de interferir na liberdade de voto do cidadão - bem jurídico tutelado pela norma” (REspe n. 47444, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Data 30.4.2019), o que não se verifica na hipótese.

Adiante, os recorrentes aduzem que houve distribuição de serviços públicos municipais sem a correta contraprestação pelos munícipes beneficiados e sem observância dos procedimentos legais, caracterizando abuso de poder político.

Relatam que teriam sido prestados pela Prefeitura serviços ao eleitor Antônio Josenir Santos, cognome "Jhonson", em sua propriedade, e à sua família, mediante o uso de máquinas e servidores, sem requerimento prévio e pagamento antecipado com base na estimativa de horas necessárias, contrariando a legislação municipal. Salientam que “somente no dia em que o Autor foi até a propriedade da família fazendo perguntas é que, a fim de ocultar o ilícito, administrativamente houve o lançamento do serviço prestado pela Prefeitura em outubro, período eleitoral, o que de forma alguma afasta os ilícitos e o resultado deles sobre a eleição” e que não foi apresentado o “boletim de máquina pela Prefeitura de Santo Antônio do Planalto, consoante requeria a inicial”.

Conforme o requerimento de serviços de máquinas ou patrulha agrícola, juntado aos autos sob ID 44947529, Antônio Josenir Santos de Souza, em 10.12.2020, solicitou a “reforma de taipa”, com emprego de retroescavadeira, com estimativa de duração de 4 horas, no valor de R$ 398,00, cujo pagamento restou efetivado no dia 17.12.2020.

Discorrem que, acerca de requerimento de serviços de máquinas ou patrulha agrícola formulado por Claudiomiro Castanho do Nascimento, em 15.10.2020, em que solicita “trator/plantadeira” por 4 horas, no valor de R$ 286,56, o montante foi pago somente em 10.12.2020, e não foi apresentado boletim de máquina (ID 44947533).

Afirmam que Cildo Nissel (ID 44947534) teria requerido serviços de máquina dia 22.10.2020, ao passo que o pagamento ocorreu posteriormente, dia 16.11.2020, e não foi apresentado boletim de máquina pelos recorridos.

Alegam que Dalmiro Onofre do Nascimento requereu, nos dias 03.11.2020, 10.11.2020 e 17.11.2020, os serviços, respectivamente, de “gradear terra 2h + plantar soja 5h”, “plantar soja 4h” e “plantar soja 4h” (ID 44947535), mas que “não houve pagamento posterior, até a data da contestação ao menos”, e que não foi apresentado boletim de máquina.

Apontam que o casal Catarina Pires Martins e Ivalino Soletti requereu diversos serviços da Prefeitura, mas, em relação ao pedido de plantio de soja, por 3 horas, efetuado em 10.9.2020, não foi juntado comprovante de pagamento.

Quanto a Moisés Cardoso Lopes, asseveram que o serviço requerido, de abrir entrada de garagem e terra para fazer entrada 2h e 20km de caminhão, não foi antecipadamente pago e “o tempo de plantio lançado administrativamente é incompatível com o serviço prestado, onde estima-se necessários ao menos 3 dias de serviço e no mínimo 20 cargas de terra para o aterramento realizado”, além de não ter sido apresentado o boletim de máquina requerido.

Contudo, as alegações não têm o condão de infirmar a conclusão sentencial de que os serviços foram prestados com amparo e na forma da legislação municipal, ausentes outras provas que corroborem as alegações dos recorrentes.

Colho, por oportuno, breve passagem da sentença, que bem apreciou a documentação acostada aos autos:

Na hipótese dos autos, verifica-se a não caracterização dos ilícitos declinados na exordial, no ponto.

A realização de serviços no dia 15 de outubro de 2020, pela administração municipal, na propriedade da família de Antônio Jocemir Rodrigues de Souza, mais precisamente para correção de uma taipa de açude, realizados pelo servidor José Beron, sem a contraprestação pelos serviços, não ocorreu da forma relatada na peça autoral. A documentação juntada aos autos dá conta que os mencionados serviços prestados não foram assentados, nas planilhas, pelo servidor municipal responsável pela prestação correspondente, uma vez que as planilhas dos trabalhos realizados nos dias 15 e 16 de outubro (ids 77360111 e ID 77360112) registram trabalho do servidor em atividade diversa da alegada na inicial. Tal documentação contradiz a alegação da testemunha José Beron, que referiu ter registrado normalmente a prestação destes serviços para controle interno da Secretaria (id 94791496; 2’17” - 2’35”). Ademais, em defesa, os impugnados sustentaram que o serviço foi prestado sem prévia anuência da Secretaria de Obras, por conta do servidor José Beron e que só tomaram conhecimento de tal conduta, quando Antônio procurou o órgão para efetuar o pagamento. Juntaram, também, documentos – requerimento e comprovante de pagamento dos serviços prestados a Antônio com a data de dezembro de 2020 (id 77360109). Não logrou êxito, assim a parte autora, na comprovação da conduta ilícita imputada aos demandados pela prestação de serviços na propriedade de Antônio Jocemir Rodrigues de Souza, seja pela ausência de prova documental, seja pelas contradições verificadas na prova testemunhal.

Quanto às demais famílias/eleitores supostamente beneficiados pelas prestações de serviços, quais sejam: Arno Onofre, Cildo Nissel, Dalmiro Onofre Nascimento, Darusa e Diego, Ivalino Soletti e Moisés (Rincão Doce), verifica-se que todos estariam abarcados nas hipóteses previstas na legislação municipal (Lei Municipal nº 251/1996 e Lei Municipal n° 501/2001 – ids 77360107 e 77360108, respectivamente). Além de autorizados por previsão legal, os serviços foram corretamente solicitados e adimplidos, conforme prova documental carreada aos autos.

 

Nítido, portanto, que, em todas as hipóteses referidas, os serviços foram requeridos e, após, prestados pelo ente público.

Se, em alguns casos pontuais, o pagamento ocorreu a posteriori, ou se até mesmo não chegou a ocorrer, materializando-se a inadimplência dos cidadãos em relação à obrigação assumida perante o município, tal circunstância não pode, per se, sustentar condenação por abuso de poder e, em consequência, desconstituir mandatos eletivos conferidos pelo povo.

Destaca-se que sequer há a demonstração segura do liame entre os fatos e o pleito ou, ao menos, de que os quantitativos de serviços e de “isenções” teriam sido substancialmente incrementados no período eleitoral em comparação com épocas passadas.

Ora, para a caracterização do abuso de poder, impõe-se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio do pleito, o que não se verificou na espécie.

Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é firme no sentido de que, “para afastar legalmente determinado mandato eletivo obtido nas urnas, compete à Justiça Eleitoral, com base na compreensão da reserva legal proporcional e fundamento em provas robustas admitidas em direito, verificar a existência de grave abuso de poder, suficiente para ensejar as rigorosas sanções de cassação do registro, diploma ou mandato e inelegibilidade” (Ação de Investigação Judicial Eleitoral n. 060157558, Acórdão, Relator Min. Jorge Mussi, Publicação: DJE de 28.3.2019).

Aliás, destaco que não procede a ilação dos recorrentes, em seu apelo, de haver irregularidade nos “boletins de máquina” juntados pelos recorridos sob IDs 44947531 e 44947532, com datas de 15.10.2020 e 16.10.2020, respectivamente, por não possuírem informações quanto ao respectivo beneficiário.

Veja-se que no primeiro boletim (ID 44947531), no campo “serviços realizados, públicos ou particulares”, foi anotado “limpeza de sarjetas”, na Estrada Estância Nova; no segundo, consta, no mesmo espaço, o registro “limpar bueiros e sarjetas”, na Estrada Estância Nova.

Desse modo, infere-se que não se tratava de serviço realizado em propriedade particular, mas sim em via pública, não havendo que se falar em benefício pessoal a determinado eleitor e  tampouco em necessidade de contraprestação pelo serviço.

Outrossim, expõem os recorrentes que não há comprovação da regularidade dos serviços prestados à empresa AGRO-E COMERCIO DE PRODUTOS AGRICOLAS LTDA., em área de propriedade da família de Diego do Nascimento, atinente a construção de Galpão para Depósito de Calcário.

Quanto ao ponto, adoto fragmento da bem-lançada sentença, que analisou detidamente os fatos:

Relativamente aos alegados serviços prestados à família Nascimento, de Diego e Darusa, registra-se uma peculiaridade: os serviços de terraplenagem efetuados na propriedade e as cargas de terra dela retiradas ocorreram em razão de autorização da empresa instalada no local (id 77360126) além de autorização legislativa para tanto. Neste sentido, dispõe o art. 3º, inciso V da Lei Municipal nº 1.522/18 (ID 77363140):

“Art. 3º Para fins de instalação ou ampliação de atividade agropecuária ou empresarial, considerando a função social e a expressão econômica do empreendimento, os incentivos poderão consistir, conjunta ou isoladamente:

(…)

V- na execução de serviços de terraplanagem e transporte de terras, materiais (…)”

Além disso, as cargas de terra removidas foram utilizadas pela municipalidade em obras públicas.

Por fim, nota-se que, nos casos acima mencionados houve afirmação categórica da parte autora no sentido de que os beneficiários e suas famílias seriam eleitores no município e teriam votado nos candidatos Élio e Gerno. Tal afirmação, de per si, já seria rechaçada pelo próprio sigilo imposto ao voto, razão que não permitiria o autor ter convicção a respeito de tais informações. Além disso, particularmente, quanto a Diego do Nascimento, conforme cópia do título de eleitor juntada aos autos no id 77360117, trata-se de eleitor com domicílio eleitoral em Carazinho.

Destarte, o conjunto probatório apresentado pela parte autora é insuficiente no sentido de confirmar a prática das condutas ilícitas imputadas aos demandados especificamente quanto às respectivas prestações de serviços. Pelas razões já expostas, não se vislumbra possibilidade de adequação das referidas condutas como praticadas com abuso de poder político e/ou econômico, pois amparadas pela Lei, conforme prova documental juntada aos autos.

 

Realmente, restou demonstrado que a terraplanagem e a retirada de carregamentos de terra no terreno da família de Diego destinaram-se a fornecer condições para empresa ali se instalar, bem como as cargas de terra foram empregadas em obras públicas, nos termos de autorização legislativa municipal (Lei n. 1.631/20), de maneira que os fatos não revelam qualquer abuso de poder ou favorecimento individual.

Os recorrentes também se insurgem contra a falta de menção na sentença de que as testemunhas CARLA ELISABETE KOFFAN DE OLIVEIRA e NELCI MARIA DOS SANTOS OLIVEIRA fossem processadas pelo crime de falso testemunho, bem como contra a alegada omissão referente à necessária “instauração de procedimento investigatório pelo Ministério Público, para apuração de improbidade administrativa por parte dos envolvidos”.

Contudo, a parte demandante em ação de impugnação de mandato eletivo não tem interesse recursal para impugnar a adoção de tais providências ou a omissão a respeito, porquanto os pedidos não se relacionam com o objeto da demanda proposta.

Não fosse isso, haveria perda superveniente do interesse recursal, pois a Procuradoria Regional Eleitoral informa que está adotando as providências pretendidas, consoante trecho do parecer a seguir reproduzido:

No que tange à alegada omissão no que diz respeito aos pedidos de apuração pela prática do crime de falso testemunho e de instauração de Inquérito Civil pelo Ministério Público, assim decidiu o i. Juízo (ID 44947661, p. 19):

Ainda, quanto ao pedido de envio dos autos ao Ministério Público Eleitoral para investigação dos crimes denunciados na defesa e a condenação das testemunhas Clairton Khelt, José Beron dos Santos Freitas e Nelci Maria dos Santos de Oliveira nas sanções dos arts. 324 e 326-A do Código Eleitoral e da testemunha André Allebrandt nas sanções dos arts. 299, 324 e 326-A do Código Eleitoral, aludiu o parquet (id 96359163) que os relatos das testemunhas em juízo, “salvo melhor entendimento, esclareceram os fatos e afastaram a incidência de possíveis crimes (no mínimo, por ausência de dolo)”, razão pela qual indefiro o pedido, no ponto.

Ocorre que é da Justiça Federal a competência para o processo e julgamento do crime de falso testemunho praticado perante a Justiça Eleitoral. Nesse sentido, havendo indícios de cometimento do ilícito por parte de CARLA ELISABETE KOFFAN DE OLIVEIRA e NELCI MARIA DOS SANTOS OLIVEIRA, esta Procuradoria Regional Eleitoral informa que está remetendo cópia dos autos ao Ministério Público Federal, titular da ação penal, para a adoção das providências que eventualmente entender cabíveis.

Outrossim, tendo em vista a notícia de ilegalidades na prestação de serviços pela Prefeitura Municipal de Santo Antônio do Planalto, esta Procuradoria Regional Eleitoral procederá ao envio de cópia dos autos também ao Ministério Público Estadual, para conhecimento e adoção de eventuais medidas no que diz respeito à responsabilização dos agentes públicos na seara da improbidade administrativa.

 

Dessa forma, na linha do parecer ministerial, não demonstrada a prática de abuso do poder político ou econômico, captação ilícita de sufrágio nem captação ilícita de recursos por prova robusta e contundente, deve ser confirmada a sentença que julgou improcedente a ação.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela rejeição das preliminares e, no mérito, pelo desprovimento do recurso.