PCE - 0603217-42.2022.6.21.0000 - Divirjo em Parte com o(a) Relator(a) - Sessão: 09/12/2022 às 09:00

VOTO DIVERGENTE

Desa. Vanderlei Teresinha Tremia Kubiak

 

Senhor Presidente e colegas, pedirei vênia para divergir do posicionamento adotado pelo eminente relator, Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, em seu voto por considerar que os valores glosados em razão do reconhecimento da dívida de campanha devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Acerca das consequências do reconhecimento da dívida de campanha, anoto que tenho ciência que Tribunal Superior Eleitoral, em julgado decidido por maioria, se posicionou no sentido de que não há "[...] respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse" (REspEl nº 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.2.2022, DJe de 30.3.2022).

Observo, porém, que naquele julgamento se examinava prestação de contas das Eleições 2018, com aplicação da Resolução TSE n. 23.553/2017.

A mencionada resolução previa que caracterizava o recurso como de origem não identificada (art. 34, § 1º):

Art. 34. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador; e/ou

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos; e/ou

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político.

§ 2º [...]

 

A norma de regência nas Eleições 2022 – Resolução TSE n. 23.607/2019 – ampliou o rol acima mencionado, ao descrever no dispositivo equivalente - o § 1º do art. 32 -, além das hipóteses previstas na resolução anterior, novas categorias de recursos de origem não identificada que podem ser reconhecidas no exame das contas de campanha, que sejam:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta da doadora ou do doador;

II - a falta de identificação da doadora ou do doador originária(o) nas doações financeiras recebidas de outras candidatas ou de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF da doadora ou do doador pessoa física ou no CNPJ quando a doadora ou o doador for candidata ou candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução à doadora ou ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real da doadora ou do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

§ 2º [...] (grifei)

 

Como se percebe, a atualização da regulamentação atentou para as hipóteses em que a fiscalização da procedência e da licitude dos recursos que servirão de base para o pagamento das despesas pendentes possa ser comprometida, em especial, por valores que não transitem pelas contas de campanha ou empréstimos cujos recursos para quitação não tenham origem comprovada, tudo no intuito de evitar a aplicação de verbas oriundas de fontes vedadas ou doações indiretas por parte da pessoa jurídica credora.

Assim, penso que o respaldo normativo eventualmente reconhecido ausente em julgados que examinavam as prestações de contas sob a ótica da Resolução TSE n. 23.553/2017 veio previsto na Resolução TSE n. 23.607/2019, de forma que é possível afastar a aplicação do precedente do TSE no caso dos autos.

Portanto, tenho que os recursos a serem usados para a quitação da dívida remanescente da contratação de gastos eleitorais não assumida pelo órgão nacional do partido político, por não transitarem nas contas de campanha do candidato, nos termos do inc. VI do § 1º do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/2019, devem ser considerados como de origem não identificada, cabendo a determinação de seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

Assim, reconhecida a irregularidade em relação à dívida de campanha, entendo cabível a determinação de recolhimento dos valores correspondentes ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 32, caput, e § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Portanto, com a devida vênia ao relator, divirjo do judicioso voto condutor tão somente para reconhecer como devido o recolhimento de valores relativos à dívida de campanha ao Tesouro Nacional.