ED no(a) REl - 0600245-27.2020.6.21.0079 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2022 às 14:00

 

VOTO

 

Da Admissibilidade

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

 

Do Mérito

Passo à análise dos argumentos trazidos nos embargos declaratórios.

 

1. Da omissão quanto às provas, peças ou argumentos que fundamentaram o pedido e o deferimento das interceptações telefônicas.

Quanto ao tópico, assim alega o embargante:

Conforme entendimento exarado no voto condutor da divergência a instauração do PIC se deu em razão de denúncia efetuada por Rosalina, a qual compareceu na Promotoria Eleitoral, prestou depoimento e forneceu imagens, áudios e vídeos da possível prática de crimes de corrupção eleitoral. Destacou que o MPE ajuizou ação de quebra de sigilo autuada sob o n. 0600242- 72.2020.6.21.0079 e que o pedido de interceptação telefônica “fundamentou-se em vários outros elementos de prova, que de forma autônoma e independentes seriam suficientes ao deferimento da medida, mesmo desconsiderados os arquivos de áudios denominados “Voz 011 e “Voz 014”.

Na sequência, asseverou que:

“Ainda que eventualmente utilizados os conteúdos dos áudios de “voz 11” e  “voz 14” para formação do juízo de deferimento da medida (o que não está expresso na decisão de ID 44850914), não foram essas gravações utilizadas como fundamento da condenação dos recorrentes”

No ponto, o acórdão incorre em omissão por ausência de fundamentação. O voto do relator consignou que a decisão que deferiu as interceptações telefônicas “não faz referência específica à provas, peças ou argumentos que sustentariam a sua conclusão [...]”, sendo, portanto, eivada de nulidade ante “violação ao art. 93, inc. X, da CF/88 e ao art. 5º da Lei n. 9.296/92, da qual decorre a nulidade da decisão judicial de interceptação telefônica e de todas as demais provas colhidas ao longo da instrução, pois delas derivas”.

Deve, portanto, ser sanada a omissão no sentido de que se esclareça de forma clara e objetiva quais foram as provas, peças ou argumentos que sustentaram o deferimento das interceptações telefônicas.

 

Não assiste razão ao embargante.

O Colegiado, por maioria, considerou válida a prova decorrente das mensagens de áudio de whatsapp enviados por Ananias para Rosalina e por ela entregues ao Ministério Público Eleitoral.

O voto condutor da divergência em relação à nulidade da prova, proferido pelo eminente Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, é claro no sentido de reconhecer que tais arquivos, juntamente com as declarações prestadas pela própria Rosalina, constituem base probatória autônoma e independente das gravações ambientais, suficientes para fundamentar a decisão que autorizou as interceptações telefônicas, cabendo a transcrição dos seguintes trechos:

Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle (Voto-Vista):

 

Adianto que minha divergência é parcial, apenas para considerar válida a decisão que deferiu a interceptação telefônica e, por via de consequência, as provas dela decorrentes.

[…].

Os arquivos de voz “Voz 011.m4a” e “Voz 014.m4a” efetivamente são gravações realizadas por Rosalina, sem o conhecimento dos demais interlocutores. O “Voz 011.m4a” decorre de uma visita de Ananias e Vasco, no dia 07.11.2020, na casa de Rosalina e o “Voz 014.m4a” refere-se à visita de Vasco, no dia 09.11.2020, igualmente na casa de Rosalina.

Relativamente a essas duas gravações (“Voz 011.m4a” e “Voz 014.m4a”), acompanho o Eminente Relator.

[…].

Entrementes, divirjo do posicionamento do Eminente Relator quando “afirma a nulidade de todo o acervo probatório”, que “O mesmo (raciocínio quanto às gravações) se estende aos arquivos de áudios identificados com os números 02, 03 e 04, enviadas por Ananias, por meio do aplicativo Whatsapp, à Rosalina, pois obtido com violação à intimidade e à privacidade da comunicação particular, sem autorização judicial prévia e sem o conhecimento de um dos interlocutores” (inclusive da interceptação telefônica deferida).

Isso porque os arquivos de WhatsApp identificados com os números 02, 03 e 04, enviados por Ananias Dorneles Soares Sobrinho à Rosalina Gonçalves Messa, não se equiparam à captação clandestina, pois foram produzidos e enviados pelo próprio recorrente, obviamente com pleno conhecimento de sua própria fala que estava sendo gravada por ele mesmo. E, como adiante será demonstrado, a interceptação telefônica autuada sob n. 0600242-72.2020.6.21.0079 é válida.

Como esclarecido no voto do Relator, a investigação relacionada ao caso iniciou a partir de denúncia de Rosalina Gonçalves Messa, acompanhada de áudios e vídeos, envolvendo possível prática de captação ilícita de votos, o que também foi apresentado por meio de uma “live” realizada pela denunciante em rede social, na noite de 10.11.2020.

Com base em tais elementos de informação, o Ministério Público Eleitoral instaurou o Procedimento Investigatório Criminal (PIC) n. 00881.001.148/2020, para apurar os eventuais ilícitos penais, no qual houve o requerimento de interceptação telefônica e telemática, autorizadas judicialmente, de Vasco Henrique Asambuja de Carvalho, Jeremias Izaguirre de Oliveira e Ananias Dorneles Soares Sobrinho.

Como constou na sentença , o Ministério Público Eleitoral instaurou o PIC para apurar a prática, em tese, do crime de corrupção eleitoral, no qual foram investigados como possíveis autores dos fatos, o candidato a vereador Vasco Henrique Asambuja de Carvalho, o candidato a vice-prefeito Jeremias Izaguirre de Oliveira, Ananias Dorneles Soares Sobrinho (apoiador do candidato Vasco), Nara Hidê Luiz dos Santos Silveira (irmã do candidato a vereador Antônio Ebertom Luiz dos Santos) e Rosalina Gonçalves Messa (eleitora que teria vendido seu voto).

A instauração do PIC se deu em razão de denúncia efetuada por Rosalina, a qual compareceu na Promotoria Eleitoral, prestou depoimento e forneceu imagens, áudios e vídeos da possível prática de crimes de corrupção eleitoral.

Com base em tais elementos, o MPE ajuizou ação de quebra de sigilo, autuada sob o n. 0600242-72.2020.6.21.0079, visando à interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas de Vasco, Jeremias e Ananias. O pedido de interceptação telefônica, cuja peça inicial foi juntada na própria defesa de Jeremias Izaguirre de Oliveria e Paulo Renato Cortelini (ID 44850911), fundamentou-se em vários outros elementos de prova, que de forma autônoma e independente seriam suficientes ao deferimento da medida, mesmo desconsiderados os arquivos de áudios denominados “Voz 011” e “Voz 014”.

 

Logo, não havendo deficiência no acórdão, rejeito a alegada omissão.

 

2. Da contradição interna no voto condutor da divergência em relação à não ocorrência de flagrante preparado e das omissões no enfrentamento da questão pelos demais julgadores.

No segundo ponto, o embargante sustenta contradição e omissão no acórdão, tecendo os seguintes argumentos:

Do mesmo modo, há contradição interna no acórdão, na medida em que o voto divergente adotando a mesma justificativa da sentença (devidamente impugnada no recurso) aduziu que não houve flagrante preparado:

Contudo, nos áudios de “Voz 11” e “Voz 14”, os interlocutores agem de forma espontânea, sem que se possa cogitar de flagrante preparado, sendo que não serão considerados apenas porque a jurisprudência do TSE firmou-se no sentido da ilicitude pelo motivo de que um dos interlocutores não teria conhecimento, independentemente da espontaneidade ou não da conversa.

Ocorre que no voto que acompanhou a divergência, houve reconhecimento do flagrante forjado:

No caso em exame, verifica-se que Rosalina forçou um pouco os diálogos a fim de obter o que buscava gravar. Nesse aspecto, considero que estas gravações seriam ilícitas, mas não contaminam a interceptação telefônica nem a quebra do sigilo, porque a decisão judicial não se baseou nas gravações para autorizar a quebra do sigilo telefônico ou as interceptações.

Cumpre destacar que os votos que acompanharam o relator adentraram na análise da questão do flagrante preparado justamente para aderir ao posicionamento do relator da contaminação de todas as provas:

[…].

Portanto, pelo que se depreende dos votos é que apenas os Desembargadores Caetano Lo Pumo, José Vinícius Japur, Luís Alberto D’azevedo Aurvalle e Vandereli Terezinha analisaram a questão sob a ótica do flagrante preparado. Sendo que os Desembargadores Caetano Lo Pumo, José Vinícius Japur e a Desembargadora Vanderlei Terezinha, reconheceram ter ocorrido flagrante preparado. Em sentido contrário, apenas o voto do Des. Federal Luís Alberto D’azevedo Aurvalle. Não consta no acórdão, portanto, o enfrentamento do fundamento nos votos da Desa. Kalin Cogo e do Presidente, Des. Francisco Moesch.

 

A alegada contradição envolve o confronto de considerações expostas no voto proferido pelo Des. Federal Aurvalle e no voto da Desa. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak.

Ocorre que, em relação à invalidade probatória das gravações ambientais produzidas por Rosalina, o voto do Des. Federal Aurvalle é expresso em consignar que, verbis: “relativamente a essas duas gravações (“Voz 011.m4a” e “Voz 014.m4a”), acompanho o Eminente Relator”, salientando, em suas razões, as recentes decisões do TSE pela ilicitude desse meio de prova quando feitas em ambiente privado sem o consentimento ou ciência inequívoca dos demais.

De seu turno, a ilustre Desa. Vanderlei Kubiak acompanhou o posicionamento pela ilicitude das gravações ambientais, no caso concreto, ressaltando fundamento diverso, qual seja, o induzimento de Rosalina aos diálogos.

Por pertinente, retomo as considerações do voto da Vice-Presidente e Corregedora deste Tribunal:

Desa. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak:

Em relação à preliminar, acompanho a divergência trazida pelo Des. Aurvalle, porque, em que pese o fato de aquela gravação ambiental ser considerada ilícita, em razão de ter sido colhida em ambiente privado sem o conhecimento dos interlocutores, dificilmente é algo a se questionar no entendimento acerca das gravações, pois, se a pessoa tem conhecimento de que está sendo gravada, evidentemente não falará nada que a comprometa. Enfim, há de se analisar caso a caso a licitude ou não da gravação.

No caso em exame, verifica-se que Rosalina forçou um pouco os diálogos a fim de obter o que buscava gravar. Nesse aspecto, considero que estas gravações seriam ilícitas, mas não contaminam a interceptação telefônica nem a quebra do sigilo, porque a decisão judicial não se baseou nas gravações para autorizar a quebra do sigilo telefônico ou as interceptações.

Nesse aspecto, acompanho a divergência trazida pelo Des. Aurvalle, que, sob minha ótica, apresenta a melhor interpretação a respeito da análise desses elementos iniciais que estamos verificando.

 

Cabe referir que ambos os aspectos, tanto o entendimento do TSE pela ilicitude das gravações ambientais quanto o induzimento de Rosalina, foram trabalhados no voto lançado por este Relator, sendo que a divergência havida consistiu, precipuamente, na ilicitude por derivação das provas que teriam sido produzidas a partir desses elementos.

Como ser percebe, não há de se falar em contradição, que somente estaria presente caso houvesse incongruência entre as razões adotadas pelo magistrado e suas conclusões. Há, em verdade, ênfase em fundamentos diversos, adotados por diferentes julgadores, mas convergindo para a mesma solução: a ilicitude das gravações ambientais feitas por Rosalina, as quais, porém, não contaminam as demais provas produzidas nos autos.

Além disso, sustenta o embargante omissão, alegando, quanto à tese de “flagrante preparado”, que “não consta no acórdão, portanto, o enfrentamento do fundamento nos votos da Desa. Kalin Cogo e do Presidente, Des. Francisco Moesch”.

Novamente, o argumento não procede.

Da leitura do acórdão, tem-se que os julgadores salientaram os pontos que consideram suficientes para o enfrentamento do tema, adotando, no mais, as razões contidas no voto inaugural da divergência. Assim, não se cogita em omissão quando os membros do Colegiado acompanham o voto anterior proferido por outro Julgador, que apreciou, fundamentadamente, as questões necessárias à solução da controvérsia.

Dessa forma, rejeito as alegações de contradição e omissão do presente tópico.

 

3. Da omissão em relação ao depoimento prestado por Rosalina junto ao Ministério Público Eleitoral.

Em sequência, o embargante refere omissão no acórdão “em relação ao depoimento prestado por Rosalina junto ao Ministério Público cuja degravação constou na íntegra dos autos, onde a denunciante revela ter se tratado de ‘armação'”.

Ocorre que a atuação de Rosalina, inclusive a apreciação do seu depoimento prestado perante o Ministério Público Eleitoral, restou analisada no seguinte trecho do voto proferido por este Relator sobre a preliminar de ilicitude da prova:

Com base em tais elementos de informação, o Ministério Público Eleitoral instaurou o Procedimento Investigatório Criminal n. 00881.001.148/2020, para apurar as eventuais ilícitos penais, no qual houve o requerimento de interceptação telefônica e telemática, autorizadas judicialmente, de Vasco Henrique Asambuja de Carvalho, Jeremias Izaguirre de Oliveira e Ananias Dorneles Soares Sobrinho (ID 44850913), todas deferidas com base nas gravações ambientais e em mensagens de Whatsapp entregues por Rosalina.

Com base nos elementos colhidos a partir das conversas telefônicas interceptadas, o Ministério Público Eleitoral requereu a apreensão e extração de dados dos telefones celulares de Vasco Henrique Asambuja de Carvalho, Jeremias Izaguirre de Oliveira, Ananias Dorneles Soares Sobrinho, Nara Hidê Luiz dos Santos Silveira e Rosalina Gonçalves Messa (ID 44850914, fls. 6-13), medida igualmente deferida pelo Juízo de origem.

Houve, ainda, a instauração do Procedimento Preparatório Eleitoral n. 01870.000.399/2020, no qual o Promotor de Justiça Eleitoral colheu o depoimento da denunciante Rosalina (ID 44850835), a qual relata que, há cerca de três anos, sua sobrinha teve câncer, quando foi feita uma campanha na rádio para angariar recursos em seu favor, por meio de Vanderlei, Robert e Jeremias. Ao final da campanha, disse que foi entregue cerca de R$ 800,00 à beneficiária. Porém, conta que tomou conhecimento de um “caderno” em que se registrava outros R$ 600,00 e uma “carga de gás” que foram arrecadados, mas que não teriam sido entregues à sua sobrinha e que a depoente julgava que teriam ficado com o Jeremias. Assim, admite que agiu por vingança ou retaliação contra Jeremias, pretendendo testar o caráter do candidato, razão pela qual gravou as conversas.

Conclui-se dos autos que Rosalina, desde o início, agiu imbuída da intenção de juntar provas em desfavor dos candidatos, ganhou a confiança de Vasco e Ananias e passou a atuar como “cabo eleitoral” da campanha, fomentando e intermediando a negociação de vantagens entre os eleitores, muitos por ela própria cooptados, e os candidatos.

Agiu, assim, como uma “agente infiltrada”, com participação ativa e relevante na realização dos fatos.

Ao final de empreitada, Rosalina divulgou, em 10.11.2020, uma live na internet, na qual narra os fatos, suas motivações e pede votos para o “11”, adversários dos candidatos recorrentes.

 

A avaliação da prova constou, igualmente, bem pontuada na declaração de voto lançada pelo eminente Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli:

Era evidente que ela, dona Rosalina, cujo nome na comunicação apareceu como Rosa, mas o correto é Rosalina, estava participando ativamente da campanha, e prova disso é uma manifestação de Jeremias de que “ela era 11, ela era progressista, mas agora é 15”, dando a entender que já estava familiarizada com as atividades de campanha e trabalhando em prol disso.

Entendo que aquelas circunstâncias, que ela mesma referiu perante o Ministério Público e depois confirmou em juízo, de que estava buscando, em suas próprias palavras, “uma vingança” com relação a Jeremias, pelo antecedente da vaquinha para obtenção de recursos para o tratamento de um familiar, ocasião em que teria supostamente desaparecido parte da quantia arrecadada, demonstram que o ingresso de Rosalina na campanha já era premeditado, e isso certamente acabou provocando essas conversas via WhatsApp antes das derradeiras gravações realizadas em 07.11 e 09.11. Digo isso porque o comparecimento dela, ou o envio da representação ao Ministério Público, data do dia 10.11, não obstante na sentença a magistrada refira que iniciou no dia 11.11, mas não, o correto é que foi instaurado procedimento preparatório investigativo no Ministério Público eleitoral no dia 10.11, ou seja, naquele dia ela já detinha todos esses elementos de prova, não só das conversações via WhatsApp como também daqueles arquivos de voz, 11 e 14, que, não sei por qual razão, não foram apresentados.

 

Desse modo, não se observa omissão no acórdão, pois os referidos votos, ainda que parcialmente vencidos em suas conclusões, são parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de prequestionamento (art. 941, § 3º, do CPC), sendo certo, ainda, que a dissidência de entendimentos havida no Plenário envolve a contaminação das interceptações telefônicas e das buscas e apreensões realizadas, e não, propriamente, a invalidade das gravações clandestinas feitas por Rosalina.

Com essas considerações, julgo que os argumentos do embargante, no aspecto, não merecem acolhimento.

 

4. Da contradição quanto à utilização das gravações ambientais ilícitas como fundamento para o reconhecimento dos abusos de poder político e econômico.

No tópico, o embargante invoca contradição no julgado, pois, embora se tenha decidido pela invalidade dos conteúdos dos arquivos de áudio referidos como “11” e “14”, houve trecho do acórdão indicando-os como provas dos fatos.

O trecho indicado envolve o voto por mim proferido sobre o mérito da demanda, assim redigido:

Ocorre que as gravações ambientais e as mensagens extraídas dos aparelhos celulares de Ananias e Jeremias comprovam o uso de valores particulares (“caixa 2”) para oferecer vantagens a diversos eleitores e instrumentalizar a compra de votos, com reiteração de condutas bastante graves e aptas a afetar a normalidade do pleito.

 

Com efeito, há erro material na passagem, devendo ser suprimida a referência às “gravações ambientais”, sem mudança da conclusão do excerto ou da julgado, pois as mensagens extraídas dos aparelhos celulares, consideradas provas lícitas, são suficientes, por si, para o convencimento exposto no voto.

Assim, acolho os embargos declaratórios no aspecto, a fim de corrigir erro material do julgado, suprindo a expressão “gravações ambientais” do mencionado excerto, que segue assim retificado:

Ocorre as mensagens extraídas dos aparelhos celulares de Ananias e Jeremias comprovam o uso de valores particulares (“caixa 2”) para oferecer vantagens a diversos eleitores e instrumentalizar a compra de votos, com reiteração de condutas bastante graves e aptas a afetar a normalidade do pleito.

 

5. Do erro material na preliminar de espelhamento do WhatsApp e da omissão acerca da ilegalidade dos prints que constam na inicial.

Ainda, o embargante defende erro material “no que tange à preliminar de espelhamento das mensagens de whatsapp”, pois não teria sido apreciada a questão acerca de ilegalidade dos prints anexados à petição inicial.

Ocorre que, conforme consta no recurso interposto pela parte ora embargante (ID 44851028), a preliminar suscitada limitou-se à ilicitude das gravações realizadas por Rosalina e da prova decorrente das gravações clandestinas, matéria detidamente analisada e discutida no acórdão.

Dessa forma, a tese de ilegalidade dos prints que constam na peça inicial representam inovação recursal trazida pelo embargante, incabível em sede de embargos declaratórios, consoante se constata dos precedentes abaixo coligidos:

ELEIÇÕES 2016. DIRETÓRIO ESTADUAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DECISÃO REGIONAL. DESAPROVAÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. INTEMPESTIVIDADE. OMISSÃO. AUSÊNCIA.

[...].

2. Evidencia-se a inovação de tese recursal, incabível em sede de embargos, na medida em que se trata de recurso de natureza integrativa, destinado apenas para sanar eventual vício, nos estritos termos do art. 275 do Código Eleitoral. Precedentes.

[...].

Embargos de declaração rejeitados.

(TSE; ED-AgR-Al n. 211-86/RS, Rel. Min. Sergio Banhos, DJe de 2.8.2019) Grifei.

 

ELEIÇÕES 2014. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. GOVERNADOR ELEITO. OBSCURIDADE NA PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO QUANTO À DESIGNAÇÃO DA RELATORIA. INOCORRÉNCIA. OBSCURIDADE NO CONTEÚDO DE VOTOS VENCEDORES. INOCORRÉNCIA. OMISSÃO QUANTO À INCIDÉNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INOVAÇÃO NA TESE RECURSAL. EMBARGOS REJEITADOS.

1. Tendo, a maioria dos julgadores, concluído pelo provimento parcial do recurso nos termos do voto da relatora, esta deve permanecer na relatoria.

2. Não há obscuridade nos votos vencedores ainda que se limitem a acompanhar o voto do relator, mormente se no deste não foi arguida obscuridade.

3. Inadmissível, em embargos de declaração, a inovação na tese recursal. Precedentes.

Embargos de declaração rejeitados

(TSE; ED-REspe 2351-86, Relatora Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 28.6.2016, publicado no DJE - Diário de justiça eletrônico, de 18.8.2016) Grifei.

 

Portanto, inviável o acolhimento do ponto.

 

6. Da obscuridade sobre os elementos de provas que atestam que Ananias teria sido coordenador de campanha e teria se utilizado de influência sobre servidores da Secretaria do Desenvolvimento Social.

Quanto ao último tópico, o embargante assevera o seguinte:

Por derradeiro, restou obscuro no acórdão qual elemento de prova existente nos autos atestaria que o embargante ANANIAS teria sido coordenador da campanha bem como teria se “utilizado da influência que tinha com a Secretária do Desenvolvimento Social, Marize Cristina Sudatti Silva, e com a servidora da mesma pasta, Elaine Maria Bianchini, para intermediar a entrega de cestas básicas para eleitores, vinculando-os aos candidatos”.

 

Entretanto, não se observa qualquer vício do julgado em relação às conclusões envolvendo a participação de Ananias na distribuição de cestas básicas e na coordenação de campanha, pois tais circunstâncias fáticas são corroboradas pelos diversos conteúdos extraídos dos aparelhos celulares apreendidos, consoante se depreende da análise probatória constante no julgado:

Por outro lado, os dados extraídos dos aparelhos celulares demonstram que distribuição pública de cestas básicas foi usada com desvirtuamento e desvio de finalidade, a fim de obtenção de proveito eleitoral, e que a seleção de parte dos beneficiários ocorreu por critérios meramente eleitoreiros.

De acordo com o Ministério Público Eleitoral, “Ananias, servidor público e presidente do Conselho Municipal de Assistência Social - CMAS, utilizou a influência que tinha com a Secretária do Desenvolvimento Social, Marize Cristina Sudati Silva, e com a servidora da mesma pasta, Elaine Maria Bianchini, para intermediar a entrega de cestas básicas para eleitores, vinculando-as aos candidatos”.

A importância do candidato Ananias é bem pontuada na sentença, a partir de suas participações em grupos para a tomada de decisões sobre a campanha:

Neste ponto, importante se discorrer sobre a atuação de Ananias Soares como coordenador de campanha de Vasco Carvalho, do partido MDB, e da chapa majoritária para o Poder Executivo local, composta por Paulo Renato (Gambá) e Jeremias. Dos elementos coligidos aos autos, pode se extrair que o representado Ananias era pessoa de confiança dentro do partido MDB e da Coligação União do Povo Assisense (UPA), formada pelo MDB e PDT, sendo coordenador de campanha do MDB e, consequentemente da campanha do então candidato a prefeito Gambá, e dos vereadores do MDB, pessoa com voz ativa e poder de influência na tomada de decisões da Coligação UPA, agindo em benefício desta e dos seus candidatos. Verifica-se que Ananias participava de grupos de Whatsapp relacionados à campanha, como o intitulado “Comissão UPA 2020”, nome posteriormente alterado para “Coordenação UPA 2020”, no qual foi incluído pela Secretária de Desenvolvimento Social, que também fazia parte dos organizadores da campanha.

Isso posto, tem-se que os pedidos de interceptações telefônicas, que antecederam a busca e apreensão de aparelhos celulares, foi embasado também nas gravações de áudios enviadas por Ananias, por meio do aplicativo Whatsapp, à Rosalina, então cabo eleitoral dos recorrentes, contidos nos arquivos de áudios identificados com os números 02, 03 e 04.

No áudio 03, Ananias confirma que “recebeu o ok da Secretaria da Assistência Social”, mas que as próprias pessoas deveriam buscar as cestas básicas e que os candidatos não poderiam aparecer. No final do áudio, Ananias diz: “a minha parte está OK, agora é com o Vasco, o Gambá e o Jeremias”.

 

Áudio 3:

Viu, Rosa, é o seguinte, ó: eu recebi o “ok” lá da secretaria de assistência social. Tudo ok! Só que essas pessoas têm que ir elas buscarem. Não dá pra nós ir de jeito nenhum! Tá. Então, nós vamos ter que dar “ok”… Aqueles nomes que tu me deu tá “ok” lá com a Elaine. Tá? Então tu vai ter que pedir para essas pessoas irem lá pegá. Tu não pode nem chegar na frente de carro. Se tu quiser levar... Acho que é melhor que elas vão lá buscar, pra nós não nos… Já pensou nós, na última semana, nós ser cassado. Então, não é pra nós ir buscar. Foram bem claro comigo. A Elaine me passou. Tá? Então, assim, ó. Tu avisa essas pessoas que vão lá buscar. Se tu quiser dar carona para alguma pessoa, eu não posso, porque eu sou até da coordenação da campanha. Tá? Se tu quiser ir levar as pessoas até um pedaço, depois, né, tu que sabe, tu fica na praça, tu deixa o teu carro num lugar e elas descarregam no carro… Daí tu vê. Tem que ter muito cuidado, não pode ter aglomeração até sexta-feira. Tá? A minha parte tá ok. Agora o resto é com o Gambá, o Vasco e o Jeremias. Tá? Eu vou aparecer aí na tua casa. Tá? Um abraço.

No áudio 04, Ananias refere que a correligionária não poderia buscar as cestas básicas para os eleitores e que alguns desses já estavam cadastrados na Assistência Social e que, quanto a eles, não haveria problemas, uma vez que se enquadravam como pessoas socialmente vulneráveis:

 

Áudio 4:

Não. Nós não podemos te levar. Imagina! Deus u livre! Como é que nós vamô descarregar as cestas básicas pra ti? Tu tem que mandar as pessoas irem pegar. Inclusive, tem uns que são cadastrados já e já tá na época de pegar. Então, não tem problema, né? Tem uns três ou quatro que são cadastrados. Tá? Então, pode… Não tem como nós levar. De jeito nenhum. De maneira nenhuma.

No arquivo identificado como “AUDIO (5)”, Ananias adverte: “(…) as pessoas podem ir com quem quiser. Tá? Só nós não podemos aparecer, nem eu nem tu, né!”. E, no “AUDIO (6)”, consta a afirmação: “Rosa, tu não entendeu. Cada pessoa tem que pegar a sua. Pode um carro ir e levar essas pessoas, mas cada um tem que pegar a sua. E não pode ir todo mundo ao mesmo tempo, por favor!”.

A extração de dados dos aparelhos celulares também revela a troca de mensagens entre Ananias e Rosalina, na data de 10.11.2022, em que tratam da reposição de gasolina para as visitas de campanha e liberação de mais cestas básicas (ID 44850851):

[...].

 

Portanto, o ponto em tela não merece acolhimento, uma vez que o acórdão não se ressente de omissão ou obscuridade sobre o tema em questão.

 

Em conclusão, cumpre acolher parcialmente os embargos declaratórios, a fim de corrigir erro material, suprimindo a referência a “gravações ambientais” no parágrafo analisado no item 4, sem modificação no conteúdo ou sentido do julgado embargado, mantido, no mais, em sua totalidade.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo acolhimento parcial dos embargos de declaração para corrigir o erro material apontado, nos termos da fundamentação.