RecCrimEleit - 0000292-24.2016.6.21.0133 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/05/2023 às 14:00

VOTO

Preliminarmente, analiso a admissibilidade dos recursos interpostos.

Da Admissibilidade do Recurso Interposto pelo Ministério Público Eleitoral

Em preliminar reconhecida de ofício no curso da instrução, o eminente Relator à época, Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, observou que a sentença foi proferida em 04.07.2019 e o Ministério Público Eleitoral, na mesma data em que intimado, a despeito de evidente equívoco material do Cartório no lançamento do mês da certidão, em que constou junho e não julho (ID 44888843, fl. 11), interpôs recurso em 10.7.2019, por simples quota, na qual o agente ministerial consigna: “Interpõe-se apelação, requerendo-se, desde já, abertura de prazo para razões” (ID 44888843, fl. 12). Posteriormente, no dia 15.07.2019, foram apresentadas as razões recursais (ID 44888843, fl. 14).

Constata-se, portanto, que a interposição do apelo observou a sistemática prevista no art. 600 do CPP, conforme a qual a apelação é interposta por termo assinado nos autos, no prazo de 5 dias, correndo, após, o prazo de 8 dias para o oferecimento de razões.

De modo diverso, o recurso criminal eleitoral é regido por disciplina específica, sendo integralmente regulado pelos arts. 266 e 362 do CE, pelos quais o apelo deve ser interposto por petição desde logo acompanhada de razões, no prazo de 10 dias, justificando a aventada preclusão consumativa sobre a qual a Procuradoria Regional Eleitoral foi instada à manifestação.

Ocorre que a questão já restou debatida neste Tribunal, em processo análogo, também originário da cisão da Ação Penal n. 20-64.2015.6.21.0133, de Triunfo, em julgamento que, por maioria, afastou a preliminar sob o fundamento de que não há irregularidade recursal caso seja observado o decêndio legal, desde a intimação da sentença, no oferecimento das razões, hipótese dos autos:

RECURSO CRIMINAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. ART. 1º, CAPUT, DO DECRETO-LEI N. 201/67 C/C ART. 29, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR. AFASTADA. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. PEÇA DE INTERPOSIÇÃO DESACOMPANHADA DAS RAZÕES DE RECURSO. IRREGULARIDADE FORMAL. PREJUÍZO INEXISTENTE. ART. 219 DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. CONDUTAS DO ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. PRESCRIÇÃO. INEXISTENTE. CORRUPÇÃO ELEITORAL. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO DE DAR OU PROMETER O VOTO EM CONTRAPARTIDA AO BENEFÍCIO OFERTADO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. NECESSIDADE DE PROVAS ROBUSTAS DA PRÁTICA DE TODOS OS ELEMENTOS DO FATO CRIMINOSO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO PENAL. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra a sentença que, julgando improcedente a denúncia, absolveu os réus, com fundamento na atipicidade das condutas e na insuficiência de provas, nos termos do art. 386, incs. III e VII, do Código de Processo Penal.

2. A mera aplicação do princípio da especialidade para que o apelo não seja conhecido vai de encontro aos princípios do duplo grau de jurisdição, da proporcionalidade e da razoabilidade. Não se desconhece que as normas processuais comuns somente são aplicáveis ao processo-crime eleitoral se houver lacuna na disciplina da matéria, mas é certo também que, no âmbito do processo eleitoral, vige o art. 219 do Código Eleitoral dispondo que, “Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo”. É possível o conhecimento das razões oferecidas em data posterior à do termo declarando a intenção de recorrer, desde que dentro do prazo de interposição, por ausência de prejuízo, merecendo prevalecer a instrumentalidade das formas em detrimento do formalismo processual. Ainda, após a juntada do termo declarando da intenção de recorrer, o juízo a quo determinou a intimação do órgão ministerial para a apresentação de razões, induzindo a parte a crer que o procedimento estava adequado, configurando o error in procedendo no processamento do recurso no âmbito do primeiro grau e prejudicando o recorrente, levando-o a crer na regularidade da conduta adotada.

[…].

6. Provimento negado ao recurso, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a ação penal proposta com fulcro no art. 386, incs. III e VII, do CPP.

(TRE-RS; RC – 29576; Relator: Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, julgamento em 13.12.2021.) (Grifei.)

 

Nesses termos, cumpre adotar o mesmo entendimento para o caso em tela, inclusive em prestígio à isonomia e à segurança jurídica, razão pela qual conheço do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral.

 

Da Admissibilidade do Recurso Interposto por JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING e JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA

A intimação dos ora recorrentes ocorreu por meio de publicação no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral no dia 17.7.2019. Desse modo, o decêndio previsto no art. 266 do CE teve termo em 27.7.2019, um sábado. Sendo que o recurso foi interposto, com devidas razões, em 29.7.2019, deve ser reconhecida a sua tempestividade.

Por outro lado, é flagrante a ausência de interesse dos recorridos para se insurgirem contra a sentença que os absolveu de todas as imputações que lhes foram feitas, com fundamento na insuficiência de provas para a condenação.

Nesse sentido, o art. 577, parágrafo único, do CPP preceitua que “Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão”, sendo a hipótese aqui versada, pois os recorrentes suscitam preliminares de inépcia da denúncia, cerceamento de defesa decorrente da cisão processual e incompetência da Justiça Eleitoral para o julgamento dos crimes previstos no Decreto-Lei n. 201/67, buscando a nulidade da sentença que os absolveu.

Os próprios recorrentes entendem que não se trata de pretensão recursal por uma posição jurídica mais favorável na medida que delimitam o eventual provimento de seus pedidos recursais apenas “caso não mantida a absolvição”, condicionando o pedido de reforma ao prévio êxito do recurso ministerial (ID 44888845, fls. 20-21).

Embora seja possível cogitar em interesse recursal na pretensão por fundamento absolutório pelo qual não mais subsista a possibilidade de apuração dos fatos na esfera cível, tal como os previstos nos incs. I, II e IV do art. 386 do CPP, na hipótese, os argumentos trazidos no apelo representam preliminares que deveriam ter sido veiculadas em sede das contrarrazões ao recurso ministerial, o que não ocorreu.

Assim, diante da ausência de interesse recursal pela nulidade da sentença absolutória, tenho que o recurso interposto por Jairo Roberto Costa Kersting e José Valmir de Oliveira não deve ser conhecido.

 

DO MÉRITO

O presente processo é originário da cisão da Ação Penal n. 20-64.2015.6.21.0133, na qual houve a denúncia de 45 pessoas por diversos fatos supostamente ocorridos no curso do processo eleitoral de 2012 no Município de Triunfo. No presente feito, estão analisados 18 fatos, envolvendo 5 acusados, documentados em 22 volumes de autos digitalizados.

Assim, o mérito recursal está aqui delimitado às imputações em desfavor de JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, da prática do crime previsto no art. 288 do CP e no art. 299 do CE; JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, em relação aos fatos capitulados no art. 299 do CE (quatro vezes) e no art. 1º, caput, incs. I e II, do DL n. 201/67 (três vezes); JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO, quanto à acusação de incursão nos tipos do art. 288 do CP, do art. 1º, incs. I e II, do DL n. 201/67 (duas vezes); JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA da prática dos crimes do art. 288 do CP e do art. 299 do CE (três vezes); e JOÃO BATISTA VIEGAS da imputação dos crimes do art. 288 do CP e do art. 301 do CE, os quais teriam sido praticados entre julho a outubro de 2012.

Inicialmente, sublinho que não há prescrição a ser reconhecida.

A denúncia foi recebida em 09.6.2015 (ID 44888752, fls. 55-56), assim, entre a data dos fatos e o recebimento da denúncia ou entre este e a presente data não transcorreu o prazo prescricional de 8 anos previsto no art. 109, inc. IV, do CP, quando a pena máxima do crime imputado não excede a 4 anos, em relação aos tipos dos arts. 288 do CP e 299 e 301 do CE, tampouco o prazo de 16 anos, previsto no art. 109, inc. II, do CP, quando a pena máxima do crime não excede a 12 anos, na hipótese do tipo do art. 1º, caput, incs. I e II, do Decreto-lei n. 201/67.

Passo, então, ao exame da pretensão recursal deduzida pelo Ministério Público Eleitoral, principiando pela análise da imputação comum a todos os réus, relacionada ao crime de associação criminosa (art. 288 do CP).

 

1. DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA

De acordo com o 1º fato descrito na denúncia, os réus Jairo Roberto da Costa Kersting, João Batista dos Reis Cunha, João Batista Viegas, José Rui da Costa Isidorio e José Valmir de Oliveira teriam incorrido no crime previsto no art. 288, caput, do CP ao se associarem entre si e com os demais denunciados, “para o fim específico de cometerem os crimes de corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral), constrangimento ilegal especial (art. 301 do Código Eleitoral) e peculato especial (art. 1º, caput, incisos I e II, do Decreto-Lei nº 201/67)”, da seguinte forma:

O esquema utilizado pela quadrilha dos denunciados revelou-se através de um modus operandi uniforme, que se estendeu desde a compra de desistência de candidaturas, compra de apoio parlamentar, compra de espaço para a colocação de propaganda eleitoral, constrangimento ilegal de eleitores, compra de votos, até o sistemático e reiterado uso da máquina pública.

[...].

A conduta da quadrilha dos acusados é facilmente compreendida por dois modos de agir diferenciados, mas com um único e comum objetivo (a obtenção de mandato eletivo):

a) fizeram uso da máquina pública, em comunhão de vontades, para obterem vantagem eleitoral, a qualquer título, através da distribuição de benefícios diversos a eleitores (p.e., distribuição de carga de terra, pedras, britas, realização de aterros, açudes, estradas);

b) de movo individual (mas sempre com o fim comum de obtenção da eleição dos candidatos ao cargo majoritário), utilizaram do estratagema de oferecimento ou de promessa de dinheiro ou de vantagens de naturezas diversas para os eleitores (p.e., pagamento de contas, Carteira de Habilitação, entrega de cimento), seja para obterem adesão na veiculação de propaganda eleitoral, seja para receberem apoio eleitoral e voto.

 

A atuação individual de cada réu na suposta associação criminosa é assim descrita na exordial acusatória:

Como os demais candidatos a Vereador da Coligação Partidária “TRIUNFO NO CORAÇÃO” e da quadrilha formada pelos denunciados, o acusado JAIRO KERSTING [...] demonstrou total desprezo pelas regras que regem a disputa eleitoral, pautando sua conduta, reiteradamente, na consecução de ilícitos das mais variadas matizes, tudo com o intuito de obter sua eleição à Câmara Municipal, bem como a eleição do acusado MARCELO ESSVEIN ao cargo de Prefeito Municipal. (fls. 34-35v).

O Vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, candidato à reeleição pela Coligação “TRIUNFO NO CORAÇÃO”, no curto período da interceptação telefônica efetivada, também manifestou disposição para praticar infrações das mais variadas naturezas, com o intuito de obter nas urnas sua recondução ao cargo de Vereador em outubro de 2012, bem como a eleição do candidato a prefeito MARCELO ESSVEIN.

[...].

A compra de espaços de propaganda e de apoio eleitoral revestiu-se na maior, senão na única, plataforma eleitoral de JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, consistindo em um modus operandi padrão, adotado por todos os apoiadores de sua campanha, os quais, evidentemente, agiam sob o comando do candidato.

A perversa e sistemática adoção de abuso do poder econômico como forma de corromper o eleitorado - seja comprando diretamente o voto ou apoio eleitoral, seja comprando espaço para divulgação de propaganda eleitoral - é facilmente comprovada no caso concreto [...]. (fl. 34-36v).

Por seu turno, o denunciado JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, conhecido como “Valmirão”, ex-Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos e candidato a Vereador de Triunfo/RS, agiu em consonância com os demais componentes da quadrilha.

O comportamento do acusado JOSÉ VALMIR caracterizou-se, basicamente, pelo oferecimento de promessas, dádivas ou vantagens aos eleitores, como forma de cooptação de votos ou de apoio eleitoral. Em síntese, JOSÉ VALMIR pautou sua conduta, na campanha, em atos de compra de apoio eleitoral e de voto, compra de espaço para veiculação de propaganda eleitoral, uso indevido da máquina pública e, ainda, contratação de serviços de engenharia elétrica para duas comunidades localizadas no interior de Triunfo/RS, como forma de obter vantagem eleitoral.

[...].

Além desse fato, a compra de apoio eleitoral e de voto, por parte de JOSÉ VALMIR, foi algo comum e corriqueiro. No curto espaço de duração da interceptação telefônica de um dos terminais celulares utilizado pelo próprio candidato, foi possível aferir que, de modo sistemático, JOSÉ VALMIR voltou-se para a prática de atos de negociação direta com eleitores, oferecendo-lhes vantagens de naturezas diversas - inclusive dinheiro - em troca de apoio político e de votos. (fls. 42v-43).

Os denunciados ALTAIR CARVALHO DE FREITAS, JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO, mais conhecido como “Zé Rui”, e VALDOIR DELCIO KUHN, também chamado de “Valdoro”, na condição de servidores públicos da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, agiam como executores diretos das tarefas atribuídas à referida Secretaria Municipal para a compra de votos e de espaço para propaganda eleitoral, especialmente em face de ordens emitidas pelo Secretário Municipal ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA, mas também diretamente pelos demais coacusados.

[...].

A quantidade de usos e desvios indevidos para os quais ALTAIR, JOSÉ RUI e VALDOIR concorreram pode ser inferida das inúmeras conversas telefônicas interceptadas sobre serviços públicos em desacordo com os princípios administrativos, assim como do volume de “protocolos” [...] executados pelos servidores e com maquinário das Secretarias Municipais de Triunfo/RS durante a campanha eleitoral, conforme item “Protocolos”, acima. (fls. 63-65v).

JOÃO BATISTA VIEGAS, mais conhecido como “Tita Viegas” [...] que exercia a função de “fiscal do transporte escolar” (tratava-se de funcionário público) no Município de Triunfo/RS, afirmou a um dos prestadores do serviço de transporte escolar nessa localidade que “todos os transportadores que não colocarem placas estão fora”.

[...].

Esses comportamentos são detalhada e individualmente descritos nos 24º e 25º fatos desta denúncia, mas a revelação de que “todos os transportadores que não colocarem placas “estão fora”, cotejada com as circunstâncias de que JOÃO BATISTA VIEGAS era funcionário público municipal, enquanto PAULO ROBERTO PEREIRA DAVID era concessionário d o Município de Triunfo/RS e compadre do então Prefeito PEDRO FRANCISCO TAVARES, comprova que eles desempenhavam papeis estruturalmente importantes e duradouros na quadrilha engendrada pelos acusados para influenciarem as Eleições Municipais de 2012, obrigando prestadores de serviços públicos de transporte a votarem na Coligação Partidária “TRIUNFO NO CORAÇÃO” e a ostentarem apoio político aos seus integrantes, sob pena de serem prejudicados. (fls. 65v-66v).

 

Registro que os fatos narrados teriam ocorrido durante a campanha eleitoral de 2012, ou seja, antes da vigência da Lei n. 12.850/13 que alterou o tipo previsto no art. 288 do CP. Assim, de acordo com a norma incriminadora em vigor na época dos fatos, a configuração do crime, então denominado “quadrilha ou bando”, exigia a associação de “mais de 3 (três) pessoas para o fim de cometer crimes”, ou seja, no mínimo, quatro pessoas.

Além disso, para a realização do tipo penal previsto no art. 288, caput, do CP, é necessária a comprovação de um vínculo associativo permanente para fins criminosos, ou seja, da predisposição comum de meios para a prática de uma série indeterminada de delitos e uma contínua vinculação entre os associados para a concretização do projeto criminoso.

Em outras palavras, a caracterização do tipo reclama uma organização entre os integrantes da associação criminosa que revele um acordo com relação à duradoura atuação em comum.

Não é o caso dos autos, em que a própria narrativa acusatória imputa a cada réu condutas independentes entre si, em contextos fáticos e temporais próprios, sem indicar a união de desígnios apta a demonstrar o vínculo associativo entre os réus ou a convergência de vontades para as práticas delitivas.

Os fatos relacionados a cada réu são autônomos, independentes e desconexos entre si, guardando em comum tão somente a intenção de favorecer os candidatos a prefeito e vice-prefeito da Coligação Triunfo no Coração, o que, por si, não caracteriza o elemento subjetivo exigido pelo crime do art. 288, caput, do CP.

É certo que os militantes de determinada campanha se associam e unem esforços para auxiliar seus candidatos, partidos e coligações na corrida eleitoral.

Isso, porém, não leva à conclusão de que os crimes eventualmente cometidos por determinadas pessoas para tanto, ainda que em concurso com outros, configuram o tipo de associação criminosa quando ausentes evidências concretas de que todos esses agentes se combinaram intencionalmente para praticar infrações penais e tinham o interesse de fazê-lo de forma concertada e regular durante o ano eleitoral.

Consoante bem apontou o douto Procurador Regional Eleitoral, “tão somente a descrição fática do 43º e do 44º fatos referem-se a dois dos ora recorridos (JOSÉ VALMIR e “ZÉ RUI”), enquanto que todos os demais fatos dizem respeito a cada um dos ora recorridos individualmente (ainda que em concursos com outras pessoas)”, circunstâncias que afasta qualquer conclusão acerca do liame associativo, bem como do quantitativo de pessoas exigido pelo tipo penal em tela.

Colho, ainda, a criteriosa análise procedida pelo magistrado sentenciante, a qual adoto como razões de decidir:

Nesse sentido, não se pode confundir a atuação conjunta, de cunho político, do candidato ao cargo majoritário e os demais candidatos ao legislativo - no âmbito da coligação, durante a campanha eleitoral e com o fim de alcançar a eleição do maior número possível de representantes - com a associação criminosa visando a consecução de crimes eleitorais.

No caso em tela, não é suficiente inserir as ações e condutas individuais dos réus dentro do contexto mais amplo do período eleitoral anterior ao pleito. É necessária, também, a demonstração dos elementos específicos da associação criminosa em relação a todos os réus denunciados sob a mesma fundamentação.

É certo que, nas eleições municipais, o objetivo de todo partido, coligação e candidato é a eleição de Vereadores e, ao mesmo tempo, do seu candidato a Prefeito. Para que isso seja possível, partidos e candidatos lançam mão de plataformas e estratégias conjuntas, seja na forma de santinhos, placas e publicidades compartilhadas, seja na forma de cooperação financeira e material, com divisão de custos no aluguel de sedes, contração de colaboradores, aluguel de veículos, etc.

Ao se extrapolar esse entendimento, corre-se o risco de que qualquer ilícito ocorrido em ano eleitoral, com a participação de postulantes aos cargos eletivos pertencentes a mesma agremiação partidária, possa ser considerado como fruto de associação criminosa, em virtude do vínculo natural de interesses e atuação no campo político.

Assim, para a configuração do delito em comento, não basta a presença desse liame de caráter político e eleitoral. Há que se demonstrar, com firmeza, o ânimo específico de associação para agir ao arrepio da lei de forma organizada, estável e permanente, o que não aconteceu nos presentes autos.

 

Destarte, não existindo demonstração suficiente quanto ao quantitativo de agentes e ao elemento subjetivo exigido pelo preceito legal do tipo, deve ser mantida a absolvição dos recorridos quanto à imputação relativa ao art. 299, caput, do CP.

Por sequência, examino as demais condutas narradas na denúncia em relação a cada um dos réus.

 

2. JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING

Jairo Roberto Costa Kersting foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 299 do CE, consoante descrito nos 8º, 12º, 26º, 47º e 62º fatos da denúncia:

Fato 8:

No período compreendido entre as Convenções Partidárias e as Eleições de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados MARCELO ESSVEIN e JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, entre si e com indivíduo conhecido como “Preto”, prometeram e deram, para o eleitor João Carlos dos Santos Nobre, o pagamento de uma conta de água dele, para obter-lhe votos em favor de suas candidaturas, respectivamente, a Prefeito e a Vereador. (fl. 70)

Na primeira oportunidade, o candidato JAIRO KERSTING por intermédio de um cabo eleitoral conhecido como “Preto”, procurou o eleitor JOÃO CARLOS, oferecendo-lhe e dando-lhe o pagamento de uma conta de água dele, em troca de apoio político e de votos. (fl. 71)

[...].

 

Fato 12

No período compreendido entre as Convenções Partidárias e as Eleições de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados MARCELO ESSVEIN e JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Jeci da Silva, materiais e serviços para a construção de um muro em uma propriedade dela, para obter-lhe votos em favor de suas candidaturas, respectivamente, a Prefeito e a Vereador. (fl. 71v. e 72)

 

Fato 26

No dia 17 de julho de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, PAULO ROGÉRIO DE SOUZA e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, ofereceram, para o eleitor Luiz Carlos Alves de Abreu, vantagens indeterminadas, consistente em “o que ele quisesse” e “um compromisso”, para obter-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a vereador Jairo.

Para tanto, JAIRO pediu uma folha ao eleitor e propôs-lhe um acordo: 17.02.12 - Assumo compromisso com Sr. Luis Carlos Alves de Abreu - Jairo Kersting. Em seguida, JAIRO KERSTING e PAULO ROGÉRIO ausentaram-se e pediram ao eleitor que refletisse. [...] Posteriormente, JAIRO KERSTING e PAULO ROGÉRIO retornaram à casa do eleitor, sendo que PAULO ROGÉRIO questionou-o sobre o acordo. Diante da recusa de Luiz Carlos, PAULO ROGÉRIO exigiu a devolução do compromisso assinado por JAIRO KERSTING. (fl. 77v.).

 

Fato 47

Em data não esclarecida, mas no período da campanha das eleições municipais de 2012 e antes de 15 de agosto de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram para a eleitora Luci Teresa Silva Azeredo, R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), para obterem-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito Marcelo e a Vereador JAIRO KERSTING.

Inicialmente, o candidato a Vereador JAIRO KERSTING procurou a eleitora LUCI TERESA, prometendo-lhe R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), em troca de apoio político e de votos. O pagamento foi realizado imediatamente e em espécie. Em demonstração pública do compromisso assumido e de apoio político, a eleitora viabilizou a instalação, na propriedade dela, de placa de propaganda eleitoral dos candidatos a Prefeito MARCELO e Vereador JAIRO KERSTING [...]. (fl. 88)

 

Fato 62

No início de setembro de 2012, na estrada TF 10, bairro General Neto, em Triunfo/RS, os denunciados MARCELO ESSVEIN e JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram um emprego e, a pós, deram R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) em espécie, para o eleitor Adão Ricardo Lopes, para obterem-lhe votos em favor de suas candidaturas, respectivamente, a Prefeito e a Vereador. (fl 98)

Inicialmente, os candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JAIRO KERSTING procuraram o eleitor ADÃO RICARDO, prometendo-lhe trabalho para que ele trocasse a placa de propaganda eleitoral instalada na casa dele por uma da Coligação “TRIUNFO NO CORAÇÃO”, para que ele prestasse apoio político aos candidatos MARCELO e JAIRO KERSTING e para que ele votasse nesses mesmos candidatos.

Em demonstração pública do compromisso assumido e de apoio político, o eleitor viabilizou a instalação, na propriedade dele, de placa de propaganda eleitoral dos candidatos a Prefeito MARCELO ESSVEIN e a Vereador JAIRO KERSTING. [...]

Posteriormente, os candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JAIRO KERSTING voltaram a procurar o eleitor ADÃO RICARDO na residência dele e deram-lhe R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) em espécie para que ele votasse em MARCELO e JAIRO KERSTING, prometendo, ainda, que, se eleitos, conseguiriam emprego para o eleitor [...]. (fl. 98v.)

 

Relativamente aos fatos 8º, 12º e 62º, a denúncia está estribada exclusivamente na reportagem da RBS-TV, realizada pelo jornalista Giovani Grizotti, levada ao ar após as eleições, a qual não se encontra integralmente encartada nestes autos.

Portanto, na ausência de elementos probatórios complementares, especialmente de prova produzida em sede judicial capaz de corroborar as acusações, não é possível atribuir a uma reportagem investigativa a força probante necessária para, por si só, embasar um decreto condenatório de natureza penal.

Isso porque não há nos autos qualquer prova ou indício acerca dos fatos, consoante bem apreendeu o magistrado a quo:

Os eleitores envolvidos nos supostos delitos não foram ouvidos na fase de inquérito e tampouco foram arrolados como testemunhas ou informantes, tendo em vista também serem réus em seus respectivos processos.

As testemunhas de acusação nada sabiam dos fatos acima expostos.

Gilmar Batista Prado (CD da fl. 1642) testemunhou a respeito de fatos envolvendo outros réus (Paulo Roberto Pereira David e João Batista Viegas), sem relação direta com os fatos aqui analisados. Paulo Prestes Pacheco (CD da fl. 1616) e Silvane de Abreu (CD da fl. 1642), da mesma forma, nada disseram sobre os fatos aqui abordados, tendo discorrido, em seus depoimentos, sobre fatos e réus diversos. Luiz Carlos Alves de Abreu (CD da fl. 1892), por sua vez, testemunhou exclusivamente sobre o 26º fato, abordado em tópico específico nesta decisão.

Ouvidos por intermédio de Cartas Precatórias, a testemunha Giovani Grizotti (termo de audiência da fl. 1841) fez declarações superficiais sobre os fatos objeto de sua reportagem. A testemunha Kleber Bicas, responsável pela investigação na época, limitou-se a comentar genericamente sobre a condução do inquérito, a natureza dos fatos investigados e suas impressões pessoais, sem entrar em detalhes específicos sobre os fatos ou réus sob exame (CD da fl. 1538).

As testemunhas de defesa, por sua vez, apresentaram relatos de cunho abonatório.

 

Ressalta-se que o apontado cabo eleitoral “Preto” sequer foi identificado.

Tendo em vista que nada mais foi produzido acerca dos fatos, é de se concluir pela insuficiência de provas de que o réu efetivamente prometeu ou entregou qualquer tipo de vantagem em troca de votos no tocante aos fatos 8º e 12º, devendo ser mantida a sentença absolutória quanto aos pontos.

Sobre o fato 62º, a Procuradoria Regional Eleitoral destaca o depoimento extrajudicial de Adão Ricardo Lopes (ID 44951711, fls. 1-2) como suficiente para comprovação de que Jairo Kersting compareceu na residência do referido eleitor, tendo dito que poderia beneficiá-lo com um emprego, caso eleito, e entregando-lhe a quantia de R$ 1.500,00 em dinheiro em troca do voto para Marcelo Esvein:

(…) QUE no dia em que JAIRO e MARCELINHO voltaram a casa do depoente para cumprir a promessa de ajuda, os dois sentaram no sofá do depoente e disseram que em caso de vitória poderiam conseguir o emprego ao depoente, que é soldador (…) QUE após cerca de 30 minutos de conversa, os candidatos se despediram e quando já estavam no pátio da residência do depoente avisaram ‘olha em cima do sofá, que o seu problema já está resolvido’; QUE retornando a sua sala, percebeu que de fato havia em cima do sofá um maço de dinheiro deixado pelos candidatos; (…) QUE em relação a reportagem, reafirma que foi feita sem o conhecimento ou qualquer tipo de combinação com o jornalista GIOVANI GRIZOTTI.

 

De seu turno, ouvido em juízo como testemunha compromissada (ID 44888781, fls. 55-56), o jornalista Giovane Antônio Grizotti nada agregou especificamente sobre os fatos, apenas relatando aspectos gerais das denúncias de que teve conhecimento e da investigação jornalística que realizou:

(…) O depoente realizou uma reportagem, na condição de jornalista, com conteúdo investigativo, na época dos fatos, não lembrando ao certo em que ano de pleito eleitoral, mas recordando claramente que o trabalho se iniciou a partir de suspeitas de denúncias de compra de votos que estaria ocorrendo no município de Triunfo onde era candidato a prefeito o primeiro réu, Marcelo. […]. Recorda haver gravado depoimentos de eleitores, sem que soubessem que estavam sendo gravados, declarando que haviam recebido dinheiro e ofertas de emprego em troca de votos. Outra troca de vantagens previa a permissão de eleitores para a colocação de placas de propaganda eleitoral em suas propriedades.

 

O conjunto probatório existente nos autos sobre o fato em questão não se mostra suficientemente robusto e inequívoco para validar o decreto condenatório pretendido, uma vez que o único elemento de prova confirmando a versão acusatória consiste nas declarações extrajudiciais de Adão Ricardo Lopes prestadas à autoridade policial.

Ocorre que o art. 368-A do Código Eleitoral veda a perda do mandato com base em prova testemunhal exclusiva e singular, ou seja, no depoimento de uma única pessoa, o que também deve ser estendido para a hipótese da sanção mais grave de restrição da liberdade ante o maior rigor probatório exigido na esfera penal.

Ainda, de acordo com o art. 155 do CPP, é vedado ao julgador a prolação de decisão condenatória com respaldo apenas em provas produzidas na fase extrajudicial, ou seja, que não foram submetidas ao crivo do contraditório, com a ressalva apenas de hipóteses específicas, tais como provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, as quais não se verificam no presente caso.

Assim, entendo impositiva a manutenção da sentença de absolvição também quanto ao fato 62º.

Em relação ao 26º fato descrito na denúncia, o substrato probatório restringe-se ao suposto compromisso de apoio, cuja cópia foi anexada ao PA 00918.00064/2012 e não se encontra reproduzida nestes autos digitais, bem como no depoimento da testemunha compromissada Luiz Carlos Alves de Abreu.

Quanto a este último, pertinente destacar os seguintes trechos do depoimento prestado:

Ministério Público: O senhor foi procurado pelo Jairo e pelo Paulo Rogério no ano de 2012?

Luiz Carlos Alves: Sim. Eles tiveram lá em casa, tomaram um chimarrão comigo até.

Ministério Público: E eles já estavam em campanha?

Luiz Carlos Alves: Tavam.

Ministério Público: E o Jairo era candidato naquela época?

Luiz Carlos Alves: O Rogério tava trabalhando pro Jairo.

Ministério Público: O Rogério tava trabalhando em campanha pro Jairo?

Luiz Carlos Alves: Aham. [...]

Ministério Público: Tá. E o que eles conversaram com o senhor?

Luiz Carlos Alves: Só conversaram se eu não dava uma mão pra eles, né? [...]

Ministério Público: Aí eles lhe ofereceram algum papel, entregaram alguma coisa, como é que foi?

Luiz Carlos Alves: Não, até o Rogério, o Rogério falou que podiam me ajudar, se ganhassem me ajudavam, com o que eu preciso, mas eu disso só ¿não quero, entendeu, não quero. Não quero me envolver nisso aí¿.

Ministério Público: Se o Jairo fosse eleito? É isso?

Luiz Carlos Alves: É, se ele fosse eleito podia me dar uma mão [ininteligível]. O cara precisa de serviço, né cara?

Ministério Público: E aí pra isso o senhor teria que votar nele?

Luiz Carlos Alves: Não, não, não, ele não falou que tinha que votar nele. Ele pediu uma mão pra mim né? ¿Eu vou ver se eu posso dar, mas eu acho que não posso dar uma mãozinha, que eu já tenho compromisso¿.

Ministério Público: E mesmo assim ele lhe entregou um papel?

Luiz Carlos Alves: [ininteligível] o Rogério me entregou um papel lá, mas aquele papel lá eu acho que não incrimina ninguém. Compromisso qualquer um faz, até eu posso fazer um compromisso com qualquer um e eu não assumir o compromisso, né?

Ministério Público: O que que dizia no papel?

Luiz Carlos Alves: Um compromisso, só um compromisso. Não sei de que que era, né? Acho que...

Ministério Público: Nesse contexto, o que o senhor entendeu?

Luiz Carlos Alves: Eu entendi que compromisso, compromisso, pra mim, que eu entendi, era pra mim dar uma mão pra ele, né? Nas eleição ali. Foi o que eu entendi. O compromisso que eu tinha que dar uma mão pra ele, né? O Rogério e ele né?

Ministério Público: E no papel dizia ¿um compromisso¿?

Luiz Carlos Alves: É.

Ministério Público: O que dizia no papel?

Luiz Carlos Alves: Ia assumir um compromisso comigo, se eu¿ talvez fosse pra ajudar na eleição, né? Ajudar ele, o Rogério e aquela turma dele, né?

Ministério Público: Eles dariam o que o senhor quisesse?

Luiz Carlos Alves: Não, não, não falaram isso não. De assinar não.

Ministério Público: Seria um compromisso do que então?

Luiz Carlos Alves: É, só um compromisso. Talvez de ajudar ele, tô dizendo, né. Ajudar ele na campanha, todo mundo. Já ajudei muitos na campanha já, né? E era um compromisso, eu tinha o compromisso de trabalhar na campanha. Fazia meu lado com ele, né. Nunca me ofereceram dinheiro, nunca pedi dinheiro pra ninguém.

Ministério Público: Aí o senhor pegou esse papel e buscou a Promotoria de Justiça?

Luiz Carlos Alves: É, aí o Rogério me desaforou, só sei que ele me disse umas coisas lá, né. Que eu era obrigado a votar, né. Obrigado é pau de arrasto no meio do brejo, aí. Aí não vou votar, só isso.

Ministério Público: Votar em quem que seria?

Luiz Carlos Alves: No Jairo. Que era obrigado a votar no Jairo.

Ministério Público: Então eles pediram voto?

Luiz Carlos Alves: Não, ele pediu pra ajudar ele, né. Ajudar na campanha, ajudar a trabalhar, né. Trabalhei na campanha de diretor sempre sempre né? Nunca me ofereceram dinheiro, nunca pedi.

 

Embora pouco firme e assertivo, o depoente narra que o pedido a ele dirigido consistiu na prestação de serviços durante a campanha e apoio político, na forma como já havia atuado em outras campanhas, nada se referindo ao voto, bem como que o mencionado compromisso envolvia a militância política e não o oferecimento do voto em troca de vantagens.

Dessa forma, ausente prova hábil e segura sobre o dolo específico de “obter ou dar voto”, exigido pelo tipo do art. 299 do CE, resta insuficientemente comprovada a materialidade da acusação, razão pela qual deve ser mantida a sentença absolutória relativamente ao 26º fato.

Sobre o 47º fato, a acusação está arrimada em um diálogo telefônico interceptado, efetuado entre o candidato João Batista dos Reis Cunha e a eleitora Luci Teresa Silva Azeredo, no qual o primeiro questiona a eleitora sobre o motivo de haver colocado uma placa do candidato Jairo Kersting em sua residência ao invés de uma dele próprio, João Batista.

A conversa assim constou na sentença, em reprodução do relatório encartado nos autos da PA 00918.00002/2012:

Dia 15/08/2012, às 08h58min40s:

No diálogo a interlocutora utilizou o telefone (51) 9855-8187, sendo identificada como “LUCIA”, é questionada por João Batista, “porque tem um placa do 'JAIRO' em sua residência”, Lucia diz para tirar a placa do concorrente e colocar dentro do pátio, João pergunta se o PRETO esteve oferecendo alguma coisa para 'LUCIA' ela diz que foi oferecido um material, mas não pegou pois estava acertada com João, ficando acordado que João, ira retirar a placa que esta colocada na casa e colocar a sua, “LUCIA” salienta que está fechada com João e fica combinado que dia 07 do mês será feito o acerto financeiro.

 

Em acréscimo, a denúncia embasa sua pretensão punitiva no termo de declarações prestadas pela eleitora Luci no curso da investigação policial (ID 44951710, fls. 4-5):

[...]. RESPONDEU QUE na casa da depoente há uma placa de propaganda política do candidato a vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA; QUE, no início da campanha política a placa que a depoente possuía em sua residência era do candidato a vereador JAIRO; QUE, reconhece que manteve diálogo em 15/08/2012, às 08hs e 58 min, com o interlocutor, candidato a vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, QUE, em relação a tal diálogo esclarece de fato, até certa data tinha em sua residência placa do candidato JAIRO pela qual lhe foi paga, pelo próprio JAIRO, a quantia de R$ 150,00 (uma cédula de R$ 100,00 e uma R$ 50,00) na residência da depoente, no momento da colocação da placa; QUE, JAIRO naquele dia chegou acompanhado de um cabo eleitoral, no mesmo carro com a placa já afirmando que iria coloca-la na residência da interrogada, constrangendo a interrogada a aceitar a colocação da mesma em sua residência; QUE, JAIRO afirmou que compensaria a colocação da placa fazendo o pagamento na hora; QUE, posteriormente, após a conversa que manteve com JOÃO BATISTA, em 15/08/2012, o mesmo compareceu até a sua residência, conforme combinado por telefone, fazendo a retirada da placa do candidato JAIRO, substituindo por sua própria placa; QUE, pela substituição das placas que ocorreu pela manhã, JOÃO BATISTA retornou no mesmo dia, pela parte da tarde, ocasião em que fez a entrega R$ 500,00, em cédulas de R$ 50,00, totalizando dez cédulas; QUE, nessa ocasião JOÃO BATISTA afirmou que posteriormente daria mais R$ 300,00 a interrogada, o que veio a ocorrer dias depois; QUE, os R$300,00 foram em seus cédulas de R$ 50,00; QUE, pelo que sabe pelos comentários que tem ouvido durante a campanha eleitoral de 2012, está sendo uma prática comum o pagamento de placas por parte dos candidatos nas residências dos moradores de Triunfo/RS; QUE, certo dia encontrou-se com JAIRO no centro da cidade de Triunfo/RS e foi questionada pelo mesmo da razão da interrogada ter retirado a sua placa da residência, comentando por que a interrogada não iria votar nele; QUE, ressalta que nas duas situações de colocações de placas, a interrogada que se sentiu abrigada, forçada, a aceitar a colocação dos referidos materiais de propaganda em sua residência; QUE, durante a colocação de placa por parte de JAIRO, a interrogada ainda disse para o mesmo várias vezes que não queria a propaganda em sua residência; [...].

 

Por sua vez, Jairo Kersting, em juízo, negou os fatos e disse que nunca esteve na residência de Luci Teresa.

Como se percebe, os elementos trazidos são frágeis e inconsistentes para a demonstração do elemento subjetivo específico exigido pelo tipo penal em tela, ou seja, na oferta ou promessa de vantagem ao eleitor com o fim de obter-lhe o voto por parte de Jairo.

A prova do fato está adstrita a uma conversa entre terceiros (João Batista e Luci), que tratam justamente da retirada da placa de Jairo para ser substituída pela propaganda de outro candidato.

O único indício de eventual prática criminosa por Jairo consta no depoimento prestado por Luci em sede policial, no qual afirmou ter recebido R$ 150,00 pela colocação da placa em sua propriedade.

Ainda que a negociação sobre a colocação de placas possa, em tese, envolver, implicitamente, a compra do voto, o caderno probatório não permite essa conclusão além de qualquer dúvida razoável, pois todos os aspectos depreendidos da gravação telefônica e do depoimento da eleitora circunscrevem-se à insistência e a contrapropostas de João Batista para a substituição da placa de Jairo por outro concorrente.

Além disso, a declaração representa prova oral singular e absolutamente isolada, não está judicializada e nem corroborada por nenhum outro elemento probatório, de modo que se revela inservível para embasar um decreto condenatório penal, na linha do previsto no art. 155, caput, do CPP e do art. 386-A do CE.

Nesse sentido, bem concluiu o juízo a quo:

Ressalto, ainda, que a permissão de colocação de placas de propaganda eleitoral na propriedade dos eleitores, mesmo que em troca de pagamento ou outro benefício, não se amolda ao tipo penal de corrupção eleitoral. Outrossim, mesmo diante da possibilidade de configuração do delito em tela mediante pedido implícito de voto, a prova de tal acontecimento não pode ser subentendida ou presumida.

 

Desse modo, ausente prova robusta que demonstre, de forma inequívoca, a prática criminosa em todos os seus elementos objetivos e subjetivos, não merece reparos a sentença absolutória quanto 47º fato.

Portanto, não há elementos que justifiquem a reforma da sentença que absolveu Jairo Roberto Costa Kersting das imputações contidas na denúncia.

 

3. JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA - “VALMIRÃO”

José Valmir de Oliveira foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 299 do CE, consoante descrito nos fatos 29º, 56º, 58º e 61º, e pelo crime do art. 1º, caput, incs. I e II, do Decreto-Lei n. 201/67, em razão dos fatos 31º, 43º e 44º da denúncia, conforme reproduzo:

Fato 29 – Corrupção Eleitoral

No dia 11 de agosto de 2012, às 13h46min, em Triunfo/RS, os denunciados MARCELO ESSVEIN, JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, PEDRO FRANCISCO TAVARES, ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA e ALTAIR CARVALHO DE FREITAS, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e, em seguida, deram, para o eleitor Éverton Avila da Rosa, serviços de retroescavadeira do Município de Triunfo/RS, para obter-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOSÉ VALMIR (fl. 79).

 

Fato 31 – Peculato Especial

Nos dias 11 e 12 de agosto de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados PEDRO FRANCISCO TAVARES, Prefeito de Triunfo/RS, MARCELO ESSVEIN, Vice-Prefeito de Triunfo/RS, ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA, Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, e ALTAIR CARVALHO DE FREITAS, servidor público do Município de Triunfo/RS, JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA E ÉVERTON AVILA DA ROSA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços utilizaram e desviaram, indevidamente, em proveito deles, bem público do Município de Triunfo/RS, consistente em uma retroescavadeira (fl. 79v.).

 

Fato 43 – Peculato Especial

No dia 14 de agosto de 2012, entre 08h48min e 11h23min, em Triunfo/RS, os denunciados PEDRO FRANCISCO TAVARES, Prefeito de Triunfo/RS, MARCELO ESSVEIN, Vice-Prefeito de Triunfo/RS, ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA, Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, VALDOIR DELCIO KUHN e JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO, ambos funcionários públicos municipais na Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, e JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, desviaram em proveito deles e de pessoas não identificadas bens públicos do Município de Triunfo/RS, consistentes em pedras, saibro e terra (FATO 43 - fl. 85v).

 

Fato 44 – Peculato Especial

No dia 14 de agosto de 2012, entre 08h48min e 11h23min, em Triunfo/RS, os denunciados PEDRO FRANCISCO TAVARES, Prefeito de Triunfo/RS, MARCELO ESSVEIN, Vice-Prefeito de Triunfo/RS, ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA, Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, VALDOIR DELCIO KUHN e JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO, ambos funcionários públicos municipais na Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, e JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, utilizaram-se, indevidamente, em proveito deles e de pessoas não identificadas, de bens e de serviços públicos do Município de Triunfo/RS, consistentes no transporte e depósito de pedras, saibro e terra por máquinas e servidores públicos municipais (FATO 44 - fl. 86).

 

Fato 56 – Corrupção Eleitoral

No período compreendido entre agosto e setembro de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, PEDRO FRANCISCO TAVARES, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Ana Paula da Cruz, serviços destinados ao fornecimento de energia elétrica na residência dela, para obter-lhes votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a vereador JOSÉ VALMIR (FATO 56 - fls. 91-91v).

 

Fato 58 – Corrupção Eleitoral

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, PEDRO FRANCISCO TAVARES, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Eleoni da Silva Soares, serviços destinados ao fornecimento de energia elétrica na residência dela, para obter-lhes votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOSÉ VALMIR (FATO 58 - fl. 91v).

 

Fato 61 – Corrupção Eleitoral

No dia 21 de agosto de 2012, às 13h14, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e, após, deram, para a eleitora Lourdes Maria Gastaldo, R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), para obterem-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOSÉ VALMIR.

 

Em síntese, a acusação relata que José Valmir, conhecido como “Valmirão”, então ex-Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos e candidato ao cargo de vereador, ofereceu promessas, dádivas ou vantagens a eleitores em troca de votos e de espaços para veiculação de propaganda eleitoral, por meio do uso indevido da máquina pública.

A denúncia contém a seguinte narrativa em relação aos fatos 29 e 31:

Na ocasião, o denunciado ÉVERTON, alcunha “Tom Zeca”, manteve contato telefônico com o acusado JOSÉ VALMIR, ex-Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS e candidato a Vereador, e solicitou-lhe o uso de uma retroescavadeira da Prefeitura Municipal de Triunfo/RS, que já se encontrava na propriedade do eleitor, por mais algum tempo, a fim de terminar obras particulares de seu interesse, em troca de apoio político e de votos [...].

Por seu turno, o acusado JOSÉ VALMIR articulou o atendimento da solicitação do eleitor, a fim de obter-lhe apoio e votos, aproveitando-se do trânsito e da influência que exercia sobre a estrutura da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, que deixara de chefiar para candidatar-se a Vereador havia alguns meses, e conforme ajuste prévio com o Prefeito, PEDRO FRANCISCO TAVARES, e com o então Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA.

Para tanto, JOSÉ VALMIR determinou a ALTAIR CARVALHO DE FREITAS, o qual desempenhava serviços gerais na Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo/RS, a realização dos serviços. ALTAIR, por sua vez, garantiu a execução das ordens de JOSÉ VALMIR com recursos públicos.

Posteriormente, em demonstração pública do compromisso assumido e de apoio político aos corruptores, o eleitor, ÉVERTON AVILA DA ROSA, viabilizou a instalação, na propriedade dele, de placa de propaganda eleitoral dos candidatos a Prefeito MARCELO ESSVEIN e a Vereador JOSÉ VALMIR [...].

 

Sobre tais condutas, envolvendo o eleitor Éverton Ávila da Silva (Tom Zeca), as interceptações telefônicas que deram base à denúncia constam nos seguintes termos (ID 44888734, fls. 49-52):

Áudio 04:

Telefone: (51) 93649213

Data: 11/08/2012              Hora inicial: 13:46:04     Duração: 00:01:06

VALMIR: Alô.

TOM ZECA: Ô Valmir.

VALMIR: Oi?

TOM ZECA: É O Tom Zeca.

VALMIR: Fala, Tom Zeca.

TOM ZECA: Ô Valmir, a retro tá aqui, tu não podia deixar ela até amanhã de meio-dia aqui?

VALMIR: Ué, se os cara quiserem trabalhar, tu pode meter.

TOM ZECA: Então tá, tu sabe que eu te amo, tu mora no meu coração, né.

VALMIR: Tá, leva [ela aí] pra terminar aí pra vim embora com ela.

TOM ZECA: Ah, pedi pra ele fazer até amanhã ou não?

VALMIR: Pode fazer, se ele quiser fazer, eu não sei se ele vai trabalhar amanhã, né?

TOM ZECA: Ah, eu vou ajeitar ele: “Ô, cara, tá ficando a coisa mais linda do mundo, só que só que nós precisava até amanhã o meio-dia”.

VALMIR: Tá tudo certo agora, né? Agora já caiu a placa aí, né.

TOM ZECA: Agora é nós, agora é nós, agora é nós.

VALMIR: Feito.

TOM ZECA: Tá, feito.

(Áudio encerrado)

 

Áudio 05:

Telefone: (51) 93649213

Data: 11/08/2012              Hora inicial: 18:47:18     Duração: 00:01:17

VM: Oi.

VALMIR: Alô.

VM: Oi.

VALMIR: Tu tá ouvindo?

VM: Não, ô Valmir, tu bem o número daquele Tom Zé lá ou não?

VALMIR: Se eu tenho?

VM: É.

VALMIR: Bah, me ligou hoje, mas eu... quem tem é o Marcelo.

VM: É que eu deixei a máquina lá...

(Conversas paralelas)

VM: Eu deixei a máquina lá para trabalhar amanhã e daí tem que levar óleo. Vai ter que ser pra segunda aquilo lá, nem ir lá amanhã.

VALMIR: Não tem óleo?

VM: Não, tem que levar óleo, nem galão não tem, tem que tirar uns 20 litros pra levar amanhã. Eu ia trabalhar até o meio dia pelo menos pra já adiantar porque é muita coisa.

VAMIR: Amanhã daí tu vai trabalhar até o meio-dia?

VM: Pelo menos até o meio-dia amanhã, mas não termina ainda até meio-dia.

VALMIR: Então quem sabe tu faz um pouco amanhã de manhã e daí segunda de manhã termina.

VM: Pois é, eu vou fazer assim, isso que tem que levar óleo ainda.

VALMIR: Viu e as horas tu bota aí que eles pagam lá.

VM: Tá bom então, eu vou lá amanhã de manhã. Tá bom.

VALMIR: Faz isso, faz isso. Guarda a máquina o meio-dia e bota o dia todo que eles pagam lá.

VM: Tá bom.

VALMIR: Tá, feito, tchau.

VM: Tchau.

(Áudio encerrado)

 

Em defesa, o recorrido nega os fatos, referindo que a Lei Municipal n. 1.478/2000 possibilita que os interessados requeiram a realização de serviços com maquinário público em áreas rurais e que não houve condicionamento a voto ou apoio político como condição ao benefício.

A partir das gravações em questão, é inequívoco que José Valmir prosseguia atuando, de fato, no exercício do cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos, inclusive recebendo as solicitações do referido munícipe e proferindo ordens aos servidores públicos diretamente responsáveis pelos serviços da Prefeitura, muito embora, de direito, houvesse se desincompatibilizado da função justamente para concorrer ao pleito.

A desincompatibilização apenas jurídica sem o devido afastamento fático das funções caracteriza, em tese, violação às normas da Lei de Inelegibilidades, além de, eventualmente, atentar contra a ética, a moralidade e a probidade administrativas, sujeitando o responsável pela conduta às sanções cíveis e administrativas cabíveis.

De forma semelhante, na esfera eleitoral, a distribuição de serviços públicos por meio de um procedimento informal de solicitação por usuários, quando o agente deveria estar afastado da Administração Pública, poderia ser enquadrada como abuso de poder econômico ou político, conforme a gravidade dos fatos, pois inequivocamente passível de angariar a simpatia do eleitor, com desequilíbrio da igualdade de chances entre os candidatos.

Todavia, para a configuração do crime de corrupção eleitoral previsto no art. 299 do CE, para além da afeição e gratidão do eleitor, é necessária a prova inconteste do dolo específico da mercancia do voto, consistente no especial fim de obter ou dar voto como moeda de troca por alguma vantagem. Vale dizer, não bastam evidências de distribuição de benesses ou favorecimento ao eleitor, sendo exigida a prova de uma situação negocial, na qual a dação ou promessa do voto é condição para o que é dado ou oferecido. Nesse sentido:

Habeas-corpus. Crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE). Recebimento da denúncia. Constrangimento ilegal. Liminar. Deferimento. Ausência de dolo específico. Trancamento da ação penal. Sendo elemento integrante do tipo em questão a finalidade de "obter ou dar voto ou prometer abstenção", não é suficiente para a sua configuração a mera distribuição de bens. A abordagem deve ser direta ao eleitor, com o objetivo de dele obter a promessa de que o voto será obtido ou dado ou haverá abstenção em decorrência do recebimento da dádiva. Ordem concedida para trancar a ação penal.

(TSE - HC: 463 BA, Relator: LUIZ CARLOS LOPES MADEIRA, Data de Julgamento: 18/09/2003, Data de Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 03/10/2003, Página 105.) (Grifei.)

 

Recurso Criminal. Eleições 2016. Ação Penal. Corrupção eleitoral. Art. 299 do Código Eleitoral. Absolvição. Preliminar. Ausência de interrogatório. Compreendido o interrogatório, precipuamente, como meio de defesa do réu, seria necessária, para a configuração da nulidade, a demonstração de que o réu se dispunha a apresentar a sua versão dos fatos e a responder às indagações que lhe fossem feitas, mas foi impedido de fazê-lo. Ausência de vício, uma vez que o próprio réu demonstrou, pelas circunstâncias, a sua vontade de não exercer a faculdade de ser interrogado. Rejeitada. Mérito. O crime de corrupção eleitoral, para que se configure, exige que o agente faça uma abordagem direta ao eleitor, uma conduta incisiva no sentido de colocar o cidadão em uma situação em que, de fato, avalie dar seu voto no candidato em troca do que lhe é oferecido, o que indica a finalidade específica de obtenção de voto, constante do tipo penal da corrupção eleitoral. A distribuição gratuita e indiscriminada de bebida em evento de campanha não configura o dolo específico do crime de corrupção eleitoral quando não tenha ocorrido a abordagem de eleitores com o fim de que colocassem seus votos em negociação. Recurso não provido.

(TRE-MG - RC: 977 PESCADOR - MG, Relator: PAULO ROGÉRIO DE SOUZA ABRANTES, Data de Julgamento: 06/11/2018, Data de Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 13/11/2018.) (Grifei.)

 

Acerca do dolo específico exigido pelo tipo penal do art. 299 do CE, anota Rodrigo López Zilio:

A corrupção eleitoral resta configurada quando o voto é efetuado como uma contrapartida a um benefício ou vantagem pessoal. Dito de outro modo, a manifestação do eleitor, através do voto, surge como uma condicionante do benefício ou vantagem prometida, oferecida, ou, mesmo, recebida. (ZILIO, Rodrigo Lopez, Crimes Eleitorais. 4ª ed. Juspodivm: 2020, pág. 113.)

 

Nessa linha, o diálogo interceptado no “Áudio 4” demonstra que o eleitor efetivamente se utilizava de retroescavadeira da Prefeitura quando dirigiu diretamente a Valmir um novo pedido de prorrogação do uso da máquina, dizendo: “Ô Valmir, a retro tá aqui, tu não podia deixar ela até amanhã de meio-dia aqui?”, então concedido ao usuário.

Apesar do contato direto e informal, não há elementos nos autos pelos quais se possa concluir que Éverton (“Tom Zeca”) não teria, efetivamente, direito ao uso do maquinário de acordo com a legislação aplicável ou que o serviço fora prestado em troca do voto.

Nesse sentido, ouvido durante as investigações, Éverton declarou que ligou para o candidato acreditando que Valmir era o encarregado das máquinas e que o serviço da “retro” era para o seu tio Ivo, “em razão do mesmo ter feito protocolo para tal serviço a pelo menos 1 ano e meio”. Quanto ao contato no dia 11.08.2012, asseverou que “pediu para VALMIR deixar a retro até meio-dia do dia seguinte para fazer o serviço em sua propriedade, já que o interrogado passou cerca de três dias com uma pá e precisava tanto que até se dispôs a pagar pelo combustível que seria utilizado pela máquina da prefeitura tamanho seu desespero”.

As demais testemunhas ouvidas nada esclareceram sobre os fatos em tela.

Tão somente, no encerramento da conversa, Valmir questiona: “Tá tudo certo agora, né? Agora já caiu a placa aí, né”. Então, Éverton confirma: “Agora é nós, agora é nós, agora é nós”.

Consoante constatado do conjunto de fatos expostos, a utilização de “placas” em propriedades particulares, para ratificar e expor a preferência ou o apoio político, consistiu em modus operandi comum no município, mas não traduzindo, necessariamente, um pedido explícito ou implícito de voto em contrapartida a algum benefício.

Vê-se, por certo, algum grau de proselitismo eleitoral posto ao final do diálogo, o que, embora indevido no contexto da prestação de serviços públicos e passível de enquadramento em ilícitos cíveis-eleitorais, não demonstra o dolo exigido pelo crime de corrupção eleitoral, ou seja, a mercancia do voto.

Do “Áudio 5”, constata-se que, estando a retroescavadeira na propriedade de Éverton, Valmir apenas dá instruções a funcionário da Prefeitura, identificado como “VM”, sobre a reposição de óleo do maquinário e sobre a jornada a ser cumprida para a execução da tarefa, não se evidenciando conotação eleitoral mínima na conversa.

Logo, entendo pelo acerto da sentença absolutória no ponto, cujos fundamentos adoto como razões de decidir:

[...] não há nos autos qualquer prova ou indício de que os fatos tenham ocorrido ou que tenha havido pedido de voto ou abstenção por parte do réu. O Ministério Público limita-se a algumas ligações interceptadas e o depoimento do corréu Everton na fase investigatória como lastro da denúncia.

O eleitor envolvido no suposto delito não foi ouvido na fase de inquérito e tampouco foi arrolado como testemunhas ou informante, tendo em vista também ser réu em seu respectivo processo.

As testemunhas de acusação nada sabiam dos fatos acima expostos. Gilmar Batista Prado (CD da fl. 1642) testemunhou a respeito de fatos envolvendo outros réus (Paulo Roberto Pereira David e João Batista Viegas), sem relação direta com os fatos aqui analisados. Paulo Prestes Pacheco (CD da fl. 1616) e Silvane de Abreu (CD da fl. 1642), da mesma forma, nada disseram sobre os fatos aqui abordados, tendo discorrido, em seus depoimentos, sobre fatos e réus diversos. Luiz Carlos Alves de Abreu (cd da fl. 1892), por sua vez, testemunhou exclusivamente sobre o 26º fato, abordado em tópico específico nesta decisão.

Ouvidos por intermédio de Cartas Precatórias, o repórter Giovani Grizotti (termo de audiência da fl. 1841) fez declarações superficiais sobre os fatos objeto de sua reportagem, sem, contudo, trazer elementos capazes de infirmar a denúncia. O delegado federal Kleber Bicas, responsável pela investigação na época, limitou-se a comentar genericamente sobre a condução do inquérito, a natureza dos fatos investigados e suas impressões pessoais, sem entrar em detalhes específicos sobre os fatos ou réus sob exame (CD da fl. 1538).

As testemunhas de defesa, por sua vez, pouco ou nada acrescentaram à elucidação dos acontecimentos, apresentando relatos de cunho abonatório ou sem conhecimento dos fatos.

Como se sabe, para fins de caracterização da prática de corrupção eleitoral na modalidade ativa, deve-se verificar a presença de dois requisitos essenciais: (i) realização pelo acusado da conduta direta ou indiretamente de um dos verbos nucleares descritos no artigo 299 do Código Eleitoral e (ii)existência de dolo específico consistente na intenção de obter ou dar voto ou conseguir ou prometer abstenção.

Ressalto, ainda, que a permissão de colocação de placas de propaganda eleitoral na propriedade dos eleitores, mesmo que em troca de pagamento ou outro benefício, não se amolda ao tipo penal de corrupção eleitoral. Outrossim, mesmo diante da possibilidade de configuração do delito em tela mediante pedido implícito de voto, a prova de tal acontecimento não pode ser subentendida ou presumida.

Com efeito, ausente a comprovação da prática, mediante atuação positiva do agente, de alguma das ações previstas no art. 299 do Código Eleitoral, materializadas nas condutas de “obter ou dar voto” ou “conseguir ou prometer abstenção”, crime não há. Na hipótese dos autos, inexistem elementos que demonstrem a ocorrência do fato descrito na denúncia ou eventual dolo específico dessa conduta, consistente na mercancia exigida para a caracterização do tipo penal. [...].

 

Assim, impositiva a confirmação da sentença, a fim de absolver José Valmir pela prática do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE) do eleitor Éverton Avila da Rosa, conhecido por “Tom Zeca (fato 29), ante a debilidade probatória.

Mostra-se igualmente inviável a procedência da ação penal em relação ao fato 31, envolvendo a prática do tipo penal do art. 1º, caput, incs. I e II, do DL n. 201/67, que representa crime próprio, que somente pode ter como autor prefeito, sendo que, na hipótese, a denúncia imputou ao réu a condição de coautor, à luz do art. 30 do CP, consoante o qual a qualidade de prefeito, por ser elementar do crime, comunica-se aos demais participantes.

Contudo, Pedro Francisco Tavares, então prefeito, processado na Ação Penal n. 294-91.2016.6.21.0133, foi absolvido das mesmas acusações contidas nos fatos 29 e 31, com fundamento na insuficiência de provas para a condenação, em sentença transitada na data de 12.02.2019.

Desse modo, não é possível a condenação de coautor que não ostenta a qualidade exigida pelo tipo penal quando o autor de crime próprio restou definitivamente absolvido por insuficiência probatória em relação à autoria e à materialidade dos fatos.

De seu turno, sobre os fatos 43º e 44º (peculato especial), em relação aos quais não foi possível identificar os supostos eleitores beneficiados, a imputação encontra lastro nas interceptações telefônicas transcritas a seguir (ID 44888734, fls. 64-66, e 44888735, fls. 1-4):

Áudio 15:

Telefone: (51) 93649213

Data: 14/08/2012                            Hora inicial: 08:48:07               Duração: 00:01:33

RUI: Alô. Alô.

VALMIR: Ô. Rui.

RUI: Oi?

VALMIR: Sabe a guria da [Sistema] e a outra deficiente lá em cima?

RUI: Aonde?

VALMIR: Ali onde morava o Tita Viega antigamente ali.

RUI: Hum.

VALMIR: Ali onde era do … do Ernani ali.

RUI: Ãhan.

VALMIR: Ali mesmo tem que carregar duas viagem de terra, sobe com terra lá em cima, largar ali pra elas ali. Só chegar ali no Tenda, ali naquele negócio de vaso ali, tá?

RUI: Ah tá, mas é onde morava a Tita, mas o Tita morava do lado da borracharia.

VALMIR: É do lado, é do outro lado, tem a pedra do meio ali. Tem a guria deficiente ali, uma guriazinha.

RUI: Sei, sei quem é, um veinho que mora ali.

VALMIR: Isso, o veio mesmo, aquele veinho mesmo.

RUI: O vei barrigudo ali, sei.

VALMIR: Isso.

RUI: Levar duas carga de … pode ser meia pedra, alguma coisa assim ou não?

VALMIR: Ãhan.

RUI: Hein, Valmir?

VALMIR: Ãh, pode ser pedra, pode ser com terra, pode ser saibro com terra, pode ser qualquer coisa que o [Samir] carregue lá, sabe? (ininteligível) carregando, vai lá e carrega.

RUI: Tá, eu vou ver, eu vou comunicar o Valdoro e vou lá dai.

VALMIR: Tá bom então.

RUI: Tá, feito.

VALMIR: Feito, tchau.

(Áudio encerrado)

 

Áudio 16:

Telefone: (51) 93649213

Data: 14/08/2012              Hora inicial: 09:35:03     duração: 00:01:12

VALMIR: Alô.

BRENO: Alô, seu Valmir.

VALMIR: Fala, seu Breno, como é que tá?

BRENO: Alô. Tudo bom, seu Valmir. Escuta...

VALMIR: Tudo bom.

BRENO: Isto, tá, seu Valmir, dá pro senhor dar uma chegadinha aqui em asa logo de noite?

VALMIR: Hoje de tardezinha, de repente de tarde.

BRENO: É, pode ser de tarde ou de noite.

VALMIR: Isso, de tarde ou de noite eu passo aí, eu tô indo pra Triunfo agora, vou fazer umas vista lá e daí na volta eu passo por aí.

BRENO: Ãhan, passa aqui para nós conversar um pouco que tem umas pessoas ai que tiveram aqui e querem...

VALMIR: Ãhan.

BRENO: Aí nós temo que fazer um acerto [com eles], tá?

VALMIR: Não, não , já vamo aí, tá?

BRENO: Então tá, tá bom, então vou lhe esperar, tá?

VALMIR: De tarde se der tempo eu passo aí, de tardezinha, pras quatro em diante.

BRENO: É, até de noite pode ser que não tem importância.

VALMIR: Tá bom então, [nós conversamos].

BRENO: Tá bom, então tá.

VALMIR: Feito.

BRENO: Pra nós conversar aqui e se defender.

VALMIR: Tá bom, um abraço, seu Breno.

BRENO: Um abraço, outro pra ti.

VALMIR: Feito. Eu falei ali de [sexta]?

(Áudio encerrado)

 

Áudio 17:

Telefone: (51) 93649213

Data:14/08/2012 Hora inicial: 09:37:42     Duração: 00:03:06

VALMIR: Alô.

DEGA: Bom dia.

VALMIR: Bom dia.

DEGA: Como é que tá, Vereador Valmirão?

VALMIR: O Vereador Valmirão vai muito bem e o [senhor] Dega como é que tá?

DEGA: Eu to levando a vida.

VALMIR: Ô Dega, tomando alguma coisa?

DEGA: Ãh?

VALMIR: Levando a vida e tomando alguma coisa.

DEGA: Ãhan, levando a vida, tô num engarrafamento aqui na 116, eu nasci pra viver em faixa, né cara, tá louco, vou botar uma [maloca] pra mim pra ficar esperando os clientes, (risos).

VALMIR: Não dá bola.

DEGA: Ô Valmirão?

VALMIR: Ãh?

DEGA: Eu precisava falar com o seu Milton, cara, eu não sei se tu te dá com ele ou não?

VALMIR: Qual é Milton?

DEGA: Aquele seu Milton ali que corta mato ali que… perto de...

VALMIR: (ininteligível)

DEGA: Eu queria ver com ele assim, se puder dar o meu número pra ele me dar uma ligada, eu queria ver se ele tirava uma pilha de lenha, ele tá tirando lenha lá, mas tá tirando [pilha] da frente e botou uma que dá bem na minha cerca e eu quero começar a fazer a cerca da chácara.

VALMIR: Tá, eu posso ver com ele, conversar com ele.

DEGA: Se tu ver ele por aí na Vendinha, que eu tô indo pouco na Vendinha agora, fui na casa dele umas três vez e não achei ele, cara.

VALMIR: Isso. Ô Dega, quantos voto tu vai arruma pra mi aí?

DEGA: Ah, rapaz, tu sabe que falar bem de ti, eu falo de montão, né.

VALMIR: Viu, ô Dega?

DEGA: Ãh?

VALMIR: E o pessoal na tua chácara ali como é que tão [aqueles] ali?

DEGA: Ah, aquilo ali eu vou dizer uma coisa, o Fábio e o… o Fábio e o baixinho lá, o de onze lá encheram eles de coisa ali, cara. Tem que ser nos últimos dia ali.

VALMIR: É?

DEGA: É, eu conheço bem aquela [gangue] ali.

VALMIR: Ah, então tá.

DEGA: Não, viu, o guri deles emplacou com o Fábio, foi o primeiro, o cara deu 1400 reais de material lá, não adianta, né, cara, não...

VALMIR: Não tem como bater com eles.

DEGA: Eu… tem que chegar eu acho que no dia ali com cinquenta pila e ganhar alguma coisa dos guri, né.

VALMIR: É.

DEGA: agora os veio não, os veio são sério.

VALMIR: Então tá.

DEGA: Tá, deixa pra mim, ali eu dou um jeito, tá?

VALMIR: Tá, tá bom.

DEGA: E a campanha como é que tá pro Lino aí? Tá boa, né.

VALMIR: Aonde?

DEGA: A campanha pro Lino tá boa, né?

VALMIR: Tá boa, tá boa, mas tá muito [comício] pro meu gosto, tá muito [comício], sabe?

VALMIR: É?

DEGA: Eu acho que eu tenho mais coisa pra resolver pra ele e eles tão se encolhendo, não tem mais dinheiro e que não sei o quê e o Marcelinho acha que não vai ajudar vereador nenhum, que não sei o quê, tá um rolo brabo. Eu achei meio desorganizada a campanha toda, toda.

VALMIR: Não, não é muito fácil não, a coisa não é fácil.

DEGA: É, pois é, eu acho assim, Valmirão.

VALMIR: Se atiraram muito… muito cedo, rapaz, quase se atiraram que nem porco na merda.

DEGA: Mas tá louco, mas agora com eu te falei...

VALMIR: E eu só na retaguarda, né, eu só na retaguarda.

DEGA: Mas é o que eu tô fazendo também.

VALMIR:

DEGA: Claro, então tá, Valmirão, feito, [vê] essa mão.

VALMIR: Depois me liga aí.

DEGA: Tá bom, feito.

VALMIR: Feito, tchau.

DEGA: Tchau.

(Áudio encerrado)

 

Áudio 18:

Telefone: (51) 93649213

Data: 14/08/2012              Hora inicial: 11:23:01     Duração: 00:01:03

VALMIR: Alô.

DAIANE: Alô, Valmir, é a Daiane.

VALMIR: Fala, Daiane.

DAIANE: Ãh… tu mandou… obrigado pelas pedras, tá, só que eu precisava de mais um favorzinho.

VALMIR: Ãh?

DAIANE: Tu não sabe quando é que vem uma máquina pra cá pra esses lado? Ou se vem ou se não vem, nem sabe?

VALMIR: Vai, vai em seguida aí, o irmão do Altair que mora aí em cima aí na outra tenda, vai em seguida aí.

DAIANE: Pois é, não, de repente se conseguisse a máquina, se a máquina passasse aqui pela frente aqui é que a pedra veio meio graúda, pra nós esparramar de pá não tem como, aí precisava da máquina, né, pra esparramar. É duas caçamba que veio daí e se tu já conseguisse a máquina, se a máquina passasse por aqui e tu pudesse pedir pra parar aqui, né, pra esparramar pra nós ali, porque de carrinho não tem como, é graúda a pedra que veio dai. Oi?

(Áudio encerrado)

 

Sobre tais acusações, a denúncia restringiu-se à imputação do crime previsto no art. 1º, caput, incs. I e II, do Decreto-lei n. 201/67, porquanto os eleitores que teriam sido corrompidos não foram identificados, inviabilizando a condenação penal com fundamento no art. 299 do Código Eleitoral.

Com efeito, é assente na jurisprudência que, para a configuração do crime de corrupção eleitoral, “é necessário que a conduta seja direcionada a eleitores identificados ou identificáveis e que o corruptor eleitoral passivo seja pessoa apta a votar” (Agravo de Instrumento n. 749719, Acórdão, Relatora: Min. Maria Thereza de Assis Moura, Publicação: DJE de 23.02.2015).

Assim, ausente a qualificação das pessoas que teriam sido favorecidas nos fatos em comento, não ocorre o preenchimento das circunstâncias legais para a caracterização do crime desenhado no art. 299 do Código Eleitoral, de modo que agiu com responsabilidade e prudência o Promotor de Justiça Eleitoral denunciante.

Novamente, mostra-se igualmente inviável a procedência da ação penal em relação à prática do tipo penal do art. 1º, caput, incs. I e II, do DL n. 201/67, que representam crimes próprios, que somente podem ter como autor prefeito, sendo que, na hipótese, a denúncia imputou ao réu a condição de coautor, à luz do art. 30 do CP, consoante o qual a qualidade de prefeito, por ser elementar do crime, comunica-se aos demais participantes.

Contudo, Pedro Francisco Tavares, então prefeito, processado na Ação Penal n. 294-91.2016.6.21.0133 foi absolvido das mesmas acusações contidas nos fatos 43 e 44, com fundamento na insuficiência de provas para a condenação, em sentença transitada na data de 12.02.2019.

Desse modo, não é possível a condenação de coautor que não ostenta a qualidade exigida pelo tipo penal quando o autor de crime próprio restou definitivamente absolvido por insuficiência probatória em relação à autoria e materialidade dos fatos.

Diante disso, a Procuradoria Regional Eleitoral propõe a emendatio libelli dos fatos 43º e 44º para o tipo penal do art. 312 do CP (peculato), traçando as seguintes razões:

Nada obstante, em relação ao 43º e ao 44º fatos, deve-se proceder a emendatio libelli, nos termos do art. 383 do CPP, para o fim de alterar a capitulação jurídica originária (DL 201/67, art. 1º, caput, I e II) dos fatos descritos na denúncia para o art. 312 do CP (peculato), considerando como coautores JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA e JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO. O último servidor público municipal na época dos fatos, também figura como recorrido nos presentes autos.

 

Com efeito, o peculato-desvio, previsto no caput do art. 312 do CP, resta caracterizado quando o funcionário público desvia, em proveito próprio ou alheio, bens cuja posse decorre do cargo ocupado.

O uso da máquina pública para a compra de votos é, em tese, suficientemente capaz de configurar o crime de peculato-desvio, mesmo na hipótese em que a conduta reflexamente acabe por atender ao interesse público. Basta que o agente proceda consciente de exceder ou ignorando os limites das suas atribuições, tendo como principal objetivo o favorecimento pessoal ou de terceiro com a exploração do aparato estatal.

Entretanto, os diálogos transcritos não permitem concluir de forma cabal sobre a ocorrência das referidas circunstâncias, mormente em relação ao especial fim de agir, qual seja, o desvio de bens ou serviços públicos para a compra de votos ou favorecimento eleitoral.

No “áudio 15”, José Valmir profere orientações funcionais para que o servidor público José Rui da Rosa Isidorio (“Rui) transporte materiais usualmente utilizados em aterramentos e nivelamentos de terrenos e vias (“pedra”, “com terra”, “saibro”) para duas munícipes, traçando referências que permitissem a localização do endereço de destino.

A conversa, embora confirme a usurpação de função pública por parte de José Valmir, não comprova que o carregamento de material ocorreu de modo ilícito ou que a vantagem foi condicionada à obtenção do voto ou outro interesse de viés eleitoral.

Em relação ao “áudio 16”, tem-se que José Valmir é contatado por Breno, pessoa não identificada, que lhe solicita um encontro, referindo a necessidade de “fazer um acerto” com certas pessoas e dizendo: “pra nós conversar aqui e se defender”.

Novamente, trata-se de diálogo bastante curto e superficial, sem elementos mínimos que permitam supor o seu contexto ou as circunstâncias envolvidas. Assim, não há demonstração suficiente do dolo exigido pelo tipo penal do art. 312 do CP, uma vez que inexiste qualquer menção à entrega ou ao desvio de bens ou serviços públicos, havendo tão somente a referência a um “acerto” de natureza não especificada, com pessoas que, igualmente, não se sabe a identidade ou qualidade.

A mesma conclusão advém do exame do “áudio 17”, no qual “Dega” telefona para José Valmir com o fito de lhe pedir o contato de “Milton”, “que corta mato ali”, para a execução do que aparenta consistir em um trabalho particular envolvendo remoção de lenhas que estão atrapalhando a conclusão de uma cerca na chácara do interlocutor.

Ao final da conversa, José Valmir questiona: “Ô Dega, quantos voto tu vai arruma pra mi aí?”. O trecho não denota qualquer tipo de aliciamento ou compra de votos, mas apenas retórica própria de campanha, com pedido de apoio político, ao que “Dega” confirma o seu engajamento com o candidato, dizendo: “Ah, rapaz, tu sabe que falar bem de ti, eu falo de montão, né”, sem indicação de favorecimento ilícito como condição ao voto ou à militância.

A única possível infração penal está contida na afirmação feita por “Dega” de que os adversários teriam dado “1400 reais de material lá” e que “tem que chegar eu acho que no dia ali com cinquenta pila”, limitando-se José Valmir a responder: “É”. Percebe-se, assim, que as falas são descontextualizadas e meramente especulativas, sem aspectos concretos mínimos que permitam a conclusão sobre eventuais compras de votos.

A conversa prossegue com comentários e opiniões sobre as estratégias de propaganda eleitoral, as limitações financeiras de campanha e a desorganização das ações.

Desse modo, não há indicações sequer supostas sobre desvio de rendas ou serviços públicos para a satisfação de interesses eleitoreiros, sem o que é inviável a adequação das condutas ao tipo previsto no art. 312 do CP.

Em relação ao “áudio 18”, constata-se uma conversa entre a pessoa identificada como “Daiane” e José Valmir, na qual a munícipe agradece as pedras enviadas e solicita os serviços de uma “máquina” para “esparramar”, porquanto “a pedra veio meio graúda”.

Do diálogo travado, não é possível extrair, ainda que implicitamente, que o serviço administrativo prestado estivesse vinculado à obtenção do voto ou que os bens públicos foram desviados para o atendimento de fins não legalmente previstos.

As demais provas produzidas, igualmente, não oferecem a necessária certeza do dolo do recorrido em relação aos fatos e, inclusive, infirmam a tese acusatório, uma vez que as testemunhas pertinentes foram congruentes em afirmar que os serviços da Secretaria de Obras ocorreram conforme a praxe administrativa local.

Quanto ao ponto, colho a judiciosa análise contida na sentença:

Ao contrário do que alega o Ministério Público Eleitoral, não há nos autos elementos ou indícios suficientes para um juízo condenatório.

Com efeito, no processo penal, para fins condenatórios, tanto a prova da existência do fato quanto da autoria devem estar demonstradas de forma incontroversa nos autos. Contudo, não é o caso presente.

A prova testemunhal trazida pela defesa é unânime ao afirmar não ter havido atendimentos sem protocolo e que, na época dos fatos, não foi possível notar qualquer diferença na gestão do setor responsável no sentido de acelerar ou facilitar a prestação de serviços.

As testemunhas de acusação nada sabiam dos fatos acima expostos. Gilmar Batista Prado (CD da fl. 1642) testemunhou a respeito de fatos envolvendo outros réus (Paulo Roberto Pereira David e João Batista Viegas), sem relação direta com os fatos aqui analisados. Paulo Prestes Pacheco (CD da fl. 1616) e Silvane de Abreu (CD da fl. 1642), da mesma forma, nada disseram sobre os fatos aqui abordados, tendo discorrido, em seus depoimentos, sobre fatos e réus diversos. Luiz Carlos Alves de Abreu (CD da fl. 1892), por sua vez, testemunhou exclusivamente sobre o 26º fato, abordado em tópico especifico nesta decisão.

Ouvidos por intermédio de Cartas Precatórias, o repórter Giovani Grizotti (termo de audiência da fl. 1841) fez declarações superficiais sobre os fatos objeto de sua reportagem, sem, contudo, trazer elementos capazes de infirmar a denúncia. O delegado federal Kleber Bicas, responsável pela investigação na época, limitou-se a comentar genericamente sobre a condução do inquérito, a natureza dos fatos investigados e suas impressões pessoais, sem entrar em detalhes específicos sobre os fatos ou réus sob exame (CD da fl. 1538).

Ao contrário do que alega o MPE, não há nos autos elementos ou indícios suficientes para um juízo condenatório. Na fase judicial, a acusação não trouxe novos elementos probatórios capazes de confirmar as informações preliminares colhidas em sede de inquérito, apenas reproduziu aquilo que foi apurado na investigação.

Cabe aqui ressaltar que o aumento genérico do cumprimento de protocolos durante a época de eleições, por si só, não tem o condão de firmar a presunção de que os serviços prestados a pedido do réu tenham sido decorrentes de promessa de voto ou abstenção em seu proveito ou em favor dos corréus envolvidos na denúncia.

Deve haver prova robusta no sentido de que a prestação de serviço revestiu-se de ilegalidade, seja para atingimento de fim ilícito ou com desvio de finalidade, o que não aconteceu nos autos. Pelo contrário, o conjunto probatório amealhado durante a instrução não abona a denúncia.

 

Além disso, tratando-se o peculato de crime próprio do funcionário público, a readequação típica proposta pelo Ministério Público Eleitoral em relação às condutas de José Valmir, então extraneus, ou seja, juridicamente fora dos quadros da Administração Pública, está condicionada à incursão de José Rui, funcionário público, no mesmo crime, de modo a comunicar sua condição pessoal ao partícipe, nos termos do art. 30 do CP.

Cumpre, assim, antecipar a análise da imputação trazida sobre esse último.

Na denúncia, o Ministério Público Eleitoral narra que José Valmir permanecia com grande ingerência na estrutura da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos de Triunfo, o que era consentido e garantido pelo Prefeito Pedro Francisco e pelo então Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos Álvaro Tomaz Castro de Souza, tendo determinado diretamente a realização de serviços aos funcionários públicos Altair Carvalho de Freitas e José Rui Isidorio em mais de uma oportunidade (ID 44888625, fl. 35-36).

Ocorre que Altair, processado por participação nos fatos 29 e 31 anteriormente citados na Ação Penal n. 20-64.2015.6.21.0133, restou absolvido com fundamento no art. 386, incs. III e VII, do CPP, por sentença transitada em julgado em 07.3.2019, tendo a magistrada consignado que, “pelo que se depreende do conjunto probatório, Altair Carvalho apenas executava ordens, não detendo a fidúcia necessária para agir diferentemente”.

Em alegações finais, o Ministério Público Eleitoral pormenorizou a participação do recorrido José Rui da Rosa Isidorio, servidor público municipal, da seguinte forma:

(…) o denunciado José Rui [...] agiu como executor direto das tarefas atribuídas à referida Secretaria Municipal para a compra de votos e de espaço para propaganda eleitoral, especialmente em face de ordens emitidas pelo Secretário Municipal ÁLVARO TOMAZ CASTRO DE SOUZA, mas também diretamente pelos demais coacusados. (fl. 2039)

 

No ponto, a prova dos fatos em relação a José Rui da Rosa Isidorio consiste nos áudios 15 e 18 anteriormente reproduzidos.

No primeiro diálogo, José Valmir dá ordens a José Rui para que entregue duas cargas de materiais (“pode ser pedra, pode ser com terra, pode ser saibro com terra, pode ser qualquer coisa”) para determinada munícipe não identificada, sendo apenas indicadas referências sobre a localização de sua residência (Áudio 15).

Em sequência, no mesmo dia, menos de três horas depois, José Valmir recebe a ligação de Daiane agradecendo o material enviado e solicitando uma “máquina” para fragmentar e espalhar as pedras recebidas, que “veio meio graúda” (Áudio 18).

Do exame das conversas interceptadas, porém, não há elementos que possibilitem estabelecer uma vinculação segura sobre o pedido feito às 08h48min do dia 14.8.2012 com o agradecimento prestado às 11h23min do mesmo dia.

Consoante bem pontuou a sentença absolutória, a prova de participação de José Rui nos fatos resume-se ao Áudio 15, “de contato realizado entre JOSÉ VALMIR e JOSÉ RUI, na qual o primeiro requeria ao segundo a realização de ‘duas viagens de terra ou de saibro com terra até uma residência onde moravam duas eleitoras’, ao que JOSÉ RUI respondeu dizendo que ‘comunicaria o colega VALDOIR e que iria ao local indicado”.

Cabe referir que o funcionário público Valdoir Delcio Kuhn foi processado pelos mesmos fatos 43 e 44 na Ação Penal n. 294-91.2016.6.21.0133, sendo absolvido com base no art. 386, inc. VII, do CPP, por sentença transitada em julgado em 12.02.2019.

Assim, torna-se pouco plausível que um extenso esquema de desvio de recursos público para fins eleitorais não contasse com a participação do então Secretário de Obras, Álvaro Tomaz Castro de Souza, ou do próprio Prefeito Pedro Francisco Tavares.

Ocorre que Álvaro Tomaz Castro de Souza foi processado pelos mesmos fatos na Ação Penal n. 20-64.2015.6.21.0133, sendo absolvido com base no art. 386, incs. III e VII, do CPP, por sentença transitada em julgado em 07.3.2019. Assim, como o então Prefeito, processado na Ação Penal n. 294-91.2016.6.21.0133, na qual foi absolvido das mesmas acusações, com base no art. 386, inc. VII, do CPP, em sentença transitada em julgado no dia 12.02.2019.

Em contrarrazões, José Rui afirma que “era um mero servidor, ocupante de cargo em comissão, subordinado ao Secretário em que estava lotado”, bem como que “os serviços prestados pelo Apelado estão previstos no art. 9º, da Lei Municipal 2.003/05. Esta estabelece que os serviços elencados, em seu art. 1º, serão fornecidos aos munícipes em forma de incentivo, sem ônus para eles” (ID 44888846, fl. 7).

Com efeito, não há elementos probatórios cabais que atestem a consciência da ilicitude dos fatos ou a adesão subjetiva ao desvio de recursos públicos para qualquer finalidade ilegal, nem que José Rui poderia atuar de modo diverso no cumprimento das tarefas que lhe eram comandadas por seus superiores hierárquicos, ainda que meramente aparentes ou por usurpação da função pública.

De acordo com as razões recursais (ID 44888843, fl. 27), o elemento subjetivo do crime de peculato estaria demonstrado a partir da conversa telefônica estabelecida entre Michele Dias Leite, então Procuradora-Geral do Município de Triunfo, e seu marido, Marcelo Essvein, Vice-Prefeito e candidato ao cargo de prefeito, assim transcrita (ID 44888749, fls. 41-42):

Áudio 16:

Telefone: (51) 9975-1765

Data: 20/08/2012              Hora inicial: 13:27:44     Duração: 00:01:15

MICHELE: Alô.

MARCELO: Fala, Michele.

MICHELE: Olha, só, Marcelo, a Geisa, a mãe da Marília [me] procurou, ela precisa que tu faça um negócio lá num terreno do lado da casa da Dani. É só uma coisinha com uma patrola, lá, ela disse que vai morrer as tais de grama que ela comprou. Tá?

MARCELO: Hum.

MICHELE: Ela me disse que tava com um problema com o Zé Rui porque ela...o Zé Rui disse que ia fazer se ela apoiasse o Juju. Sei lá qual é o candidato do Zé Rui, e ela quer apoiar o [Guido].

MARCELO: Uhum.

MICHELE: Daí eu ligue pro Zé Rui hoje pra pedir o favor, só que ele disse que teve uma briga entre o Tomás e o Beto, e que tá tudo parado, que ele não pode usar a máquina, não sei o quê. Agora tô sem sabe...

MARCELO: Não, pode [desligar] eu não tenho telefone do Zé Rui. Pode dizer pra ele que falou comigo, é pra fazer lá e pronto.

MICHELE: Mas acontece que o Tomás tirou a Kombi dele e a máquina dele.

MARCELO: Não, ele tirou nada, ele tá fazendo marola. Ele não tem retro lá então?

MICHELE: Parece que não, ele disse que o Tomás proibiu ele de fazer serviço pro Beto.

MARCELO: Se der eu vou passar ali na garagem, na esquina, agora. To indo na Vendinha, eu falo ali com o coisa.

MICHELE: Tá, mas vê se tu arruma isso, que a Geisa nem vai te pedir nada, é só fazer esse servicinho lá que ela vai perder as gramas. Tá?

MARCELO: Tá bom. Falou.

MICHELE: Tchau.

 

Como se percebe, a passagem em que Michele afirma que “o Zé Rui disse que ia fazer se ela apoiasse o Juju” consiste em reprodução de algo que teria sido dito por terceira pessoa não precisamente identificada, cujo contexto fático, igualmente, está pouco claro, mas que certamente não se refere ao fato descrito na denúncia, sendo prova frágil para a demonstração da vontade livre e consciente do recorrido na prática do crime de peculato.

Por outro lado, as demais sequências do diálogo confirmam que José Rui mantinha uma relação de subordinação com diversos agentes públicos hierarquicamente superiores, inclusive Tomaz, ou Álvaro Tomaz Castro de Souza, então Secretário de Obras, e o próprio Vice-Prefeito Marcelo.

Vale dizer, apesar de ser possível depreender que José Rui não ignorava a situação funcional de José Valmir, não há prova conclusiva e estreme de dúvida de seu dolo, consistente na vontade livre e consciente de desviar recursos públicos em proveito próprio ou de terceiros e que poderia, nas circunstâncias, determinar sua ação de maneira diversa.

Nesse trilhar, irreparável a sentença absolutória sobre o tópico:

(...) ao contrário do que alega o Ministério Público Eleitoral, não há nos autos elementos ou indícios suficientes para um juízo condenatório.

Com efeito, no processo penal, para fins condenatórios, tanto a prova da existência do fato quanto da autoria devem estar demonstradas de forma incontroversa nos autos. Contudo, não é o caso presente.

A prova testemunhal trazida pela defesa é unânime ao afirmar não ter havido atendimentos sem protocolo e que, na época dos fatos, não foi possível notar qualquer diferença na gestão do setor responsável no sentido de acelerar ou facilitar a prestação de serviços.

As testemunhas de acusação nada sabiam dos fatos acima expostos. Gilmar Batista Prado (CD da fl. 1642) testemunhou a respeito de fatos envolvendo outros réus (Paulo Roberto Pereira David e João Batista Viegas), sem relação direta com os fatos aqui analisados. Paulo Prestes Pacheco (CD da fl. 1616) e Silvane de Abreu (CD da fl. 1642), da mesma forma, nada disseram sobre os fatos aqui abordados, tendo discorrido, em seus depoimentos, sobre fatos e réus diversos. Luiz Carlos Alves de Abreu (cd da fl. 1892), por sua vez, testemunhou exclusivamente sobre o 26º fato, abordado em tópico específico nesta decisão.

Ouvidos por intermédio de Cartas Precatórias, o repórter Giovani Grizotti (termo de audiência da fl. 1841) fez declarações superficiais sobre os fatos objeto de sua reportagem, sem, contudo, trazer elementos capazes de infirmar a denúncia. O delegado federal Kleber Bicas, responsável pela investigação na época, limitou-se a comentar genericamente sobre a condução do inquérito, a natureza dos fatos investigados e suas impressões pessoais, sem entrar em detalhes específicos sobre os fatos ou réus sob exame (CD da fl. 1538).

As testemunhas de defesa, por sua vez, pouco ou nada acrescentaram à elucidação dos acontecimentos, apresentando relatos de cunho abonatório ou sem conhecimento dos fatos.

 

Anoto que, relativamente aos fatos 43º e 44º, a absolvição de José Rui é suficiente, por si, para impor também a absolvição do corréu José Valmir, que não detinha a condição pessoal elementar do tipo penal, uma vez que o crime do art. 312 do CP somente pode ser imputável a agentes particulares em casos de coautoria ou participação com funcionário público, com ciência e comunicação das elementares do crime (art. 30 do CP), o que não ocorre na hipótese.

Assim, torna-se impositiva a manutenção da sentença que absolveu os réus José Valmir de Oliveira e José Rui da Rosa Isidorio, com fundamento no art. 386, inc. VII, do CPP, em relação aos fatos 43º e 44º.

Em relação aos fatos 56º e 58º, de acordo com a versão acusatória, o candidato a vereador José Valmir, com a participação de Ana Paula Garcia Hartmann, prometeu e entregou às eleitoras Ana Paula da Cruz e Eleoni da Silva Soares serviços de instalação de rede de energia elétrica em troca de votos.

O Ministério Público Eleitoral especificou a participação do ora recorrido nos seguintes termos:

O candidato a Vereador JOSÉ VALMIR articulou com ANA PAULA GARCIA, funcionária da Cooperativa de Geração de Energia e Desenvolvimento Taquari Jacuí - CERTAJA, o fornecimento desses serviços a eleitores das referidas localidades, serviços esses que seriam custeados pelo então Prefeito PEDRO FRANCISCO TAVARES, em benefício das candidaturas a Prefeito de MARCELO ESSVEIN e a Vereador JOSÉ VALMIR. Em seguida, convenceram as eleitoras ANA PAULA DA CRUZ e ELEONI DA SILVA SOARES a fornecerem os dados delas e a assinarem documentos relativos a esses serviços. (fl. 92)

 

A tese acusatória está amparada na interceptação do telefone de José Valmir de Oliveira, cujos trechos mais relevantes constam reproduzidos na sentença:

Dia 21/08/2012 (fl. 131 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR liga e conversa com ALINE e diz que é sobre a energia elétrica na Vila Tieta e dos Morenos e que iriam pagar, pois está com o CHICO (prefeito). KARINE afirma que VALMIR deveria ligar para ANA PAULA, de Taquari, que já estaria sabendo e fornece o telefone 3653-6600)

 

Dia 23/08/2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR liga para CERTAJA e conversa com ANA PAULA, a fim de resolver o negócio da luz, questionando-a sobre a forma de pagamento, se em cheque ou em boleto. VALMIR diz que seria na forma uma mais duas. ANA PAULA afirma que isto deve ser no nome de uma das pessoas beneficiadas. ANA PAULA afirma que irá sair na fatura da energia. ANA PAULA cita, como exemplo o nome Marcia da Mota Lopes. VALMIR passa o telefone para CHICO (PREFEITO). CHICO conversa com ANA PAULA e afirma que o cheque seria dele não poderia dar pro LUIZ e ficar a coisa aberta. ANA PAULA afirma que não pode fazer isto. ANA PAULA informa que cada pessoa entrou em contato com eles e negociou de forma diferente, mas VALMIR afirmou que seria feito pela PREFEITURA. CHICO afirma que é ele quem pagará. ANA PAULA sugere se não tinha como dividir e dar o dinheiro para as pessoas. CHICO afirma que poderia dar a entrada a vista e deixava dois cheques na CERTAJA, ficando no nome deles porém cheque dele. ANA PAULA afirma que pode ela não pode fazer e diz que passará pro gerente financeiro. [...]

 

Dia 23/08/2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR recebe ligação de ANA PAULA e esta informa que seria delicado a questão de cheques, somente com o presidente. VALMIR sugere pagamento por boleto. Valmir em conversa com CHICO acerta que poderá receber os boletos. ANA PAULA afirma que precisa de um nome para lançar no boleto. Dia 23/08/2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012): VALMIR liga para a cooperativa CERTAJA e em conversa com ANA PAULA, fornece o nome de ANA PAULA DA CRUZ. ANA PAULA pergunta como VALMIR fará, se dará uma entrada de mil. VALMIR diz que dará uma entrada de R$ 900,00 e duas de R$ 1.000. ANA PAULA diz que fará título a receber e quando estiver pronto ligará para ANA PAULA dar entrada e negociar a rede. [...]

 

Dia 23/08/2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR conversa com ANA PAULA, da CERTAJA, e esta refere que a mulher indicada não queria aceitar aquele acordo e que ela não se estressaria por isto. VALMIR informa que ela, a pessoa indicada, estava nervosa e que tinha aceitado sim a emissão dos boletos. ANA PAULA, da CERTAJA, conversa com a senhora e informa os riscos do não pagamento, ou seja, do nome dela ir pro SPC, pois ela não estava negociando com VALMIR ou CHICO, porém a referida senhora afirma que pode fazer.

 

Na fase do inquérito policial, Ana Paula da Cruz narrou o seguinte (ID 44951710, fl. 2-3):

[...] QUE há cerca de três meses a depoente e mais nove moradores do mesmo bairro foram até a COOPERATIVA CERTAJA solicitar instalações de energia elétrica pelo PROGRAMA LUZ PARA TODOS; QUE na CERTAJA, unidade TRIUNFO, foi dito aos moradores que não existia a possibilidade de se beneficiarem do PROGRAMA LUZ PARA TODOS; QUE aos moradores foi dado um orçamento em torno de quase nove mil reais para a instalação de energia elétrica em todas as dez casas; QUE cerca de um mês após elaborado o orçamento todos os moradores manifestaram interesse na instalação de energia elétrica, e através de contato com a funcionária ANA PAULA, da unidade de TAQUARI, cada morador assinou uma espécie de contrato junto à cooperativa; QUE segundo a CERTAJA, daqueles cerca de nove mil reais a cooperativa arcaria com aproximadamente R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e o restante seria pago por cada interessado, no valor de R$ 298,00 (duzentos e noventa e oito reais) mais uma pequena taxa de R$ 20,00 (vinte reais), pode tudo ser parcelado; QUE há pouco mais de um mês foi procurada por sua vizinha de mesma rua, de nome MÁRCIA, a qual disse que haveria possibilidade ou promessa de que o candidato a vereador JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA iria pagar todo o saldo que não seria coberto pela CERTAJA, ou seja, aproximadamente quatro mil reais; QUE até o momento o candidato JOSÉ VALMIR não apareceu para fazer o pagamento, tendo a depoente já pago a primeira mensalidade da dívida da instalação e estando muito preocupada pois não tem condições financeiras para pagar as demais prestações; QUE por volta do dia 18 de setembro a depoente chegou em sua residência e constatou que haviam fixado uma placa de propaganda do candidato JOSÉ VALMIR junto com o candidato a prefeito MARCELINHO na cerca da propriedade da depoente; QUE a placa ainda está no local, pois a depoente não quis arrumar mais nenhuma confusão; QUE não sabe dizer se os demais moradores também colocaram placa em sua residência [...].

 

De seu turno, Eleoni da Silva Soares declarou o seguinte na fase extrajudicial (ID 44951710, fl. 1):

[…]. QUE a funcionária da CERTAJA, de nome ALINE, avisou à depoente que estava tudo certo, que candidato a vereador VALMIRÃO tinha dado o pagamento de entrada e iria pagar o restante mês a mês, de acordo com o vencimento das prestações assumidas pela depoente, alcançando um montante de R$ 1.534,00 [¿] QUE no início da campanha a depoente conversou com VALMIRÃO quando o mesmo foi até o bairro Vila dos Morenos, ocasião em que ele disse que queria se eleger e precisava de votos QUE a depoente disse a VALMIRÃO que estava precisando de ajuda, especificamente quanto a instalação de energia elétrica junto a CERTAJA tendo então VALMIRÃO dito que ajudaria a depoente e pagaria os valores junto a CERTAJA contando que em troca teria garantido os votos da depoente e demais moradores do local (fl. 332 do Inquérito Policial)

 

A prova é complementada por um conjunto de onze diálogos telefônicos interceptados, que, de acordo com a tese acusatória, demonstrariam que José Valmir, juntamente com Pedro Francisco Tavares, então Prefeito de Triunfo, propuseram a quitação de despesas com a cooperativa Certaja, em nome de Ana Paula e Eleoni, a fim de viabilizar a instalação de energia elétrica em residências da Vila dos Morenos e da Vila Tieta, no município.

Nesse sentido, no Áudio 42, José Valmir e Pedro Francisco confirmam com a funcionária da Certaja que os débitos seriam pagos com cheques pessoais do então prefeito, mas que os documentos ficariam em nome de algum dos moradores da comunidade:

Áudio 42

Telefone: (51) 93649213

Data: 23/08/2012              Hora inicial: 08:35:19     Duração: 00:04:20

(…).

VALMIR: Ana Paula, só uma dúvida que nós temos aqui (…) pra acertar esse negócio aqui dessas luz, pode ser me cheque ou é em boleto pra pagar?

ANA PAULA: Tá, eu não sei, como é que vocês vão pagar?

VALMIR: Uma e mais duas.

ANA PAULA: Tá. Não, mas isso eu já conversei com o senhor. Tem que ser no nome de um dos consumidores lá.

VALMIR: Isto.

ANA PAULA: Tem que ser … dessas dez pessoas te que escolher uma e ser descontado esse valor no nome dela.

VALMIR: Sim, só que vai vim boleto dela ou cheque?

ANA PAULA: Vai sair na fatura de energia. Posso fazer com título a receber, sem problema (…).

VALMIR: Título a receber?

ANA PAULA: Isso.

VALMIR: Pode ser, mas daí eu vou dar em cheque ou em dinheiro. Não tem como ser dois boletinho? No nome da mulher?

ANA PAULA: Tá, não, assim, vai ser feito.

VALMIR: Só um pouquinho, vou falar aqui, vou passar pro Chico aqui.

CHICO: Oi, Ana Paula! Vocês é da CERTEJA mesmo, né?

ANA PAULA: Sim.

CHICO: Eu não...Como é cheque meu, é o Chico, é o Prefeito que tá falando, tá.

ANA PAULA: Sim.

CHICO: Como é cheque particular, eu não posso dar em cheque aí pro Luiz e ficar com o cheque ali? E que eu não posso rodar com o meu cheque por aí e trancar uma coisa dessa, entende?

ANA PAULA: Não, não, mas… Eu entendo, só que eu não posso fazer isso.

CHICO: Tá.

ANA PAULA: Aí o seu Valmir entrou em contato dizendo que seria feito pela Prefeitura, tá. O que acontece é o seguinte: ou sai no nome de uma pessoa física, uma dessas pessoas aqui, porque até porque nós estamos em época de eleição, a CERTAJA não pode… né.

CHICO: Tá.

ANA PAULA: Então, assim, ou sai no nome de um, no caso assim, de outro terceiro, no caso, da Prefeitura, uma pessoa jurídica, entende?

CHICO: Mas eu não tenho como fazer pela Prefeitura.

ANA PAULA: Eu sei. Então tem que pegar uma pessoa.

CHICO: Eu, eu que vou pagar, entendeu. Eu ia… é que eu pensei que pudesse fazer.

ANA PAULA: Tá. E não tem como dividir esse valor, da pras pessoas, tipo assim: deu duzentos e oitenta e dois…

CHICO: Mas eu pensei, como ali dava três vezes, vamos supor, eu já ia dar a entrada à vista, né, e ia deixar dois cheques na CERTAJA aqui, eu pensei.

ANA PAULA: Não, mas aí…

CHICO: Cheque meu, particular.

ANA PAULA: Tá, mas no nome de quem vai ficar isso?

CHICO: Fica no nome deles lá, mas com os meus cheques de garantia ali.

ANA PAULA: Não, eu posso até assim, ó, o Chico, eu posso fazer o seguinte: isso aí, por mim aqui não, entendeu. Mas eu vou te passar pro gerente financeiro.

 

No Áudio 44, a funcionária da Certaja recomenda o pagamento por meio de boletos bancários, ao que José Valmir aceita e indica que a emissão ocorra em nome de “uma guria lá da vila”, referindo-se a Ana Paula Cruz, e que “pode ser no nome da pessoa e passa boleto para nós”:

Áudio 44:

Telefone: (51) 93649213

Data: 23/08/2012              Hora inicial: 08:49:12     Duração: 00:02:34

(…).

ANA PAULA: Seu Valmir, assim, ó, tava verificando aqui com o pessoal responsável, a questão de deixar cheques ali na Vendinha, tá sendo um pouco delicado (…) o problema é o seguinte, é que esse tipo de… de ficar com o dinheiro assim, eles não fazem isso, entende.

VALMIR: Tá, mas se fizer um negócio pra pagar duas… Um boleto, qualquer coisa.

ANA PAULA: Não, assim, o que eu quero dizer é o seguinte, a gente pode ser um boleto – e a pessoa que vai ficar responsável – nós entregamos o boleto. Ao invés, no caso, do Chico dar cheque, ele pega os boletos e paga na volta. É bem mais simples.

VALMIR: Tá, tranquilo.

(…).

VALMIR: Tá, pode ser no nome da pessoa e passa boleto pra nós.

ANA PAULA: Tá, mas aí em nome de quem vai ficar?

VALMIR: Aí vai ter uma guria lá da vila que vai vim ali.

 

Conforme se extrai do Áudio 50, a funcionária da Certaja adverte a eleitora Ana Paula Cruz de que a responsabilidade pelo débito seria pessoalmente dela, ao que a interlocutora manifesta ciência e certeza de “que o Chico que vai pagar”:

Áudio 50:

Telefone: (51) 936491213

Data: 23/08/2012              Hora inicial: 11:11:24     Duração: 00:04:23

(…).

ANA PAULA CRUZ: (…). Porque o Valmirão disse que ele não podia vir aqui, mas agora ele chegou aqui, daí ele disse assim que vai vim boleto, né?

ANA PAULA (CERTAJA): Vem boleto, mas se eles não pagar no prazo, tu é... Quem vai pro SPC é tu.

ANA PAULA CRUZ: Pois é, mas ele disse que é certo, que o Chico que vai pagar.

ANA PAULA (CERTAJA): Não, tudo bem, eu só quero te dizer o seguinte: eu não tô negociando com o Chico nem com o Valmir, eu tô negociando com a Ana Paula. Se chegar na data x, não pagar, eles vão em cima de ti. Eles não vão cobrar do Valmir e nem do Chico, entendeu, porque eles não tão aparecendo como devedor, quem tá aparecendo como devedor é a Ana Paula. Eu quero que isso fique bem claro pra ti.

ANA PAULA CRUZ: Não, seu sei, eu sei.

 

Em sua defesa, José Valmir impugna as transcrições e alega que não prometeu vantagens em troca de votos e não pagou qualquer quota de energia elétrica, seja em nome próprio ou de terceiros.

Com efeito, não se constata da prova oral produzida ou do conteúdo das interceptações telefônicas realizadas o especial fim de agir exigido para a caracterização do tipo penal de corrupção eleitoral.

O crime em questão, em sua modalidade ativa, cujo bem jurídico tutelado é o livre exercício do voto, consuma-se com o ato de dar, oferecer ou prometer, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer vantagem, desde que imbuído pelo dolo específico de “obter voto”, consoante a descrição do art. 299 do Código Eleitoral.

Sobre o elemento subjetivo reclamado pelo tipo, leciona a doutrina de José Jairo Gomes:

Há previsão de elemento subjetivo do tipo, assim expresso: “para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção”. Destarte, para a perfeição do crime é preciso que a causa da conduta esteja relacionada diretamente ao voto, isto é, obter ou dar voto, bem como conseguir ou prometer abstenção de voto. Caso contrário, atípica será a conduta. (GOMES, José Jairo. Crimes e processo penal eleitorais. São Paulo: Atlas, 2015, p. 56)

 

Nessa toada, a mercancia do voto é extraída exclusivamente de breve menção realizada na declaração extrajudicial da eleitora Eleoni da Silva Soares, cujo depoimento não foi ratificado sob o crivo do contraditório judicial.

Os demais elementos do acervo probatório revelam a participação do Vereador Valmir e do Prefeito Pedro Francisco nas intermediações para a instalação de energia elétrica, incluindo a oportunista colocação de placas de propaganda eleitoral na propriedade das eleitoras, o que não configura prova cabal de que a promessa de auxílio teve como contrapartida o voto de eleitores certos para determinado candidato.

Conforme a sedimentada jurisprudência do TSE, para a caracterização do crime do art. 299 do Código Eleitoral não bastam as evidências de promessa ou entrega de benesses, ainda que realizadas com o intuito indireto de autopromoção ou propaganda eleitoral pelo candidato, sendo indispensável a demonstração, por prova segura e robusta, do dolo específico de dar ou prometer vantagem em contrapartida do voto.

Nesse sentido, destaco os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DE INCURSÃO NO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. No caso, o TRE de origem, soberano na análise das provas, concluiu que não ficou demonstrado o dolo específico do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE), consubstanciado na finalidade eleitoral, pelo fornecimento de medicamento a eleitor. 2. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, é necessária a ocorrência de dolo específico, consistente no especial fim de obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção. Precedente: AgR-AI 7497-19/RJ, Rel. designado Min. DIAS TOFFOLI, DJe 23.2.2015. 3. Para se alterar a conclusão do Tribunal Regional quanto à existência ou não de dolo específico, seria necessário o reexame do conjunto probatório dos autos, o que não é possível em Recurso Especial, de acordo com o enunciado sumular 24 do TSE. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento.

(TSE - AI: 4244 MARAU - RS, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 17/10/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 10/11/2017)

 

ELEIÇÕES 2006. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL. ART. 299 DO CE. DOLO SPECÍFICO. NECESSIDADE. CONDICIONAMENTO DE REALIZAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS E ODONTOLÓGICOS À OBTENÇÃO DE VOTO. NÃO COMPROVAÇÃO. INVIABILIDADE, EM ÂMBITO EXTRAORDINÁRIO, DE SE ALTERAR A CONCLUSÃO DO TRE DO AMAZONAS. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, é necessária a ocorrência de dolo específico, consistente no especial fim de obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção. Precedentes. 2. Na espécie, o Tribunal de origem, soberano na análise das provas, concluiu pela ausência do dolo específico de condicionar a prestação de serviços médicos e odontológicos à promessa votos. 3. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica quanto à impossibilidade de se alterar a conclusão do Tribunal Regional Eleitoral quanto à existência ou não de dolo específico. 4. Agravo Regimental desprovido.

(TSE - RESPE: 99847141120086040000 MANAUS - AM, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 09/02/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 57, Data 23/03/2017, Página 26)

 

Assim, bem  considerou o magistrado da origem que a acusação está amparada exclusivamente em declarações prestadas na fase inquisitorial, não corroborados por provas produzidas ao longa da instrução judicial, inviabilizando o decreto condenatório:

Não há elementos nos autos que permitam a conclusão segura de que as condutas narradas na denúncia, referentes aos fatos aqui analisados, tenham ocorrido com o intuito de obtenção do voto dos beneficiários do serviço contratado. Há uma única menção de um suposto pedido de votos no depoimento da eleitora e corré Eleoni da Silva Soares.

Contudo, cabe frisar o fato de que nenhum dos pretensos beneficiados foi ouvido durante o processo, esvaziando ainda mais a tese, constante na denúncia, no sentido de que todas as tratativas realizadas pelo réu, para a instalação da rede elétrica em duas comunidades distintas, se deram com o fim específico de angariar os votos dos beneficiados pelo serviço.

Sob outra perspectiva, os elementos trazidos aos autos em sede de instrução probatória, na fase judicial do procedimento, não foram aptos a formar a convicção do juízo.

 

Registro, ainda, que Pedro Francisco Tavares, então Prefeito, processado na Ação Penal n. 294-91.2016.6.21.0133, foi absolvido das mesmas acusações contidas nos fatos 56 e 58, com fundamento na insuficiência de provas para a condenação, em sentença transitada na data de 12.02.2019.

Na mesma senda, julgo que a instrução probatória não logrou ofertar um juízo de segurança e certeza da versão apresentada na denúncia em relação ao dolo específico de dar ou prometer o voto, impondo-se a manutenção da sentença que entendeu pela insuficiência de provas quanto ao elemento subjetivo do tipo e absolveu José Valmir de Oliveira pelos 56º e 58º fatos, com fulcro no art. 386, incs. III e VII, do CPP.

No tocante ao fato 61º, consta na denúncia que, no dia 21.8.2012, às 13h14min, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e, após, deram, para a eleitora Lourdes Maria Gastaldo, R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), em troca de votos em favor dos candidatos a prefeito MARCELO e a vereador JOSÉ VALMIR.

A participação do réu foi narrada na denúncia nos termos que passo a transcrever:

Na ocasião, a eleitora LOURDES MARIA enviou mensagem (SMS), por telefone celular, ao candidato a Vereador JOSÉ VALMIR, pedindo-lhe R$ 150,00: “(tipo: entrega) Valmirao, me consegue 150,00 at sexta-feira? Pede pro Maicon trazer pra mim. OBRIGADO. LOURDES.” [21.08.12 - fl. 131 do Apenso I do IP 0905/2012].

Cerca de uma hora depois, LOURDES MARIA telefonou para JOSÉ VALMIR e perguntou-lhe se ele tinha recebido a predita mensagem. JOSÉ VALMIR afirmou que passaria para conversar com LOURDES MARIA à tarde, encerrando a ligação dizendo “Vamo botá uma placa minha aí”. [ligação em 21/08/2012 - fl. 131 do PC.00918.00002/2012].

 

O diálogo telefônico referido consta assim reproduzido (ID 44888739, fl. 19-20):

Áudio 34:

Telefone: (51) 93649216

Data: 21/08/2012              Hora inicial: 13:14:33     Duração: 00:00:52

VALMIR: Alô!

LOURDES: Oi, Valmirão!

VALMIR: Oi.

LOURDES: Recebeu a minha mensagem?

VALMIR: Recebi.

LOURDES: E aí, o que tu acha, dá pra ser?

VALMIR: Vou vê de tarde aí, vou vê se passo aí de tarde.

LOURDES: Ah, então tá.

VALMIR: Tá, feito.

LOURDES: Tá. Eu liguei pra Vendinha hoje e falei com a enfermeira lá, aquela que tá te ajudando lá…

VALMIR: Ali no postinho?

LOURDES: Isso.

VALMIR: Tá.

LOURDES: Aí se tu consegue hoje, aí ela disse que ia falar contigo a semana que vem, mas ai se tu consegue hoje, não precisa ela falar contigo.

VALMIR: Tá bom, vamos botar uma placa minha aí.

LOURDES: Tá.

VALMIR: Tá.

LOURDES: Tá bom.

VALMIR: Tá bom, então. Tchau.

LOURDES: Tchau.

 

Ouvido em juízo, José Valmir negou a acusação. As demais oitivas realizadas nada acrescentaram sobre os fatos narrados.

Consoante se extrai das interceptações telefônicas, a despeito de aparentes pedidos de auxílio feitos pela eleitora, José Valmir não manifesta nenhum tipo de cedência ou concordância imediata, estando ausente comprovação de oferecimento ou promessa de qualquer vantagem ou benesse à sua interlocutora.

Assim, não merece reparos a conclusão sentencial “que o réu não fez qualquer menção a ceder ao pedido da eleitora, tampouco ofereceu-lhe qualquer vantagem ou prometeu-lhe qualquer benesse, tendo apenas prometido conversar com ela, propondo a afixação de placa em sua propriedade”.

Os elementos trazidos são frágeis e lacunosos para a demonstração do elemento subjetivo específico exigido pelo tipo penal em tela, ou seja, na oferta ou promessa de vantagem ao eleitor com o fim de obter-lhe o voto.

No aspecto, bem referiu a Procuradoria Regional Eleitoral:

Todavia não chega a haver anuência com os pedidos. A ausência de confirmação dos pedidos pelo telefone associada a limitação do contexto probatório, obsta a aferição dos elementos do tipo da corrupção eleitoral em ambos dos fatos.

 

Destarte, deve ser mantida a sentença que absolveu José Valmir relativamente ao 61º fato descrito na denúncia.

 

4. JOSÉ RUI DA ROSA ISIDORIO

José Rui da Rosa Isidorio foi denunciado pela prática do crime do art. 1º, caput, incs. I e II, do Decreto-Lei n. 201/67, em razão dos 43º e 44º fatos da denúncia.

Consoante bem pontuou a sentença absolutória, a prova de participação de José Rui nos fatos resume-se ao Áudio 18, “de contato realizado entre JOSÉ VALMIR e JOSÉ RUI, na qual o primeiro requeria ao segundo a realização de ‘duas viagens de terra ou de saibro com terra até uma residência onde moravam duas eleitoras’, ao que JOSÉ RUI respondeu dizendo que ‘comunicaria o colega VALDOIR e que iria ao local indicado”.

Os fatos, provas e a conduta de José Rui da Rosa Isidorio constam analisadas no tópico anterior, que enfrentou a suposta incursão de José Valmir nos mesmos fatos, ao qual me reporto, prevenindo desnecessária tautologia.

Assim, nos termos anteriormente expostos, deve ser mantida a sentença que absolveu José Rui da Rosa Isidorio relativamente aos 43º e 44º fatos da denúncia.

 

5. JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA – “BAIXINHO”

João Batista dos Reis Cunha foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 299 do CE, combinado com o art. 29, caput, e na forma do art. 71, caput, ambos do CP, consoante descrito nos 35º, 36º e 49º fatos da denúncia, conforme reproduzo:

Fato 35º – Corrupção Eleitoral

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local [12 de agosto de 2012, Triunfo/RS], os denunciados MARCELO ESSVEIN e JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram, para a eleitora Amalia Grzegorczyk, vantagens indeterminadas, para obter-lhe votos em favor de suas candidaturas, respectivamente, a Prefeito e a Vereador. [FATO 35 - FL 81V E 82]

(…).

Na ocasião, o candidato JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA manteve contato telefônico com a eleitora AMALIA, no qual ela lhe perguntou o que ele podia oferecer-lhe para que ela votasse nele e o apoiasse politicamente. JOÃO BATISTA questionou se a eleitora estava comprometida com outros candidatos e se mudaria seu voto, ao que ela respondeu que dependeria do que JOÃO BATISTA lhe oferecesse. [...] (fl. 82)

 

Fato 36º – Corrupção Eleitoral

Nos dias 12 e 14 de agosto de 2012, respectivamente, às 17h03min e 16h39min, em Triunfo/RS, os denunciados MARCELO ESSVEIN e JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para o eleitor Vando Uiliam Milke Campos, vantagem pecuniária, consistente no pagamento de serviços de habilitação para dirigir veículos automotores, para obterem-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOÃO BATISTA. [FATO 36 - FL 82V]

[…].

No dia 12 de agosto de 2012, após já ter negociado seu apoio ao denunciado JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, o acusado VANDO UILIAM MILKE CAMPOS telefonou ao candidato a Vereador e pediu-lhe ¿um dinheiro¿ para que, no dia seguinte, pagasse por sua Carteira Nacional de Habilitação. Por seu turno, o denunciado JOÃO BATISTA respondeu que entraria em contato com o eleitor [...].

[…].

Conforme Relatório de Diligências nº 49/GAECO/2012, o denunciado JOÃO BATISTA DOS REIS entregou a quantia em dinheiro solicitada pelo eleitor, já que houve o efetivo pagamento da taxa de inscrição no curso de habilitação para dirigir veículos automotores. [...] [fl. 83]

 

Fato 49º – Corrupção Eleitoral

No dia 15 de agosto de 2012, às 08h58min, em Triunfo/RS, os denunciados JOÃO BATISTAS DOS REIS CUNHA e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Luci Teresa Silva Azeredo, R$ 800,00 (oitocentos reais), para obterem-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO ESSVEIN e a Vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA. [fato 49 - fl 88]

[...] o também candidato a Vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA manteve contato telefônico com a eleitora LUCI TERESA, no qual eles acertaram que a denunciada retiraria a propaganda eleitoral do candidato JAIRO KERSTING, que possuía em sua residência, colocando propaganda de JOÃO BATISTA DOS REIS no lugar daquela. Ao final da conversa, LUCI TERESA salientou que “está fechada” com JOÃO BATISTA, combinando que o acerto financeiro seria no dia sete [...] Conforme combinado entre JOÃO BATISTA e LUCI TERESA, ele compareceu na residência da eleitora e substituiu a placa de JAIRO KERSTING pela dele [...]. Em compensação pelos votos e pelo apoio político de LUCI TERESA, o denunciado JOÃO BATISTA DOS REIS entregou-lhe, primeiro, R$, 500,00 (quinhentos reais) e, dias depois, mais R$ 300,00 (trezentos reais), ambas as quantias em espécie [...]. [fls. 88v-89]

 

A prova relativa ao fato 35º resume-se às declarações da eleitora Amália e ao conteúdo das interceptações telefônicas, estando assim descritas na sentença:

Termo de Declarações (fl. 383 - Apenso I Volume II do IP 0905/2012)

[...] QUE em relação ao diálogo que estabeleceu com JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, em 12 de agosto de 2012, a partir das 16:57 h, esclarece que ligou para o mesmo a fim de solicitar um trabalho em sua área, como Técnica de Enfermagem; QUE recorda-se que durante a ligação disse que apoiaria JOÃO dependendo do que ele teria a oferecer, o que para a declarante seria seu trabalho com técnica de enfermagem; […]

 

Dia 12/08/2012 (fl. 168 da PC 00918.00002/2012)

Nesta ligação, A interlocutora identificada como “MARI” pergunta para João Batista o que ele pode oferecer para que ela apoie sua campanha, João pergunta se ela não esta apoiando a “KATIA e o MAURO”, João então pergunta se ela vai mudar, a interlocutora diz que depende do que João vai oferecer, a Interlocutora diz ainda que tem mais gente querendo mudar seu candidato e quer conversar com João salienta ainda que não gravar nada, João diz que as pessoas estão falando que ela quer gravas as conversas, a interlocutora diz que não vai gravar nada e que precisa de ajuda pois ficou quase quatro anos sem trabalho e ainda quer que João ajude uma amiga que esta com problemas com impostos, ficando acertado que João vai procura-la em sua residência para falar pessoalmente, pois pelo telefone não dá.

 

Com efeito, no ID 44888740, fls. 31-34, consta a degravação do diálogo em questão, cabendo destacar os seguintes trechos:

MARI: Alô, quem fala?

JOÃO BATISTA: João Batista.

MARI: Oi, além de oferecer cervejinha pra mim, tu não tem mais nada pra me oferecer?

JOÃO BATISTA: Que cervejinha? Eu nunca te ofereci cervejinha.

[…].

MARI: Por que tu não veio conversar comigo?

JOÃO BATISTA: Me falaram que tu ia com a Cátia e com o Mauro.

MARI: Não, mas, ué, meu filho, quem pode mais chora menos.

JOÃO BATISTA: Vamo mudar?

MARI: Ué, o que tu me oferece?

JOÃO BATISTA: Ãh? Não, não…

MARI: Por telefone não dá, tu sabe, né?

[…].

JOÃO BATISTA: E o Marcelinho, tu sabe, né, que é uma lavagem, né?

MARI: Eu sei, va ser, só que eu quero conversar contigo. Eu chamei ele pra conversar, ele ficou com medo de gravação, eu não vou grava nada, eu só quer conversar com vocês eu preciso de umas ajudas, fique quatro anos sem trabalhar eu tô falida.

[…].

JOÃO BATISTA: Ah, eu vou, essa semana aí… É porque a gente fica com medo, né, Mari, porque todo mundo fica falando que vocês querem gravar nós.

[…].

 

De modo semelhante, sobre o 36º fato, a prova consiste no termo de declarações do eleitor supostamente corrompido e no diálogo interceptado entre João Batista e Vando Uilian, conforme resumido na decisão recorrida:

Dia 12/08/2012 (fl. 168 da PC 00918.00002/2012)

Nesta ligação o interlocutor identifica-se como “VANDRO” pede que João Batista adiante um dinheiro, dizendo que precisa para pagar sua carteira de habilitação, João Batista diz amanhã vai procurar o interlocutor.

 

Relatório de Diligências nº 49/GAECO/2012 (fl. 147 da PC 00918.00002/2012)

[...] Diante dos fatos podemos constatar que, o dialogo foi realizado tendo a seguinte sequência solicitação realizada no dia 12 de agosto do corrente, João diz que no dia 13 de agosto conversaria com o seu interlocutor, provavelmente para entregar a quantia solicitada, já na sequencia dos fatos, mais precisamente dia 14 de agosto de 2012, Vando, recebeu o dinheiro solicitado e deu entrada no CFC (Centro de Formação de Condutores) o pagamento de taxa para iniciar as aulas no sentido de fazer sua primeira habilitação, como consta da pesquisa acima. […]

 

Termo de Declarações de Vando Uilian Milke Campos (fls. 327-328 do IP - Apenso I Volume II)

[...] QUE se recorda que em agosto do corrente ano conversou por telefone com o candidato a vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA e disse para o mesmo que o seu voto e de sua família seriam do candidato caso o mesmo concordasse em pagar cerca de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) referentes aos custos junto ao CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES de São Jerônimo/RS para a obtenção da carteira de motorista, categorias A e B; QUE alguns dias depois de ter essa conversa telefônica o interrogado conversou novamente com JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA [...] ocasião em que o candidato disse que queria marcar um lugar pra fechar o negócio referente à carteira de motorista do interrogado QUE naquele momento da ligação o candidato JOÃO BATISTA não poderia conversar com o interrogado, dizendo que estava em campanha política no bairro Vendinha QUE posteriormente não conseguiu mais contato com o JOÃO BATISTA QUE em outras oportunidades o interrogado ligou mas não conseguiu falar por telefone com o candidato JOÃO BATISTA […]

 

A conversa em questão consta reproduzida no ID 44888740, fls. 34-36, sendo relevante enfatizar o seguinte trecho:

[…].

VANDO: Eu já queria conversar contigo, ô, tu não consegue me adiantar aí um, um dinheiro pra mim pagar a minha carteira amanhã?

JOÃO BATISTA: Ô, filhote, eu te procuro amanhã de manhã, eu te ligo, tu tá de valde amanhã de manhã?

VANDO: Tô, tô por casa, tô por casa amanhã.

JOÃO BATISTA: Tá uma dez, umas dez, dez e pouco eu te ligo despois eu te ligo pra ti, tá?

[…].

 

Como se percebe, em ambas as hipóteses, embora sejam nítidos os pedidos feitos pelos eleitores, o candidato João Batista esquivou-se dos pedidos mediante respostas evasivas, dizendo que falariam mais tarde ou retornaria o contato, sem ceder às propostas e sem oferecer ou prometer definitivamente qualquer vantagem ou benesse em troca dos votos.

Assim, não há a cabal demonstração da prática dos verbos “dar”, “prometer” ou “oferecer” por parte do candidato, pois os diálogos interceptados não demonstram se as propostas dos eleitores foram acolhidas em troca de votos, inexistindo outros elementos de prova sobre os alegados fatos.

Conforme bem referiu a Procuradoria Regional Eleitoral:

Todavia não chega a haver anuência com os pedidos. A ausência de confirmação dos pedidos pelo telefone associada a limitação do contexto probatório, obsta a aferição dos elementos do tipo da corrupção eleitoral em ambos dos fatos.

 

No tocante ao fato 49º, a denúncia embasa sua pretensão punitiva no termo de declarações prestadas pela eleitora Luci no curso da investigação policial (ID 44951710, fls. 4-5):

[...]. RESPONDEU QUE na casa da depoente há uma placa de propaganda política do candidato a vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA; QUE, no início da campanha política a placa que a depoente possuía em sua residência era do candidato a vereador JAIRO; QUE, reconhece que manteve diálogo em 15/08/2012, às 08hs e 58 min, com o interlocutor, candidato a vereador JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, QUE, em relação a tal diálogo esclarece de fato, até certa data tinha em sua residência placa do candidato JAIRO pela qual lhe foi paga, pelo próprio JAIRO, a quantia de R$ 150,00 (uma cédula de R$ 100,00 e uma R$ 50,00) na residência da depoente, no momento da colocação da placa; QUE, JAIRO naquele dia chegou acompanhado de um cabo eleitoral, no mesmo carro com a placa já afirmando que iria coloca-la na residência da interrogada, constrangendo a interrogada a aceitar a colocação da mesma em sua residência; QUE, JAIRO afirmou que compensaria a colocação da placa fazendo o pagamento na hora; QUE, posteriormente, após a conversa que manteve com JOÃO BATISTA, em 15/08/2012, o mesmo compareceu até a sua residência, conforme combinado por telefone, fazendo a retirada da placa do candidato JAIRO, substituindo por sua própria placa; QUE, pela substituição das placas que ocorreu pela manhã, JOÃO BATISTA retornou no mesmo dia, pela parte da tarde, ocasião em que fez a entrega R$ 500,00, em cédulas de R$ 50,00, totalizando dez cédulas; QUE, nessa ocasião JOÃO BATISTA afirmou que posteriormente daria mais R$ 300,00 a interrogada, o que veio a ocorrer dias depois; QUE, os R$300,00 foram em seus cédulas de R$ 50,00; QUE, pelo que sabe pelos comentários que tem ouvido durante a campanha eleitoral de 2012, está sendo uma prática comum o pagamento de placas por parte dos candidatos nas residências dos moradores de Triunfo/RS; QUE, certo dia encontrou-se com JAIRO no centro da cidade de Triunfo/RS e foi questionada pelo mesmo da razão da interrogada ter retirado a sua placa da residência, comentando por que a interrogada não iria votar nele; QUE, ressalta que nas duas situações de colocações de placas, a interrogada que se sentiu abrigada, forçada, a aceitar a colocação dos referidos materiais de propaganda em sua residência; QUE, durante a colocação de placa por parte de JAIRO, a interrogada ainda disse para o mesmo várias vezes que não queria a propaganda em sua residência; [...].

 

O Ministério Público Eleitoral invoca, ainda, os relatórios de interceptações telefônicas, que demonstram tratativas realizadas entre João Batista e Luci para a colocação de placa de propaganda eleitoral na propriedade da eleitora, substituindo, inclusive, a placa de outro candidato que já estava afixada.

Transcrevo o diálogo em questão (ID 44888741, fls. 71-74):

Áudio 46:

Telefone: (51) 98359094

Data: 15.08.2012              Hora inicial: 08:58:40     Duração: 00:02:14

LÚCIA: Alô!

JOÃO BATISTA: Lúcia?

LÚCIA: Oi.

JOÃO BATISTA: Tudo bom, é o João Batista.

LÚCIA: Ah, pode falar.

JOÃO BATISTA: Oh, Lúcia, eu posso botar a placa lá, Lúcia?

LÚCIA: Tá, eu vou pra casa daqui a pouquinho porque eu tô aqui em Triunfo.

JOÃO BATISTA: Oh, Lúcia, eu dei uma passadinha lá, aquela placa do Jairo lá, de quem é, Lúcia?

LÚCIA: Oi.

JOÃO BATISTA: Aquela placa do Jairo lá?

LÚCIA: Tá não, aquilo lá eu falei pro Dirceuzinho ontem, ele teve lá, o Jairo é meio...

JOÃO BATISTA: Não, eu tô, eu tô com o Dirceu aqui e ele não sabia de nada.

LÚCIA: Tu tá ai na frente da casa?

JOÃO BATISTA: É, nós temos aqui, eu e ele.

LÚCIA: Não, tu tira e bota dentro do meu pátio, faz favor, tá?

JOÃO BATISTA: Tá, mas, oh, Lúcia, tamo tranquilo? Tudo certinho, né?

LÚCIA: Não, não, tô contigo, tu sabe eu falei ontem, tu tá ai...

JOÃO BATISTA: O Preto teve lá, o Preto teve lá, no mínimo oferecendo uma coisinha?

LÚCIA: Âh?

JOÃO BATISTA: O Preto teve lá oferecendo alguma coisinha?

LÚCIA: O Preto?

JOÃO BATISTA: O Preto teve lá oferecendo alguma coisinha?

LÚCIA: Aonde? Na minha casa ali?

JOÃO BATISTA: É.

LÚCIA: Hoje?

JOÃO BATISTA: Não, porque eu digo… ontem, tu botou ontem a placa.

LÚCIA: Não, eu botei ontem de tardezinha que o Jairo foi lá, o Jairo até deu (ininteligível), sabe?

JOÃO BATISTA: Tá.

LÚCIA: E aí foi sábado umas conversas assim, aí ele até queria me dar um material pra minha garagem, sabe? Eu, eu até ia falar contigo, João Batista, até ia pegar o material dele, mas não tinha conversado contigo, né.

JOÃO BATISTA: Tá, mas, mas nós temos combinado naquilo direitinho?

LÚCIA: Não, é contigo que eu tô fechado! Tu sabe que é pra ti.

JOÃO BATISTA: Não, tranquilo, tranquilo então, tá! Eu vou tirar a plaquinha dele e vou deixar dentro do teu pátio e vou botar a minha lá, tá?

LÚCIA: Tá, aí tu bota, tu bota tudo dentro do pátio ali tá.

JOÃO BATISTA: Não, pode deixar que eu acho um lugar bem no cantinho que não atrapalhe, tá?

LÚCIA: Tá. Oh, João Batista? Daí a, mês que vem lá pelo dia sete? Dia...

JOÃO BATISTA: Antes.

LÚCIA: É antes?

JOÃO BATISTA: Tá?!

LÚCIA: Tá bom, João Batista, valeu, um abraço.

JOÃO BATISTA: Tá bom, tchauzinho, outro.

LÚCIA: Tchau.

 

As circunstâncias extraídas tanto do depoimento extrajudicial da eleitora quanto do diálogo telefônico interceptado estão conformadas à cessão de espaço de propaganda eleitoral em propriedade privada, inclusive com a eleitora Luci negociando a instalação de placas com mais de um candidato. Entretanto, não há menção ou referência mínima, sequer implícita, que permita concluir sobre mercancia do voto, sem o que não há de se cogitar no aperfeiçoamento do crime de corrupção ativa.

Deveras, a jurisprudência exige a comprovação cabal e inequívoca do elemento subjetivo do tipo, que, na hipótese, representa o intuito de oferecer vantagem como forma de captar o voto, não bastando para a configuração do crime em tela que a benesse tenha sido condicionada a ato de propaganda, à colocação de adesivos em veículos ou, tal como no caso concreto, à instalação de placas na residência de eleitores.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL. IMPROCEDÊNCIA. CORRUPÇÃO ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO DE VALE-COMBUSTÍVEL EM TROCA DA AFIXAÇÃO DE ADESIVOS. DOLO ESPECÍFICO DE CAPTAR VOTOS. AUSÊNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PROVIMENTO. 1. Segundo a jurisprudência desta Corte, para a configuração do crime descrito no art. 299 do CE, é necessário o dolo específico que exige o tipo penal, isto é, a finalidade de "obter ou dar voto" e "conseguir ou prometer abstenção" ( RHC nº 142354, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 5.12.2013). 2. Na espécie, o recebimento da vantagem - materializada na distribuição de vale combustível -, foi condicionado à fixação de adesivo de campanha em veículo e não à obtenção do voto. Desse modo, o reconhecimento da improcedência da ação penal é medida que se impõe. 3. Agravo regimental provido para conhecer e prover o recurso especial e julgar improcedente a ação penal, afastando a condenação do agravante pela prática do crime de corrupção eleitoral.

(TSE - RESPE: 00000029120086190085 PETRÓPOLIS - RJ, Relator: Min. Maria Thereza Rocha De Assis Moura, Data de Julgamento: 03/02/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 42, Data 04/03/2015, Página 220) Grifei.

 

Também no âmbito deste Tribunal Regional Eleitoral, já se decidiu que “recompensas pela ajuda na campanha ou benefícios com o exclusivo fim de obter a simpatia do eleitor não se amoldam ao tipo penal em questão” (TRE-RS - AP: 135214, Relator: Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, DEJERS de 04.08.2016).

Dessa forma, não merece reforma a sentença, cujos fundamentos agrego às minhas razões de decidir:

(...) a minuciosa análise dos elementos de prova trazidos aos autos desemboca na ausência do elemento subjetivo específico do crime, consistente na oferta ou promessa de vantagem à eleitora com o fim especial de obter-lhe o voto.

Considerando os elementos trazidos aos autos e aqueles constantes do inquérito, em especial a ligação e o depoimento de Luci Teresa na fase de investigação, evidencia-se que o suposto pagamento teria ocorrido como contraprestação pela afixação de placa na propriedade da eleitora, ausente o pedido, expresso ou implícito, de voto ou abstenção.

O Ministério Público Eleitoral não foi capaz de demonstrar, durante a instrução, a presença dos elementos caracterizadores do delito de corrupção eleitoral ativa. A eleitora implicada na conduta narrada na denúncia não foi ouvida na fase judicial.

[...].

Ressalto, ainda, que a permissão de colocação de placas de propaganda eleitoral na propriedade dos eleitores, mesmo que em troca de pagamento ou outro benefício, não se amolda ao tipo penal de corrupção eleitoral. Outrossim, mesmo diante da possibilidade de configuração do delito em tela mediante pedido implícito de voto, a prova de tal acontecimento não pode ser subentendida ou presumida.

 

De fato, não demonstrado de forma cabal o elemento subjetivo do tipo, no sentido de que eventuais benesses ocorreram em contraprestação ao voto, deve ser mantida a sentença que absolveu João Batista dos Reis Cunha em relação aos fatos 35º, 36º e 49º, com fundamento no art. 386, incs. III e VII, do CPP.

 

6. JOÃO BATISTA VIEGAS

João Batista Viegas foi denunciado por incurso no art. 301 do Código Eleitoral (coação eleitoral), combinado com o art. 29, caput, e na forma do art. 71, caput, ambos do CP, em razão da suposta prática do 24º fato descrito na denúncia, in verbis:

Na semana que antecedeu o dia 16 de julho de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados JOÃO BATISTA VIEGAS, MARCELO ESSVEIN e PEDRO FRANCISCO TAVARES, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, usaram de grave ameaça para coagir Gilmar Batista do Prado a votar nos candidatos do PDT, bem como a fazer o que a lei não mandava, especificamente instalar placas de propaganda eleitoral do PDT na residência da família dele. [Fato 24 - fl. 76]

Nesse contexto, nas circunstâncias acima delimitadas, JOÃO BATISTA VIEGAS [...] na condição de “fiscal do transporte escolar”, tratando-se de funcionário público do Município de Triunfo/RS, afirmou ao eleitor Gilmar que “todos os transportadores que não colocarem placas estão fora” [...]. [fl 77]

 

Em síntese, o Ministério Público Eleitoral defende que o réu coagia, mediante grave ameaça, a que os prestadores de serviços de transporte público do município votassem na Coligação Triunfo no Coração e ostentassem o apoio político, sob pena de serem prejudicados nos contratos com a Prefeitura.

A descrição envolve a infração penal insculpida no art. 301 do CE, com o nomen iuris de coação eleitoral, conforme o seguinte tipo incriminador:

Art. 301. Usar de violência ou grave ameaça para coagir alguém a votar, ou não votar, em determinado candidato ou partido, ainda que os fins visados não sejam conseguidos:

Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze-dias-multa.

 

No tocante ao elemento normativo “grave ameaça”, na lição de Rodrigo López Zilio, “deve causar um mal injusto e grave ao eleitor, suprimindo-lhe a livre capacidade de escolha no pleito” e, ainda, “deve impor um temor real sobre o mal anunciado, devendo ser verossímil – o que não se coaduna com bravatas ou ameaças genéricas e vagas” (Crimes eleitorais. 3. ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 123).

A prova do fato consiste no depoimento da apontada vítima da coação, Gilmar Batista do Prado, assim exposto na sentença:

Promotor: No primeiro momento, quem teve um encontro com o senhor?

Gilmar Batista: O Paulo David.

Promotor: Ele tava sozinho?

Gilmar Batista: Sim.

Promotor: Aí ele te procurou e disse o que?

Gilmar Batista: Primeiro ele me procurou pedindo que eu botasse as placas. Depois me chamou na casa dele pra essa reunião, foi no dia em que eu gravei.

Promotor: E as placas que ele pediu que o senhor colocasse eram placas de quem?

Gilmar Batista: Era do PDT. [...]. Eu sei que era do PDT e era da atual gestão na época, da administração.

Promotor: Seria pro Marcelo Essvein?

Gilmar Batista: Isso, isso.

Promotor: E ele pediu pra colocar placa em que tom?

Gilmar Batista: No qual eu disse, “tu vai ter que colocar essa placa porque senão tu vai perder o serviço, vou ter que tirar, vou ter que rescindir os contratos que tenho contigo”.

[…].

Promotor: Aí no segundo momento, quem é que tava participando?

Gilmar Batista: Não, no segundo momento era o Paulo David e depois, em partes, o seu João Batista Viegas teve também no encontro, junto.

Promotor: Nesse segundo encontro?

Gilmar Batista: Nesse segundo encontro.

Promotor: E o João Batista Viegas falou o que para o senhor?

Gilmar Batista: Ele disse “ó, é melhor tu botar a placa, senão ele vai te tirar”.

Promotor: E o João Batista, ele tinha ingerência nessa empresa que terceirizava?

Gilmar Batista: Não, na empresa não. Ele era fiscal do transporte.

Promotor: Do município?

Gilmar Batista: Do município.

 

Na linha encampada na decisão absolutória, tenho que a prova é por demais frágil e incerta para um decreto condenatório, porquanto não é possível depreender, de forma robusta e cabal, o dolo específico exigido pelo tipo penal em comento, consistente na grave ameaça direcionada a coagir o voto ou sua abstenção.

Com efeito, a participação de João Batista Viegas delimitou-se à recomendação de que Gilmar colocasse a placa ou, caso contrário, Paulo David, chefe imediato do coagido, iria tirá-lo do serviço. O contexto extraído do acervo probatório permite concluir que tal dicção foi produzida como mera recomendação de prudência ante a ameaça produzida por terceiro em reunião em que todos participavam.

A corroborar tal possibilidade, bem observou o juízo a quo que “não há, no caderno probatório, elementos que permitam concluir que o réu João Batista Viegas, na condição de fiscal do contrato, teria poderes para fazer cumprir a ameaça que lhe imputam, o que esvaziaria a conduta do mínimo de ofensividade ao bem jurídico tutelado pelo tipo penal”.

Adoto, ainda, a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral na mesma linha de entendimento:

Especificamente questionada sobre a participação de TITA VIEGAS, a testemunha esclareceu que ele era apenas o servidor público municipal responsável pela fiscalização do transporte escolar, não tendo ingerência sobre as contratações/demissões dos funcionários dessa empresa terceirizada. Disse que ele presenciou uma das ocasiões em que “Paulo Contador” lhe ameaçou, tendo apenas comentado “acho melhor tu botar placa senão ele vai te tirar”.

 

Logo, deve ser mantida a sentença no ponto em que absolveu João Batista Viegas da acusação contida no 24º fato da denúncia.

 

Dispositivo

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento do recurso interposto por JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING e JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA e pelo desprovimento do recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a ação penal proposta contra JAIRO ROBERTO COSTA KERSTING, JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, JOÃO BATISTA DOS REIS CUNHA, JOAO BATISTA VIEGAS e JOSE RUI DA ROSA ISIDORIO.