ED no(a) REl - 0600490-69.2020.6.21.0101 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/03/2023 às 14:00

VOTO

Os pontos invocados na petição de embargos de declaração foram expressamente enfrentados no acórdão embargado, não havendo omissão a ser sanada.

A alegação de omissão quanto à preliminar de nulidade da prova - especialmente no que toca à apreensão de celular com base em denúncia anônima e provas derivadas - resta superada com a prolação do voto divergente e vencido, proferido pelo Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, que acolheu a tese na forma pretendida pelos embargantes (ID 45361865), sendo certo que, conforme o § 3° do art. 941 do CPC: “O voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de pré-questionamento”.

Por outro lado, o voto condutor do julgado, de relatoria do ilustre Desembargador Eleitoral Gerson Fishmann, concluiu pela caracterização da captação ilícita de sufrágio a partir das provas testemunhal e documental, colhidas durante a instrução processual, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, em relação aos eleitores Cláudio Nilto Machado, Márcio Santos e Rodrigo Tavares, suficientemente superando as alegações envolvendo a produção de provas na fase inquisitorial, nos seguintes termos:

(…)

Esse fato, ao contrário dos demais, foi confirmado por Cláudio Nilto Machado em juízo, o qual disse que o nome de seu pai é Ricardo, que é conhecido na cidade como o “piá do Ricardo”, reconheceu a conversa localizada no celular apreendido, e tão somente afirmou que o favor acabou não sendo prestado:

Promotor: Tá, o senhor se recorda de ter mandado uma foto do teu titulo de eleitor pra ele?

Cláudio: Sim.

Promotor: Com que objetivo?

Cláudio: Não é que todo mundo pensa que eu não votava ali no caso, porque a gente tava morando dentro na reserva indígena né, e daí todo mundo desconfiava que eu não votava em Miraguaí, e daí eu disse assim então eu vou mandar no caso, mas sem interesse nenhum né era só para mostrar que eu era eleitor de Miraguaí né.

Promotor: E porque era tão importante demonstra isso pra ele?

Cláudio: É que bom, não tenho resposta pra isso.

(grifo original)

 

A captação ilícita de sufrágio, quanto a Cláudio, resta demonstrada, ainda que o eleitor não tenha resposta para justificar a foto do seu título de eleitor, uma vez ter reconhecido que seu objetivo era garantir ao candidato que efetivamente vota em Miraguaí.

(…)

De igual modo, foi demonstrada a captação ilícita de sufrágio no que se refere ao eleitor Márcio Santos, o qual, em 16.10.2022, enviou mensagem de texto para Valdelírio Pretto solicitando um vale-gasolina, ao que o candidato responde “Vou passar aí”, momento em que Márcio fornece seu endereço residencial e período do dia em que fica em casa, conforme constatado no aparelho celular (ID 44924558, p. 58, 59 dos autos n. 0600001-95.2021.6.21.0101).

(…)

Em juízo, Márcio disse que a vantagem, relativamente à carona e ao vale-combustível, não foi prestada, mas confirmou o conteúdo da conversa, no sentido de que o candidato pediu para “esperar”, e o especial fim de agir, consistente na finalidade eleitoral das tratativas, na medida em que reconheceu que o contato foi realizado em razão das eleições, dizendo: “É costume né as vez né de os candidato de pedir alguma coisa né”:

Promotor: Seu Márcio o senhor confirma que falou com o prefeito né,

com o prefeito que seria eleito?

Márcio: Sim no dia 22 de outro de 2020.

Promotor: O senhor precisava levar alguém pra Três Passos, é isso?

Márcio: Tem meu sogro que precisava de uma ajuda mas.

Promotor: E Luis Machado e Eleda Machado?

Márcio: São meus sogros.

Promotor: Teus sogros, e eles efetivamente foram levados a Três

Passos?

Márcio: Não.

Promotor: Mas o candidato respondeu ta bom diz pra eles aguardar,

certo?

Márcio: Sim, ele só falo espera.

Promotor: Só falo isso?

Márcio: Sim.

Promotor: O senhor lembra de ter pedido um vale gasolina para o

prefeito?

Márcio: Sim, eu pedi pra ele.

Promotor: Ele te respondeu como?

Márcio: Agora não me lembro.

Promotor: ta mas o senhor reconhece a conversa né, porque você foi

falar justamente com o candidato sobre isso?

Márcio: É costume né as vez né de os candidato de pedir alguma

coisa né (Inaudível).

Promotor: O senhor foi falar porque ele era candidato.

Márcio: É.

Promotor: O senhor acreditou que ele iria dar a vantagem?

Márcio: Eu achei que ele ia me dar, mas não me deu.

Promotor: Ele confirmo no Whatsaap que ia dar isso.

Márcio: Não me lembro agora disso.

Promotor: Bom com a conversa aqui eu to satisfeito.

(Grifos originais)

 

Portanto, há provas seguras e incontroversas relativamente à captação de sufrágio do eleitor Márcio Santos.

No que concerne ao eleitor Rodrigo Tavares, foi constatada mensagem de celular, enviada no dia das eleições, 15.11.2022, para o candidato Valdelírio Pretto da Silva, agradecendo ao recorrido porque “o senhor me arrumou o material para o banheiro”:

Eu só quero agradecer a sua atenção e ajuda que me deu muito obrigado mesmo de coração s2 eu sou o Rodrigo Tavares aqui do Irapua onde o senhor me arrumou o material para o banheiro – pode ter certeza que aqui somos mais você só peço a Deus que ele te abençoe hoje e sempre e que tudo de certo para nois rumo a vitória. S2 s2 Deus nos abençoe

 

Em juízo, Rodrigo confirmou a conversa, esclarecendo que a ajuda do candidato consistiu em sua indicação ao dono de uma loja para fins de obtenção de crédito, e o proprietário da loja de materiais de construção, Francisco Osmar Wagner, confirmou que o eleitor comprou “tijolo e areia pro banheiro dele, talvez por indicação do seu Preto”, e que o pagamento foi realizado por Rodrigo em “quatro ou cinco parcelas”, ou seja, o eleitor conseguiu efetuar a compra a crédito, justamente a vantagem desejada pelo eleitor.

 

Transcrição do depoimento de Francisco:

Advogados Robson e Rolemberg: Alguma vez o Pretinho pagou algum material de construção pra esse senhor, esse Rodrigo?

Francisco: Não não não.

Advogados Robson e Rolemberg: O senhor vendeu esse material pra ele?

Francisco: Esse Rodrigo comprou alguma coisa lá eu acho que se não me engano tijolo e areia pro banheiro dele, talvez por indicação do seu Preto, mas nada em nome do seu Rodrigo.

Advogados Robson e Rolemberg: E quem fez os pagamentos?

Francisco: Ele mesmo.

Advogados Robson e Rolemberg: O Rodrigo?

Francisco: (Sinal afirmativo), e no caixa, mensal né, foi parcelado em quatro ou cinco parcelas.

Advogados Robson e Rolemberg: E quem fez os pagamentos?

Francisco: Ele mesmo.

Advogados Robson e Rolemberg: O Rodrigo?

Francisco: (Sinal afirmativo), e no caixa, mensal né, foi parcelado em quatro ou cinco parcelas.

(...)

Embora quanto a tais eleitores as provas não tenham sido judicializadas, restou plenamente demonstrada a captação ilícita de sufrágio no que se refere aos eleitores Cláudio Nilto Machado, Márcio Santos e Rodrigo Tavares, em relação aos quais não há somente provas colhidas exclusivamente na fase inquisitorial, e sim elementos de convicção submetidos ao rito do contraditório judicial.

Conforme a jurisprudência da Corte Superior Eleitoral, inexiste impedimento para que o julgador embase o seu convencimento em provas colhidas na fase inquisitorial, desde que somadas àquelas produzidas durante a instrução processual (TSE - Agravo de Instrumento n. 3270, Rel. Min. Edson Fachin, DJe 06.05.2021).

(...)

 

No mesmo sentido, cumpre transcrever as considerações apresentadas no voto do Excelentíssimo Desembargador Presidente Francisco José Moesch, o qual ressaltou que as provas contra os eleitores Cláudio Nilto Machado, Márcio Santos e Rodrigo Tavares, que embasam o resultado da demanda, foram produzidas durante a instrução processual, afastando-se a alegação de nulidade da prova coligida na fase investigativa:

(…)

Entretanto, foi devidamente apurada a existência de farta prova da infração em questão, mediante corrupção eleitoral quanto aos eleitores Cláudio Nilto Machado, Márcio Santos e Rodrigo Tavares, em relação aos quais não há provas colhidas exclusivamente na fase inquisitorial.

A propósito, consigno que estou plenamente de acordo com o entendimento de que inexiste impedimento para que o julgador embase o seu convencimento em provas colhidas na fase inquisitorial, desde que somadas àquelas produzidas durante a instrução processual, conforme ocorreu no caso concreto.

(…)

 

Verifica-se, assim, que o acórdão tratou de forma expressa a questão preliminar de nulidade da prova, o que culminou no parcial provimento do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral, para julgar parcialmente procedente a representação por captação ilícita, relativa aos candidatos aos cargos de prefeito e de vice-prefeito, cassando-lhes o diploma e aplicando multa ao prefeito.

Desse modo, quanto ao ponto os embargantes buscam a rediscussão do assunto afeto ao acerto ou desacerto da decisão (mérito), pretensão que não se coaduna com a finalidade da via processual eleita.

Ainda, no tocante ao prequestionamento da matéria indicada nos embargos, para fins de interposição de recurso perante as instâncias superiores, ressalto que o primordial para o conhecimento dos recursos especial e extraordinário é o enfrentamento da questão jurídica discutida nos autos, o que ocorreu adequadamente no caso em tela.

Por fim, cumpre referir que o art. 1.025 do CPC adotou o prequestionamento ficto, tendo em vista que assim dispõe: "Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que a embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

 

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.