REl - 0600777-23.2020.6.21.0007 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/12/2022 às 09:00

VOTO

Passo ao exame da preliminar de nulidade do feito por falta de intimação do parecer conclusivo, e adianto que não prospera.

Do exame da tramitação do feito nos sistemas PJe de primeiro e segundo graus, observa-se que os advogados da parte recorrente foram devidamente intimados da decisão que concedeu 3 (três) dias para manifestação sobre o relatório preliminar técnico de exame das contas.

A comunicação ocorreu dentro do sistema PJE, pelo ato de intimação n. 9279137, com expedição eletrônica em 04.11.2021, às 17:39:07, e prazo até 19.11.2021, às 23:59:00.

Conforme consta nos §§ 3º e 4° do art. 69 da Resolução TSE n. 23.607/19, a unidade técnica somente oportunizará intimação do prestador sobre o conteúdo do parecer conclusivo caso não se tenha dado ao prestador oportunidade de se manifestar quanto a falhas relacionadas no exame preliminar, o que de fato ocorreu no caso dos autos.

Ressalto que a forma de intimação obedeceu à regra expressa prevista no § 4º do art. 26 da Resolução TRE-RS n. 347/20, segundo o qual as intimações nos processos de prestação de contas relativas às eleições de 2020 serão realizadas mediante ato de comunicação via sistema no Processo Judicial Eletrônico (PJe), desobrigando a publicação no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e dispensando, até 12.02.2021, a observância do prazo de ciência de 10 (dez) dias previsto no art. 5º, § 3º, da Lei n. 11.419/06 (Resolução TSE n. 23.632/20, art. 6º; Resolução TRE-RS n. 338/19, art. 51).

Assim, no caso em tela, considerando que o parecer conclusivo apenas aponta o somatório das irregularidades listadas no relatório preliminar, do qual o partido foi intimado, não havia motivo para nova intimação.

Portanto, diante da ausência de qualquer nulidade na tramitação, afasto a preliminar arguida.

No mérito, as contas do PSD de Bagé/RS foram desaprovadas devido a 18 depósitos em cheque, efetuados na conta-corrente do partido de natureza “Doações para Campanha”, totalizando a quantia de R$ 2.170,00, os quais não constaram na prestação de contas partidária, portanto de origem não identificada, como bem apontou a sentença.

A segunda falha trata de receitas declaradas por transferência eletrônica no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais na soma de R$ 2.398,00, mas que não transitaram pela conta bancária do partido, ou seja, ausentes no extrato bancário.

A última irregularidade cuida de despesas declaradas no sistema de prestação de contas, todavia ausente no extrato bancário, na quantia de R$ 340,00, para pagamento de honorários de advogado, que não restaram comprovadas.

A primeira irregularidade consiste no depósito de 18 cheques na conta “Outros Recursos” da agremiação, no somatório de R$ 2.170,00, em 24.11.2020.

O recorrente alega que tais valores depositados referem-se a cheques emitidos para pagamento de cabos eleitorais, mas como estes não possuíam conta bancária, correligionários receberam os cheques dos colaboradores, pagando em dinheiro a cada um dos ajudantes, e depositaram os cheques a título de doação na conta-corrente bancária da agremiação.

O procedimento contraria a norma eleitoral (chamadas de formalidades), prejudicando a confiabilidade e transparência da contabilidade, por não ficar demonstrada a origem dos beneficiários dos cheques.

Além disso, como bem apontou o Parquet, os depósitos, constantes nos extrato bancário, só ocorreram após as eleições, na data de 24.11.2020, portanto sem observar o disposto no art. 33, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19:

“Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.”

A segunda irregularidade, refere-se à quantia de R$ 2.398,00 declarada no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais, os quais não constaram nos extratos de conta bancária informada à Justiça Eleitoral, como pode ser verificado pelo sítio Divulga Cand Contas no endereço: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/partido/2020/2030402020/85316/4/55/extratos.

Entretanto, tais valores transitaram pela conta-corrente “PSD Comissão Provisória Doação Campanha” (ID 44935449), no qual é possível verificar que os depósitos foram realizados sem os dados de CPF do doador e após 15.11.2020, quando já havia terminado o período eleitoral para arrecadação de recursos, portanto não foi observado o disposto no art. 21, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF da doadora ou do doador seja obrigatoriamente identificado;

A última falha apontada, no valor de R$ 340,00, relaciona-se à despesa declarada e não comprovada.

Nas contas, houve a informação de ser emitido cheque de n. 24 para pagamento de serviço de advogado, no entanto não foi debitado na conta bancária.

Portanto as falhas apontadas demonstram que não foi atendido o disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, em que despesas eleitorais de natureza financeira devem ser efetuadas por meio de cheque nominal cruzado ou transferência com identificação do CPF ou CNPJ do beneficiário, o que não foi observado pelo partido no caso em tela:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário;

Ademais, os valores que não transitam pelo sistema financeiro nacional podem facilmente ser destinados a pessoas que não compuseram a relação indicada como origem do gasto de campanha.

A omissão de receitas e de despesas é falha de natureza grave que, conforme sua abrangência, conduz à desaprovação das contas, pois os recursos recebidos e utilizados na quitação de débitos sem declaração nas contas configuram recursos de origem não identificada, nos termos de jurisprudência desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. AUSÊNCIA DE ABERTURA DE CONTA BANCÁRIA. OBRIGATORIEDADE. GARANTIA DA ISONOMIA DO PROCESSO ELEITORAL E DO CONTROLE DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA PELA JUSTIÇA ELEITORAL. OMISSÃO DE GASTOS. ASSESSORIA JURÍDICA E CONTÁBIL. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA ¿ RONI. TRANSPARÊNCIA DAS CONTAS PREJUDICADA. SUSPENSÃO DE RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO POR DOZE MESES. SANÇÃO ADEQUADA E RAZOÁVEL. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO DE OFÍCIO. FUNDAMENTAÇÃO DA SANÇÃO. ART. 74, §§ 5º, 6º e 7º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DESPROVIMENTO. [...] A omissão dos gastos relativos ao pagamento dos serviços importa em indício de utilização de recursos cuja origem não é identificada - RONI, visto que não transitaram por conta de campanha, comprometendo irremediavelmente a transparência da prestação de contas. 4. Adequada e razoável a sanção aplicada de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 (doze) meses, pois bastante grave a irregularidade de omissão na abertura de conta bancária por parte de agremiação que participou ativamente do pleito, em evidente desequilíbrio na paridade de armas relativamente aos concorrentes eleitorais que prestaram contas de forma correta. Correção, de ofício, de erro material em relação ao dispositivo invocado para fundamentar a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o art. 74, §§ 5º, 6º e 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 5. Provimento negado.

(TRE-RS – Rel n. 06004783620206210075 Nova Bassano/RS 060047836, Relator: OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Data de Julgamento: 09.02.2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico.) (Grifei.)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. EXISTÊNCIA DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. IRREGULARIDADE AFASTADA. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL E DO PERCENTUAL DA MULTA IMPOSTA. SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A APLICAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Recebimento de recursos de origem não conhecida. Compete ao partido manter em ordem a sua movimentação bancária, devendo receber recursos financeiros obrigatoriamente por intermédio de cheque cruzado ou depósito identificado pelo CPF do doador, nos termos dos arts. 5º, inc. IV, 7º e 8º, §§ 1º e 2º, todos da Resolução TSE n. 23.464/15. A jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave, que impede o controle da Justiça Eleitoral, prejudicando a transparência das informações contábeis. [...]

(TRE-RS – Rel n. 1519 SANTA ROSA - RS, Relator: RAFAEL DA CÁS MAFFINI, Data de Julgamento: 12.02.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 29, Data: 15.02.2019, p. 13.) (Grifei.)

Além disso, na esteira do parecer ministerial, a apresentação de documento fiscal exigido pelo art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, sem o vínculo com os meios de pagamento relacionados no art. 38 e seus incisos da mesma resolução, não tem o efeito de comprovar ou de dar regularidade às contas, tratando-se de declaração unilateral, transcrevo:

Diga-se que os documentos previstos no art. 60, caput e §§ 1º e 2º da Resolução TSE nº 23.607/2019 jamais se prestam, sozinhos, à comprovação dos gastos eleitorais, devendo ser entendidos como um reforço de comprovação em relação àqueles informados no art. 38 e seus incisos da mesma Resolução. Em outras palavras, os documentos fiscais idôneos, com o preenchimento de todos os dados necessários, a que alude o art. 60, devem se somar aos meios de pagamento determinados no art. 38, jamais podendo ser apontados como alternativos ou exclusivos para efeito de comprovação da efetiva e regular utilização dos recursos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Destaco que o art. 45, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece a responsabilidade dos partidos sobre suas contas, não podendo a irregularidade ser relevada com base na alegação de que ocorreu por equívoco.

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas.

A quantia somada das irregularidades (R$ 4.568,00) representa mais de 100% das receitas financeiras na prestação de contas, não sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação dos registros contábeis, mesmo com ressalvas, pois as falhas são graves e comprometem de forma insanável a confiabilidade e a transparência da movimentação financeira.

Com essas considerações, a manutenção da sentença de desaprovação das contas é medida impositiva.

Diante do exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a sentença que desaprovou a prestação de contas e determinou o recolhimento de R$ 4.568,00 ao Tesouro Nacional.