PC-PP - 0600266-46.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/05/2023 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas, o Diretório Estadual do PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL - PC do B apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos no exercício financeiro de 2019.

Após o exame dos documentos e esclarecimentos apresentados nos autos, o órgão técnico deste Tribunal considerou sanados parte dos apontamentos inicialmente realizados, à exceção da aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário, na quantia de R$ 45.715,75, e da ausência de utilização mínima de 5% de valores desse Fundo, no exercício de 2019, na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, remanescendo o saldo de R$ 10.500,00 (ID 45003739).

Passo ao exame dos apontamentos que a análise técnica considerou não superados.

1 – Da aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário

As irregularidades pertinentes à comprovação dos gastos realizados com recursos do Fundo Partidário dizem respeito às contratações e às despesas relacionadas na seguinte tabela:

Tais apontamentos, que se referem à aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário, importariam em R$ 45.715,75 e, conforme a análise técnica, decorrem de despesas em que a documentação juntada aos autos não comprovou adequadamente a contratação.

Os primeiros itens dizem respeito às contratações de MARCIO PEREIRA CABRAL, no período de outubro a dezembro de 2019, para as quais não teria havido a comprovação da efetiva prestação de serviços, descritos como técnicos.

Cabe mencionar que, em um primeiro exame, foi detectado um número maior de despesas não comprovadas em relação a MARCIO, sendo uma delas sanada pela juntada aos autos de uma deliberação da comissão executiva do partido encaminhando a realização do Curso de Formação para Militantes do PCdoB/RS, o qual teria coordenação-geral de Márcio Pereira Cabral, que também atuaria como palestrante do Painel 1 (ID 44959655 – p. 14-15), seguida de fotos de pessoas em sala de aula. A unidade técnica entendeu que tal documentação seria apta a comprovar a despesa de R$ 1.500,00, que havida sido identificada no parecer conclusivo de ID 44954411, mas não os demais gastos.

Verifiquei que, na petição de ID 44959656, o partido informou que as despesas em questão estão relacionadas a ressarcimentos ao dirigente da agremiação. Junta recibo dos gastos, descritos como “BUFFET LIVRE”, no valor de R$ 500,00, e nota fiscal que descreve o pagamento de 20 unidades de “BUFFET LIVRE” no valor unitário de R$ 25,00 (ID 44956959 – p. 29-30). Também há comprovantes de despesas com combustíveis (ID 44956959 – p. 31-33).

Ocorre que os gastos apontados na tabela foram identificados na prestação de contas como “PF – Despesas com Outros Serviços Técnicos”. Nos Recibos de Pagamento a Autônomo – RPA, MÁRCIO PEREIRA CABRAL declara o recebimento de valores por prestação de serviços (ID 6202233 – p. 50 e 51; ID 6201683 – p. 80-81 e ID 6201733 – p. 31-32) ou “prestação dos serviços de Assessoria Política” (ID 620168 – p. 102-103).

Dessa forma, os documentos fiscais juntados aos autos não são aptos a corroborar as declarações constantes nos documentos contábeis.

Assim, os gastos relacionados a MARCIO PEREIRA CABRAL não foram devidamente comprovados.

Também não foi comprovada a efetiva prestação do serviço em relação aos gastos contratados com LANOT GOTTLEIB SOCIEDADE DE ADVOGADOS (item 5 da tabela).

No ponto, a fim de evitar tautologia, valho-me das observações veiculadas pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer (ID 45142596), que adoto como razões de decidir:

Quanto ao tópico 5 da tabela, verifica-se que o contrato firmado com o escritório Lanot Gottlieb Sociedade de Advogados, CNPJ 33.265.292/0001-43 (ID 44959655 - p. 12), conta com a seguinte descrição de objeto: assessoria e orientação jurídica na elaboração de contratos e prestações de contas e acompanhamento de processos judiciais de interesse do Contratante. Porém, não foram juntados, pela parte prestadora, documentos aptos a demonstrar a efetiva prestação do serviço contratado, como por exemplo a apresentação de peças e minutas jurídicas elaboradas pelo referido escritório de advocacia ou ainda a indicação de processos judiciais ou administrativos em que este representou a agremiação.

De se destacar, ainda nesse ponto, que o escritório contratado em 2019 não representou o partido nas prestações de contas referentes aos exercícios de 2017 (0600382-23.2018.6.21.0000) e de 2018 (0600372-42.2019.6.21.0000), sendo que todas as petições juntadas nos referidos autos, no ano de 2019, foram firmadas pelo advogado Lucas Couto Lazari (Lucas Lazari Advocacia), que ora representa o PCdoB e seus dirigentes.

 

Na hipótese, como o objeto da contratação envolvia prestações de contas e acompanhamento de processos judiciais, considerando a ausência de atuação do escritório de advocacia contratado nos processos indicados pelo Parquet e à míngua da produção de outras provas que pudessem demonstrar a realização do serviço contratado, o gasto deve ser considerado irregular.

Os itens 6, 7, 8, 9 e 10 da tabela dizem respeito às contratações efetuadas com TATIELY ROSANE RODRIGUES, ou TATIELLY ROSANE RODRIGUES NEVES PINTO, como indicado no documento fiscal (ID 6202233 – p. 59).

Reproduzo a descrição da irregularidade em questão na análise preliminar (ID 41837483):

A documentação fiscal (ID 6202233, p. 58/59) não demonstra de forma clara como se deu a prestação dos serviços.

1) Despesa de R$ 19.000,00: a nota fiscal tem por descrição: “design propaganda com objetivo de recrutamento de mulheres e fomento à participação feminina junto aos militantes do PCdoB, no RS, de setembro a dezembro de 2019”.

A empresa foi aberta em 2019 e para o referido gasto foi emitida a nota fiscal somente em 08/04/2020, e não em 2019 (NFe 2020/14). Essa despesa integra a tabela do item 1, de gastos realizados sem a devida comprovação material.

 

Na tabela incorporada a este voto, produzida na “Análise de documentos juntados após o parecer conclusivo” (ID 45003739), constou a seguinte manifestação técnica:

Nas razões finais, comprovação da prestação dos serviços de elaboração de material de design.

Todavia, a data da emissão da NFS-e 2020/14 é 8/4/2020, 7 meses após o primeiro pagamento (11/09/2019) e da suposta ocorrência da efetiva prestação do serviço.

No caso de serviços, a nota fiscal deve ser emitida assim que os serviços forem prestados, sendo irregular o pagamento efetuado com recursos públicos sem a emissão de documento fiscal idôneo.

 

Depreende-se da leitura do trecho que, na primeira parte, se considerou suprida a comprovação de prestação do serviço, restando, todavia, irregularidade em relação ao documento fiscal.

Na hipótese, foi juntada aos autos nota fiscal das despesas contratadas em 2019, a qual foi emitida em 08.4.2020. Nesse documento, consta como discriminação “Serviços de design de propaganda com objetivo de recrutamento de mulheres e fomento à participação feminina junto aos militantes do PCdoB no Rio Grande do Sul de setembro a dezembro de 2019”. Também está indicado como “Código de Tributação Municipal: 130300100 / Gravação, trucagem, reprodução e mixagem de vídeos, filmes, e congêneres”, bem como “Subitem Lista de Serviços LC 116/03 / Descrição: 13.03 / Fotografia e cinematografia, inclusive revelação, ampliação, cópia, reprodução, trucagem e congêneres”.

O órgão técnico apontou, portanto, que é irregular o pagamento efetuado com recursos públicos sem a emissão de documento fiscal idôneo.

A agremiação sustenta que o “fato de Tatiely Rosane Rodrigues ter emitido a nota fiscal após o primeiro pagamento não torna irregular o pagamento pelo serviço prestado“ (ID 45010792).

Tenho que assiste razão ao partido.

Embora a emissão intempestiva do documento fiscal embarace o registro adequado da despesa, contrariando normas de contabilidade e o disposto no art. 2º da Resolução TSE n. 23.546/17, tenho que a mácula pode ser considerada falha formal por não comprometer a regularidade das contas.

No mesmo sentido, localizei julgado do Tribunal Regional do Piauí que também examinava prestação de contas de exercício de partido político. Confira-se:

PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL DE PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2013 CONTAS APROVADAS. 1. AUSÊNCIA DE ATESTADO DE RECEBIMENTO DE MATERIAL IMPRESSO, JÁ QUE O DOCUMENTO APRESENTADO NÃO CONSTA ASSINATURA DO CLIENTE CONFIRMANDO O RECEBIMENTO DO MATERIAL. Embora o atestado de recebimento não tenha validade, já que não consta a assinatura do recebedor, entendo que a juntada do exemplar do jornal, onde consta o nome da empresa responsável pela impressão e a tiragem (dados que coincidem com os constantes da Nota Fiscal), comprova a entrega do produto, atingido, assim, a finalidade de provar a entrega do bem/serviço adquirido. Falha sanada. 2. DIVERGÊNCIA ENTRE O VALOR CONTABILIZADO NA NOTA FISCAL E AQUELE REGISTRADO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS E NO CHEQUE. Equívoco causado pela má grafia aposta quando do preenchimento do cheque, o que levou inclusive o bancário a efetuar o pagamento com valor diverso do informado por extenso. Falha sanada. 3. EMISSÃO EXTEMPORÂNEA DE NOTAS FISCAIS, EM DESCUMPRIMENTO AO DISPOSTO NO ARTIGO 11 DA RES. TSE N 21.841/2004 C/C ART. 6º E 9º DA RES. CFC Nº 1.282/10 (SEGUNDA FALHA). A Inobservância de princípios e normas de contabilidade, embora contrarie o disposto no art. 11 da Res. TSE nº 21.841/2004, trata-se de falha formal quando não compromete a regularidade das contas, como é o caso que ora se apresenta. 4. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. Houve utilização de recursos do fundo para criação, diagramação e impressão de cartões natalinos e respectivos envelopes, a fim de felicitar os filiados ao partido. Os recursos do fundo partidário possuem destinação específica disciplinada pelo art. 8º da Res. TSE 21.841/2004. Falha não sanada. 5. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. Aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade para aprovar com ressalvas a prestação de contas, já que o valor da irregularidade corresponde a 0,54% dos recursos arrecadados do fundo partidário no exercício. Alerto que A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral entende que, mesmo quando as irregularidades encontradas redundam na aprovação das contas com ressalvas, é cabível a determinação de valores ao erário. (Prestação de Contas nº 94702, Acórdão de 29/05/2014, Relator(a) Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 154, Data 20/08/2014, Página 72/73). 6. RECOLHIMENTO DO VALOR DO FUNDO PARTIDÁRIO APLICADO IRREGULARMENTE. Determinação de recolhimento ao erário do valor aplicado irregularmente do Fundo Partidário, devidamente atualizado e pago com recursos próprios, sendo que, caso o partido não providencie esse recolhimento, os dirigentes partidários responsáveis pelas contas em exame devem ser notificados para fazê-lo, nos termos do art. 34 da Resolução TSE n° 21.841/2004.

(Prestação de Contas nº 8588, Acórdão de , Relator(a) Des. ANTÔNIO LOPES DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 172, Data: 08/09/2016, Página 19)

 

Quanto a esta despesa, a Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45142596) entendeu que, mesmo admitida a nota fiscal, não teria havido a demonstração de que os serviços foram devidamente prestados, visto que não seria possível presumir que as mídias juntadas no ID 44959655 (p. 32 a 51) são de autoria da prestadora de serviços, pois sequer o partido prestador fez essa referência.

Por entender que as peças gráficas mencionadas estão diretamente relacionadas ao objeto do contrato – campanha de fomento à participação feminina –, bem como em razão de o órgão técnico deste Tribunal ter considerado tais elementos suficientes à comprovação material do ajuste, tenho que os apontamentos relativos à contratação de TATIELY ROSANE RODRIGUES estão suficientemente esclarecidos, restando apenas o registro da ressalva decorrente da falha formal no documento fiscal.

Prosseguindo, os itens 11 e 12 da lista de apontamentos estão relacionados ao ressarcimento dos gastos efetuados por EDISON PUCHALSKI.

O órgão técnico indicou a ausência de comprovação de vinculação do gasto de R$ 1.050,00 – refeição de 21 pessoas – com o desempenho de atividades partidárias e a falta de demonstração de gastos no valor de R$ 100,00. Nesse último apontamento, o valor representa a diferença entre o repasse efetuado de R$ 404,00 e a apresentação de comprovantes de despesas com refeições e combustível no valor de R$ 304,00.

Na hipótese, não tendo a agremiação produzido elementos suficientes a relacionar os primeiros gastos com a atividade partidária e juntar comprovantes em relação ao segundo gasto, deve ser reconhecida a irregularidade pertinente aos itens 11 e 12.

Na sequência, a despesa do item 13 representa o pagamento de R$ 178,67 a titulo de multa e juros, os quais estão discriminados em DARF.

A guia de recolhimento, juntada no documento de ID 44959655 – p. 11, indica a quitação do “valor principal” de R$ 1.004,01, “valor da multa” de R$ 100,35 e “valor dos juros e/ou encargos DL – 1.025/69” de R$ 78,32, totalizando R$ 1.182,68.

A utilização de verbas do Fundo Partidário para tal finalidade viola frontalmente o contido no § 2º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.546/17, que estabelece que tais recursos “não podem ser utilizados para a quitação de multas relativas a atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros”.

É, portanto, irregular o dispêndio de R$ 178,67.

Finalmente, o último item da tabela – n. 14 – glosa gasto declarado como despesa judicial e o respectivo pagamento, no valor de R$ 12.487,08.

O partido alegou que o “saque de R$ 12.487,08 refere-se a uma penhora determinada pelo juízo da 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre/RS, nos autos do processo n. 5002528-30.2018.8.21.0001” (ID 45010792), e juntou cópias do mencionado processo no ID 45010793.

Em seu parecer (ID 45142596), o Dr. José Osmar Pumes, Procurador Regional Eleitoral, em criterioso exame, observou tratar-se de ação monitória de cobrança relativa à despesa dos exercícios de 2017 e 2018. Vejamos:

Por fim, no que diz respeito ao apontamento de nº 14, relativo ao levantamento de R$ 12.487,08 da conta bancária, declarado na prestação de contas como “despesas judiciais”, a agremiação afirmou, na petição de ID 45010792, que se trata de uma penhora determinada pelo juízo da 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre/RS, nos autos do processo n. 5002528-30.2018.8.21.0001. Junto à referida petição, colacionou a íntegra do processo citado (ID 45010793).

Embora tenha havido a comprovação da origem do referido gasto, tem-se que este não pode ser tido como regular por essa Justiça Especializada, porquanto se trata de penhora realizada nos autos de ação monitória em que buscada a cobrança de mensalidades de serviço de estacionamento referentes aos exercícios de 2017 e 2018, incluindo também os consectários resultantes da inadimplência do partido. Ou seja, na sequer é o caso de se perquirir sobre a regularidade dos gastos com estacionamento, visto se tratar de serviços prestados em exercícios diversos, e tampouco há que se considerar regulares os dispêndios decorrentes da inadimplência da agremiação prestadora, efetuados com recursos do Fundo Partidário, haja vista a vedação do artigo 17, §2º, da Resolução TSE nº 23.546/2019.

 

Anoto que constam nos autos da monitória cópias de e-mails enviados pela autora da ação – empresa que realizava a cobrança das mensalidades do estacionamento – dirigidos a “Edison”, que também foi a pessoa que recebeu a citação. A ação monitória não foi contestada (ID 45010793), e o partido só se manifestou naqueles autos apresentando exceção de pré-executividade para arguir a impenhorabilidade dos recursos do Fundo Partidário e questionar a identificação da parte ré. Nessa ocasião, o partido afirmou a nulidade da inicial que não delimitou a esfera partidária demandada, mas deixou de, oportunamente, apresentar defesa quanto à cobrança amparada em “contrato padrão de locação de espaço para estacionamento de veículo” em que sequer estava qualificado como locatário.

A conduta do partido em relação à ação monitória é, então, mais um elemento a recomendar a glosa dos valores utilizados para quitação de despesas com estacionamento referente a exercícios anteriores.

O gasto é irregular diante da ausência de demonstração de qualquer relação do serviço pago judicialmente com a atividade partidária, de se tratar de despesa de exercícios anteriores e do evidenciado descuido com questão que acabou por se refletir na retenção de valores do Fundo Partidário.

Assim, retomo que foram consideradas irregulares as despesas indicadas nos itens 1, 2, 3, 4, 5, 11, 12, 13 e 14 da tabela acima mencionada, os quais perfazem o total de R$ 26.715,75 (ou o valor inicial indicado pela SAI, R$ 45.715,75, com a subtração do apontamento tido como regular, no valor de R$ 19.000,00).

Os apontamentos não superados representam aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário, atraindo a determinação de recolhimento do montante glosado ao Tesouro Nacional, nos termos do § 2º do art. 59 da Resolução TSE n. 23.546/17.

2 – Da ausência de aplicação mínima de 5% dos recursos do Fundo Partidário, no exercício de 2019, na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres

Pois bem, a aplicação dos recursos do Fundo Partidário no exercício 2019 está regulamentada, quanto aos aspectos materiais, na Resolução TSE n. 23.546/17.

Em relação à destinação das verbas do Fundo Partidário, o art. 44 da Lei dos Partidos Políticos determina a aplicação de, no mínimo, de 5% (cinco por cento) para finalidade específica, qual seja:

Art. 44. Os recursos oriundos do Fundo Partidário serão aplicados:

[...]

V - na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, criados e executados pela Secretaria da Mulher ou, a critério da agremiação, por instituto com personalidade jurídica própria presidido pela Secretária da Mulher, em nível nacional, conforme percentual que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 5% (cinco por cento) do total;

 

O dispositivo foi assim regulamentado na Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 22. Os órgãos partidários devem destinar, em cada esfera, no mínimo, 5% (cinco por cento) do total de recursos do Fundo Partidário recebidos no exercício financeiro para a criação ou manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, a serem realizados de acordo com as orientações e de responsabilidade do órgão nacional do partido político.

§ 1º O partido político que não cumprir o disposto no caput deve transferir o saldo para conta bancária de que trata o inciso IV do art. 6º, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, de modo que o saldo remanescente deve ser aplicado dentro do exercício financeiro subsequente, sob pena de acréscimo de 12,5% (doze inteiros e cinco décimos por cento) do valor previsto no inciso V do caput, a ser aplicado na mesma finalidade (Lei nº 9.096/1995, art. 44, § 5º).

§ 2º Na hipótese do § 1º, o partido fica impedido de utilizar qualquer dos valores mencionados para finalidade diversa.

§ 3º A aplicação de recursos a que se refere este artigo, além da contabilização em rubrica própria do plano de contas aprovado pelo TSE, deve estar comprovada mediante a apresentação de documentos fiscais em que conste expressamente a finalidade da aplicação, vedada a comprovação mediante o rateio de despesas ordinárias, tais como água, luz, telefone, aluguel e similares.

§ 4º A infração às disposições previstas neste artigo implica irregularidade grave a ser apreciada no julgamento das contas.

§ 5º A critério da secretaria da mulher ou, inexistindo a secretaria, a critério da fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política, os recursos a que se refere o caput podem ser acumulados em diferentes exercícios financeiros, mantidos em contas bancárias específicas, para utilização futura em campanhas eleitorais de candidatas do partido, não se aplicando, neste caso, o disposto no § 2º.

§ 6º Nas três eleições que se seguirem ao dia 29 de setembro de 2015, os partidos reservarão, em contas bancárias específicas para este fim, no mínimo 5% (cinco por cento) e no máximo 15% (quinze por cento) do montante do Fundo Partidário destinado ao financiamento das campanhas eleitorais para aplicação nas campanhas de suas candidatas, incluídos nesse valor os recursos a que se refere o inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/1995 (Lei nº 13.165/2015, art. 9º).

§ 7º Para fins de aferição do limite mínimo legal, devem ser considerados os gastos efetivos no programa e as transferências financeiras realizadas para as contas bancárias específicas de que trata o inciso IV do art. 6º.

 

A análise técnica apontou que cabia ao partido empregar, no exercício de 2019, o valor de R$ 14.500,00 (considerando o recebimento de R$ 290.000,00 do Fundo Partidário) na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres (ID 44954411).

O parecer conclusivo também anotou que:

Consultando o Extrato da Prestação de Contas reapresentado na retificadora (ID 44938191, p. 18-21), foi declarada a aplicação de recursos do Fundo Partidário com alistamento de mulheres, no valor de R$ 4.000,00, e com propaganda doutrinária e política para mulheres, no valor de R$ 19.000,00.

Todavia, como assinalado no Exame de Prestação de Contas, os documentos fiscais juntados (ID 6202233, páginas 58-59 e ID 6201683, páginas 18-19) não configuram provas aptas a demonstrar a efetiva aplicação de recursos em ações de incentivo à participação política feminina.

Sendo assim, referidas despesas, de R$ 4.000,00 e R$ 19.000,00, integram o rol de gastos irregulares constantes da tabela 1 – aplicação irregular do fundo partidário acima, por ausência de “comprovação material da efetiva prestação do serviço”.

Desta forma, não sendo possível atestar a aplicação mínima de 5% de recursos do Fundo Partidário na promoção da participação política das mulheres, a agremiação deverá transferir o valor de R$ 14.500,00, no exercício subsequente, para conta específica destinada à movimentação de recursos dessa natureza, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, sob pena de acréscimo de 12,5%, nos termos do artigo 22, § 1º, da Resolução TSE 23.546, de 201719 .

 

A análise técnica posterior (ID 45003739) considerou regular um dos gastos – aquele no valor de R$ 4.000,00 –, remanescendo pendente de comprovação e adequação o montante de R$ 10.500,00.

O partido afirma que a despesa contratada com TATIELY ROSANE RODRIGUES, no valor de R$ 19.000,00, por estar relacionada à propaganda doutrinária e política para mulheres, atende à destinação legal.

Pois bem, tal despesa foi considerada irregular pelo órgão técnico em razão da emissão extemporânea da nota fiscal, como se expôs anteriormente.

Tendo considerado a mácula tão somente irregularidade formal, tenho que a contratação também deve ser considerada apta a observar a destinação de recursos para programas de incentivo à participação de mulheres na política.

Reproduzo algumas das peças realizadas pela fornecedora e utilizadas pelo partido, as quais foram trazidas aos autos para demonstrar tal pertinência:

Como se percebe, o material é especificamente destinado à finalidade prevista em lei, de forma que os valores despendidos nessa contratação devem ser subtraídos daquela cota relativa à destinação específica.

Como remanescia de comprovação o montante de R$ 10.500,00 e a contratação em questão totalizou R$ 19.000,00, deve ser considerada sanada a irregularidade.

Conclusão

No exercício de 2019, a agremiação auferiu receitas que atingiram o montante de R$ 366.938,95 (ID 44954411). As irregularidades glosadas, relativas à aplicação irregular do Fundo Partidário, atingem o patamar de R$ 26.715,75, o que representa 7,28% dos recursos arrecadados.

Assim, é razoável e proporcional a aprovação das contas com ressalvas em face da jurisprudência desta Corte, uma vez que as falhas não comprometeram de forma insanável a confiabilidade e a transparência das contas, nem prejudicaram o exame da Justiça Eleitoral sobre a destinação dos recursos públicos recebidos pelo partido.

Da mesma forma, a aprovação com ressalvas afasta a sanção de multa, como tem entendido este colegiado e pode ser verificado em recente julgado de minha relatoria:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. APLICAÇÃO IRREGULAR E AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. FALHAS DE BAIXO PERCENTUAL. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, relativa ao exercício financeiro de 2019, disciplinadas quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.546/17. 2. Aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário. 2.1. A documentação apresentada nos autos pelo partido não esclarece a espécie de serviços prestados, desatendendo ao requisito legal disposto no caput do art. 18 da Resolução TSE n. 23.546/17, que determina a descrição detalhada da atividade executada. Mantida a falha. Descabido o pedido de nova intimação. 2.2. Pagamento de multa de trânsito e outros pagamentos de multa, juros e/ou encargos com recursos do Fundo Partidário. Afronta ao disposto no § 2º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.546/17, que é expresso em estipular a vedação da quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros. 2.3. Gastos por meio de cheques não nominativos e não cruzados. Infringência ao art. 18, caput e § 4º, da citada Resolução. 3. Ausência de comprovação de gastos com verbas do Fundo Partidário. 3.1. Divergência de valores na locação de reboque. A despesa realizada pelo prestador não foi sanada por meio de esclarecimentos e documentos, desbordando em discrepância de valores constatada a partir do recibo apresentado, caracterizando o gasto irregular realizado com recursos públicos. Por conseguinte, remanesce a falha. 3.2. Contrato de prestação de serviços com instituto de pesquisa de opinião pagos mediante cheque nominal não cruzado. A agremiação não logrou comprovar documentalmente o vínculo entre a beneficiária e o instituto de pesquisa, de forma a justificar o pagamento. Vício não sanado. 3.3. Gastos em relação aos quais não houve a demonstração inequívoca de vinculação com as atividades partidárias. Incidência do art. 18, caput e § 4º, c/c o art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17. 3.4. Ausência de vínculo do beneficiado com o “ressarcimento”. Inobservância da forma direta de pagamento prevista no § 4º do art. 18 da Resolução mencionada, bem como da alternativa da constituição de Fundo de Caixa para gastos de pequeno vulto. 3.5. Falha na comprovação dos gastos com serviços de contabilidade não configuradas. Os dados não permitem concluir pela irregularidade da operação, tendo em conta que deve ser considerada “a abrangência dos serviços contratados pelas agremiações, a expertise do profissional de contabilidade, o tempo de dedicação exclusiva despendido pelo profissional, entre outros fatores que compõem o valor dos honorários”. 4. O montante das irregularidades representa 2,8% da movimentação financeira da agremiação. Possível a simples aposição de ressalvas na contabilidade quando a baixa representação percentual das falhas não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário. 5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº 060020843, Acórdão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 39, Data: 06/03/2023)

 

A aprovação com ressalvas das contas não afasta o dever de recolhimento dos valores glosados ao Tesouro Nacional, que independe da sorte do julgamento final sobre o mérito das contas, pois consubstancia, no caso dos autos, ressarcimento em razão da ausência de comprovação da adequada destinação dos recursos públicos, e não providência sancionatória em sentido estrito.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela aprovação com ressalvas das contas do Diretório Regional do PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL - PCdoB, referentes ao exercício 2019, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17, e pela determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 26.715,75 (vinte e seis mil, setecentos e quinze reais e setenta e cinco centavos).