PCE - 0602944-63.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/11/2022 às 14:00

VOTO

HEITOR JOSE SCHUCH, candidato eleito ao cargo de deputado federal nas eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Processados os documentos nos termos da Resolução TSE n. 23.607/219, foi elaborado parecer conclusivo que considerou sanados parte dos apontamentos realizados inicialmente e apontou a permanência de falhas na contabilidade relacionadas à entrega dos relatórios financeiros de campanha fora do prazo estabelecido pela legislação eleitoral; recebimento de recursos de origem não identificadas em virtude da omissão de despesas verificadas em documentos fiscais localizados em procedimento de circularização; pagamentos em espécie para o mesmo fornecedor, cuja soma dos dispêndios ultrapassa o limite estabelecido para pagamentos de pequeno valor; e transferências de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha a candidatos após o dia da eleição (ID 45326597).

O prestador de contas juntou documentos e esclarecimentos em duas ocasiões após a elaboração do laudo técnico.

Na hipótese, deixei de determinar a remessa dos autos à Secretaria de Auditoria Interna – SAI em razão da preclusão da oportunidade para juntada de elementos pelo interessado. No entanto, diante das peculiaridades do caso em apreço e da quantidade de dados complementares juntados, conheço dos esclarecimentos e documentos na medida de sua aptidão para sanar as irregularidades sem a necessidade de nova análise técnica ou de outras diligências.

Passo à análise dos apontamentos.

 

Do atraso na entrega dos relatórios financeiros de campanha à Justiça Eleitoral

A análise técnica apontou que houve descumprimento quanto à entrega dos relatórios financeiros de campanha no prazo estabelecido pela legislação eleitoral (art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Em relação à não observância do prazo para envio dos dados relativos ao recursos recebidos para financiamento da campanha eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral consolidou o entendimento de que o atraso ou a entrega com inconsistências não necessariamente conduzem à desaprovação das contas e que devem ser aferidos no exame final da contabilidade, no caso concreto, a extensão da falha e o comprometimento no controle exercido pela Justiça Eleitoral (Prestação de Contas n. 060119887, Acórdão, Relator(a) Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 120, Data 28/06/2022; Prestação de Contas n. 43424, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 11/11/2020, Página 197-212).

Na hipótese, foi consignado no parecer conclusivo que a “impropriedade descrita não afetou a identificação da origem das receitas e destinação das despesas comprovadas pela movimentação bancária” (ID 45326597).

Assim, não tendo havido comprometimento da fiscalização das contas pela Justiça Eleitoral, a falha deve ser considerada mera impropriedade.

 

Dos recursos de origem não identificada

A análise técnica localizou notas fiscais não declaradas pelo prestador de contas, irregularidade que restou assim descrita no parecer conclusivo (ID 45326597):

3. Dos Recursos de Origem Não Identificada - RONI

Com base nos procedimentos técnicos de exame e na análise dos extratos bancários eletrônicos, disponibilizados pelo TSE, assim como na documentação apresentada nesta prestação de contas, foi constatado o recebimento e utilização de Recursos de Origem Não Identificada:

3.1. Quando da emissão do Relatório de Exame de Contas ID 45304239, foram identificadas as seguintes omissões relativas às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais, infringindo o que dispõe o art. 53, I, g, da Resolução TSE n. 23.607/2019:

[…]

Tecnicamente, a manifestação acima descrita não altera as falhas apontadas, uma vez que as notas fiscais foram emitidas com o CNPJ do candidato e não foi possível atestar, nesta prestação de contas, a origem do recurso utilizado para quitar tais despesas.

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados para o pagamento destas despesas, considera-se irregular o montante de R$ 991,17, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 32 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

O prestador de contas não reconhece as três despesas representadas por estes documentos fiscais e argumenta que “não se pode esquecer que o CNPJ do candidato é um dado público e exposto em diversos locais, inclusive por determinação legal, porquanto não é de se excluir a possibilidade de pessoa alheia à campanha haver pedido tais notas fiscais” (ID 45315633).

No entanto, a emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, nos termos do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

 

Havendo o registro do gasto nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas, que deve laborar para o cancelamento da nota fiscal, conforme previsto no art. 59 e no art. 92, §§ 5º e 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 59. O cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular.

 

[...].

 

Art. 92. (...)

§ 5º O eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, apresentado por ocasião do cumprimento de diligências determinadas nos autos de prestação de contas, será objeto de notificação específica à Fazenda informante, no julgamento das contas, para apuração de suposta infração fiscal, bem como de encaminhamento ao Ministério Público.

§ 6º Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pelo fornecedor.

 

Na hipótese, tenho que, embora não tenham vindo aos autos todos os elementos previstos na legislação, podem ser considerados sanados os apontamentos relativos à despesa contratada com TANEA MARIA BORGES KLAFKE ME, no valor de R$ 447,00, já que foi juntada aos autos nota fiscal onde consta em “Informações Adicionais”, “NFS-e Cancelada em 16/11/2022. | Motivo: Erro” (ID 45339502). Da mesma forma, pude verificar em http://soledade-portais.govcloud.com.br/NFSe.Portal/Prestador/Nota/RenderizarDetalhes?nota=GCz407F%208yo%3D, o registro do documento fiscal com a “Situação ‘Cancelada’”. Também na DANFE emitida por TIAGO FILBER RECARGAS, no valor de R$ 345,60, juntada pelo prestador (ID 45339503), há o registro da Operação “999 - ESTORNO DE NF-E NÃO CANCELADA NO PRAZO LEGAL”, o qual também pode ser observado em https://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/principal.aspx, com a utilização da chave de acesso 43221105501367000102550010000085481335317645.

Em relação à nota fiscal emitida por POSTO CENTER LTDA., comprova o prestador de contas que requereu seu cancelamento (ID 45339501) e afirma que

[...] não a reconhece como despesa de campanha, nos termos do e-mail e demais anexos.

Como reforço argumentativo, observa-se, pelo ID 45242586, que todos os abastecimentos de veículos de campanha foram realizados na Rede Sim, única autorizada pela coordenação para tal finalidade.

Dessa forma, considerando o referido acima, imperioso sejam considerados sanados os referidos apontamentos. Com efeito, em que pese tenham sido canceladas fora do prazo as referidas notas, para efeitos fiscais, no caso em evidência demonstram a plena boa-fé do prestador na seara do direito eleitoral.

 

Ocorre que não foi comprovado o efetivo cancelamento desse último documento fiscal e nem foram juntados esclarecimentos firmados pelo fornecedor, como requer o regulamento.

Por consequência, está caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

A despesa resultante da nota fiscal omitida e cujo cancelamento não foi devidamente comprovado, no valor de R$ 198,57, implica, por consequência, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando o recurso como de origem não identificada, do qual o montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Irregularidades na comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

A análise técnica consignou que o candidato efetuou pagamentos em espécie a fornecedores sem observação do limite permitido para utilização de Fundo de Caixa. Vejamos (ID 45326597):

4.1. Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FC

Com base nos procedimentos técnicos de exame e análise dos extratos bancários eletrônicos, disponibilizados pelo TSE, assim como na documentação apresentada nesta prestação de contas, foram,constatadas irregularidades na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, quando da emissão do Relatório de Exame de Contas ID 45304239.

.

4.1.1. No Relatório de exame de Contas foram identificados pagamentos em espécie para o mesmo fornecedor, cuja soma dos pagamentos ultrapassa o limite estabelecido para pagamentos de pequeno valor, contrariando o disposto no art. 40 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

[…]

A falha implica em descumprimento de preceito fundamental para a transparência e controle dos gastos com recursos públicos e impossibilita a efetiva verificação da relação entre o valor pago e a aplicação dos recursos, devendo o valor de R$ 5.360,16 ser recolhido ao Tesouro Nacional por aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário/Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

 

A legislação eleitoral permite que o candidato constitua reserva em dinheiro (Fundo de Caixa) para pagamento de gastos de pequeno vulto (art. 39 da resolução de regência) definidos como “despesas individuais que não ultrapassem o limite de meio salário mínimo, vedado o fracionamento de despesa” (art. 40 da norma).

Acerca dos pagamentos em espécie realizados pelo candidato e do fracionamento de despesas no caso em exame, me valho do criterioso exame realizado pelo Dr. José Osmar Pumes, Procurador Regional Eleitoral, em seu parecer (ID 45335968), que adoto como razões de decidir:

Ocorre que os pagamentos em espécie, com recursos contabilizados na forma do art. 39 da Resolução TSE nº 23.607/2019, devem-se limitar ao valor de R$ 606,00 (meio salário mínimo), vedado o fracionamento de despesas, que se caracteriza pela divisão artificial ou fraudulenta de um gasto, como forma de inseri-lo, em suas ocorrências isoladas, dentro do limite legal, mas que o supera, caso considerado como um todo. Nesse aspecto, as circunstâncias da contratação ou do serviço/produto fornecido indicam se há um fracionamento de despesa ou uma mera recorrência não planejada de gastos de pequeno vulto realizadas perante um único fornecedor.

Em relação aos pagamentos realizados para as atividades de militância e mobilização de rua, é inegável que houve superação do limite estabelecido para o pagamento em espécie, pois os pagamentos para as pessoas contratadas são superiores a meio salário mínimo, inclusive em relação aos dois pagamentos que beneficiaram Julia Sehiv, totalizando R$ 750,00, porquanto a continuidade da prestação de serviços para a campanha recomenda que a despesa seja considerada única e, portanto, avaliada pelo somatório dos valores dispendidos.

No tocante aos pagamentos realizados a título de gastos com alimentação, observa-se a existência de seis notas fiscais, emitidas por dois estabelecimentos comerciais, Restaurante Rudy e Restaurante Konzen. Individualmente, nenhuma das notas supera meio salário mínimo, o que ocorre, porém, se somadas.

Neste caso, entretanto, não se mostra tão evidente a ocorrência de fracionamento de despesas, senão a recorrência de gastos, espaçados entre si e sem um padrão de repetição. Ou seja, não é razoável entender que houve o fracionamento das despesas realizadas com o Restaurante Rudy em relação a um pagamento em 06.09.2022 e outro em 01.10.2022, pois nada indica que tal seria esperado ou que estaria planejada uma nova contratação após a primeira.

Em situação semelhante também se encontram os pagamentos para o Restaurante Konzen, em 02.09.2022, 06.09.2022, 21.09.2022 e 01.10.2022. Em todos esses casos (ID 45242727 - 45243038), os pagamentos referem-se a refeições realizadas no dia. Não se trata de uma única contratação do restaurante para fornecer alimentação para um número certo de pessoas por um número definido de dias, mas de sucessivas (quatro) contratações eventuais, ao longo de dois meses, que em vários outros dias foram dirigidas para outros fornecedores (v.g. ID 45242606, 45242617, 45242619, etc).

Nesse sentido, não nos parece caracterizado o fracionamento de despesas, restando válidos os pagamentos realizados em espécie, mediante utilização de fundo de caixa.

Portanto, devem ser mantidas apenas as irregularidades que totalizam R$ 3.250,00 (R$ 1.000,00 + R$ 800,00 + R$ 700,00 + R$ 360,00 + R$ 390,00).

 

Como bem ponderado no parecer, as contratações eventuais realizadas pelo candidato não devem ser consideradas fracionamento de despesa, considerada a pluralidade de fornecedores contratados para o mesmo objeto e a ausência de padrão de repetição.

Assim, considero superadas as máculas apontadas pelo órgão técnico em relação aos pagamentos realizados à RESTAURANTE RUDY e RESTAURANTE KONZEN, remanescendo, no ponto, as irregularidades quanto ao pagamento alcançado aos contratados para militância e mobilização de rua, no total de R$ 3.250,00.

Em não se verificando a utilização regular do Fundo de Caixa, restam configuradas a violação ao art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 e o uso indevido dos recursos públicos, os quais devem ser restituídos ao Tesouro Nacional.

Nessa linha são os precedentes da Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. IRREGULARIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO FUNDO DE CAIXA. FORMA INDEVIDA DE PAGAMENTO. CHEQUE NÃO CRUZADO. ART. 38 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. ALTO PERCENTUAL. FALHAS GRAVES. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou a prestação de contas, relativas ao pleito de 2020 e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

2. Utilização de Fundo de Caixa com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), ultrapassando o limite de 2% dos gastos contratados, conforme previsto na Resolução TSE n. 23.607/19. O Fundo de Caixa é uma reserva em dinheiro permitida aos partidos políticos e aos candidatos para que possam realizar despesas de pequena monta, desde que os valores não ultrapassem a importância de meio salário-mínimo, sem a possibilidade de fracionamento de despesas, e que não sejam superiores a 2% do total dos gastos contratados, vedada a recomposição, conforme disposto nos arts. 39 e 40 da Resolução TSE 23.607/19. Os recurso públicos indevidamente utilizados ou cuja destinação não tenha sido comprovada devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

[...]

(Recurso Eleitoral nº 060034017, Acórdão, Relator(a) Des. FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. CARGO DE VEREADORA. DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO DE RECEITAS PRÓPRIAS EXCEDENTES A 10% DO LIMITE REGULAMENTAR. APLICAÇÃO DE MULTA EQUIVALENTE A 100% DA QUANTIA EM EXCESSO. RECOLHIMENTO DE VALORES AO FUNDO PARTIDÁRIO. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA # FEFC. REALIZAÇÃO DE SAQUE ELETRÔNICO DA CONTA BANCÁRIA DE CAMPANHA E POSTERIOR PAGAMENTO EM ESPÉCIE. NÃO CARACTERIZADO PAGAMENTO DE DESPESA DE PEQUENO VULTO. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS BENEFICIÁRIOS DOS RECURSOS PÚBLICOS EMPREGADOS NA CAMPANHA. MANTIDA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. PERCENTUAL EXPRESSIVO DAS IRREGULARIDADES. INVIABILIZADA A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO INTEGRAL DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

[...]

3. Verificada irregularidade quanto ao pagamento de despesas com recursos do FEFC mediante a realização de saque eletrônico da conta bancária de campanha e posterior depósito em espécie na conta do fornecedor. A forma de pagamento dos gastos eleitorais encontra-se disciplinada no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Caracterizado o pagamento à margem dos preceitos enunciados no citado dispositivo, configurando irregularidade grave, apta a justificar a desaprovação das contas. Improcedente a alegação de que a importância da falha seria inferior ao valor considerado como de pequeno vulto, porquanto, segundo a dicção do art. 40 da Resolução TSE n. 23.607/19, a verba assim caracterizada não pode ultrapassar o limite de meio salário-mínimo. Ademais, para pagamento de despesa de pequeno vulto, devem, ainda, ser observados outros requisitos constantes do art. 39 do mesmo diploma normativo. Os gastos eleitorais, superando os limites individual e global da utilização do Fundo de Caixa, devem ser efetuados por intermédio das formas prescritas na legislação. Dessa forma, tendo havido o saque eletrônico dos valores, seguido de alegado pagamento em espécie, não é possível verificar se os prestadores de serviço informados na demonstração contábil foram efetivamente os beneficiários das verbas públicas empregadas em campanha. Ausente a devida comprovação da aplicação de recursos públicos por meio da identificação da contraparte no histórico das operações bancárias respectivas, impõe-se a obrigação de ressarcir ao Tesouro Nacional o montante da irregularidade, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

[...]

(Recurso Eleitoral nº 060027533, Acórdão, Relator(a) Des. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE)

 

A análise técnica apontou que parte das mesmas despesas quitadas com recursos em espécie também deixaram de observar a necessidade de comprovar que o fornecedor do serviço foi o destinatário dos recursos, contrariando o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, a análise técnica apontou que o prestador de contas transferiu recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para outros candidatos após o dia da eleição, o que afronta o previsto no art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19, já que os recursos não utilizados deveriam ser restituídos ao Tesouro Nacional.

Colho do parecer conclusivo (ID 45326597):

4.1.2. Neste item do Relatório de Exame foram apontadas transferências de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha aos candidatos abaixo relacionados após o dia da eleição, contrariando o disposto no art. 33 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

O candidato apresentou esclarecimentos e manifestações jurídicas ID 45315633, bem como comprovantes de transferência ID 45315679 a 45315682 que tecnicamente não alteram as falhas apontadas.

Conforme disposto no art. 17§3º da Resolução TSE nº 23.607/2019 os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha que não forem utilizados nas campanhas deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional. Neste sentido no dia 30 de setembro o prestador já tinha conhecimento que o montante de R$ 28.000,00, que fora repassado a outros candidatos conforme descrito na tabela acima, seria sobra de sua campanha eleitoral e que deveria ser devolvido ao Tesouro Nacional.

Cumpre esclarecer que a Comissão Nacional do Partido Socialista Brasileiro, através da Resolução CEN n. 001/2022, protocolado no TRE PC 0600627-77.2022.6.00.0000, definiu os critéros de distribuição dos recursos do FEFC, não mencionando repasses entre candidatos e orientado para que os recursos não utilizados fossem devolvidos ao Tesouro Nacional.

Conforme exposto, considera-se irregular o montante de R$ 28.000,00, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE 23.607/2019.

 

O candidato afirma que realizou a transferência de R$ 10.000,00 para VICENTE PAULO DE OLIVEIRA SELISTRE, e aquela para RODRIGO CONTE, no dia 30/09 (ID 45315633), o que é comprovado pelos documentos de ID 45315679 e 45315682.

Na mesma linha adotada no parecer ministerial, a irregularidade relativa a estas duas transações deve ser considerada superada. Confiram-se os argumentos expostos pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, os quais agrego como razões de decidir:

[...] foram apontadas transferências de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha a outros candidatos após o dia da eleição, contrariando o disposto no art. 33 da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tais transferências, totalizando R$ 28.000,00, foram realizadas em 03.10.2022 (2) e 17.10.2022.

O candidato sustenta que as duas transferências datadas de 03.10.2022 foram realizadas em 30.09.2022, mas somente vieram a ser efetivadas posteriormente em razão do horário bancário aplicado à operação pretendida (ID 45315679 e 45315682).

Embora as transações tenham se consumado no dia 03.10.2022, segunda-feira, ambas foram inseridas no sistema de pagamento da instituição bancária, via TED, no dia 30.09.2022. Caso o candidato tivesse optado por realizar as transferências por meio de PIX, nenhuma objeção lhes seria lançada. Assim, entendemos que podem ser consideradas regulares.

Quanto à transferência realizada em 17.10.2022, é inequívoca a destinação de saldo do FEFC não utilizado pelo candidato, em operação financeira posterior a 02.10.2022, ou seja, após a data das eleições.

É lícito o repasse de valores recebidos do FEFC para outros candidatos do partido, desde que ainda não encerrada a campanha. Permanecendo os recursos em sua conta após a data das eleições, e não sendo utilizados para quitar as obrigações contraídas no

período eleitoral, incide a regra do art. 50, §5º, da Resolução TSE nº 23.607/2019: Os valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) eventualmente não utilizados não constituem sobras de campanha e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional integralmente por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) no momento da prestação de contas.

Portanto, deve ser mantida a irregularidade da transferência dos recursos do FEFC no valor de R$ 11.000,00, uma vez que deveria ter havido o recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 50, §5º, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

 

Em relação à transferência realizada em 17/10, o prestador de contas sustenta que se trata de despesa atinente à quitação de débitos anteriormente assumidos, nos moldes da previsão legal do art. 33, § 1º, da Resolução n. 23.607/19, e junta declaração do recebedor dos recursos nesse sentido (ID 45328991 e 45315680).

O fundamento invocado não ampara as pretensões do prestador de contas. O mencionado parágrafo autoriza a “arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição”, ou seja, permite que candidatos arrecadem recursos, o que é diverso de realizar doação/transferência de recursos públicos. Embora o dispositivo permita que VICENTE PAULO DE OLIVEIRA SELISTRE, após o encerramento da campanha, busque recursos para cobrir gastos efetuados, não há qualquer permissão para que o prestador de contas disponha, mediante doação ou transferência, de recursos públicos que detenha e não tenham sido destinados oportunamente. Pelo contrário, o regulamento explicita que os saldos não utilizados do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC “não constituem sobras de campanha e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional integralmente por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) no momento da prestação de contas” (art. 50 e § 5º da Resolução TSE n. 23.607/2019).

Assim, a transferência do valor de R$ 11.000,00 é irregular e, nos termos do § 5º do art. 50 da Resolução TSE n. 23.607/19, o montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

 

Conclusão

Repriso que foram consideradas impropriedades/irregulares não sanadas pelo prestador de contas o atraso na entrega dos relatórios financeiros de campanha à Justiça Eleitoral, a utilização de recursos de origem não identificada (R$ 198,57) e a ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC em razão de pagamentos que não atenderam aos requisitos para utilização de Fundo de Caixa (R$ 3.250,00) e a transferência de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para outro candidato após o dia da eleição (R$ 11.000,00).

O montante das falhas perfaz R$ 14.448,57, valor que corresponde a 0,56% da receita declarada e se mostra insignificante frente aos R$ 2.574.500,00 geridos pelo candidato em sua campanha eleitoral.

Assim, como as incorreções não tem aptidão para comprometer a regularidade das contas, é caso de aprovação com ressalvas da contabilidade.

Como explicitado ao longo da fundamentação, a quantia correspondente a R$ 14.448,57 (quatorze mil, quatrocentos e quarenta e oito reais e cinquenta e sete centavos) deverá ser recolhida ao Tesouro Nacional.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela aprovação com ressalvas das contas de campanha de HEITOR JOSE SCHUCH, candidato eleito ao cargo de deputado federal nas eleições 2022, com fundamento no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino o recolhimento do montante de R$ 14.448,57 (quatorze mil, quatrocentos e quarenta e oito reais e cinquenta e sete centavos) ao Tesouro Nacional.