PC-PP - 0600131-97.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/04/2023 às 16:30

VOTO

O Diretório Estadual do Partido CIDADANIA apresenta contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2020, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

Em parecer conclusivo, a unidade técnica apontou as seguintes irregularidades: ingresso de doação proveniente de pessoa jurídica (item 2.1), contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido e que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2021 (item 2.2) e aplicação irregular de valores provenientes do Fundo Partidário (item 4.4) por descumprimento do art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Quanto ao item 2.1, a análise técnica apontou o recebimento de R$ 660,00 (seiscentos e sessenta reais) em onze parcelas iguais de R$ 60,00 (sessenta reais), constando no extrato bancário CNPJ atribuído a “RPPS/EXECUTIVO-PG”. Sobre isso, o prestador esclareceu que não se trata de doação recebida de pessoa jurídica, mas sim de desconto em folha de proventos devidamente autorizado pela doadora (pessoa física), acostando declaração por ela firmada, corroborando o alegado.

Todavia, como bem apontado no parecer conclusivo, por se tratar de mera declaração da parte, mesmo não havendo indícios de fraude ou má-fé, o documento apresentado não faz prova da origem do recurso, tal como preceitua o inc. III do art. 36 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Dessa forma, não havendo a apresentação de elemento probatório objetivamente constituído que respalde o esclarecimento apresentado, tenho que o apontamento consignado no parecer conclusivo deve prosperar, restando configurado o recebimento de recursos de fonte vedada.

A segunda anotação no item de fontes vedadas (2.2) refere-se a 46 (quarenta e seis) depósitos realizados ao longo do ano de 2020, no montante de R$ 9.286,89, advindos dos seguintes doadores: Adriana Gonçalves, Carlos Alberto Schroder, Clarissa França, Leandro Mello de Souza, Marcio Leandro Mutto, Neusa Beatriz Pedroso Bueno, Pedro Paulo da Silva Guimarães, todos exercentes de cargos públicos de livre exoneração ou demissão em diferentes órgão públicos no exercício de 2021, conforme sistematizado no parecer conclusivo.

Intimado do Relatório de Exame de Contas (ID 44999602), o prestador nada manifestou sobre o referido apontamento, tampouco demonstrou a incidência da ressalva da parte final do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, culminando na caracterização de recebimento de recursos de fonte vedada também neste item.

Com efeito, a percepção pelo partido de recursos oriundos de tais fontes é expressamente vedada pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. (Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017) (Grifo nosso)

 

Como regra, o partido é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive mediante publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário.

Conforme mencionado, a parte final do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95 estabelece uma exceção à vedação e, justamente por se tratar de uma salvaguarda, deve ser interpretada restritivamente, ou seja, “quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação”.

A finalidade da ressalva é possibilitar ao partido o recebimento de contribuições ordinárias dos seus filiados a título de mensalidade, para que a agremiação não se veja desfalcada dessa fonte de custeio pelo fato de o filiado ser alçado à função ou a cargo público de livre exoneração ou demissão.

Desse modo, consoante o inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre exoneração ou demissão, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada à grei beneficiária da doação.

Esse é o entendimento adotado por esta Corte, conforme resposta apresentada à Consulta n. 0600076-83.2020.6.21.0000, de relatoria do Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, julgado em 08.6.2020, quando indagada acerca da licitude de doações oriundas de filiados à agremiação diversa daquela destinatária dos recursos:

(...) Nos termos do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação.

 

Assim, a existência de recursos de fonte vedada demanda o recolhimento do seu montante ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Portanto, diante da existência de recursos provenientes de fontes vedadas, impõe-se o recolhimento da quantia de R$ 9.946,89 (nove mil, novecentos e quarenta e seis reais e oitenta e nove centavos) ao Tesouro Nacional a tal título.

Em relação à aplicação de verbas do Fundo Partidário em desacordo com o art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19, verifica-se que a grei partidária apresentou elementos capazes de elidir parcialmente o apontamento.

Com efeito, foi indicado o montante de R$ 3.737,71 (três mil, setecentos e trinta e sete reais e setenta e um centavos) como objeto de aplicação irregular de recursos públicos, resultante do somatório das cinco despesas indicadas na tabela do item 4.4 do parecer conclusivo de ID 45142755, sendo três delas relativas ao fornecedor “NET SERVIÇOS”, uma referente ao fornecedor “GRÁFICA FLORESTA” e uma pertinente ao fornecedor “MONIQUE RAUPP”.

No tocante às despesas contraídas junto ao fornecedor “NET SERVIÇOS” (despesas 3, 4 e 5 da tabela), verifico que a documentação apresentada na manifestação de ID 45077424 possui o condão de superar o apontamento, pois o prestador demonstra que tais despesas efetivamente se referem a serviços de telefonia e internet contratados com o fornecedor Claro/Net, conforme declarado e como se depreende das referidas faturas, além de ser fato conhecido que as empresas CLARO S/A e NET SERVIÇOS constituem uma única entidade. Diante disso, tenho por satisfeita a normativa insculpida no art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19 no ponto.

Todavia, mesma sorte não assiste em relação às despesas contratadas com os fornecedores “GRÁFICA FLORESTA” e “MONIQUE RAUPP” (itens 1 e 2 da tabela do item 4.4 do parecer conclusivo – ID 45142755). De fato, não se verifica nos autos, inclusive na manifestação complementar apresentada após a indicação no Relatório Preliminar, documento capaz de satisfazer o requisito do citado art. 18, o que inviabiliza o afastamento da irregularidade.

Na espécie, contudo, as irregularidades apontadas totalizam R$ 13.196,89 (treze mil, cento e noventa e seis reais e oitenta e nove centavos), o que representa 1,58% das receitas declaradas, ficando abaixo do percentual (10%) utilizado como parâmetro para permitir a aprovação das contas com ressalvas na esteira da jurisprudência desta egrégia Corte.

Desse modo, nos termos da jurisprudência desta Corte, imprópria a aplicação da sanção de multa de até 20% sobre a importância apontada como irregular, pois apenas devida na hipótese de desaprovação de contas:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A SANÇÃO DE MULTA E A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiação em razão do recebimento de recursos de fonte vedada, oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, da legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte e na esteira da jurisprudência do TSE.

2. Irrelevante o argumento de o cargo ocupado por autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria de autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/2015, aplicável ao exercício em análise, incide o caráter objetivo da norma, sem espaço para eventual análise subjetiva.

3. Valores irregularmente recebidos que representam 2,83% do total de recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Aplicados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Mantido o recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastadas a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional e a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Recurso Eleitoral n 5482, ACÓRDÃO de 11/04/2019, Relator(aqwe) MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 22/04/2019.) (Grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADE. RECONHECIDA A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95. INCIDÊNCIA DAS DISPOSIÇÕES DA LEI N. 13.488/17 COM RELAÇÃO A PARTE DAS CONTRIBUIÇÕES. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DA IRREGULARIDADE FRENTE AO TOTAL MOVIMENTADO NO PERÍODO. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IMPUGNADA AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A SANÇÃO DE MULTA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

[...]

4. O valor irregularmente recebido representa 2,1% do total da receita arrecadada no exercício financeiro, possibilitando o juízo de aprovação com ressalvas. Circunstância que não afasta a devolução ao Tesouro Nacional do valor indevidamente recebido, conforme estabelece o art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, afastando-se apenas a aplicação da multa, cabível somente nos casos de desaprovação. Redução do valor a ser recolhido ao erário, em virtude de duas contribuições abrangidas pelas disposições da Lei n. 13.488/17.

5. Provimento.

(Recurso Eleitoral n 805, ACÓRDÃO de 02/09/2019, Relator MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 167, Data1: 06/09/2019, Página 5) (Grifo nosso)

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do exercício financeiro de 2020 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO CIDADANIA, determinando o recolhimento da importância apontada como irregular, no valor de R$ 13.196,89, ao Tesouro Nacional.