RecCrimEleit - 0600057-89.2021.6.21.0114 - Acompanho a divergência - Sessão: 05/06/2023 às 14:00

VOTO VISTA

Submeto à apreciação deste Colendo Tribunal o presente voto-vista.

Encontra-se em debate nesta Corte o recurso criminal interposto em face da sentença que condenou VERA TEREZINHA FALCÃO SOUZA ao cumprimento da pena de dois anos de reclusão, substituída por prestação de serviços à comunidade pelo prazo de oito meses, e ao pagamento de 15 dias-multa, pela prática do crime de apropriação indébita eleitoral previsto no art. 354-A do Código Eleitoral.

A sentença condenatória concluiu que, no curso da campanha ao cargo de deputada estadual das eleições de 2018, a recorrente teria se apropriado de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), mediante a emissão de cinco cheques ao portador, sem comprovação dos beneficiários e dos serviços prestados na campanha eleitoral.

Na sessão de 22.05.2023, a Eminente Relatora, Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, em seu excelente voto, após afastar as preliminares suscitadas pela defesa, discorreu sobre a presença da prova de autoria e de materialidade suficiente para o decreto condenatório, não vislumbrando causas excludentes de tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade, e desproveu o apelo recursal, mantendo as penas aplicadas, no que foi acompanhada pelo ilustre Desembargador Eleitoral Afif Jorge Simões Neto.

De outro lado, o ilustre Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo apresentou voto divergente, com judiciosas razões pela defesa contundente de garantias constitucionais, oferecendo dados objetivos sobre a fragilidade da prova da prática delitiva diante dos documentos contidos no feito, com destaque para os contratos firmados pela candidata. Apontou que o caderno probatório gera fundada dúvida sobre a existência do elemento volitivo do tipo e concluiu pelo provimento do recurso para absolver a ré, com base no art. 386, inc. VII, do CPP.

Acompanharam o posicionamento divergente o ilustre Desembargador Federal Rogério Favreto e a Excelentíssima Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak.

Pedi vista dos autos para melhor examinar o feito e refletir sobre a questão posta em discussão e, pedindo vênia à Eminente Relatora, acompanho integralmente os sólidos fundamentos do voto divergente prolatado pelo ilustre Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, com os seguintes acréscimos.

Ao descrever a apropriação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, mediante emissão de cheques ao portador – sem a identificação do beneficiário –, a acusação assume ônus de comprovar com segurança todas elementares do tipo, incluindo-se o dolo (inteligência dos arts. 156 e 158 do CPP; art. 373, inc. I, do CPC).

Sublinho, nesse sentido, o preciso argumento do voto do Excelentíssimo Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo que – ao analisar o caso detidamente –, inexistindo modalidade culposa nessa figura típica (art. 354-A do CE), a despeito da desídia da candidata com sua contabilidade eleitoral, entende não comprovado elemento subjetivo do tipo em face de inexistir nos autos prova de inautenticidade dos contratos, da inexecução dos serviços, de conluio ou de (re)direcionamento indevido dos valores.

Perfilham essas judiciosas razões, a propósito, o Excelentíssimo Desembargador Federal Rogério Favreto e a Excelentíssima Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, ressaltando (ao menos, dúvida razoável em favor da ré da) inexistência do dolo.

Por conseguinte, em razão dos princípios de intervenção mínima e de fragmentariedade, sendo a reprimenda penal a ultima ratio de proteção aos bens jurídicos, a irregularidade contábil apontada não desperta, por si só, automática responsabilização criminal, como exposto na ilustre divergência, sob pena de indesejada inversão de ônus probatório, quebra do princípio da verdade real e responsabilização penal objetiva.

ANTE O EXPOSTO, pedindo mais uma vez vênia à Eminente Relatora, Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, acompanho o voto divergente do ilustre Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo pelo provimento do recurso, a fim de absolver VERA TEREZINHA FALCÃO SOUZA com fundamento no art. 386, inc. VII, do CPP.