REl - 0600622-03.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/01/2023 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, em razão de dois depósitos em espécie realizados no mesmo dia, no total de R$ 1.300,00.

No caso dos autos, o extrato bancário da conta de campanha apresenta dois depósitos em dinheiro nos valores de R$ 1.000,00 e R$ 300,00 (10.11.2020.), cujo depositante foi identificado com o CNPJ do próprio candidato, em contrariedade ao art. 21, inc. I, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece o limite de R$ 1.064,09 para depósitos bancários em espécie, ainda que efetuados na mesma data:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

§ 6º É vedado o uso de moedas virtuais para o recebimento de doações financeiras.

 

Ademais, embora o prestador tenha declarado nas contas que o dinheiro é proveniente de recursos próprios, observa-se que o recibo de depósito não identifica o CPF do depositante, apenas o CNPJ do próprio candidato, circunstância que impossibilita à Justiça Eleitoral verificar a autenticidade da declaração de que o valor se trata de recurso pessoal aplicado na campanha.

Ressalto que é firme o posicionamento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, em virtude da ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário.

Consigno, a tal respeito, que a Corte Superior entende que a obrigação das doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária não constitui mera exigência formal, sendo que o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

No caso dos autos, inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos ou por qual motivo não foram realizados depósitos por transferências bancárias de modo conjunto, impossibilitando que a falha seja relevada.

O recorrente colacionou junto à peça recursal (ID 44923042) a sua declaração de imposto de renda, com a qual pretende demonstrar sua capacidade financeira e a origem da quantia recebida.

Entretanto, não está em discussão sua capacidade financeira para doação de recursos para sua campanha, mas a comprovação da origem do recurso depositado em sua conta, que não foi efetuado por transferência bancária.

Ademais, na conta de campanha, após o depósito em espécie efetuado no dia 10.11.2020, houve dois saques nos valores de R$ 1.000,00 e R$ 300,00 (11.11.2020.), os quais não têm o condão de sanar a falha apontada na sentença, conforme requer o recorrente, pois não há identificação do destinatário dos saques.

É dizer: não há, nos extratos, os dados da pessoa que recebeu os valores, uma vez que a quantia foi debitada da conta na forma de saque em dinheiro, conforme se verifica no Divulga Cand Contas, no seguinte endereço <https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88536/210000881535/extratos>.

Consequentemente, não há como se comprovar, pela documentação trazida aos autos, as teses recursais de que o valor depositado na conta de campanha tem origem em recursos próprios e de que o candidato tentou sacar o dinheiro para corrigir a falha.

A utilização do valor irregularmente depositado em dinheiro contraria o disposto no § 3º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina a não utilização de valores recebidos de forma diversa do que prescreve o art. 21, caput e seus incisos, sendo considerados RONI caso utilizados.

Tal exigência normativa visa assegurar a rastreabilidade dos recursos (origem e destino) recebidos pelos candidatos, o que resta comprometido quando a operação é feita por meio diverso, como realizado pelo recorrente.

O raciocínio é que o descumprimento da exigência de transferência bancária ou de cheque nominal cruzado não fica suprido pela realização de depósito em espécie identificado por determinada pessoa, circunstância que não se mostra apta para comprovar a efetiva origem do valor devido à ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário.

Friso que não se discute a capacidade financeira do candidato, mas a falta de observância da norma eleitoral que determina que doações acima de R$ 1.064,09, inclusive com recursos próprios, devam ser efetuadas pelo sistema bancário.

Destarte, o depósito em dinheiro igual ou acima de R$ 1.064,10, ainda que do próprio candidato, é meio incapaz de comprovar a efetiva origem da receita devido à natureza essencialmente declaratória do ato e, mesmo alegando, em suas razões, equívoco no procedimento, não afasta a irregularidade.

Não se trata de análise da boa ou má-fé dos prestadores, ou de hipótese de malversação e desvio dos recursos públicos recebidos, mas de manifesto e injustificável descumprimento de norma eleitoral aplicável a todos os candidatos.

Dessa forma, as razões recursais e a documentação acostada às contas são insuficientes para sanar a irregularidade em questão.

No caso concreto, tendo em vista que os depósitos em dinheiro realizados na conta bancária caracterizam recursos de origem não identificada, a quantia recebida deve ser recolhida ao Tesouro Nacional com fundamento no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesses termos, o recurso não comporta provimento em virtude da irregularidade de R$ 1.300,00 representar 31,01% do total das receitas financeiras, no montante de R$ 4.192,00, e ultrapassar o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a Resolução TSE n. 23.607/19 considera módico.

Com essas considerações, não é adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, pois a falha é grave e compromete de forma insanável a confiabilidade da movimentação financeira.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 1.300,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.