MSCiv - 0603595-95.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/11/2022 às 10:00

VOTO

Eminentes Colegas, a presente impetração combate ato judicial que indeferiu, em sede de tutela de urgência, pedido de suspensão de divulgação de pesquisa eleitoral (RS-04463/2020) realizada pelo INSTITUTO GAÚCHO DE PESQUISAS DE OPINIÃO – IGAPE, nome fantasia da empresa Eva Francieli de Souza Pereira – ME, nos autos da Representação n. 0600128-67.2022.6.21.0143, ajuizada em razão da realização de eleição suplementar em Cachoeirinha-RS.

A decisão combatida, que indeferiu a suspensão de divulgação da pesquisa, não foi modificada pela concessão parcial da liminar, que apenas deferiu o pedido de acesso ao sistema de controle interno, verificação e fiscalização da coleta de dados, o qual não fora apreciado na origem.

Com o intuito de evitar tautologia, reproduzo a decisão que apreciou o pedido liminar a fim de assentar os limites do cabimento do mandado de segurança em pedidos como o que aqui se examina e os motivos que evidenciaram a ausência de direito líquido e certo a amparar as pretensões dos impetrantes:

[...]

Decido.

O mandado de segurança é remédio constitucional colocado à disposição do jurisdicionado quando seu direito líquido e certo estiver sendo violado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, na esteira do que dispõe o art. 5º, inc. LXIX, da CF/88.

Na hipótese em exame, o mandamus é impetrado em face da decisão de 26.10.2022, proferida pelo Dr. Cássio Benvenutti de Castro, Juiz Eleitoral da 143ª Zona, nos autos da Representação n. 0600128-67.2022.6.21.0143, processo no qual se questiona a regularidade de pesquisa eleitoral, ou seja, em feito de caráter jurisdicional, consoante expressamente estipula o 16 da Resolução TSE n. 23.600/2019.

Excepcionalmente, é possível o conhecimento de mandado de segurança impetrado em face de decisão judicial nas hipóteses de manifesta ilegalidade e de grave atentado contra direito líquido e certo do impetrante, demonstrado, de modo inequívoco, na petição inicial.

Confira-se, neste sentido, o Enunciado n. 22 da Súmula do TSE: “Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial recorrível, salvo situações de teratologia ou manifestamente ilegais”.

Estabelecidas essas premissas, transcrevo a decisão impetrada:

DECISÃO

Vistos.

Trata-se de representação referente a pesquisa eleitoral (ID 110186011 – Petição Inicial Anexa (1 Impugnacao Pesquisa Cachoeirinha protocolo)).

Por ora, indefiro o pedido de tutela de urgência, pois a Justiça Eleitoral não realiza qualquer controle prévio sobre o resultado das pesquisas, tampouco gerencia ou cuida de sua divulgação (art. 10, § 1º, Res. TSE 23.600/2019).

Expeça-se mandado de citação, ou carta precatória, de ordem, para que o representado: EVA FRANCIELI DE SOUZA PEREIRA /IGAPE INSTITUTO GAUCHO DE PESQUISAS DE OPINIAO, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.º 37.524.035/0001-30, apresente defesa no prazo de 24 (VINTE E QUATRO) HORAS.

Apresentada a defesa ou decorrido o prazo respectivo, dê-se Vista ao Ministério Público Eleitoral para parecer no prazo de 01 (um) dia, findo o qual o processo deverá ser imediatamente concluso a este Magistrado para decisão.

A decisão impugnada não apresenta contornos ilegais, abusivos ou teratológicos a justificar sua suspensão na via do mandado de segurança.

Ainda que a Justiça Eleitoral realize certo controle sobre as pesquisas, em especial, em relação ao não atendimento das exigências contidas na Resolução TSE n. 23.600/2019 e no art. 33 da Lei nº 9.504/1997, a análise da tutela liminar postulada pelos impetrantes na representação é permeada por questões técnicas e controversas, o que tem aptidão para autorizar que a autoridade coatora postergue a decisão para possibilitar o exercício do contraditório.

De regra, as questões relativas a pesquisas eleitorais demandam análise estritamente técnica, o que inviabiliza que se extraia, na estreita via do mandado de segurança, uma aparência clara de violação da legislação de regência sem exame detalhado do caso e das circunstâncias envolvidas.

Direito líquido e certo, ademais, é aquele demonstrado de plano, o que aqui não ocorre: irregularidade no registro da empresa, cometimento de erros em levantamentos anteriores, ausência de informações sobre origem de recursos e dados de pessoal contratado, plano amostral tecnicamente inadequado, estratificação equivocada e informações dúbias sobre nível econômico dos entrevistados, falta de confiabilidade da empresa contratada, são todos elementos que demandam aprofundamento e contraditório.

Ausente, da mesma forma, a indicação objetiva do direito violado.

Se há, e pode haver, irregularidades na pesquisa objeto da representação, lá é que ocorrerá a manifestação jurisdicional para tanto – irregularidades essas, aliás, às quais a legislação eleitoral prevê multa, em contrapartida ao cometimento.

Assim, o pedido de modificação da decisão impugnada para que seja determinado aos responsáveis pela pesquisa n.º RS-04463/2020 que se abstenham de realizar qualquer divulgação de resultados deve ser indeferido.

Entretanto, considerando que aparentemente o juízo de 1º Grau deixou de se manifestar sobre o pedido de acesso ao sistema interno de controle constante na petição inicial da representação, tal requerimento deve ser analisado.

Nos termos do art. 13 da Resolução TSE n. 23.600/2019, defiro o pedido de acesso ao sistema interno de controle, verificação e fiscalização da coleta de dados da pesquisa impugnada, incluídos os referentes à identificação de entrevistadoras e entrevistadores e, bem como de, por meio de escolha livre e aleatória de planilhas individuais, mapas ou equivalentes, confrontar e conferir os dados publicados, preservada a identidade das pessoas entrevistadas.

Defiro também o acesso ao relatório entregue ao solicitante da pesquisa e ao modelo do questionário aplicado, para facilitar a conferência das informações divulgadas, cabendo à Secretaria Judiciária notificar a empresa responsável pela realização da pesquisa para disponibilizar o acesso aos documentos solicitados, nos termos do § 4º do artigo já citado.

DIANTE DO EXPOSTO, defiro em parte o pedido de tutela liminar tão somente para autorizar o acesso ao sistema interno de controle, verificação e fiscalização da coleta de dados da pesquisa impugnada e ao relatório da pesquisa, nos termos da fundamentação.

[...]

 

Nos termos da decisão que indeferiu o pedido de modificação da decisão impugnada, não se configurou perceptível a presença de direito líquido e certo a ser amparado no mandado de segurança, visto que este é perceptível de plano, enquanto as alegações formuladas pelos impetrantes demandam aprofundamento e contraditório.

Da mesma forma, não há manifesta ilegalidade ou teratologia do ato impugnado.

Como bem pontuou a Dra. Maria Emília Corrêa da Costa, Procuradora Regional Eleitoral Substituta, em seu parecer, as questões referentes às pesquisas eleitorais demandam análise estritamente técnica, incompatível com a via estreita do mandado de segurança. Colho trecho da bem-lançada manifestação:

Acerca do controle posterior das pesquisas eleitorais divulgadas, anota-se que, de acordo com os §§ 2 e 3º do art. 34 da Lei 9.504/97, a eventual comprovação de irregularidade nos dados publicados sujeita os responsáveis às penas de detenção e multa, “sem prejuízo da obrigatoriedade da veiculação dos dados corretos no mesmo espaço, local, horário, página, caracteres e outros elementos de destaque, de acordo com o veículo usado”.

Ademais, cabe lembrar que a representação disciplinada na Resolução-TSE 23.608/19, procedimento caracterizado pela celeridade, constitui o instrumento processual adequado de impugnação do registro ou da divulgação de pesquisas eleitorais. E não poderia ser diferente, considerando que as questões referentes às pesquisas eleitorais demandam análise estritamente técnica, incompatível com a via estreita do mandado de segurança.

Não custa ressaltar que o pleito suplementar em questão foi vencido pelo impetrante Cristian Wasem Rosa, da Coligação Cachoeirinha Um Novo Tempo, consoante se extrai de consulta ao Portal DivulgaCandContas do TSE. Conforme se noticiou, o candidato obteve 51,4% dos votos válidos.

Portanto, considerando os dispositivos mencionados, inexiste ilegalidade na decisão que deixa de realizar controle prévio sobre divulgação de pesquisa eleitoral, sem prejuízo da impugnação desta por meio de representação junto ao juízo da zona eleitoral, em se tratando de eleição municipal suplementar. Todavia, a segurança deve ser concedida em parte, para que o impetrante tenha acesso ao sistema de controle interno da pesquisa em questão, confirmando-se, assim, os termos da medida liminar deferida.

 

Assim, diante da ausência de manifesta ilegalidade do ato impugnado, é de ser confirmada a liminar que concedeu apenas o acesso ao sistema interno de controle, verificação e fiscalização da coleta de dados da pesquisa n. RS-04463/20 e ao relatório.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela concessão em parte da segurança, apenas para garantir o acesso dos impetrantes ao sistema de controle interno da pesquisa, confirmando a decisão liminar proferida.