REl - 0600470-80.2020.6.21.0165 - Divirjo em Parte com o(a) Relator(a) - Sessão: 15/12/2022 às 14:00

Eminentes Colegas.

Peço vênia para divergir parcialmente do voto da e. Relatora. Penso que se trata de provimento parcial do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e manter a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional no valor de R$ 1.000,00, ainda que por fundamento diverso daquele exarado na sentença, a qual sinaliza ter laborado em mero erro material, ponto esse no qual me alinho aos termos do parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral.

Explico.

Em primeiro lugar, convém indicar que o valor sob exame, R$ 1.000,00, provém do FEFC – Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Dito isso, de fato apenas o equívoco procedimental de depósito na conta “Outros Recursos” não ensejaria, por si só, gravidade apta a ensejar o recolhimento do valor, conforme pacífica jurisprudência desta Corte.

Mas, para além do trânsito da verba pública em conta bancária equivocada, há a ausência de esclarecimento relativamente ao destino do valor recebido do FEFC, falha de grandeza majorada.

E a questão não é nova nos presentes autos – aqui divirjo da Relatora –, pois desde o grau da origem, e antes mesmo do relatório preliminar (ID 44960584) oferecido pelo setor técnico da 165ª Zona Eleitoral, a própria prestadora de contas refere em nota explicativa, ID 44960564, os gastos de R$ 640,00 (despesa de panfletagem de rua, nota fiscal n. 2020290 e cheque n. 900005) e de R$ 360,00 (despesa com divulgação carro de som, nota fiscal n. 2020289, cheque n. 900006) sem, contudo, comprovar o destino de tais valores, pois os cheques referidos foram sacados em circunstâncias não esclarecidas, não sendo possível indicar, conforme a legislação de regência, a destinação efetiva.

Mais: novamente no recurso, ID 44960601, p. 8, item denominado “Dos argumentos capazes de reformar a decisão adotada pelo juízo a quo”, a recorrente afirma que “(…) não obstante tenha ocorrido a transferência de valores do FEFC para sua conta denominada “Outros Recursos”, os recursos foram utilizados na forma prevista na legislação eleitoral, apresentando um demonstrativo onde apartou os gastos do FEFC dos demais recursos”, (grifei) o que não corresponde às circunstâncias comprovadas, exatamente devido à ausência de identificação dos beneficiários dos pagamentos, nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Consta, também no recurso, a mesma tabela que a parte apontara em nota explicativa perante o primeiro grau de jurisdição, indicando os referidos cheques.

Ora, quando a parte invoca uma razão recursal, é óbvio que carrega para si o ônus de comprovar o alegado, e ao mesmo tempo permite – ao magistrado, na realidade, obriga – a análise de sua potência, de sua capacidade de modificação da decisão recorrida. O efeito devolutivo dos recursos é amplo, encontra limite apenas na reformatio in pejus, e nos presentes autos há a expressa alegação recursal (infundada) de que os gastos ocorreram de acordo com a legislação eleitoral.

Nesse norte é que a Procuradoria Regional Eleitoral bem aponta que “(…) em vista da utilização irregular dos recursos do FEFC, deve ser determinada a sua devolução ao erário, ainda que sob outro fundamento, pois não se trata de recursos de origem não identificada”.

Não há novel falha apontada, portanto, mas sim afastamento da alegação recursal de que “os recursos foram utilizados na forma prevista na legislação eleitoral”, restando obedecidos os princípios do contraditório e da ampla defesa, e o referido limite da reformatio in pejus se apresenta plenamente respeitado, pois ele deve ser observado objetivamente e, no caso concreto, há uma sentença com juízo de desaprovação e ordem de recolhimento de R$ 1.000,00, situação que não será piorada.

A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido da realização de ordem de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional em caso como o posto, motivo pelo qual voto pela manutenção da determinação já exarada pela d. magistrada da origem. Há uma série de julgados, também deste Tribunal, que mantém eventuais repercussões à parte, e apenas corrige eventual erro material – como  a destinação do recolhimento – Tesouro Nacional ou Fundo Partidário, por exemplo, o recurso eleitoral em prestação de contas n. 0600433-16.2020.6.21.0048, de relatoria do Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, julgado em 16.9.2021, à unanimidade. 

No que diz respeito à aprovação com ressalvas, alinho-me à posição da Relatora, e cito precedente que cabe como paradigma, em que houve determinação do recolhimento de R$ 1.000,00 por inadequado manejo de verbas oriundas do FEFC, Relator o Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 09.11.2022:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. DESPESA COM COMBUSTÍVEL. AUSENTE REGISTRO DE LOCAÇÃO/CESSÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. VALOR IRRISÓRIO. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANTIDA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato, relativas ao pleito de 2020, e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

2. Despesa com combustível, sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Afronta ao disposto no art. 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Ainda que o art. 60, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispense a cessão de automóvel de propriedade do candidato e do seu cônjuge para utilização em benefício da candidatura, permanece a obrigação de registro na prestação de contas da campanha. Ademais, verifica-se que o pagamento de combustíveis realizado pelo candidato com recursos da campanha (FEFC) desrespeita o disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece que não configura gasto eleitoral e não pode ser pago com recursos de campanha o valor despendido em combustível usado pelo candidato.

4. Embora a irregularidade represente 34,48% das receitas declaradas, o valor esta abaixo do parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico. Aplicados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

5. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Mantida a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

 

Diante do exposto, divirjo parcialmente da Relatora, voto pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas e manter a determinação de recolhimento de R$ 1.000,00 ao Tesouro Nacional, por desobediência ao art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.