PCE - 0602757-55.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/11/2022 às 10:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas.

Após exame da contabilidade e manifestação da parte, a Secretaria de Auditoria Interna do TRE-RS (SAI) identificou remanescentes vícios quanto à existência de doações e gastos não informados ocorridos em momento anterior à data de entrega das contas parciais; a devolução de sobras de campanha, na conta “outros recursos”; e, ainda que parcialmente sanadas, a omissão de despesas, as quais entende quitadas com recursos de origem não identificada (RONI).

As máculas remanescentes são abordadas pela Resolução TSE n. 23.607/19 nos arts. 47, § 6 (doações e gastos ocorridos em momento anterior à data de início para entrega das contas parciais); 50, §§ 1º, 2º, 3º e 4º (sobras de campanha); e art. 53, inc. I, al. “g” (omissão de despesas):

Art. 47. Os partidos políticos e as candidatas ou os candidatos são obrigadas(os), durante as campanhas eleitorais, a enviar por meio do SPCE à Justiça Eleitoral, para divulgação em página criada na internet para esse fim (Lei nº 9.504/1997, art. 28, § 4º) :

(…)

§ 4º A prestação de contas parcial de campanha deve ser encaminhada por meio do SPCE, pela internet, entre os dias 9 a 13 de setembro do ano eleitoral, dela constando o registro da movimentação financeira e/ou estimável em dinheiro ocorrida desde o início da campanha até o dia 8 de setembro do mesmo ano. ( Vide, para as Eleições de 2020, art. 7º, inciso V, da Resolução nº 23.624/2020 )

(...)

§ 6º A não apresentação tempestiva da prestação de contas parcial ou a sua entrega de forma que não corresponda à efetiva movimentação de recursos caracteriza infração grave, salvo justificativa acolhida pela justiça eleitoral, a ser apurada na oportunidade do julgamento da prestação de contas final.

 

Art. 50. Constituem sobras de campanha:

I - a diferença positiva entre os recursos financeiros arrecadados e os gastos financeiros realizados em campanha;

II - os bens e materiais permanentes adquiridos ou recebidos durante a campanha até a data da entrega das prestações de contas de campanha;

III - os créditos contratados e não utilizados relativos a impulsionamento de conteúdos, conforme o disposto no art. 35, § 2º, desta Resolução.

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos e a filiação partidária da candidata ou do candidato, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º O comprovante de transferência das sobras de campanha deve ser juntado à prestação de contas da(o) responsável pelo recolhimento, sem prejuízo dos respectivos lançamentos na contabilidade do partido político.

§ 3º As sobras financeiras de recursos oriundos do Fundo Partidário devem ser transferidas para a conta bancária do partido político destinada à movimentação de recursos dessa natureza.

§ 4º As sobras financeiras de origem diversa da prevista no § 3º deste artigo devem ser depositadas na conta bancária do partido político destinada à movimentação de "Outros Recursos", prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos.

 

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

I - pelas seguintes informações:

(..)

g) receitas e despesas, especificadas;

 

Em manifestação quanto aos apontamentos efetuados pela SAI no relatório preliminar, a prestadora, referente às doações percebidas em momento anterior à data inicial de entrega das contas parciais e não arroladas quando aberto o prazo, indicou que recebeu, por motivos que fugiram de sua alçada, os documentos referentes às doações em período posterior à abertura para entrega dos dados financeiros parciais. Quanto aos gastos ocorridos em período anterior ao definido para lançamento das movimentações contábeis, e não discriminadas quando da sua inauguração, alegou que não foram registrados, pois os documentos relativos às despesas não haviam sido repassados à sua assessoria contábil. Asseverou que, por equívoco, as sobras financeiras da conta “outros recursos" foram destinadas ao diretório nacional da agremiação, e não, conforme a regra eleitoral determina, ao órgão estadual do partido. Ao enfrentar a questão das despesas omitidas do acervo contábil, encontradas quando do cotejo entre as contas parciais e a prestação de contas final, bem como em confronto com a base de dados da Justiça Eleitoral, no intuito de ver sanadas as máculas, informou ter efetuado pagamento por serviços jurídicos com valores não oriundos da campanha e apresentou prestação de contas retificadora (ID 45329034).

Compulsando os autos, adianto que entendo não sanadas as falhas apontadas no parecer conclusivo da Secretaria de Auditoria Interna (SAI).

Tanto as doações quanto as despesas ocorridas em momento anterior ao período inicial de lançamento dos dados contábeis de campanha não foram, de fato, informadas pela prestadora quando da data de abertura para registro da movimentação financeira, nos termos do art. 47 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, as falhas remanescem, em que pese a argumentação expendida pela candidata, no sentido de que, ainda que por motivos alheios, não estava de posse dos documentos relativos às contribuições e aos gastos de campanha, visto que restou descumprida regra objetiva, disposta na norma eleitoral, a qual tem por fito permitir o acompanhamento e a transparência da contabilidade dos candidatos durante a corrida eleitoral.

Na mesma linha, mantido o erro quanto à destinação das sobras de campanha da conta “outros recurso”, pois, mesmo que a prestadora tenha apontado equívoco contábil que resultou na transferência dos valores ao diretório federal da agremiação em detrimento da emissão dos recursos ao ente partidário estadual, conforme preceitua o art. 50 da Resolução TSE n. 23.607/19, a parte não colacionou ao feito documento apto a demonstrar a adequação da operação financeira a regra eleitoral.

Friso, contudo, na linha do parecer da unidade técnica, que tais vícios, ainda que revestidos de caráter de impropriedades, não prejudicaram a verificação da origem das receitas e a destinação das despesas, uma vez que a análise financeira dos extratos bancários eletrônicos, disponibilizados pelo TSE, revelou informações necessárias para a aplicação dos procedimentos técnicos de exame.

Restam, por fim, os dispêndios omitidos pela prestadora, os quais vieram à tona quando do cotejo entre as despesas registradas na prestação de contas e a base de dados da Justiça Eleitoral, bem como do confronto entre o acervo contábil parcial apresentado e prestação de contas final, consubstanciados em nota fiscal de estorno relativa a débito em estabelecimento de combustíveis e gastos com honorários advocatícios.

Destaco, neste ponto, que a prestadora, após a emissão de parecer conclusivo da SAI, acostou ao feito petição contendo documentos aptos a sanar, em parte, as falhas.

O primeiro erro refere-se à nota fiscal de estorno não localizada, mencionada no ID 45329034, no valor de R$ 189,42. O aludido documento fiscal foi carreado ao feito, ID 45339486, entretanto, consta ao final da nota, em "DADOS ADICIONAIS", que o cancelamento do cupom se deu por duplicidade de emissão, todavia, não foi localizada, nos autos, a despesa no respectivo valor e data de lançamento, de modo que a glosa quanto ao ponto deve ser mantida.

A corroborar, segue trecho do percuciente parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

Após a emissão do parecer conclusivo, a candidata manifestou-se aduzindo não reconhecer a despesa em questão, e juntou aos autos documento auxiliar de nota fiscal eletrônica constando, no campo "natureza da operação", "estorno de nota fiscal não cancelada no prazo legal", e campo "INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES" o seguinte:

“NF-e referenciada - 4322 0992 3673 7400 0168 6500 0000 0334 2610 0182 0181 GASTO COM COMBUSTIVES EM CAMPANHA ELEIÇÕES 2022 DEPUTADO ESTADUAL Informações Adicionais de Interesse do Fisco: ESTA NOTA É DE CANCELAMENTO DO CUPOM FISCAL REFERENCIADO POIS FOI REALIZADO EM DUPLICIDADE COM O EMITIDO EM 16/09/2022 - NUMERO DE REFERENCIA 43220992367374000168650000000334261007160620 - N”

Em consulta aos extratos bancários da candidatura no site https://divulgacandcontas.tse.jus.br, verifica-se, na conta "outros recursos", a existência de um único pagamento realizado para o CNPJ da empresa emissora do cupom fiscal (Posto Boa Viagem 92.367.374/0001-68), no montante de R$ 5.999,98.

Em consulta às Notas Fiscais Eletrônicas, é possível constatar o agrupamento de diversos cupons fiscais de despesas realizadas junto ao referido fornecedor, e de nota fiscal em valor congruente com o apontado no extrato bancário.

Entretanto, nos limites do que foi possível verificar (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/21000164895
1/nfes), identificou-se apenas um cupom fiscal no valor de R$ 189,42, com data de 17.09.2022 (objeto do cancelamento), não constando nenhum outro documento de igual valor emitido em 16.09.2022 ou com o número de referência informado pelo documento auxiliar (ESTA NOTA É DE CANCELAMENTO DO CUPOM FISCAL REFERENCIADO POIS FOI REALIZADO EM DUPLICIDADE COM O EMITIDO EM 16/09/2022 - NUMERO DE REFERENCIA 43220992367374000168650000000334261007160620 – N).

Assim, em que pese o documento auxiliar de Nfe apresentado pelo prestador, não é possível afastar a realização da despesa e a irregularidade que lhe recai, ainda que de valor ínfimo, haja vista os fundamentos apresentados. (grifei)

 

Com efeito, não suprida a lacuna quanto ponto, não restou demonstrada a fonte dos valores utilizados para quitação do débito, configurando a utilização de recurso de origem não identificada, os quais deve ser recolhidos ao erário. 

O segundo, trata-se de honorários advocatícios, na ordem de R$ 5.000,00, constante na prestação de contas parcial, mas removido do acervo contábil quando da entrega da prestação de contas final, referido no ID 45335471. A nova tese da candidata, juntada após parecer, indica que  a unidade técnica entendeu que a despesa, em realidade, tratava-se de doação de serviços de assessoria, devendo assim constar na contabilidade. Todavia, relatou que a assessoria jurídica acabou sendo recompensada com valores não provenientes da campanha, motivo pelo qual o gasto foi removido da contabilidade.

Ocorre que as despesas com serviços de advocacia compõem a relação de gastos eleitorais, conforme disposto no § 3º, art. 35, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35  São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução:

(...)

§ 3º As despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade no curso das campanhas eleitorais serão consideradas gastos eleitorais, mas serão excluídas do limite de gastos de campanha.

§ 4º Para fins de pagamento das despesas de que trata o parágrafo anterior, poderão ser utilizados recursos da campanha, do candidato, do Fundo Partidário ou do FEFC.

 

Ou seja, os recursos utilizados para quitação das despesas não transitaram por conta bancária, de forma que inviabilizada a aferição de sua origem. Nesse norte, ausente comprovação da fonte dos valores destinados ao adimplemento dos débitos de campanha, resta configurado o uso de recursos de origem não identificada (RONI), prática vedada, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, que enseja o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

Dessarte, o montante irregular, somado, perfaz R$ 5.189,42, e representa 0,51% do total auferido em campanha, de sorte que aplicáveis ao caso os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

 

Diante do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de NEIVA TERESINHA MARQUES, candidata eleita para o cargo de deputada estadual pelo Partido Liberal, e determino o recolhimento da quantia de R$ 5.189,42 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.

É como voto, Senhor Presidente.