REl - 0600149-98.2020.6.21.0018 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/11/2022 às 09:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

DENER MAHLKE MENNA recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidato a vereador de Dom Pedrito nas eleições de 2020.

A decisão hostilizada entendeu haver as irregularidades na ausência de comprovação de despesas contratadas, no valor de R$ 1.200,00 (ID 44979436).

De forma específica, encontra-se no parecer técnico exarado na origem (ID 44979432) a ausência de cruzamento de dois cheques:

- Fornecedor Natali Vaz Guimarães, R$ 620,00, cheque n. 85005;

- Fornecedor Maurício Paz Vaz, R$ 580,00, cheque 850007.

O recorrente sustenta terem sido apresentados documentos cujo conjunto afasta a falha, e entende que o cruzamento de cártulas se trata de mero erro formal.

Não procede.

No que se refere ao pagamento de despesas em desacordo com a legislação, a análise das contas identificou o desconto de cheques dos quais não há registro de contraparte beneficiária, a indicar desobediência ao disposto na Resolução TSE n. 23.607/19, art. 38, inc. I:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

(grifei)

 

No ponto, o recorrente não fez constar esclarecimentos objetivos no recurso (por exemplo, documentação complementar contratual), mas apenas alegou que a documentação presente nos autos é suficiente para esclarecer as circunstâncias das despesas.

Ocorre, contudo, que se trata de documentos produzidos de modo unilateral pelo candidato, sem força probante e, portanto, inábeis a fazer comprovação de gastos em processos de prestação de contas, nos termos da legislação de regência. Não suprem a ausência de cruzamento dos cheques. Destaco que a comprovação da aplicação segura dos recursos públicos usados na campanha dos candidatos se faz por meio de documentos fiscais idôneos, corretamente preenchidos e movimentados conforme os ditames previstos nas normas eleitorais.

Colho, do parecer ministerial, oportuno e esclarecedor trecho que trata da necessidade de cruzamento de cheques, o qual expressamente agrego como razões de decidir:

Cumpre ressaltar que os meios de pagamento previstos no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos e, por consequência, da veracidade do gasto correspondente.

Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento, para que se possa apontar, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo, pois, necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi tal pessoa quem efetivamente recebeu o referido valor.

É somente a triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes.

Ademais, a obrigação para que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta), como se dá com o cheque cruzado (art. 45 da Lei n. 7.357/85), assegura que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

Finalmente, ao não ser cruzado o cheque, permitindo o saque sem depósito em conta, resta prejudicado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e gastos de campanha, uma vez que impossibilitada a alimentação do sistema Divulgacandcontas com a informação sobre o beneficiário, inviabilizando o controle por parte da sociedade. (Grifei)

 

E friso: a falha ensejaria, inclusive, a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, circunstância de inviável exame nesta ocasião tendo em vista o respeito ao princípio non reformatio in pejus e a existência de recurso exclusivo da parte do prestador de contas, de maneira que apenas o efeito declaratório da desaprovação é, admita-se, situação que resulta benéfica ao recorrente, considerado igualmente que o valor da irregularidade, R$ 1.200,00, compõe 37,6% das receitas totais declaradas (R$ 3.190,00), e é superior ao patamar que a jurisprudência do TSE compreende como de valor irrisório (R$ 1.064,10), utilizado como parâmetro para a aprovação com ressalvas.

DIANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.