PC-PP - 0600084-60.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/04/2023 às 14:00

VOTO

Passo ao exame das irregularidades apontadas pela Secretaria de Auditoria Interna (SAI) relativas à aplicação de verbas  oriundas do Fundo Partidário constantes nos itens 1.3, 2 e 3 do parecer conclusivo, no montante de R$ 11.261,74, e ao recebimento de recursos de fonte vedada no valor de R$ 3.416,20 referido no item 4.

a) Falta de descrição detalhada do serviço prestado (1.3)

No item 1.3 do parecer conclusivo, foi apontada falha no valor de R$ 5.895,60 referente à falta de descrição detalhada do serviço prestado pela contraparte Andreza Daiane Gonçalves Gomes quanto a pagamentos efetuados em 03 e 10.01 e 1º.02 de 2019, nos valores de R$ 3.344,80, R$ 350,00 e R$ 2.200,80, respectivamente (ID 45139443 – p. 2).

Os prestadores afirmaram que o pagamento é relativo à prestação de serviço de assessoramento ao Vice-Presidente do MDB, Sebastião Melo (ID 44979721 – p. 5), informaram não ter sido celebrado contrato e referiram que os repasses foram efetivados por meio de RPA (Recibo de Pagamento Autônomo).

Alegam que Andreza realizava atividades inerentes aos serviços de assessoria de imprensa, bem como de secretária executiva, e que não foi firmado contrato de trabalho, como prevê o § 1º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.546/17, pois se tratava de contratação de terceiro autônomo, pago mediante RPA. Ocorre que o dispositivo em questão apenas refere que, em tais casos, as despesas não devem ser consideradas para efeito da aferição do limite de gastos com pessoal.

A unidade técnica, por sua vez, considerou que não foram apresentados documentos comprobatórios do efetivo serviço prestado, em contrariedade ao disposto no art. 18, § 7º, inc. I, e art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

Entretanto, os prestadores demonstraram que no acórdão do julgamento da PC 0600257-21.2019.6.21.0000, de Relatoria do Des. Federal Luiz Alberto D' Azevedo Aurvalle, os gastos com a referida profissional foram considerados regulares, merecendo ser acolhido o entendimento de que os pagamentos feitos à prestadora Andreza nada mais são do que uma extensão, a finalização, daqueles feitos no exercício imediatamente anterior. 

A prestadora de serviço em questão é profissional que já foi contratada diversas vezes pelo partido, inclusive em outros períodos e em outras prestações de contas os pagamentos foram tidos como regulares.

Assim, é possível o afastamento da falha no valor de R$ 5.895,60.

b) Comprovantes ilegíveis de despesas (2)

A unidade técnica referiu que parte dos documentos fiscais utilizados para a comprovação dos gastos encontram-se ilegíveis e, por tal razão, considerou que não foi possível atestar a totalidade das despesas pagas com recursos do Fundo Partidário, de acordo com a tabela abaixo:

Os prestadores argumentaram que parte das notas fiscais estava legível, reconhecendo, contudo, a juntada de documentos com baixa nitidez.

Ao analisar os autos, observei que alguns apontamentos da tabela acima colacionada podem ser afastados, devendo o valor a recolher ser reduzido, pois, de fato, parte dos documentos fiscais não está completamente ilegível, podendo ser acolhida a manifestação do prestador, da seguinte forma:

- Item 1 – a baixa nitidez foi considerada somente quanto a três notas fiscais, sendo duas nos valores de R$ 100,00 e uma de R$ 62,99. Entretanto, os documentes são legíveis o suficiente para se verificar que se trata de gasto com combustível nos postos Comercial de Combustível XV de Novembro Ltda., Abastecedora de combustíveis Tricolor Ltda. e Chafariz. A última nota fiscal refere-se ao comprovante de pagamento de estacionamento Safe Park. Logo, a falha pode ser afastada;

Item 6 – a falha foi apontada somente quanto à nota fiscal no valor de R$ 244,07, mas é possível verificar que a descrição do documento indica se tratar de gasto com gasolina referente a 24,25L no posto Buffon. As demais notas encontram-se legíveis.

Portanto, entendo que deve ser afastada a glosa quanto aos itens 1 (R$ 283,03) e 6 (R$ 718,10).

No tocante aos itens 2, 4 e 5 da tabela colacionada, constatei que apenas no item 02 há duas notas fiscais ilegíveis no valor de R$ 234,04. No item 04, apenas uma nota fiscal, na quantia de R$ 7,00, está ilegível. No item 05, a soma das notas fiscais legíveis é de R$ 1.003,35, restando somente a quantia de R$ 245,30, referente à única nota não legível.

Ressalto que não se trata de apuração de má-fé, mas tão somente de desídia do partido ao deixar de juntar aos autos documentos fiscais que possam ser lidos pela análise técnica.

Quanto ao item 3, no valor de R$ 246,60, a Procuradoria Regional Eleitoral aponta que a despesa na verdade é de R$ 92,35, conforme recibo da p. 16  do ID 5553083, a qual foi glosada porque o valor ressarcido refere-se à hospedagem em hotel no Município de Gramado, sendo que não foi informado o nome do hóspede, contrariando o disposto no art. 18, § 7º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.546/17. Os demais valores correspondentes ao restante do ressarcimento foram comprovados.

Desse modo, devem ser computadas como irregulares as quantias de R$ 234,04 (item 2), R$ 92,35 (item 3), R$ 7,00 (item 4) e R$ 245,30 (item 5), totalizando R$ 578,69, montante que deve ser recolhido ao erário (art. 59, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17).

c) Pagamento de multas e encargos de mora com recursos do Fundo Partidário (3)

Conforme o órgão técnico apontou, foi constatado o pagamento de multas, juros e/ou encargos de mora com recursos do Fundo Partidário, em desacordo com o art. 17, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17, resultando em um total de R$ 2.207,85 de despesas irregulares.

O MDB justificou a falha, dizendo tratar-se de REFIS e encargos que “passaram despercebidos ao partido tendo em vista que os valores vêm inclusos no boleto ou GRU ou DARF a serem pagos, sem possibilidade de pagamento em separado”, e afirmou que “está pronto para realizar o recolhimento destes valores”.

Desse modo, permanece o apontamento de irregularidade, devendo ser realizada a devolução ao erário do montante de R$ 2.207,85, conforme determinação do art. 59, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

d) Recebimento de contribuições de fontes vedadas procedentes de detentores de cargo, emprego ou função pública de livre nomeação e exoneração (4)

A última irregularidade refere-se ao recebimento de contribuições de pessoas físicas, conforme tabela abaixo, que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, no total de R$ 3.416,20, que não estavam filiadas à agremiação, consideradas fontes vedadas de arrecadação por ficarem de fora da ressalva contida no inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações referidas no art. 38 desta Lei e as provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha; (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

III - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

IV - entidade de classe ou sindical.

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

(Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017) (Grifei.)

Quanto a este apontamento, a agremiação, inicialmente, em alegações finais, invocou a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, após o parecer conclusivo, e requereu que fossem reanalisadas as doações (ID 44979721 – p. 8).

Em decisão monocrática (ID 44980093), foi determinado que o partido informasse “quando e quais seriam as doações efetuadas e os respectivos servidores públicos que as realizaram, bem como os valores envolvidos, que estariam sujeitos à anistia prevista no art. 55-D da Lei 9.096/95, apresentando o correlato demonstrativo de cálculo discriminado”.

O MDB novamente peticionou (ID 44993395), relatando equívoco no pedido.

Dessa forma, como não foram apresentados fatos novos ou documentos aptos a reverter as falhas apontadas, permanece o apontamento, e a quantia de R$ 3.416,20 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, conforme art. 14, § 1°, da Resolução TSE n. 23.546/17.

Em conclusão, tem-se que as irregularidades constatadas, nos valores de b) R$ 578,69 + c) R$ 2.207,85 + d) R$ 3.416,20, alcançam o montante de R$ 6.202,74, que representa 0,26% de toda a receita arrecadada no exercício de 2019, na ordem de R$ 2.380.091,65, mostrando-se razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, em face da jurisprudência desta Corte, uma vez que as falhas não comprometeram de forma insanável a confiabilidade e a transparência dos registros contábeis, nem prejudicaram o exame da Justiça Eleitoral sobre a destinação dos recursos públicos recebidos pelo partido.

Tal conclusão, porém, não afasta o dever de recolhimento do valor indevidamente recebido ao Tesouro Nacional, que independe da sorte do julgamento final sobre o mérito das contas, pois consubstancia consequência jurídica relacionada à vedação do enriquecimento ilícito, e não providência sancionatória em sentido estrito.

Nessa linha, segundo o TSE: “A aprovação das contas com ressalvas em função das irregularidades apuradas impõe sempre a devolução dos respectivos valores ao erário” (PC n. 978-22/DF, redator para o acórdão Min. Dias Toffoli, DJe de 14.11.2014).

Inviável, entretanto, a aplicação da sanção de multa de até 20% sobre a importância apontada como irregular, assim como da suspensão das quotas do Fundo Partidário, nos termos da jurisprudência desta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A SANÇÃO DE MULTA E A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiação em razão do recebimento de recursos de fonte vedada, oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, da legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte e na esteira da jurisprudência do TSE.

2. Irrelevante o argumento de o cargo ocupado por autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria de autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/2015, aplicável ao exercício em análise, incide o caráter objetivo da norma, sem espaço para eventual análise subjetiva.

3. Valores irregularmente recebidos que representam 2,83% do total de recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Aplicados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Mantido o recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastadas a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional e a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Recurso Eleitoral n. 5482, ACÓRDÃO de 11.4.2019, Relatora MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 22.4.2019.) (Grifo nosso)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADE. RECONHECIDA A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95. INCIDÊNCIA DAS DISPOSIÇÕES DA LEI N. 13.488/17 COM RELAÇÃO A PARTE DAS CONTRIBUIÇÕES. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DA IRREGULARIDADE FRENTE AO TOTAL MOVIMENTADO NO PERÍODO. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IMPUGNADA AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A SANÇÃO DE MULTA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

[...]

4. O valor irregularmente recebido representa 2,1% do total da receita arrecadada no exercício financeiro, possibilitando o juízo de aprovação com ressalvas. Circunstância que não afasta a devolução ao Tesouro Nacional do valor indevidamente recebido, conforme estabelece o art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, afastando-se apenas a aplicação da multa, cabível somente nos casos de desaprovação. Redução do valor a ser recolhido ao erário, em virtude de duas contribuições abrangidas pelas disposições da Lei n. 13.488/17.

5. Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 805, ACÓRDÃO de 02.9.2019, Relator MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 167, Data: 06.9.2019, p. 5.)

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas da prestação de contas do exercício financeiro de 2019 do Diretório Estadual do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) DO RIO GRANDE DO SUL, e determino o recolhimento da quantia de R$ 6.202,74 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.

Após o trânsito em julgado, proceda-se de acordo com o art. 32 e seguintes da Resolução TSE n. 23.709/22, inclusive no que se refere à intimação, de ofício, da Advocacia-Geral da União (AGU/PGU), para manifestar interesse no cumprimento definitivo de sentença no prazo de 30 (trinta) dias.