PCE - 0602374-77.2022.6.21.0000 - Acompanho o(a) relator(a) - Sessão: 13/12/2022 às 10:00

DECLARAÇÃO DE VOTO

DES. CAETANO CUERVO LO PUMO

Há dois precedentes do TSE, a PC n. 0601363-37, de relatoria do Ministro Sergio Banhos, julgada em março de 2022 e a PC n. 0000421-25, relatoria do Ministro Alexandre de Morais, julgada em outubro de 2021, que reconhecem omissão de despesas eleitorais decorrente de repasses partidários sem que tenha sido aplicada a obrigação de recolhimento de valores ao erário.

A omissão de repasses, analisada nos precedentes, caracteriza omissão de despesas eleitorais na contabilidade partidária, equiparada, contabilmente, à omissão de notas fiscais, conforme analisado no caso concreto.

Tal posição foi reforçada em recente precedente, de novembro de 2022, de relatoria do Ministro Carlos Horbach, em que se decidiu que a “omissão de despesas vinculadas ao período eleitoral no montante de R$ 4.043,00 (quatro mil e quarenta e três reais) viola o que dispõe o art. 56, I, g, da Res.–TSE nº 23.553/2017. Por constituir apontamento de natureza contábil, este Tribunal tem decidido que tal circunstância não acarreta o dever de ressarcimento ao Erário”.

Este último caso tratou justamente da omissão de notas fiscais emitidas em nome do partido e ausentes no registro de prestação de contas. Na ocasião, o Ministro Relator referiu a gravidade da falha e destacou que, como nos precedentes da Corte, a mesma não gera o dever de recolhimento ao erário, verbis:

A omissão de despesas vinculadas ao período eleitoral viola o disposto no art. 56, I, g, da Res.-TSE nº 23.553/2017 por constituir vício que compromete a confiabilidade das contas. Neste sentido: PC nº 97965/DF, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 13.12.2019; PC nº 229-97/DF, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.4.2018. De igual modo, a regular “escrituração contábil – com documentação que comprove a entrada e a saída de recursos recebidos e aplicados – é imprescindível para que a Justiça Eleitoral exerça a fiscalização sobre as contas” (PC nº 229-97/DF, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.4.2018). Embora a irregularidade repercuta na transparência das contas, esta Corte Superior tem decidido que tal circunstância não acarreta o dever de ressarcimento ao Erário, haja vista a natureza contábil da glosa. A esse respeito, confira-se: PCE nº 0000421-25, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 18.5.2021

 

Entendo, portanto, que, com esse novo entendimento, que expressamente equipara as omissões dos repasses partidários à omissão de notas fiscais, restou sedimentada a posição do Colendo TSE no sentido da inviabilidade do dever de recolhimento das omissões de despesas, não obstante permanece a gravidade da falha, a ser sopesada com o conjunto das contas para fins de análise acerca da aprovação ou desaprovação das contas.

Além disso, considerando que sequer pode ser afirmado com certeza que as referidas despesas foram quitadas, entendo aplicável também o raciocínio do E. Ministro Barroso, no julgamento do REspEl no 0601205-46/MS, em 8.2.2022, realizado com relação às dívidas de campanha, no sentido de inexistir respaldo normativo para se presumir que o débito será pago em momento futuro com recursos de origem não identificada:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO FEDERAL. DÍVIDA DE CAMPANHA. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DA QUANTIA AO ERÁRIO. REJEIÇÃO DAS CONTAS. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

1. Trata-se de recurso especial eleitoral interposto contra acórdão do TRE/MS que desaprovou as contas de candidato ao cargo de deputado federal nas Eleições 2018.

2. Na origem, o TRE/MS, por unanimidade, concluiu haver irregularidades graves na prestação de contas, notadamente dívidas de campanha no montante de R$ 110.422,50 (cento e dez mil, quatrocentos e vinte e dois reais e cinquenta centavos), que não foram assumidas pelo órgão partidário nacional. No entanto, deixou de determinar a devolução deste valor ao Tesouro Nacional, por não considerar que se tratasse de utilização de recurso de origem não identificada.

3. O Ministro Relator propõe que se acolha a tese suscitada no recurso especial do Ministério Público, para além da desaprovação das contas, determinar-se ainda a devolução ao Tesouro Nacional da quantia referente às dívidas de campanha, pelos seguintes fundamentos: (i) a infringência ao art. 35 da Res.-TSE nº 23.553/2017 impede que a Justiça Eleitoral controle a regularidade da movimentação financeira do candidato, logo o pagamento das despesas, se realizado, será com recurso cuja origem não estará comprovada nos autos da prestação de contas; e (ii) à luz da interpretação sistemática da legislação, é devido o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor referente aos débitos de campanha não quitados e não assumidos pelo partido político, porque não comprovada a procedência das verbas a serem futuramente utilizadas, caracterizando-as como recurso de origem não identificada.

4. Contudo, observo que não há respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse.

5. Isso porque (i) a assunção da dívida pelo partido não é um procedimento obrigatório e, tampouco, afasta a possibilidade de que o candidato obtenha diretamente os recursos para quitar as obrigações junto aos fornecedores; (ii) incabível considerar como de “origem não identificada” recursos que sequer foram captados, pois significaria, em última análise, impedir o candidato de quitar a obrigação pela qual responde pessoal e individualmente; e (iii) a medida apenas agrava o problema detectado pelo Relator, pois o candidato terá que duplicar o esforço de arrecadação de recursos junto a fontes não controladas pela Justiça Eleitoral, para além de pagar fornecedores, realizar o recolhimento ao Tesouro.

6. Com essas considerações, divirjo do voto do Ministro relator, para negar provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral.

(TSE; REspEl 0601205–46/MS; Redator para o acórdão: Min. Luís Roberto Barroso, sessão de 8.2.2022) Grifei.

Em meu ponto de vista, as situações, para fins de aplicação de dever de recolhimento, se equiparam.

O aparecimento de notas fiscais por meio da circularização realizada pelo órgão técnico tem sido bastante normal, mas em geral em despesas de pequena monta, como gastos com gasolina, estadia ou mesmo alimentação (supermercado no caso), a indicar erros formais ou mesmo gastos realizados sem o conhecimento do candidato. Além disso, temos visto a dificuldade de atender à norma que exige o cancelamento das notas.

Essas circunstâncias, pela natureza do gasto ou das circunstâncias, devidamente fundamentado, pode inclusive, em algum caso concreto, levar a outra conclusão, mas não de forma automática pela aparição das notas fiscais não registradas. Para a aplicação de devolução ao erário, deve haver um fundamento específico das circunstâncias do caso concreto.

Registro, ainda, meu entendimento no sentido de que a segurança jurídica resta melhor preservada com o respeito ao entendimento da aplicação da legislação eleitoral da mesma forma, em todo o território nacional, o que se dá pela posição esposada por unanimidade pelo Pleno do TSE.

Tais fatos não descaracterizam a falha, mas mostram que a determinação de recolhimento ao erário não é a solução mais correta, como já apontado pelo Colendo TSE.

Por fim, registro que tal raciocínio, como não poderia deixar de ser, limita-se, prima facie, à análise das contas, sem prejuízos de outras consequências de natureza eleitoral.

No caso em tela, entendo por afastar a glosa decorrente da omissão da despesa com nota fiscal e desaprovando as contas pelo volume das falhas, nos termos do voto da Eminente Relatora.