REl - 0600545-49.2020.6.21.0059 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/01/2023 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a controvérsia restringe-se à autoria das publicações e à caracterização das postagens impugnadas como sendo divulgação de pesquisa sem registro, mediante veiculação no perfil “VIAMÃO 24 HORAS”, na rede social Facebook, sob a responsabilidade de ROGÉRIO LUIS FRANQUI VARGAS, recorrente.

Preliminar. Pedido de exclusão da parte. 

Desde já, entendo por afastar o pedido de exclusão da parte representada, proposta sob a alegação de nunca ter sido “notificado de que contra ele tramitava um litígio na Justiça Eleitoral”.

Embora a certidão que registra a citação do representado “VIAMÃO 24 HORAS”, integrante dos autos, de fato não indicar o nome do usuário (pessoa física) responsável pelo perfil, é incontestável que ROGÉRIO LUIS FRANQUI VARGAS respondia pela página da veiculação impugnada, a qual registrava nas informações o endereço eletrônico rogerio_teio@yahoo.com.br, e telefone para contato +55(51) 989 430 302, apontados na inicial.

Ademais, o cartório certificou a citação pessoal do representado da decisão que determinou a retirada da publicação impugnada e a abertura de prazo para defesa em 11.11.2020, bem como a obediência à ordem judicial de retirada da postagem, no mesmo dia, a demonstrar a efetividade da intimação.

Igualmente, não é de viável aceitação a tese de que a divulgação foi em perfil de nome semelhante (Viamão 24 Horas!(Oficial), do usuário Douglas Santos, pois a imagem trazida na inicial com a postagem tida por irregular pertence, evidentemente, ao representado Rogério. Observo que os nomes se assemelham, mas os logotipos dos perfis são absolutamente diferentes, não restando dúvidas quanto à responsabilidade.

Afasto o pedido de exclusão, portanto.

Isto posto, passo à análise do teor da publicação.

No caso, o juízo a quo, em decisão liminar, considerou que “da análise da “pesquisa”, verifica-se desrespeito flagrante ao art. 10 da Resolução nº 23.600/19, cujos critérios exigidos (período de realização de coleta; margem de erro; nível de confiança; número de entrevistas; nome da entidade ou empresa que realizou e número do registro de pesquisa) são essenciais para nutrir o eleitor de informações idôneas”.

Saliento que, de fato, estão ausentes os elementos indicando a margem de erro; metodologia; nível de confiança; nome da entidade ou empresa que realizou a pesquisa, bem como o número do registro de pesquisa.

Nesta instância, a Procuradoria Regional opinou pela existência de ilícito eleitoral, mas manifestou-se pelo provimento parcial do recurso por considerar que os dados são superficiais e sem amparo em métodos técnicos ou científicos, de modo que não deve ser caracterizado como pesquisa à luz da legislação de regência, mas, no máximo, como resultado de algo assemelhado à enquete.

Acerca de pesquisas de opinião, o art. 33 da Lei n. 9.504/97 dispõe, in verbis:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal. (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

§ 1º As informações relativas às pesquisas serão registradas nos órgãos da Justiça Eleitoral aos quais compete fazer o registro dos candidatos.

§ 2o  A Justiça Eleitoral afixará no prazo de vinte e quatro horas, no local de costume, bem como divulgará em seu sítio na internet, aviso comunicando o registro das informações a que se refere este artigo, colocando-as à disposição dos partidos ou coligações com candidatos ao pleito, os quais a elas terão livre acesso pelo prazo de 30 (trinta) dias.             (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinqüenta mil a cem mil UFIR.

§ 4º A divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, punível com detenção de seis meses a um ano e multa no valor de cinqüenta mil a cem mil UFIR.

 

E, por seu turno, o § 5º do art. 33 da Lei n. 9.504/97 (acrescido pelo art. 3º da Lei n. 12.891/13) assim determina:

(...)

§ 5º é vedada, no período de campanha eleitoral, a realização de enquetes relacionadas ao processo eleitoral.

 

Na mesma linha, a Resolução TSE n. 23.600/19, que trata das pesquisas eleitorais nas eleições 2020, assim estabelecia, na redação da época, em seu art. 23 e §§ 1º a 3º:

Art. 23. É vedada, a partir da data prevista no caput do art. 36 da Lei nº 9.504/1997, a realização de enquetes relacionadas ao processo eleitoral. (Vide, para as Eleições de 2020, art. 4º da Resolução n. 23.624/2020)

§ 1º Entende-se por enquete ou sondagem o levantamento de opiniões sem plano amostral, que dependa da participação espontânea do interessado, e que não utilize método científico para sua realização, quando apresentados resultados que possibilitem ao eleitor inferir a ordem dos candidatos na disputa.

§ 2º A partir da data prevista no caput deste artigo, cabe o exercício do poder de polícia contra a divulgação de enquetes, com a expedição de ordem para que seja removida, sob pena de crime de desobediência.

§ 3º O poder de polícia não autoriza a aplicação de ofício, pelo juiz eleitoral, de multa processual ou daquela prevista como sanção a ser aplicada em representação própria (Súmula TSE n. 18).

 

Por fim, a Resolução TSE n. 23.624/20, a qual dispõe sobre o Calendário Eleitoral das Eleições 2020, informa o dia 27.9.2020 como data a partir da qual não é permitida a realização de enquetes relacionadas ao processo eleitoral.

Portanto, nos termos do § 1º do art. 23 da Resolução TSE n. 23.600/19, “Entende-se por enquete ou sondagem o levantamento de opiniões sem plano amostral, que dependa da participação espontânea do interessado, e que não utilize método científico para sua realização, quando apresentados resultados que possibilitem ao eleitor inferir a ordem dos candidatos na disputa”.

Ou seja: parece claro que a pesquisa eleitoral stricto sensu – aquela devidamente registrada na Justiça Eleitoral – difere da enquete ou sondagem.

E para distinguir com clareza os aspectos atinentes a cada forma de pesquisa de opinião pública, recorro à doutrina que bem abordou o tema (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016. p. 442):

A pesquisa eleitoral não se confunde com enquete ou sondagem. Com efeito, enquete ou sondagem consiste em um mero levantamento de opiniões, sem controle de amostra, que não utiliza método científico para sua realização, dependendo apenas da participação espontânea do entrevistado. A Lei nº 12.891/13 incluiu o §5º do art. 33 na LE, prevendo que “é vedada, no período de campanha eleitoral, a realização de enquetes relacionadas ao processo eleitoral". A regra proíbe a divulgação de tudo o que não se caracterize tecnicamente como pesquisa eleitoral, abrangendo tanto a realização de enquete como de sondagens. A vedação estabelecida ocorre desde que a enquete seja relacionada ao processo eleitoral, ou seja, faça referência a candidatos, partidos ou eleições. (Grifei.)

Nota-se que o doutrinador entende que a enquete ou sondagem consiste em um mero levantamento de opiniões, sem controle de amostra, que não utiliza método científico para sua realização, dependendo apenas da participação espontânea do entrevistado.

Não desconheço que as pesquisas eleitorais possuem um papel importantíssimo para as campanhas eleitorais e escolha de candidatos. A avaliação constitui ferramenta ideal para verificação da disputa entre candidatos e a intenção de voto do eleitorado, muitas vezes espelhando e antevendo o desempenho no dia da eleição.

Penso, no entanto, que a postagem analisada nestes autos, retratando resultado de pergunta proposta em página de internet, “Se as eleições fossem hoje em quem você votaria?”, não se revelam como uma pesquisa eleitoral propriamente dita. Ademais, não há nos autos elementos elucidativos a respeito da expressividade da página do Facebook, número de curtidas demonstrado ou de pessoas alcançadas pelas publicações, sem indicação de que o texto divulgado tenha aptidão para iludir o eleitorado.

Nessa toada, compreendo que se tratou de simples enquete ou sondagem, e não divulgação da pesquisa de opinião pública, sem possibilidade de induzir os eleitores a acreditar que se tratava de verdadeira pesquisa eleitoral. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral vem no mesmo sentido, ao compreender que “simples enquete ou sondagem, sem referência a caráter científico ou metodológico, não se equipara ao instrumento de pesquisa preconizado em referido dispositivo" (REspe754-92, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 20.4.2018). Transcrevo ementa, com grifos meus:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. DIVULGAÇÃO DE SUPOSTA PESQUISA ELEITORAL SEM PRÉVIO REGISTRO. FACEBOOK. PUBLICAÇÃO DE DADOS SUPERFICIAIS. MULTA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. VERBETES DAS SÚMULAS 24 E 30/TSE. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO. 1. A Corte Regional, instância exauriente na análise dos fatos e das provas, assentou que os dados publicados em página pessoal do Facebook não têm elementos mínimos para configurar pesquisa eleitoral, mais se assemelhando a enquete. 2. Segundo o Tribunal de origem, o texto divulgado não teve aptidão para iludir o eleitorado, diante da inexpressividade da página do Facebook, da primariedade da mensagem e do contingente ínfimo de pessoas pesquisadas. 3. A revisão do entendimento adotado pelo Tribunal a quo ensejaria o revolvimento das provas dos autos, providência vedada em sede extraordinária, a teor do verbete sumular 24 do TSE. 4. O acórdão regional está em consonância com a jurisprudência desta Corte em relação à incidência do art. 33 da Lei 9.504/97, firmada no sentido de que "simples enquete ou sondagem, sem referência a caráter científico ou metodológico, não se equipara ao instrumento de pesquisa preconizado em referido dispositivo" (REspe 754-92, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 20.4.2018). Precedentes. Incidência do verbete da Súmula 30 do TSE. 5. O entendimento do Tribunal de origem encontra respaldo na orientação juris-prudencial desta Corte, no sentido de que a incidência da multa por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro exige a presença de alguns elementos mínimos de formalidade para que seja considerada pesquisa de opinião, sem os quais o texto pode configurar mera enquete ou sondagem, cuja divulgação prescinde de registro e não enseja a aplicação de sanção pecuniária. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (TSE - Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 38792 - Ministro Sergio Silveira Banhos – Data: 30/08/2019). (Grifei.)

De outra sorte, de acordo com a Lei das Eleições e a Resolução TSE n. 23.600/19, para a realização de pesquisa eleitoral é necessário que a empresa responsável informe à Justiça Eleitoral: quem a contratou; valor e origem dos recursos despendidos no trabalho; metodologia e período de realização da pesquisa; intervalo de confiança e margem de erro; questionário completo aplicado ou a ser aplicado; nome de quem pagou pela realização do trabalho; e cópia da respectiva nota fiscal.

Ademais, a divulgação de pesquisas eleitorais que não estejam devidamente registradas é considerada como um ilícito eleitoral gravíssimo, que sujeita os responsáveis à pena de multa de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais), e não se mostra razoável punir o recorrente com a pesada multa prevista para a divulgação de pesquisa sem registro, quando é possível concluir pela inexistência de mínima potencialidade lesiva nas postagens realizadas, de modo que, diante da ausência de informações claras e específicas sobre dados de efetiva pesquisa eleitoral e outros argumentos de ordem técnica, próprios de levantamentos estatísticos, considero que o material não atrai a penalidade prevista no § 3o do art. 33 da Lei n. 9.504/97.

De fato, a simples referência à investigação de intenções de obtenção de voto, desprovida de qualquer dado concreto, a exemplo da margem de erro, comparativos, índices, não se equipara à divulgação de pesquisa eleitoral, conforme já assentado por esta Corte Regional no julgamento da Representação n. 0600567-73.2020.6.21.0135, de relatoria do Des. Eleitoral Gustavo Alberto Gastal Diefenthaler, julgado na sessão de 10.11.2020, cuja ementa transcrevo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL. REDES SOCIAIS. DO CANDIDATO. FACEBOOK. NÃO CONFIGURADA. SIMPLES ENQUETE. PUBLICAÇÃO REMOVIDA. MULTA POR DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL IRREGULAR. AFASTADA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recurso em face de sentença que julgou procedente o pedido formulado, ao fundamento de ocorrência de divulgação de pesquisa eleitoral irregular, nos termos do art. 33, § 3º, da Lei das Eleições.

2. As postagens analisadas nestes autos não se revelam como pesquisa eleitoral, nem tiveram aptidão de induzir a vontade do eleitor, sendo incapazes de manipular o eleitorado, sobretudo diante da apresentação rudimentar utilizada. Comprovada a devida remoção das postagens veiculadas.

3. Diante da ausência de índices efetivos de desempenho entre candidatos, ou de outros argumentos de ordem técnica, próprios de levantamentos estatísticos, o material não atrai a penalidade prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 9.504/97, conforme já assentado por esta Corte Regional.

4. Provimento Parcial. Afastada a condenação ao pagamento de multa.
 

Assim, considerando que a postagem veiculada na rede social Facebook se trata de um levantamento informal de intenções de obtenção de voto, cabe reconhecer parcialmente os argumentos do recorrente, afastando a aplicação da penalidade prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

Registro ter sido certificada nos autos a devida remoção da postagem impugnada.

 

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto para afastar a condenação ao pagamento de multa por divulgação de pesquisa eleitoral irregular.