REl - 0600507-11.2020.6.21.0100 - Acompanho o(a) relator(a) - Sessão: 04/04/2023 às 14:00

Acompanho o relator.

Com efeito, devem ser afastadas as preliminares de nulidade processual por (1) violação ao devido processo legal e (2) cerceamento de defesa e, no mérito, merece provimento o recurso.

Não há como extrair, dos autos, elementos probatórios para a manutenção do juízo condenatório em desfavor dos demandados JONES ADEMAR RECH, NILSON PANISSON e JUSENE CONSOLADORA PERUZZO, seja pela prática de abuso de poder econômico e político, seja pela captação ilícita de sufrágio (figuras jurídicas bem conceitualmente recortadas ao longo do voto do em. Relator, sobretudo no que diz respeito aos requisitos para configuração). Os testemunhos fundamentais, dos eleitores Tatiana e Fabiano (então cônjuges) trazem fortes contradições sobre a entrega do suposto benefício, bem como acerca das visitas dos candidatos à residência do casal.

Senão, vejamos.

Fabiano relata a entrega de material de construção (areia e brita) no pátio de sua casa, ou em frente a ela, por um “caminhão da prefeitura”, com a visita no dia subsequente por parte de JONAS RECH e “o Vice” (NILSON PANISSON), dos quais teria recebido a proposta do recebimento do material como contraprestação a “fazer campanha para ele”.

Tatiana, em contrapartida, indicou ter havido visita prévia de JUSENE e de JONES, com o intuito de pedir que o casal fizesse campanha (ocasião em que teria discutido com JUSENE). Ainda conforme Tatiana, somente após esta visita é que teria havido a descarga de material, com a descrição de um terceiro evento: a visita, dois dias após a entrega de areia e brita, de JUSENE, JONES e NILSON.

Ou seja, são perceptíveis desacordos para além de meros detalhes de narrativa, mas que consubstanciam a própria ocorrência (ou inocorrência) de fatos.

Mas não é só.

Há os testemunhos de (1) Lindonês Girardi, comerciante que afirmou ter vendido areia e brita a Fabiano, e a ele indicado que pedisse à Prefeitura a realização do transporte dos materiais; (2) Jonatas Kraczuski, servidor público municipal efetivo, o qual declarou ter recebido ordem de transporte de brita e de areia, tendo executado a tarefa com Fabiano orientando de carro, à frente, o caminho no transporte da areia, e narrou ter visualizado nota fiscal emitida em nome de Lindonês, no relativo à brita; (3) Ivalino Pegoraro, então Secretário Municipal de Obras, e (4) Antoninho Cidinei Mello, servidor público, os quais prestaram testemunho alinhado, no sentido de que a prática de transporte de materiais de particulares, pelo Poder Executivo Municipal, era corriqueira há bastante tempo.

Enfim, transcrevo elucidativo trecho do parecer do ilustre Procurador Regional Eleitoral:

Colocadas essas premissas jurídicas, observa-se que, no caso concreto, o conjunto probatório não autoriza      conclusão no sentido de que tenha havido captação ilícita de sufrágio, e as circunstâncias descaracterizam a ocorrência de abuso de poder político e econômico. (...)

Em que pese seja impossível reconstituir com precisão o que aconteceu, parece haver um consenso entre a maior parte dos depoentes no sentido de que os materiais foram adquiridos por Fabiano e apenas foram entregues em sua residência por máquina da Prefeitura operada por servidor municipal em horário de trabalho. Conquanto essa última circunstância pudesse caracterizar ilegalidade, as testemunhas afirmaram tratar-se de prática comum na região, pela suposta inexistência de empresas de transporte, e que acontece independentemente de afinações políticas, seja dos gestores municipais seja dos munícipes beneficiados. 

O reconhecimento das práticas de abuso de poder e de captação ilícita de sufrágio ensejam sanções gravosas, de modo que o juízo de condenação deve estar alicerçado em prova inconcussa e estreme de dúvidas, o que não se vislumbra no caso dos autos.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso, nos termos do voto do em. Relator.