ED no(a) PCE - 0602053-42.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/12/2022 às 09:00

VOTO

Da Admissibilidade

Os embargos são tempestivos.

Anoto que esta espécie recursal possui fundamentação vinculada, sendo cabível tão somente para sanar os defeitos do ato judicial taxativamente indicados no art. 1.022 do Código de Processo Civil, ou seja, (a) obscuridade, (b) contradição, (c) omissão ou (d) erro material.

É sabido que a presença de tais vícios é relevante tanto para o juízo de admissibilidade da irresignação quanto para o exame do mérito.

No primeiro caso, verifica-se a presença em abstrato do vício, sendo a segunda etapa o exame em concreto. Dessa forma, a mera alegação da existência de um dos vícios descritos pela lei autoriza o conhecimento do recurso, sendo a análise da existência concreta de tal falha matéria de mérito.

Alegado o vício, o recurso é admissível; existente o vício alegado, o recurso é provido; caso contrário, nega-se provimento ao recurso (Barbosa Moreira, citado por NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – volume único. 9. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 1702).

Na hipótese, é possível deduzir que o embargante afirma a existência de contradição no acórdão em relação a outros julgamentos realizados pela Corte aceitando a comprovação de gastos por meio de tabela, de forma que considero a interposição adequada, de forma a comportar conhecimento por estarem preenchidos, também, os demais pressupostos de admissibilidade.

DESTACO.

 

Do Mérito

No mérito, o recurso insurge-se contra o acórdão que, por unanimidade, desaprovou as contas de campanha de SANDRO FIGUEIREDO DE OLIVEIRA, candidato eleito terceiro suplente do cargo de deputado federal nas eleições 2022, e determinou o recolhimento do valor de R$ 46.852,01 (quarenta e seis mil, oitocentos e cinquenta e dois reais e um centavo) ao Tesouro Nacional (ID 45369736).

A ementa do acórdão embargado restou assim redigida:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. 3º SUPLENTE. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS. DESPESAS COM IMPULSIONAMENTO JUNTO AO FACEBOOK PARCIALMENTE SANADAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS DESPESAS COM SISTEMA DE ALARME E MONITORAMENTO DE IMÓVEL LOCADO. IRREGULARIDADE MANTIDA. GASTOS COM PESSOAL EM DESACORDO COM O DISPOSTO NO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. IRREGULARIDADES QUE REPRESENTAM ELEVADO VALOR. PRECEDENTES. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato eleito ao cargo de 3º suplente de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

2. Conhecida a documentação juntada extemporaneamente, diante das peculiaridades do caso em apreço, e da quantidade de dados complementares com aptidão para sanar as irregularidades sem a necessidade de nova análise técnica ou de outras diligências.

3. Aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. 3.1) Gastos com publicidade e carro de som comprovados pelos vídeos publicados em rede social, que demonstram a utilização do equipamento. 3.2) Despesas com impulsionamento junto ao Facebook parcialmente comprovadas. A existência de nota fiscal eletrônica emitida pelo Facebook contra o CNPJ da campanha do prestador, constando como discriminação dos serviços “Conjunto de pedidos de inserção de anúncios na internet durante o mês Setembro”, comprovou parcialmente o gasto eleitoral com impulsionamento de internet, remanescendo uma diferença, que deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.3) Gastos referentes à locação de imóvel sanados, pois o contrato firmado descreve o objeto da locação, o preço contratado e o prazo da avença, que coincide com o período eleitoral, havendo ainda a demonstração de que o local foi utilizado como comitê de campanha, conforme publicação na rede social Instagram, indicada pelo prestador. Todavia, não restou comprovada a despesa com o sistema de alarme e monitoramento. Revelada desproporção entre o valor da locação do imóvel e o valor do sistema de alarme e monitoramento, possivelmente relacionada com um dos itens descritos na nota fiscal. Ademais, o candidato não demonstrou satisfatoriamente a necessidade de tais serviços, não se prestando para tanto a alegação genérica de que o local fora alvo de invasões e furtos. Irregularidade mantida. 3.4) Gastos relacionados a transporte e fretamento devidamente justificados, em razão da juntada de recibos.

4. Despesas com pessoal sem observância do disposto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, que determina que essas “devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado”. Os recibos trazidos não são aptos a comprovar os gastos, visto que não atendem aos requisitos exigidos pela norma. Igualmente sem utilidade como prova a planilha elaborada pelo prestador, pois se trata de declaração unilateral.

5. As falhas apuradas na prestação de contas representam 10,23% da arrecadação, o que impõe a desaprovação das contas em razão do comprometimento de sua regularidade. Percentual superior ao que este Tribunal Regional Eleitoral e o Tribunal Superior Eleitoral vêm decidindo para admitir a aprovação com ressalvas. A superação do limite percentual, mesmo que ligeiramente, atrai a desaprovação da contabilidade, como se verifica nos precedentes em que foram constatadas falhas que totalizaram 10,89%, 11,13% e 10,48% (TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060756859, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 44, Data 15.03.2022; Agravo de Instrumento n. 060542330, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 204, Data 13.10.2020; Prestação de Contas n. 98742, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 106, Data 06.06.2019, Página 21/23). Determinado o recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional, com fundamento no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

6. Desaprovação, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19. Determinado o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional.

 

O embargante insurge-se, inicialmente, contra a glosa com as despesas com pessoal, argumentando que a prova dos autos seria apta a comprová-las e afirmando que “em outras prestações de contas relativas ao mesmo pleito, documento parecido a este foi aceito como complementação aos contratos de prestação de serviço” e relacionando processos.

Ocorre que a contradição a ser analisada nos embargos de declaração é aquela interna à decisão.

Nesse sentido, colaciono decisão do Tribunal Superior Eleitoral em que se examinou argumentação semelhante a que se formula nos presentes aclaratórios:

ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RCED JULGADO IMPROCEDENTE. AUSÊNCIA DE QUITAÇÃO ELEITORAL. MATÉRIA DE NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. PREEXISTENTE. IMPOSSIBILIDADE DE SER ARGUIDA EM RCED. PRECEDENTES. CONTRADIÇÃO EXTERNA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS. MERO INCONFORMISMO. REJEITADOS OS ACLARATÓRIOS.

1. Consta expressamente do aresto embargado que, na linha da jurisprudência do TSE, a ausência de quitação eleitoral consiste em matéria de natureza infraconstitucional e, como tal, só poderia ser objeto de RCED se fosse superveniente ao registro de candidatura, o que, contudo, não é a hipótese dos autos, em que era preexistente.

2. O embargante alega a existência de contradição na jurisprudência desta Corte, por tratar de situações iguais a do presente caso, qual seja, a ausência de quitação eleitoral como condição de elegibilidade, matéria constitucional, o que difere do assentado no acórdão embargado, que a considerou matéria de status infraconstitucional.

3. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "a contradição que autoriza a oposição de embargos é a de ordem interna, ou seja, entre elementos da própria decisão" (ED–PC–PP nº 182–21/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgados em 10.6.2021, DJe de 22.6.2021), não sendo admitida a oposição dos aclaratórios em que se aponta contradição com outras decisões, conforme ocorrido na espécie.

4. O argumento do embargante não dá azo ao acolhimento dos embargos de declaração, denotando o propósito de rediscutir matéria já decidida, providência inviável na via aclaratória.

5. O simples fato de inexistir o vício alegado no decisum embargado não é suficiente para a aplicação de multa pela oposição dos primeiros aclaratórios, mormente porque não demonstrado o intuito protelatório. Mutatis mutandis: ED–AgR–AI nº 16–15/RJ, rel. designado Min. Alexandre de Moraes, julgados em 23.9.2021, DJe de 10.12.2021.

6. Embargos de declaração rejeitados.

(AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060078174, Acórdão, Relator(a) Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 238, Data 25/11/2022)

 

Ainda, na mesma linha, também da jurisprudência do TSE: RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060284280, Acórdão, Relator Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 179, Data 15/09/2022; RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060014951, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 117, Data 24/06/2021; Agravo de Instrumento n. 060721259, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 210, Data 12/11/2021.

Ademais, em exame de embargos de declaração, não cabe apurar a prova produzida em processos de outros relatores a fim de cotejar similitudes/discrepâncias entre os elementos produzidos pelas partes.

Ainda, o embargante pleiteia que sejam considerados os esclarecimentos sobre a contratação de pessoal constantes em planilha juntada e afirma que a promoção para colocação de alarme de monitoramento no comitê central do candidato foi regular e que a boa-fé não precisa ser provada.

Ocorre que, no decorrer de toda a instrução processual, o prestador teve respeitado o seu direito à ampla defesa, sendo intimado para manifestação e conhecidos os documentos e esclarecimentos apresentados mesmo após o decurso do prazo concedido para tanto.

Foram juntados documentos após o parecer conclusivo e após o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, elementos esses considerados no voto condutor do acórdão.

Os esclarecimentos foram acatados na medida de sua aptidão para sanar as irregularidades, tanto que, a despeito da análise técnica, que recomendou a glosa de R$ 98.117,56 (ID 45326618), e do parecer ministerial, que opinou pelo recolhimento de R$ 77.882,01 (ID 45336655), o voto condutor considerou esclarecidos vários apontamentos, reduzindo o montante das irregularidades para R$ 46.852,01.

Sobre as despesas com pessoal, em especial, considerou-se regular o gasto contratado com GUILHERME ESTIMA SCHUCH no valor de R$ 2.000,00, pois, diferente dos demais recibos juntados aos autos, este diferia do padrão verificado e permitia a comprovação do dispêndio.

O que se verifica, então, é que o embargante está irresignado com a valoração e análise das provas, pretendendo a rediscussão das matérias afetas ao acerto ou desacerto da decisão (mérito), pretensão que não se coaduna à finalidade da via processual eleita.

Quanto ao prequestionamento, os dispositivos invocados pelo embargante foram expressamente mencionados no acórdão impugnado.

Portanto, não constatado qualquer vício que macule a decisão impugnada, os embargos devem ser rejeitados.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto por conhecer e rejeitar os embargos de declaração.