AJDesCargEle - 0600276-22.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/11/2022 às 10:00

 VOTO

Analiso, inicialmente, a petição protocolada por Dari da Silva, na data de ontem, (23.11.2022) postulando a “impossibilidade de inclusão em pauta” de julgamento diante da falta do parecer da PRE, pela juntada de documentos e pela ausência dos vídeos dos depoimentos colhidos em audiência de instrução.

Sem razão.

Eventual ausência de parecer escrito da PRE não conduz à impossibilidade do julgamento do feito, tampouco gera qualquer nulidade.

Ademais, houve a apresentação do parecer, na data de ontem (ID 45359664).

Quanto aos documentos juntados e à inexistência de vídeos da audiência de instrução, as matérias estão preclusas, pois não suscitadas no momento oportuno.

Além disso, houve oportunidade da parte manifestar-se quanto à documentação e à gravação dos depoimentos das testemunhas, que se encontram nos autos, basta acessar o link:  https://drive.google.com/drive/folders/11Bc3rLXs9vysNlwglxFIMumOSqGaR1UN?usp=sharing (ID 45099174 e 45099175). Acrescenta-se que a alegação beira a litigância de má-fé, pois o procurador se encontrava presente na solenidade (ID 45099175, p. 6).

Assim, o feito está apto para julgamento.

Prossigo.

 Em preliminar, o requerente afirma que, na qualidade de 1º suplente (ID 45010514), possui legitimidade para requerer a decretação da perda do cargo eletivo, após expirado o prazo do partido, nos termos do § 2º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07.

 

Art. 1º O partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

§ 2º Quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da comunicação da desfiliação, efetivada pela Justiça Eleitoral nos termos do 25-B da Res.-TSE nº 23.596/2018, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subsequentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público Eleitoral.

 

Com efeito, é entendimento assente na jurisprudência da Corte Superior que o 1º suplente possui legitimidade ativa para propositura da ação de decretação de perda de mandato eletivo de mandatário infiel, eis que possui interesse jurídico.

Quanto ao prazo, a ação deve ser interposta pelo partido no prazo de 30 dias após o partido político ser comunicado da desfiliação pela Justiça Eleitoral. No caso, a comunicação da desfiliação ocorreu em 26.5.2022 (ID 45010520), assim, o prazo de 30 (trinta) dias para pedir a decretação da perda do cargo eletivo findou para o partido em 25.6.2022 (sábado). Na sequência, os 30 dias para o requerente transcorreriam somente em 25.7.2022, sendo a ação interposta em 11.7.2022, tempestiva (ID 45010511).

Ressalto que houve alteração pela Resolução TSE n. 23.668/21 da contagem do prazo decadencial, passando a fluir da comunicação pela Justiça Eleitoral da desfiliação, e não mais da comunicação da desfiliação ao partido.

Assim, a ação é tempestiva.

No mérito, o requerente invoca desfiliação do parlamentar requerido do partido pelo qual foi eleito, sem a ocorrência de hipótese de justa causa a amparar tal ato.

A justa causa capaz de justificar a desfiliação sem perda do mandado eletivo está prevista no art. 22–A da Lei n. 9.096/95:

Art. 22-A. Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito.

 Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses:

 I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;

II - grave discriminação política pessoal;

 III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.


 

Igualmente, figura como hipótese constitucional de justa causa a anuência do partido:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:

[...]

§ 6º Os Deputados Federais, os Deputados Estaduais, os Deputados Distritais e os Vereadores que se desligarem do partido pelo qual tenham sido eleitos perderão o mandato, salvo nos casos de anuência do partido ou de outras hipóteses de justa causa estabelecidas em lei, não computada, em qualquer caso, a migração de partido para fins de distribuição de recursos do fundo partidário ou de outros fundos públicos e de acesso gratuito ao rádio e à televisão.

 

Para procedência da Ação para Decretação da Perda de Cargo Eletivo, necessário se faz a verificação de dois fatores: a ocorrência de desfiliação do partido pelo qual foi eleito e a ausência de hipótese de justa causa.

Quanto à desfiliação, em sua contestação, o requerido junta documento de Comunicação de Desfiliação Partidária (ID 45024377) datado de 30.3.2022 e firmado pelo presidente municipal do partido (PL) pelo qual o requerido foi eleito e do qual desejava se desfiliar.

Assim, considerando a Comunicação de Desfiliação Partidária e a Certidão de ID 45010517, juntada aos autos, a desfiliação do sr. Dari da Silva é fato incontroverso.

Com relação à existência de justa causa, verifico que o requerido juntou aos autos Carta de Anuência, datada de 30.3.2022, e assinada pelo presidente do partido PL (ID 45024375), suscitando a hipótese de justa causa constitucional, com fulcro no art. 17, § 6º, da Constituição Federal.

A Carta de Anuência foi assinada por quem detinha legitimidade para firmá-la, o presidente partidário à época, sr. Alex Luis de Souza, sendo o período de vigência do seu mandato de 11.02.2022 a 10.02.2024, conforme documento extraído do SGIP (ID 45010518).

Ocorre que a condição de validade da Carta de Anuência é no sentido de que corresponda a ato da Comissão Executiva, e não apenas à vontade isolada e exclusiva do presidente da agremiação.

Destaco a previsão estatutária no sentido de que é da exclusiva competência colegiada das comissões executivas toda matéria do órgão partidário, consoante o § 3º do art. 6º do Estatuto.

Art. 6º - São órgãos do Partido nas respectivas áreas jurisdicionais:

I - de deliberação: as Convenções Municipais, Regionais e Nacional;

II - de direção: os Diretórios Municipais, Regionais e Nacional;

III - de ação parlamentar: as bancadas nas Câmaras Municipais, nas Assembléias e Câmaras Legislativas, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal;

IV - de execução: as Comissões Executivas Municipais, Regionais e Nacional;

V - de cooperação: os Conselhos de Ética, os Conselhos Fiscais e Políticos e outros que sejam criados, os Departamentos e os Movimentos, os Institutos e as Fundações.

(...)

 

3o - A Comissão a que se refere o 1º anterior se incumbirá de convocar, organizar e dirigir convenções e exercer, cumulativamente, as atribuições de órgão de direção e de execução, no âmbito de sua respectiva jurisdição.

 

O presidente do PL de Parobé, sr. Alex Luis de Souza, na oportunidade em que foi ouvido como informante, afirmou que houve uma reunião para discutir sobre a expedição da Carta de Anuência, para a qual todos os vereadores e filiados foram convocados. Contudo, não trouxe prova do alegado, resumindo-se a sustentar que a convocação foi realizada por telefone.

Em contrapartida ao depoimento do informante, o requerente trouxe aos autos duas declarações, registradas em cartório, de integrantes da Comissão Provisória do PL, vice-presidente (Celso Luiz de Abreu) e vogal do partido (Sidnei de Quadros dos Santos), afirmando não ter existido reunião para deliberar sobre a Carta de Anuência (Ids 45123549 e 45123553).

Muito embora o requerido tenha sustentado que a decisão foi tomada no âmbito colegiado da Comissão Executiva, tendo havido reunião deliberativa, da qual inclusive foi redigida a ata, não foram juntadas aos autos nem a convocação nem a aludida ata.

Assim, os elementos de prova indicam que a anuência com a desfiliação do vereador Dari da Silva foi concedida pelo presidente do partido em ato individual, sem a devida participação dos demais dirigentes partidários na deliberação.

Sobre a matéria, este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido de que a Carta de Anuência deve ser “qualificada” para autorizar a desfiliação do parlamentar:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE JUSTA CAUSA PARA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA SEM PERDA DO MANDATO ELETIVO. RESOLUÇÃO TSE N. 22.610/07. PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA INDEFERIDO. PRELIMINAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO. REJEITADA. MÉRITO. CARTA DE ANUÊNCIA DE DESFILIAÇÃO. ART. 17, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INVÁLIDA PARA O FIM PRETENDIDO. NÃO DEMONSTRADA ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL NAS DIRETRIZES DO PARTIDO. INEXISTÊNCIA DE GRAVE DISCRIMINAÇÃO PESSOAL. AUSÊNCIA DE QUAISQUER DAS HIPÓTESES DE JUSTA CAUSA PREVISTAS NO ART. 22-A DA LEI N. 9.096/95. PEDIDO IMPROCEDENTE.

1. Ação declaratória de justa causa para desfiliação partidária ajuizada por vereador eleito, em face de partido político, com base no art. 17, § 6º, da Constituição Federal e no art. 22-A da Lei n. 9.096/95. Pedido de tutela provisória indeferido.

2. Preliminar de extinção do processo rejeitada, sob o fundamento de que “persiste o interesse do requerente em ver reconhecida justa causa para a desfiliação sem perda do mandato, a despeito do escoamento do prazo de filiação para a eleição de 2022”.

3. Art. 17, § 6º, da Constituição Federal. Anuência da agremiação. Este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido de que, para aceitar o consentimento do partido como justa causa, a anuência deve ser ‘qualificada’, expressando uma declaração de que o partido não tem interesse no cargo eletivo. No caso, em que duas esferas partidárias comparecem nos autos e contestam os fatos narrados na inicial, refutando a validade da dita declaração, insurgindo-se contra o desligamento do requerente com manutenção do mandato, e no qual o parlamentar sequer se manifesta para se contrapor aos argumentos da defesa, inviável considerar atendida a hipótese de justa causa prevista no § 6º do art. 17 da Constituição Federal.

4. Mudança substancial e desvio reiterado de programa partidário. O alegado alinhamento da sigla às pautas do Presidente da República, bem como as sanções aplicadas ao Presidente de Honra do partido não configuram justa causa para a desfiliação partidária, pois, já em 2018 e no decorrer do ano de 2020, antes da eleição do requerente como vereador, tal circunstância era de sua ciência, inclusive de conhecimento público e notório com extensa divulgação midiática. Este Tribunal já assentou o entendimento de que o envolvimento de filiados de determinada agremiação em ações penais e processos envolvendo casos de corrupção, ainda que praticados por dirigentes partidários, não caracteriza desvio reiterado do programa do partido. Ademais, conforme assentado pelo Tribunal Superior Eleitoral, o pedido de desfiliação com base no art. 22-A da Lei n. 9.096/95 somente é procedente quando ocorre dentro de prazo razoável, o que não se verifica nos autos. Tampouco apontado qualquer ato pessoal de grave discriminação política pessoal quanto a si ou contra o exercício do seu mandato. Como já decidido pelo TSE, “a hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição”. Não verificada a ocorrência das hipóteses previstas no art. 22-A da Lei n. 9.096/95 para a declaração de justa causa a amparar a desfiliação

5. Pedido improcedente.

(TRE-RS, AJDesCargEle 0600029-41.2022.6.21.0000, julgado em 06.09.2022, Rel. Des. Gerson Fischmann.) (Grifo nosso)

 

Assim, não verifico, do exame dos autos, a hipótese prevista no art. 17, § 6º, da Constituição Federal, pois o requerido não trouxe aos autos prova suficiente a caracterizar justa causa para a desfiliação, sem a consequente perda do mandato eletivo.

Com essas considerações, inexistindo demonstração de hipótese de justa causa para desfiliação partidária, o juízo de procedência da ação é de rigor.

 

ANTE O EXPOSTO, rejeito a matéria preliminar e VOTO pela procedência do pedido, para o fim de decretar a perda do cargo eletivo de DARI DA SILVA, determinando a execução imediata do presente acórdão, nos termos do art. 10 da Resolução TSE n. 22.610/07.

Comunique-se à Mesa Diretora da Câmara de Vereadores de Parobé para o devido cumprimento, devendo assumir a respectiva cadeira o primeiro suplente do Partido Liberal (PL) eleito no pleito de 2020, conforme consta no resultado oficial divulgado pela Justiça Eleitoral.