REl - 0600930-74.2020.6.21.0001 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/01/2023 às 09:30

 

VOTO

 

Da Admissibilidade

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Da Preliminar de Nulidade da Sentença, por Cerceamento de Defesa e Inobservância do Devido Processo Legal

O recorrente suscita, em preliminar, nulidade do processo por cerceamento de defesa, uma vez que não teve vista do laudo conclusivo que opinou pela desaprovação das contas, e por ofensa ao devido processo legal, haja vista que o Ministério Público Eleitoral não se manifestou sobre o parecer técnico conclusivo.

Não assiste razão ao recorrente.

Consoante anotei na decisão de ID 45185406, as manifestações do Ministério Público Eleitoral em primeiro grau foram realizadas, equivocadamente, com registro de sigilo, o qual foi removido nesta instância.

Destarte, houve regular pronunciamento do Ministério Público Eleitoral nos autos, tendo sido, sob ID 45024485, juntado parecer, após a emissão do parecer conclusivo e antes da prolação da sentença.

No que concerne ao alegado cerceamento de defesa, a prefacial também não merece acolhimento, pois não houve afronta ao rito estabelecido na Resolução TSE n. 23.607/19, notadamente nos arts. 69 a 74.

Deveras, após a emissão do parecer técnico conclusivo, no qual sejam apontadas irregularidades, deve ser dada vista dos autos ao prestador exclusivamente na hipótese de ainda não ter sido dada oportunidade específica de manifestação.

Compulsando os autos, observo que o primeiro laudo técnico que vislumbrou falhas na contabilidade foi juntado sob ID 45024412. Após, o partido, regularmente intimado (IDs 45024415, 45024420, 45024421), deixou decorrer in albis o prazo para se defender (ID 45024423), sobrevindo parecer conclusivo (ID 45024479), que não inovou, mas apenas manteve os apontamentos anteriormente descritos no parecer preliminar.

Não há, portanto, que se falar em cerceamento de defesa.

Assim, devem ser rejeitadas as preliminares arguidas.

Do Mérito

No mérito, as contas foram desaprovadas porque não foram satisfatoriamente comprovadas as despesas quitadas com recursos do FEFC, relativamente ao fornecedor BRUNO GABRIEL CASTRO VEIGA, sobre o qual “não foi possível localizar o documento fiscal, ou de outra natureza, que comprovasse o valor de R$ 350,00”, e com serviços advocatícios, tendo em vista que, “nas informações constantes no documento de comprovação da despesa  efetuada com o contrato de prestação de honorários feitos com o advogado JOSÉ LUIS BLASZAK (CPF 416.137.160-87), cujo pagamento declarado, segundo o extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE no site http://divulgacandcontas.tse.jus.br, teria sido de R$ 10.000,00 (dez mil reais), originários também do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, o que diverge do estipulado no item “Da Remuneração Pelos Serviços Prestados” do contrato de prestação de serviço entabulado pelas partes, que indica o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)”.

Assim, ante a ausência de adequada comprovação dos gastos realizados com recursos públicos, a sentença determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 5.350,00.

Em suas razões, a agremiação limita-se a pugnar pela aprovação das contas com ressalvas, com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, porquanto o total das irregularidades perfaz 6,68% da receita declarada.

Na linha da manifestação ministerial, o recurso merece provimento.

A jurisprudência remansosa do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, perfilada por esta Corte, é no sentido de que, no julgamento das contas de órgãos partidários e candidatos, quando o percentual das falhas seja inferior a 10% do total da receita arrecadada ou quando se situe em patamar abaixo de R$ 1.064,10, impõe-se a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, para que sejam aprovadas com ressalvas.

Colaciono, a seguir, ementas de arestos de ambos tribunais:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADA FEDERAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. VALOR DIMINUTO DAS IRREGULARIDADES, CONSIDERADO SEU PERCENTUAL. ATÉ O LIMITE DE 10%. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 30/TSE. IRREGULARIDADES QUE NÃO COMPROMETEM A FISCALIZAÇÃO DAS CONTAS. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO–PROBATÓRIO DOS AUTOS. INVIABILIDADE. SEDE ESPECIAL. SÚMULA Nº 24/TSE. AGRAVO DESPROVIDO.

1. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade podem ser aplicados para aprovar, com ressalvas, as contas cujas falhas identificadas constituam valor percentual ou valor absoluto módico.

2. O montante equivalente a 1.000 (mil) Ufirs – R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) – é considerado diminuto e, isoladamente, inapto a ensejar a desaprovação de contas.

3. Ao lado desse critério, examina–se o percentual correspondente ao vício impugnado que, segundo precedentes desta Corte, alcança o limite máximo de 10% do total da arrecadação ou despesa.

4. Na espécie, conforme consta do aresto regional, embora as falhas apuradas tenham valor absoluto superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), representam valor percentual pouco significativo, pois inferior a 5% do total das despesas de campanha, afigurando–se inaptas a prejudicar, de modo irremediável, a regularidade das contas.

5. Não se conhece de recurso especial manejado com amparo na divergência jurisprudencial quando a decisão verberada está em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior, nos termos da Súmula nº 30/TSE.

6. Para alterar a conclusão do acórdão regional que assentou que as irregularidades são inaptas a comprometer a fiscalização das contas, seria necessário o reexame do conjunto fático–probatório dos autos, providência inviável em sede especial, por força do enunciado da Súmula nº 24/TSE.

7. Agravo a que se nega provimento.

(AgR-REspEl n. 060169270, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 244, Data 25.11.2020).

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. VALOR DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC REPASSADO AO PARTIDO. VALOR INSIGNIFICANTE. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato, relativas às eleições de 2020, em razão de, ao final da campanha, ter havido o repasse de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) à agremiação partidária, e não ao Tesouro Nacional.

2. O repasse das verbas do FEFC não utilizadas ao partido, e não aos cofres públicos, contraria o disposto no art. 17, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Contudo, a falha de valor tão diminuto não poderia conduzir à desaprovação das contas, cuja quantia representa 0,08% do montante de recursos arrecadados. Aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

4. Provimento parcial.

(TRE-RS, REl n. 0600914-87.2020.6.21.0012, Acórdão, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 02.5.2022). Grifei.

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. PRELIMINAR AFASTADA. PENALIDADE NÃO APLICADA NA ORIGEM. SUSPENSÃO DE REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PRECLUSÃO. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. VALOR INEXPRESSIVO E DE BAIXA REPRESENTATIVIDADE DIANTE DO TOTAL ARRECADADO. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IMPUGNADA AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A SANÇÃO DE MULTA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

(...)

2. Recebimento de recursos de origem não identificada. Falha de valor absoluto irrisório e correspondente a 9,80% das receitas auferidas pelo partido no período sob exame. Aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas o ajuste contábil. Circunstância que afasta a aplicação de multa, mas não a determinação de recolhimento da quantia impugnada ao Tesouro Nacional.

3. Provimento.

(TRE-RS, RE n. 23-88.2018.6.21.0076, Acórdão, Relator: Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 30.9.2020, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 08.10.2020). Grifei.

 

No que tange à própria caracterização das falhas e à determinação de recolhimento de R$ 5.350,00 ao Tesouro Nacional, a agremiação não formulou qualquer esclarecimento ou impugnação específica, inviabilizando a revisão dos fundamentos não atacados no recurso, tendo em vista o princípio do tantum devolutum quantum apellatum e os termos do art. 932, inc. III, do CPC e da Súmula n. 26 do TSE.

Nesse passo, deve ser dado provimento ao apelo apenas para que as contas do partido sejam aprovadas com ressalvas, mantida a determinação de recolhimento de valores aos cofres públicos.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas do Diretório Municipal do CIDADANIA de Porto Alegre, relativamente às eleições de 2020, mantida a determinação de recolhimento R$ 5.350,00 ao Tesouro Nacional.