REl - 0600470-80.2020.6.21.0165 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2022 às 14:00

VOTO

Inicialmente, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, não deve ser conhecida a petição de emenda ao recurso eleitoral (ID 44960604), visto que não se enquadra na exceção prevista no parágrafo único do art. 932 do CPC, afeta à juntada de documentos novos.

Ademais, não há como deferir o pedido de aplicar a EC n. 117/22 ao feito, referente à anistia concedida a partidos políticos quanto a irregularidades constatadas nas contas eleitorais, pois este processo se trata de prestação de contas de candidata ao cargo de vereador.

Portanto, não conheço a petição.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada devido ao trânsito de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha de R$ 1.000,00, recebidos do Diretório Estadual do Partido Progressistas (PP) do Rio Grande do Sul, na conta bancária “Outros Recursos”, em contrariedade ao art. 9º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e ao § 3º do art. 22 da Lei n. 9.504/97.

Transcrevo o conteúdo do parecer conclusivo:

Foi constatada a seguinte inconsistência que afeta a regularidade da prestação de contas apresentada:

Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), assim como comprovantes bancários de devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada ou guia de recolhimento ao Tesouro Nacional de recursos de origem não identificada.

O recurso recebido, advindo de FEFC, conforme extrato bancário e Nota Explicativa apresentada de documento ID foi transferido para conta de “Doações de campanha” da candidata.

Esclareço que os gastos realizados através do recurso de origem não identificada recebido foram comprovados e aplicados na campanha da candidata, possibilitando a verificação da utilização de tal recurso.

Destaca-se que a análise técnica das contas está adstrita às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não se esgotando a possibilidade de surgirem informações, a qualquer momento, por conta da fiscalização ou investigação de outras esferas do poder público.

 

CONCLUSÃO

A falha apontada compromete a regularidade das contas apresentadas e importam no valor total de R$ 1.000,00 (um mil reais), o qual representa 52,38% do total de receita (financeira e estimável) declarada pelo prestador.

 

A sentença acolheu o parecer técnico nos seguintes termos:

A Unidade Técnica desta 165ª Zona Eleitoral fez ver que a candidata não apresentou “Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), assim como comprovantes bancários de devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada ou guia de recolhimento ao Tesouro Nacional de recursos de origem não identificada”, violando assim o estatuído no artigo supra.

Não foi outra a conclusão da perita:

“A falha apontada compromete a regularidade das contas apresentadas e importam no valor total de R$ 1.000,00 (um mil reais), o qual representa 52,38% do total de receita (financeira e estimável) declarada pelo prestador.

'Para fins do art. 72 da Resolução TSE 23.607/2019, antes da emissão deste Parecer Conclusivo, foi dada oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, para a juntada de documentos e esclarecimentos sobre as irregularidades apontadas no Relatório de Exame de Contas (ID 103770795).

'Ao final, considerando o resultado dos exames técnicos empreendidos na prestação de contas, verifica-se uma irregularidade grave, geradora de potencial desaprovação e consequente aplicação de multa, vide os arts. 9º e14 da Resolução TSE nº 23.607/2019.”

Diante do exposto, imperiosa a desaprovação das contas da candidata, com a determinação de devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada, mas sem aplicação de qualquer multa.

Diante do exposto, na esteira do parecer técnico juntado aos autos, bem como do parecer ministerial, nos termos do inciso III, do art. 74, da Resolução TSE nº 23.607/2019 e artigos citados no corpo da presente decisão, JULGO DESAPROVADAS as contas apresentadas pela candidata supra, determinando o recolhimento ao Tesouro dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada.

 

No caso dos autos, essa é a única falha apontada na sentença, e se trata de impropriedade meramente formal, pois foi possível realizar a rastreabilidade do valor.

A falta de apresentação do extrato é motivo de ressalva nas contas, e pode ser suprida pelo acesso aos extratos eletrônicos disponíveis no DivulgaCandContas do TSE, observando-se que as receitas em espécie depositadas na conta bancária da candidata estão todas identificadas, não restando comprometida a aferição da referida quantia.

O valor de R$ 1.000,00 é considerado diminuto, uma vez que é inferior ao patamar de R$ 1.064,10 que o art. 21, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece como limite para doações em espécie em conta bancária, dispensada a transferência eletrônica. Em caso análogo, a falha foi objeto apenas de ressalva nas contas:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. DESAPROVADAS. MOVIMENTAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. AUSENTE CONTA BANCÁRIA ESPECÍFICA. UTILIZAÇÃO DA CONTA “OUTROS RECURSOS”. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO DEVIDAMENTE UTILIZADO EM CAMPANHA. AFASTADO RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas devido à movimentação de valores oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) na conta bancária "Outros Recursos". Determinado o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

2. Embora não tenha realizado a abertura de conta-corrente específica para o trânsito de recursos oriundos do FEFC, conforme o disposto no art. 9º, caput e § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a candidata recebeu do órgão partidário estadual repasse de verbas procedentes daquele fundo em sua única conta, destinada à movimentação de “Outros Recursos”, em inobservância à legislação eleitoral. Contudo, diante do valor diminuto da irregularidade, aplicados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas.

(...)

4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.
(TRE-RS, REl PC n.  0600818-91.2020.6.21.0135, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 24.8.2021, publicação: PJe) (Grifei.)

Ressalto que o parecer técnico e a sentença mencionam, de modo genérico e superficial, a falta de comprovantes bancários de devolução dos valores recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada eventualmente recebidos pela candidata, mas não há indicação de repasse desses valores durante a campanha.

Nesse ponto, a Procuradoria Regional Eleitoral refere que, ao consultar o extrato da conta bancária da recorrente disponível no sítio Divulga Cand Contas, verificou que houve descumprimento do art. 38, incs. I e II, da Resolução TSE n. 23.607/19, porque a candidata emitiu dois cheques, nos valores de R$ 640,00 e R$ 360,00, os quais foram descontados sem identificação dos beneficiários dos pagamentos (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/86592/210000666538/extratos).

Todavia, não cabe, em sede recursal, realizar novo exame das contas ou inovar na constatação de falhas que foram desconsideradas tanto pelo exame técnico quanto pela sentença.

A única irregularidade mencionada durante a instrução, e na decisão recorrida, é referente ao trânsito irregular de verbas do FEFC em conta bancária indevida, e tal irregularidade, no caso específico dos autos, não prejudicou nem impediu a rastreabilidade dos recursos, sendo razoável e proporcional o apontamento apenas de ressalva nas contas.

Entendo inviável que nesta instância recursal sejam consultados os extratos bancários para desaprovar as contas por fundamento não referido na sentença, sob pena de violação dos princípios do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, e da vedação da reformatio in pejus, pois o recurso é exclusivo da candidata, a qual não teve oportunidade de se defender das falhas apontadas pela Procuradoria Regional Eleitoral, uma vez que levantadas após a interposição do recurso. Com esse entendimento, o seguinte precedente desta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. PRELIMINAR AFASTADA. NÃO RECONHECIDA A NULIDADE DA SENTENÇA. OMISSÃO NÃO ALEGADA NAS RAZÕES RECURSAIS. PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS. APRESENTAÇÃO INTEMPESTIVA DAS CONTAS. FALHA FORMAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO. Preliminar afastada. Omissão na sentença quanto ao reconhecimento de suposta ausência de manutenção de conta bancária durante o exercício em exame. Irresignação ausente nas razões recursais. Reconhecimento que ensejaria a reformatio in pejus. Anulação não determinada. O art. 28 da Resolução TSE n. 23.464/15, reproduzindo o teor do art. 32, caput, da Lei n. 9.096/95, preceitua que os diretórios partidários devem apresentar suas contas anuais à Justiça Eleitoral até o dia 30 de abril do ano subsequente. O prazo visa assegurar a anualidade da submissão das contas, a atualidade dos registros financeiros mantidos pela agremiação e a oportunidade do controle social e jurisdicional. Não observado o comando normativo. A extemporaneidade da apresentação das contas, entretanto, não prejudica a confiabilidade dos documentos contábeis, tampouco obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral. Configurada falha formal. Aprovação das contas com ressalvas. Provimento.

(TRE-RS - RE: 1304 QUARAÍ - RS, Relator: JORGE LUÍS DALL`AGNOL, Data de Julgamento: 19/12/2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 12, Data 26/01/2018, Página 8) - Grifei

Diante do exposto, não conheço da petição de emenda recursal e VOTO pelo provimento do recurso para reformar a sentença, a fim de aprovar as contas com ressalvas e afastar a determinação de recolhimento de R$ 1.000,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.