REl - 0600564-32.2020.6.21.0099 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/11/2022 às 14:00

VOTO

Inicialmente, em razão do óbito, julgo extinto o feito em relação ao recorrido Edegar Krummenauer com fundamento no art. 485, inc. VI, do CPC.

Além disso, cumpre afastar a preliminar de revelia dos recorridos.

A matéria foi enfrentada pelo juízo a quo na sentença, tendo sido acertadamente apontado que, de acordo com a prorrogação de prazos prevista no art. 224, § 1º, do CPC, o prazo defensivo com encerramento na quarta-feira de cinzas de 17.02.2021 foi prorrogado para o dia seguinte, 18.02.2021, data da apresentação das contestações.

De igual modo, o julgador também reforçou que a preliminar resta afastada em virtude do aproveitamento das contestações tempestivamente apresentadas, em razão da pluralidade de réus, circunstância disposta no 345, inc. I, do CPC, não havendo que se falar em intempestividade das defesas ou revelia dos recorridos.

Portanto, afasto a matéria preliminar.

No mérito, passo ao enfrentamento do pedido de reforma da decisão quanto aos fatos apontados no recurso que impugnou somente a improcedência da condenação.

Anoto que a peça recursal se reportou de modo diverso à numeração dos fatos contida na inicial, mas que este voto manterá a numeração original: na inicial “3.2.1”, e no recurso “2.2.1”; na inicial “3.2.2”, e no recurso “2.2.2”; na inicial “3.2.3”, e no recurso “2.2.3”; na inicial “3.2.5”, e no recurso “2.2.4”; na inicial “3.2.6”, e no recurso “2.2.5”; na inicial “3.2.9”, e no recurso “2.2.6”; na inicial “3.2.10”, e no recurso “2.2.7”; na inicial “3.2.11”, e no recurso 2.2.8; na inicial “3.2.14”, e no recurso 2.2.9.

 

a) Fato “3.2.1” da inicial – Captação ilícita de sufrágio do eleitor Adriano da Silva de Oliveira praticada pelo advogado Edegar Krummenauer

A Procuradoria Regional Eleitoral entende que o recurso comporta provimento quanto a esse fato.

A alegação de captação ilícita de sufrágio praticada pelo advogado Edegar Krummenauer em favor dos recorridos está baseada em mensagens de áudio do profissional enviadas pelo aplicativo WhatsApp ao eleitor Adriano da Silva de Oliveira (ID 44866205, ID 44866206, ID 44866207), seu cliente em ação criminal, também registradas em Ata Notarial (ID 44866226).

Adriano narrou em juízo que devia a Edegar R$ 2.000,00 referentes aos honorários advocatícios da defesa no processo, e que o primeiro áudio se refere à cobrança do valor em troca do voto nos recorridos Elias Miguel e Tarciso.

O magistrado sentenciante também verificou que, de fato, Edegar atuava na defesa de Adriano ao tempo da gravação do áudio, nos autos da ação penal n. 113/2.14.0001317-9, e retirou referido processo em carga em 18.12.2019, efetuando sua devolução em 03.12.2020, quase um ano depois, e após a conversa com Adriano.

O vínculo do advogado com os candidatos foi perfeitamente delineado nos autos.

Conforme aponta o recurso, desde 2016, Edegar é advogado do Partido dos Trabalhadores (PT) de Trindade do Sul/RS, pelo qual foram eleitos os candidatos Elias Miguel Segalla e Tarciso Rosatto, por meio da Coligação “Rumo novo, com a força do povo”, composta pelo PT, MDB e PL. Foi ajuizada no ano da eleição, em 10.7.2020, a prestação de contas do PT de Trindade do Sul, PC n. 0600026-51.2020.6.21.0099, na qual atua o advogado.

Essa manifesta proximidade do advogado com o partido dos recorridos não fica afastada pelo simples fato de que, nos processos da eleição, a coligação dos candidatos foi representada pelas advogadas que atuam no feito, Jucelia Aparecida Segalla, Fernanda Lazzaretti e Geovana Pereira da Silva, pois a própria sentença consigna que Edgar, Fernanda e Geovana compareceram ao cartório no dia da eleição para confirmar a diferença de 4 votos no resultado da eleição.

Na primeira gravação, de 23.11.2020, degravada na Ata Notarial (ID 44866226) e na sentença, o advogado Edegar, aparentemente tratando da cobrança de dívida, aponta que Adriano tem dois lados para escolher, o “lado de aqui” e “o outro lado”. Então, o advogado afirma “eu quero que tu quite comigo, agora final do mês eu quero que tu quite comigo, de um lado ou do outro tu vai acertar, tá bom? Quer do lado de lá, vai, quer do lado de cá, vem, você que sabe, mas final do mês nós vamos acertar”.

Ou seja, o advogado ao mesmo tempo em que “chama” o eleitor para o “lado” que entende ser o melhor, ou mais vantajoso, não pede o voto, não cita candidato algum, e ainda afirma que o débito terá de ser pago por Adriano em qualquer situação. Veja-se:

“Bah Adriano! Tu não veio ontem cara, ta loco, estava marcado ai com o cara e coisa, não sei, se tu não quer beleza, mas dai me avisa tá. Mas assim ô se você quiser ficar do outro lado não tem problema nenhum, só que assim ô no final do mês eu quero o dinheiro tá?, se você tu não quer desse lado de aqui, tu pega do lado de lá, mas final do mês eu quero o dinheiro, tá, porque eu estou com o processo aqui, eu vou esperar final do mês eu vou entregar, eu te falei, dai o negócio em Nonoai agora reabriu o Fórum, vai andar, então assim, tu não quis cara, o cara, bha, ta loco, tinha até carne ai, hoje tu tava fazendo carne ai e, sei lá, mas assim, final do mês vem e dai se tu tiver mais dinheiro já fizemos um acerto ai, botamos as contas em dia e tranquilo tá e aproveite agora, que agora é o momento, que agora eu quero que tu quite comigo, agora final do mês eu quero que tu quite comigo, de um lado ou do outro tu vai acertar, ta bom, quer do lado de lá, vai, quer do lado de cá, vem, você que sabe, mas final do mês nós vamos acertar, porque você vai ter condições, é só você pedir que você vai ganhar, tá, que dai nós acertamos, zeramos as contas, beleza. Daqui para frente é só trabalho dai, beleza, ta parceiro. Abraço! Você podia estar comendo uma carninha agora né cara, báh! Os cara vieram aqui me buscar agora eu não posso ir, tu podia estar junto né... aaaa... você é louco”.

 

Analisei atentamente esse áudio e não verifico na fala do advogado os elementos caracterizadores da captação ilícita de sufrágio, sequer de forma implícita: doação, oferta, promessa ou entrega de bem ou vantagem em troca do voto, conforme estabelece o art. 41-A da Lei das Eleições:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 1o Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 2o As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 3o A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 4o O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Ora, na conversa Edegar deixa claro que cobrará os valores devidos por Adriano de qualquer forma, independentemente do lado escolhido, e sequer menciona o interesse no voto do eleitor, ou o conhecimento dos recorridos sobre a afirmação de que “abandonará”, caso Adriano não pague os honorários.

Em seu depoimento judicial, Adriano afirmou que Edegar teria falado que, se não votasse nos recorridos, abandonaria o processo, e teria lhe prometido serviço na Prefeitura.

Mas esse fato não se extrai das provas colhidas. No áudio, Edegar deixa claro que seu principal objetivo com a conversa é a busca do apoio político de Adriano, e não o seu voto. A fala “se tu não quer desse lado de aqui, tu pega do lado de lá” deixa claro que em nenhum momento Edegar está a tratar ou a se preocupar com o voto de Adriano, mas sim com “o lado” em que ele vai estar na campanha.

Em 2017, o TSE analisou exatamente essa quaestio iuris, nos autos do Recurso Especial Eleitoral n. 45867, da relatoria do Ministro Luiz Fux, que tinha como questão central a discussão sobre a compra de apoio político qualificar-se, ou não, juridicamente como captação ilícita de sufrágio.

No julgamento, a Corte Superior Eleitoral definiu que o aliciamento destinado a atrair o apoio político do eleitor não configura captação ilícita de sufrágio podendo tão somente caracterizar-se como abuso de poder econômico quando o fato implicar violação à igualdade de chances entre o candidato e à legitimidade e à normalidade do pleito. Transcrevo o precedente:

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PREFEITO. VICE-PREFEITO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. MANIFESTAÇÃO SOBRE PROVAS EM ALEGAÇÕES FINAIS. MÉRITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. COOPTAÇÃO DE LIDERANÇA POLÍTICA LOCAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. POSSIBILIDADE. DEBILIDADE DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO QUANTO À RESPONSABILIDADE DO PREFEITO. MERO BENEFICIÁRIO. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. SEGUNDO RECURSO NÃO CONHECIDO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO PARA AFASTAR A MULTA IMPOSTA AO RECORRENTE. PREJUÍZO DA AÇÃO CAUTELAR Nº 477-92/PI.1. A cooptação de apoio político, a despeito de não configurar captação ilícita de sufrágio, ostenta gravidade suficiente para ser qualificada juridicamente como abuso de poder econômico, sempre que, à luz das singularidades do caso concreto, se verificar que o acordo avençado lastreou-se em contrapartida financeira a vilipendiar os cânones fundamentais da igualdade de chances e da legitimidade e normalidade do prélio eleitoral.2. O reenquadramento jurídico dos fatos, por tratar-se de quaestio iuris, é cognoscível na estreita via do recurso especial eleitoral.3. No meritum causae, a) O candidato a vice-prefeito eleito firmou contrato com liderança política local para que esta desistisse da candidatura e apoiasse politicamente o Recorrente, em troca de nomeação no cargo de Secretário Municipal por todo o período do mandato vindouro, além de estabelecer multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em caso de inobservância do contrato; b) Como consectário, a assinatura do referido acordo qualifica-se juridicamente como prática de abuso de poder econômico, nos termos da atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (Precedente: REspe nº 19847/RS, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 4.3.2015).4. A causa de inelegibilidade decorrente da prática de abuso do poder econômico, nos moldes do art. 22, XIV, da LC nº 64/90, requer, para a sua incidência, que o beneficiário pela conduta abusiva tenha tido participação direta ou indireta nos fatos.5. No caso sub examine, a) A conduta narrada no acórdão regional (e. g. acordo para cooptação de lideranças) foi realizada exclusivamente pelo candidato a Vice-Prefeito, inexistindo qualquer conduta atribuída ao Prefeito, estando o seu conhecimento acerca do fato embasado em ilações e conjecturas. b) Consequentemente, a ausência de participação do Recorrente na prática do ilícito eleitoral obsta o reconhecimento da sua inelegibilidade.6. A interposição simultânea de recurso especial e embargos de declaração contra acórdão regional impede o conhecimento de novo recurso especial interposto pela mesma parte, ante a ocorrência da preclusão consumativa.7. O cerceamento de defesa resta afastado sempre que oportunizado à parte manifestar-se acerca das provas carreadas aos autos.8. In casu, inexistiu cerceamento de defesa, na medida em que, após a juntada de documento de ofício pelo magistrado, foi facultado à parte manifestar-se acerca dos fatos em alegações finais.9. Recurso especial parcialmente provido para afastar a multa imposta a José Francisco de Sousa, ficando prejudicada a Ação Cautelar nº 477-92/PI, vinculada a este processo.

(Recurso Especial Eleitoral nº 45867, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Data: 15/02/2018) (Grifei.)

 

No caso em tela, é inegável que a cooptação do apoio político de apenas um eleitor não se reveste de gravidade suficiente para caracterizar abuso de poder econômico.

Desse modo, considerando que a prova demonstra que o foco da conversa não se concentrou no interesse em oferta de vantagem em troca do voto, e que a cooptação de apoio político não configura, per se, captação ilícita e sufrágio, o recurso não comporta provimento nesse ponto.

O segundo áudio enviado pelo advogado Edegar a Adriano é bastante grave, pois ele foi realizado em 16.11.2020, um dia depois da eleição, e na sua fala Edegar afirma que comprou 8 votos com dinheiro próprio, o que teria sido fundamental para que os candidatos Elias Segalla e Tarciso Rossato vencessem as eleições municipais com diferença de apenas 4 votos.

A declaração está registrada na Ata Notarial do ID 44866226, cujos trechos cumpre transcrever, com grifos:

(…) Tudo que tu puder me ajudar tu sabe que eu vou te ajudar, só que agora na Prefeitura quem vai mandar sou eu, né véio, agora acabou com João Paulo, Uelinton e companhia, agora é eu né, o bicho vai pegar, ontem cheguei de lá nove e pouco da noite, tu acha que de graça não foi né véio, não ganhei nem um pila, cobrei nada deles, campanha inteira, não ganhei nem um real, ontem, comprei uns votinhos ali, oito votos, cem pila, ganhemos a eleição né véio, mas dinheiro meu, oitocentos pila que eu tinha em casa aí guardado pra gente se manter né, mas estou zerado também, mas não tem problema, só que assim, nunca vou esquecer de você Adriano, capaz homem, nós somos parceiros, tu viu as coordenadas que eu te dei aquele dia, tu ficou chateado comigo né, mas você viu no que deu, hã… isso aí véio, vem aí que pessoalmente eu te conto os brique, certo, um abraço, tudo de bom pra ti, tô por casa, a hora que tu quiser descer aí, fica tranquilo (…).

 

A fala é clara, sendo inverossímil a defesa apresentada por Edgar no sentido de que a afirmação de compra de votos foi realizada “em forma de bravata e fanfarronice” durante conversa com amigos em uma roda de aperitivo, “para se gabar perante os demais, sem contudo, ter na fala nenhum sentido de verdade ou prática de conduta ilícita”.

Ora, o conteúdo dos áudios encaminhados por Edgar a Adriano deixam clara a relação de proximidade e de amizade existente entre ambos, não havendo nenhum motivo ou circunstância que indicasse se tratar de uma mentira. Em verdade, na fala Edgar deixa claro que estava se gabando da sua atuação durante a coleta de votos para a campanha dos recorridos e, inclusive, da compra de 8 votos.

E apesar de todo esse cenário, que retrata conduta antidemocrática praticada por um advogado, é forçoso reconhecer que a sentença foi correta ao acolher a tese defensiva no sentido de que o fato não caracteriza captação ilícita de sufrágio, ou abuso de poder econômico, porque os eleitores que teriam vendido o voto para Edgar não estão identificados.

O entendimento de que, para a configuração do ilícito, a conduta deve ser dirigida a eleitor determinado ou determinável é questão sedimentada na doutrina (Zilio, Rodrigo López. Direito Eleitoral, 8.ed. JusPodivm: São Paulo, 2020, p. 729; Castro, Edson de Resende. Curso de Direito Eleiroral. 11.ed. Del Rey: São Paulo, 2022, p. 698) a partir da diretriz jurisprudencial de que somente com a identificação dos eleitores corrompidos será possível verificar se o fato envolveu a negociação personalizada de vantagem em troca do voto. Cito precedente:

ELEIÇÕES 2018. GOVERNADOR E VICE–GOVERNADOR. RECURSO ORDINÁRIO. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. AIJE POR CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DO PODER ECONÔMICO. JULGAMENTO CONJUNTO COM A AIJE Nº 0603024–56/DF. PROMESSAS DE RECONSTRUÇÃO DE CASAS DEMOLIDAS PELA AGEFIS E DE REFORMA EM CRECHES E ESCOLAS PÚBLICAS COM RECURSOS PRÓPRIOS. PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DIREITO DE PRODUÇÃO PROBATÓRIA E DE AUSÊNCIA DE CONTESTAÇÃO REJEITADAS. MÉRITO. CONFIGURAÇÃO DE PROMESSAS GENÉRICAS. INEXISTÊNCIA DE DISPÊNDIO DE RECURSOS PATRIMONIAIS. GRAVIDADE NÃO DEMONSTRADA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO. 

(…)

4. Captação ilícita de sufrágio. A jurisprudência do TSE exige, cumulativamente, para a configuração da captação ilícita de sufrágio, o cumprimento dos seguintes requisitos: (a) capitulação expressa da conduta no tipo legal descrito no art. 41–A da Lei nº 9.504/1997; (b) realização da conduta no período eleitoral; (c) prática da conduta com o especial fim de agir, consubstanciado na vontade de obter o voto do eleitor ou de grupo determinado ou determinável de eleitores; (d) existência de conjunto probatório robusto acerca da demonstração do ilícito, considerada a severa penalidade de cassação do registro ou diploma. 

5. Na espécie, as promessas feitas pelos candidatos a respeito de problemas fundiários e de educação possuem caráter genérico, o que, segundo o entendimento do TSE, afasta a incidência do art. 41–A da Lei nº 9.504/1997, por não se dirigirem a eleitores individualizados ou a grupo determinado ou determinável de eleitores, mas, sim, à população em geral. Ausente o especial fim de agir exigido para a configuração do ilícito. Precedentes.

6. Inexiste, nos autos do processo eletrônico, prova quanto à demonstração de que o candidato eleito ou correligionário de sua campanha tenha abordado eleitor, no local do evento, a fim de transacionar voto em troca do cumprimento das promessas realizadas. Ausente conjunto probatório robusto da comprovação do ilícito. 

7. Abuso do poder econômico. O abuso de poder se caracteriza "[...] pela utilização desmedida de aporte patrimonial que, por sua vultosidade, é capaz de viciar a vontade do eleitor, desequilibrando a lisura do pleito e seu desfecho [...]" (AgR–REspe nº 131–63/CE, rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27.11.2018, DJe de 11.12.2018). 

8. No caso concreto, não houve o dispêndio de recursos patrimoniais pelo candidato no que concerne às promessas realizadas ou à veiculação dos fatos na mídia, o que descaracteriza a prática de abuso do poder econômico, prevista no art. 22 da LC nº 64/1990. 

9. As condutas dirigidas ao público de, aproximadamente, 60 pessoas, ainda que tenham sido veiculadas na mídia, não foram graves o suficiente para ferir a lisura e a legitimidade das eleições, sobretudo quando verificada a dimensão do pleito, no qual compareceram e votaram, aproximadamente, 1,5 milhão de eleitores. 

10. Negado provimento ao recurso ordinário. 

(RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL n. 060299166, Acórdão, Relator(a) Min. Og Fernandes, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 215, Data: 26/10/2020) (Grifei.)

 

Além disso, em nenhum momento Edgar menciona o conhecimento ou a anuência dos candidatos em relação ao seu modo de agir, não havendo mínima prova nos autos sobre a questão além das alegações de Adriano, circunstância que atrai a aplicação do disposto no art. 368-A do Código Eleitoral: “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Portanto, concluo, contrariamente à pretensão recursal e ao parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, que o recurso não comporta provimento quanto a esse fato.

 

b) “3.2.2” – Captação e gastos ilícitos de recursos e abuso de poder econômico por meio de saques efetuados por familiares e cabos eleitorais dos recorridos

Os recorrentes afirmam ter sido comprovada a captação e gastos ilícitos de recursos e prática de abuso de poder econômico por intermédio de saques efetuados por familiares e apoiadores dos recorridos, com destinação dos valores à campanha eleitoral, restando infringido o art. 30-A da Lei das Eleições:

Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 107, de 2020)

§ 1o Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, no que couber. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

§ 2o Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

§ 3o O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

 

O fato de ter sido indeferido o pedido de quebra do sigilo bancário das pessoas envolvidas na imputação não trouxe prejuízo aos recorrentes porque foram ouvidas em juízo as pessoas indicadas, as quais juntaram aos autos extratos bancários pessoais, tendo sido devidamente apurada a alegação de cometimento do ilícito, a qual restou afastada.

Embora durante a instrução tenha sido verificada a ocorrência de saques de valores por familiares e apoiadores dos recorridos - Eliandro Segalla (filho do recorrido Elias Miguel Segalla), Maria Segalla (mãe de Elias Segalla), Luiz Barbieri (genro de Maria Segalla e tio de Eliandro Segalla) e Thales Rossatto (irmão do candidato Tarciso Rossatto) -, não houve prova alguma no sentido de que os recursos foram revertidos em favor da campanha.

Foi apurado que, no dia 03.11.2020, o filho do recorrido Elias Miguel Segalla, Eliandro Segalla, sacou R$ 40.000,00 de sua conta bancária, em espécie, na Agência do Sicredi de Trindade do Sul, para compra do veículo Caminhoneta S10.

A propriedade da camioneta foi informada na Declaração de Imposto de Renda prestada por Eliandro à Receita Federal do Brasil do exercício 2021 (ID 44866402, p. 5), não tendo sido apura qualquer ilegalidade na operação, merecendo ser reproduzida a análise probatória contida na sentença:

Ademais, o Sr. Eliandro Segalla é agricultor e movimenta constantemente sua conta bancária para custeio de suas atividades, manutenção da propriedade e atividades e subsistência da família, sendo que todos seus rendimentos e bens são devidamente declarados perante a Receita Federal do Brasil, conforme faz prova a DIRPF anexa”.

Eliandro juntou extrato bancário (ID 88772432); Cédula de Crédito Bancário 000921317-8 (ID 88772434); Declaração e Recibo de entrega da declaração de ajuste anual (ID 88772439 e 88772441).

 

Os recorrentes contestam a versão apresentada por Eliandro, afirmando não ter sido apresentada a placa do veículo, a prova do seu pagamento ou da sua aquisição, nem os extratos da sua conta bancária. Entretanto, o extrato foi acostado ao ID 44866399, observando-se que o valor de R$ 40.000,00 é parte de empréstimo pessoal de R$ 40.800,00 fornecido pelo banco, conforme contrato do ID 44866400.

As razões recursais em nada contribuem para demonstrar que o valor sacado se relaciona com a campanha eleitoral.

O mesmo se verifica quanto ao saque de R$ 40.000,00 realizado em 06.11.2020 por Maria Segalla, mãe de Elias Segalla e avó de Eliandro, o qual foi justificado porque a referida é proprietária de uma loja de confecções, de uma leitaria, e ainda possui, com seu marido, uma granja, gerando “alta movimentação mensal que exige o cumprimento de obrigações de pagamento por parte da manifestante”.

Tais informações foram comprovadas pelos documentos anexados ao ID 44866443, os quais foram refutados no recurso com o mero argumento de que “não é comum e nem contabilmente adequado, Excelências, utilizar-se da conta pessoa física para quitação de débitos de pessoa jurídica”.

Luiz Barbieri, genro de Maria Segalla e tio de Eliandro Segalla, confirmou ser sócio da granja de Maria Segalla e comprovou ter efetuado um saque de R$ 40.000,00, no dia 05.11.2020, para pagamento de despesas de maquinários e insumos utilizados em atividade rural, de acordo com documento emitido pela cooperativa Cotrisal, juntado ao ID 44866458, não tendo sido comprovado que o declarante faltou com a verdade quanto ao destino do valor.

Por fim, averiguou-se que Thales Rossato, irmão do candidato Tarciso Rossatto, realizou um saque de R$ 24.000,00 em 11.11.2020, tendo afirmado nos autos que o montante foi destinado ao custeio de sustento próprio e de sua família, mediante apresentação de extratos de diversas contas bancárias mantidas em seu nome e em nome de sua empresa, bem como de sua Declaração de Imposto de Renda (ID 44866471).

Além disso, Thales demonstrou que em data próxima, 26.10.2020, adquiriu um veículo JEEP Compass mediante pagamento de R$ 172.000,00 (ID 44866471), tendo o magistrado a quo corretamente concluído que, “como o Sr. Tales adquiriu um veículo de considerável valor zero km poucos dias antes do referido saque é crível que tenha tido despesas com emplacamento, IPVA, despachante e seguro total naqueles dias”.

Não há qualquer prova de que os valores tenham vínculo com a campanha dos recorridos.

Acerca dos fatos, os recorrentes se limitam a afirmar, em suas razões, que os saques têm valores idênticos, chamam a atenção e causam estranheza por caracterizarem coincidência de retiradas em espécie, mas não trazem elementos mais aprofundados de prova de que a operação tenha se dado no intuito de captar recursos ou realizar gastos ilícitos de campanha.

Aplica-se ao caso a regra do art. 373, inc. I, do CPC, segundo a qual o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito, sendo improcedente o pedido condenatório também nesse ponto.

 

c) “3.2.3” - Oferecimento e entrega de vantagem ao sr. Rui Carlos Viapiana, configurando abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio cometido por ELIAS MIGUEL SEGALLA em prol de sua própria candidatura e de Tarciso Rossatto

Os recorrentes alegaram que na semana que antecedeu ao pleito o proprietário de uma borracharia, Rui Carlos Viapiana, teria recebido dos candidatos Elias Miguel Segalla e Tarciso Rossatto a quantia de R$ 900,00 (novecentos reais), grampeados em material de campanha, para votar nos referidos candidatos, declarar apoio nas redes sociais, mediante gravação de vídeo e ainda realizar a busca de “briques” em prol da candidatura destes. Referem que briques é a denominação pela qual o abuso de poder econômico e a captação ilícita de sufrágio são conhecidos na cidade.

A prova do fato consiste em vídeos nos quais o sr. Rui Viapiana aparece contando dinheiro (R$ 900,00), que está grampeado em um “santinho” escrito “Segalla13”, em postagem de vídeo em rede social, em que o referido eleitor manifesta apoio ao candidato Segalla, em gravação ambiental de imagens de vídeo em que Rui conversa com um outro indivíduo e fornece detalhes de como teria agido para praticar captação ilícita de sufrágio durante a eleição, e em outras imagens, áudios, vídeos, com registro de ata notarial que demonstrariam a movimentação de pessoas na oficina de Rui nos dias que antecederam à eleição.

Ocorre que as provas apresentadas não demonstram o conhecimento dos recorridos sobre a tese acusatória, e a defesa arrolou testemunhas e apresentou diversos elementos de convicção que contradizem a versão da inicial.

Das testemunhas ouvidas, o principal depoimento é o de Sérgio Pazini, que esclareceu as circunstâncias em que gravado o vídeo no qual Rui segura a quantia de R$ 900,00 nas mãos. Sérgio contou que ele e Rui estavam com Edson Basso e que o valor se tratava de um pagamento seu para Edson em troca da prestação de serviço de retroescavadeira, mas que, antes de entregar a quantia à Edson, sem o conhecimento dos candidatos, grampeou um santinho de propaganda de Segalla no dinheiro e repassou o maço para Rui, que fez uma brincadeira, “entregando para Edson dizendo: Vote bem”. Sérgio “confirmou que foi ele mesmo quem gravou o referido vídeo, o qual foi postado num grupo da borracharia e acabou se espalhando”.

O caso não restou devidamente comprovado, merecendo acolhida a conclusão do juízo sentenciante de que “o fato de que no vídeo em que manifestou apoio a Elias Miguel e Tarciso, Rui estaria usando roupa semelhante (ou igual) aquela do vídeo em que aparece contando dinheiro é absolutamente irrelevante, inclusive porque se trata do uniforme de trabalho (camiseta com os dizeres Borracharia Via Piana). Tal roupa, a toda evidência é utilizada todos os dias, razão pela qual não se pode afirmar que os vídeos foram gravados na mesma data”.

Além disso, não merece relevância, como prova condenatória, a gravação de vídeo na qual um sedizende membro do Diretório do PT de Porto Alegre, cujo nome não é identificado, conversa com Rui Viapiana, que refere a existência de compra de votos nas eleições, pois o material não demonstra a atuação dos candidatos, ainda que na forma de anuência, com a acusação.

Ademais, os recorridos apresentaram o Boletim de Ocorrência n. 406251/20, no qual Rui Viapiana afirma ter sido ameaçado e sofrido agressão física devido à divulgação do vídeo e um atestado de atendimento médico prestado a Rui Viapiana pela médica Karize F. Da Rosa após as supostas ameaças.

Segundo a sentença, “ganha relevância a circunstância de que no dia 03/12/2020, ou seja, em data anterior ao ajuizamento da presente demanda, o requerido Rui registrou ocorrência policial relatando ter sido vítima de ameaças no dia 02/12/2020 por volta das 14hs, para que declarasse informações falsas sobre a compra de votos (ID 78768541)”.

As testemunhas defensivas Karize Fardin da Rosa, Jaimelizzi, Rosa Maria Balest e Ezequiel da Rosa Camargo também prestaram depoimento confirmando a existência de ameaças e gravações de vídeos com o propósito de criar fatos políticos contra os candidatos recorridos.

Destarte, entendo que a narrativa fática não restou suficientemente comprovada, merecendo ser mantida a sentença, cujas razões de decidir cumpre transcrever:

Dois dias após o fato narrado na ocorrência policial, ou seja, em 04/12/2020, o requerido Rui foi atendido na UBS do Município de Trindade do Sul pela médica Karize Fardin Da Rosa queixando-se de dor torácica anterior em esquerda e aumento de TA, conforme demonstra o atestado médico juntado no ID 78768540.

Quanto a tal atendimento, tem-se as declarações da médica Karize Fardin da Rosa a qual relatou que o requerido Rui chegou ao atendimento acompanhado da esposa relatando que há alguns dias não dormia direito e sentia dor torácica anterior esquerdo em aperto e com aumento de pressão. O paciente teria lhe dito que ficou assim depois de ter sido ameaçado de morte.

Cumpre ressaltar que o atendimento médico prestado pela Dra. Karize ao requerido Rui foi realizado em 04/12/2020 (ID 78768540), ou seja, é anterior ao ajuizamento da ação.

Importante aqui referir que as provas produzidas nos autos (em relação aos demais fatos) demonstram que outras pessoas teriam sido vítimas de tais ameaças, as quais teriam, em tese, sido praticadas, no mesmo período, por pessoas de Porto Alegre, que estiveram na cidade de Trindade do Sul, após as eleições. Nesse sentido anteriormente foram transcritos os depoimentos de Jaime Lizzi, Ezequiel da Rosa Camargo e Rosa Maria Balest, que foram arrolados pela defesa em relação a este fato da inicial (3.2.3).

Situação semelhante às ameaças alegadas pelo Sr. Rui Carlos Viapiana também teriam ocorrido com o Sr. João da Rosa (fato 3.2.13), com Sr. Irineu Filipini (fato 3.2.14) e com a Sra. Rosa Maria Balest (fato 3.2.15 da inicial), conforme se verá a seguir nesta decisão.

A Sra. Rosa Balest registrou ocorrência policial nº 1606/2020 no sentido de que teria sido coagida por pessoas estranhas a gravar um vídeo dizendo que seu voto foi comprado com telhas brasilit. A referida ocorrência teria sido registrada no mesmo dia da coação, às 15h53min (ID 78772659), sendo que a Sra. Rosa recebeu atendimento médico da Dra. Karize Fardin da Rosa às 14h51min do dia 02/12/2020 (ID 78772661).

Chama a atenção a coincidência no sentido de que a Sra. Rosa Balest teria sido ameaçada para gravar um vídeo, por pessoas com sotaque porto alegrense, no dia 02/12/2020, por volta das 9hs da manhã, conforme boletim de ocorrência nº 1606/2020 (ID 78772659), e, o Sr. Rui Carlos Viapiana também teria sido ameaçado por pessoa com sotaque porto alegrense, durante gravação de vídeo no mesmo dia 02/12/2020, por volta das 14hs, conforme boletim de ocorrência 406.251/2020 (ID 78768541).

Vale dizer que em diversos vídeos juntados com a inicial verifica-se os interlocutores tem sotaque típico da região metropolitana de Porto Alegre/RS e parecem comandar o teor dos relatos prestados pelas pessoas nas gravações, eis que ao final das mesmas dizem expressões como “foi”, “fechou”, “ótimo”.

No caso dos autos, o teor do vídeo (ID 55277908) juntado com a inicial deve ser valorado com cautela, uma vez que, produzido após o pleito eleitoral, quando já se tinha conhecimento sobre o resultado das eleições, restando evidente a real intenção de sua gravação, sendo crível que Rui Carlos Viapiana teria sido ameaçado no dia 02/12/2020, pelo conjunto da prova produzida (coerência nos depoimentos de Jaime Lizzi, Ezequiel da Rosa Camargo e Rosa Maria Balest), pelo agravamento do seu estado de saúde relatado pela testemunha/médica Karize, bem como considerando que outros moradores de Trindade do Sul referiram que foram visitados e ameaçados/coagidos por pessoas estranhas para gravar vídeos sobre compra de votos.

O Poder Judiciário tem instrumentos para facilitar a denúncia de ilícitos, como por exemplo, o aplicativo Pardal, que pode ser baixado por qualquer eleitor e utilizado para registro de fotos, áudios e vídeos, para encaminhamento à Justiça Eleitoral e ao Ministério Público. Ainda, caso uma pessoa queira noticiar um ilícito o MPE também pode ser procurado e havendo indícios e fundadas razões, certamente agirá, o que poderá ensejar a adoção de medidas judiciais que não deixam margem para dúvidas quanto a produção da prova cautelar/antecipada em futuras ações eleitorais.

De outro lado, devem ser valorados com cautela os elementos probatórios colhidos em circunstâncias no mínimo duvidosas, após o pleito, quando já sabido o resultado da eleição.

Ainda analisando o teor do vídeo registrado pelo sedizente membro do diretório do PT de Porto Alegre, calha referir que o fato do filho de Elias Miguel Segalla estar no referido estabelecimento comercial é irrelevante, na medida em que se trata de uma borracharia, razão pela qual ele poderia estar naquele local na condição de cliente do referido estabelecimento. Ademais, mesmo que estivesse no local sem fazer nada como disseram os requerentes, ainda assim não haveria que se suspeitar de tal circunstância, uma vez que em se tratando de cidade pequena, como no caso de Trindade do Sul, as pessoas, geralmente clientes que já frequentam o local nesta condição, têm o hábito de se ir aos locais para se reunir com amigos, conversar, tomar chimarrão, seja qual for o estabelecimento comercial (oficina, borracharia, lavagem de carros, etc).

Por outro lado, no que se refere à movimentação no estabelecimento comercial de Rui (Borracharia), destaca-se que não foi feito qualquer registro de ocorrência em relação a tal fato, sendo que tal notícia só foi informada à Justiça Eleitoral por ocasião do ajuizamento da presente demanda, o que só veio a ocorrer após o resultado das eleições.

Contudo, conforme amplamente divulgado na rede mundial de computadores, e em outros meios de comunicação o Tribunal Superior Eleitoral desenvolveu aplicativo que permite a fiscalização na época da campanha eleitoral “em qualquer esquina”. Tal aplicativo por ser baixado gratuitamente nas lojas da Google e da Apple, é fácil de usar e permite anexar fotos, vídeos e áudios, possuindo atalho para abrir a câmera do dispositivo para bater a foto no momento exato em que a denúncia é feita. Feita a denúncia, o Ministério Público Eleitoral analisa a pertinência da notícia e, havendo características de um crime, ajuizará a ação pertinente perante a Justiça Eleitoral.

Notícia sobre aplicativo Pardal: https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2020/Novembro/aplicativo-pardal-auxilia-cidadao-em-denuncias-de-irregularidades-nas-eleicoes

Contudo, estranhamente nenhuma denúncia foi feita através do referido aplicativo, aqui cabendo mencionar que não se pode alegar desconhecimento sobre tal possibilidade na medida em que houve intensa divulgação sobre referido instrumento de controle disponibilizado ao eleitor. Ainda, há que se ter em conta que ambos os partidos são assessorados por advogados que tem pleno conhecimento acerca da existência do referido aplicativo.

Ademais, nota-se que os áudios acostados com a inicial, em relação ao fato ora analisado, foram enviados através do WhatsApp, de modo que, se os interlocutores possuem facilidade com outros aplicativos também o teriam com o Pardal.

No que tange à existência de movimentação na borracharia de propriedade de Rui Carlos Viapiana, destaca-se que não restou demonstrado nos autos a que título ocorreu a junção de vários veículos no local.

Contudo, ainda que estivesse ocorrendo algum evento de cunho político, o TSE já decidiu que a simples realização de um evento, ainda que com oferta de comida e bebida, na qual esteja presente candidato, não caracteriza, por si só, a captação ilícita de sufrágio, embora seja vedada a realização de propaganda eleitoral por meio de oferecimento de dádiva ou vantagem de qualquer natureza (recurso Ordinário 1.803 – Rel. Min. Marcelo Ribeiro – j. 04.08.2009).

“[...] Captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei nº 9.504/97). Descaracterização. Deputado federal. Candidato. Oferecimento. Churrasco. Bebida. [...]. 3. Para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, é necessário que o oferecimento de bens ou vantagens seja condicionado à obtenção do voto, o que não ficou comprovado nos autos. 4. Não obstante seja vedada a realização de propaganda eleitoral por meio de oferecimento de dádiva ou vantagem de qualquer natureza (art. 243 do CE), é de se concluir que a realização de churrasco, com fornecimento de comida e bebida de forma gratuita, acompanhada de discurso do candidato, não se amolda ao tipo do art. 41-A da Lei nº 9.504/97. [...]”

(Ac. de 18.3.2010 no RO nº 1522, rel. Min. Marcelo Ribeiro; no mesmo sentido o Ac. de 18.3.2010 no RCEd nº 766, rel. Min. Marcelo Ribeiro; o Ac. de 18.2.2010 no RCEd nº 761, rel. Min. Marcelo Ribeiro e o Ac. de 6.10.2009 no RO nº 2311, rel. Min. Marcelo Ribeiro.)

Os elementos/requisitos do artigo 41-A da lei 9504/97 não restaram comprovados, tais como a conduta praticada por candidato, o verbo núcleo do tipo (doar/oferecer/prometer/entregar ao eleitor), o objeto material (de bem ou vantagem pessoal).

Ainda que fosse verídica a suposta compra de votos por parte de Rui Carlos Viapiana, trata-se de alegação genérica, não há prova robusta de participação dos candidatos Elias e Tarciso, não se sabe quem seriam os supostos eleitores corrompidos e não se tendo prova do pedido de voto e da efetiva entrega da vantagem financeira, a fim de se ter todos os requisitos do art. 41-A da lei das eleições.

Em analogia ao processo penal (CPP, art. 158) caso se considera-se que Rui Viapiana teria confessado a compra de votos (no vídeo anexado aos autos), a sua confissão não supriria a necessidade de prova da materialidade, devendo ser analisado todo o contexto/conjunto probatório.

A propósito, convém destacar que o TSE, diferentemente do entendimento seguido alguns anos atrás, atualmente, vem exigindo a identificação dos eleitores corrompidos na compra de votos, o que no entendimento deste magistrado se aplica tanto a ilícitos criminais quanto civil-eleitoral:

RECURSO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DO ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IDENTIFICAÇÃO DOS ELEITORES. AUSÊNCIA. PROVIMENTO.

1. "Na acusação da prática de corrupção eleitoral (Código Eleitoral, art. 299), a peça acusatória deve indicar qual ou quais eleitores teriam sido beneficiados ou aliciados, sem o que o direito de defesa fica comprometido" (RHC nº 45224, Rel. Min. Laurita Vaz, Rel. designado Min. Henrique Neves, DJe de 25.4.2013).

2. In casu, ausente a adequada identificação do corruptor eleitoral passivo, fato esse que impede a aferição da qualidade de eleitores, como impõe o dispositivo contido no art. 299 do Código Eleitoral, devem ser reconhecidas a inépcia da denúncia e a ausência de justa causa para submissão do paciente à ação penal.

3. Recurso conhecido e provido para concessão do pedido de habeas corpus negado na origem.

(Autos nº 0000133-16.2013.6.24.0000. RHC - Recurso em Habeas Corpus nº 13316 - IÇARA – SC. Acórdão de 17/12/2013. Relator(a) Min. Luciana Lóssio. Publicação:DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 34, Data 18/02/2014, Página 95-96)

 

RECURSO EM HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ELEITORAL. CÓDIGO ELEITORAL. ARTIGO 299. DENÚNCIA. REQUISITOS.

1. A denúncia deve conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias.

2. Na acusação da prática de corrupção eleitoral (Código Eleitoral, art. 299), a peça acusatória deve indicar qual ou quais eleitores teriam sido beneficiados ou aliciados, sem o que o direito de defesa fica comprometido.

3. Recurso em habeas corpus provido.

Autos nº 0000452-24.2012.6.13.0000. RHC - Recurso em Habeas Corpus nº 45224 - JUIZ DE FORA – MG. Acórdão de 26/02/2013. Relator(a) Min. Laurita Vaz. Relator(a) designado(a) Min. Henrique Neves Da Silva. Publicação:DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 77, Data 25/04/2013, Página 55

 

No caso em exame inexiste identificação de quem seriam os eleitores que supostamente teriam sido corrompidos por Rui Carlos Viapiana. Assim, ausente um dos requisitos do art. 41-A da lei das eleições.

Reitero que os autores não arrolaram nenhuma testemunha quanto ao fato 3.2.3 da inicial. Assim, se baseiam apenas no vídeo gravado pelo sedizende membro do Diretório do PT de Porto Alegre (ID 55277908) em circunstância no mínimo duvidosa, sendo crível que Rui Viapiana, assim como outros moradores de Trindade do Sul foram ameaçados para realizar gravações.

Não há provas cabais de que os requeridos Elias e Tarciso tenham concorrido com Rui Viapiana em compra de votos.

Segundo já decidiu o TSE: “para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, exige-se prova robusta de pelo menos uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97, da finalidade de obter o voto do eleitor e da participação ou anuência do candidato beneficiado” (RESPE nº 36335/AC – j. 15/02/2011).

Cito o seguinte precedente da jurisprudência do TSE sobre prova frágil baseada apenas em gravação ambiental:

“[...] Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei 9.504/97. [...] Gravação ambiental. Prova robusta. Ausência. [...] 3. O TRE/MG concluiu pela configuração da prática de captação ilícita de sufrágio, embasando-se, além do depoimento pessoal do candidato ao reconhecer sua voz (mas negando a prática ilícita), em uma única prova consistente em gravação ambiental, sem efetivamente declinar as circunstâncias da produção desse elemento probatório e destacando pequeno trecho de diálogo, de teor vago sobre eventual cooptação de voto, do qual não é possível inferir, com segurança, a existência da conduta ilícita. 4. ‘A configuração da captação ilícita de votos possui como consequência inexorável a grave pena da cassação do diploma, pelo que se exige para o seu reconhecimento conjunto probatório robusto, apto a demonstrar, indene de dúvidas, a ocorrência do ilícito e a participação ou anuência dos candidatos beneficiários com a prática’ [...]”

(Ac. de 10.4.2019 no REspe nº 69233, rel. Min. Admar Gonzaga; no mesmo sentido o Ac. de 26.6.2018 no AgR-RO 224081, rel. Min. Rosa Weber.)

 

Registra-se, por fim, que além dos áudios e vídeos que instruíram o ajuizamento da presente demanda (os quais, torno a repetir, só chegaram ao conhecimento da Justiça Eleitoral com o ajuizamento desta ação), não foram produzidas outras provas para demonstrar a prática da captação ilícita de sufrágio, de sorte que não há como reconhecê-la.

Desta feita, a prova produzida nos autos é insuficiente para demonstrar a prática de captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico em relação ao fato 3.2.3 da inicial.

 

d) “3.2.5” - Coação a eleitores e oferecimento e entrega de vantagem à sra. Leonilde Cezimbra de Oliveira

A inicial alega que, conforme o Boletim de Ocorrência Policial n. 1523/2020/151335, um dia antes do pleito, o policial aposentado Luir de Souza, sogro do candidato a vereador do MDB Dinamar da Rosa (genro de Luir), compareceu à residência do eleitor Itacir Cavalheiro da Silva e de sua esposa Leonilde Cezimbra de Oliveira, ocasião em que ofereceu e entregou vantagem financeira para Leonilde, com a finalidade de obter os votos do casal em prol dos candidatos Elias e Tarciso e também do candidato Dinamar.

Segundo os recorrentes, Itacir confessou apoio aos candidatos da oposição, razão pela qual Luir e seu filho Vinicius teriam retornado à sua casa armados e desferindo ameaças porque o eleitor já havia recebido valores em troca do voto nos candidatos recorrentes.

Todavia, assiste razão ao magistrado singular ao concluir pela insuficiência da prova para o juízo de procedência da ação. De igual modo, conforme concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral, os fatos são graves, mas “não aportou no caderno processual nenhuma outra prova material comprobatória dos fatos narrados e, além do que, houve a desistência de oitiva da testemunha Marcos Dilamar Padilha e Itacir e Leonilde, supostas vítimas do ilícito, não compareceram na data aprazada para sua oitiva”.

Demais disso, também aqui não há qualquer tipo de conduta, conhecimento ou anuência dos então candidatos Elias e Tarciso em relação aos supostos fatos.

 

e) “3.2.6” - Coação a eleitores praticada por Volmir Antônio da Silva (alcunha Coração), para tentativa de impedimento de exercício do sufrágio contra a sra. Irma de Carvalho Oliveira

Narra a inicial que o sr. Volmir Antônio da Silva, conhecido como “Coração”, tentou impedir que a eleitora Irma de Carvalho Oliveira, possivelmente apoiadora dos candidatos adversários dos recorridos, acessasse seu local de votação no dia da eleição, conforme comprovaria um vídeo juntado aos autos.

Tal fato também não está devidamente comprovado.

Nos termos da decisão recorrida, “há de se destacar que em razão do voto ser secreto, não se sabe qual em qual das chapas majoritárias a Sra. Irma votou. A prova produzida revelou que a confusão envolvendo Volmir (vulgo coração) se deu do lado de fora da escola e na sequência a Sra. Irma entrou e foi votar”.

O depoimento das testemunhas arroladas para comprovar a alegação foi recebido com reservas porque as testemunhas Leidiane Ferreira Gomes, Naiara Michael dos Santos e Sonia Maria Favaretto são apoiadoras da campanha dos recorrentes, tendo sido verificado que a testemunha Naiara, a qual filmou os fatos, confirmou que a eleitora Irma entrou na escola e exerceu o voto.

A par disso, o juiz de primeiro grau apontou que as testemunhas afirmaram ter conhecimento da prática de compra de votos durante a eleição a partir de “diz que me disse”, boatos, e que “a prova produzida não se extrai qualquer indício de que os candidatos Elias e Tarciso tenham qualquer participação ou anuência quanto ao fato”.

Nesse ponto, transcrevo as razões da sentença:

Para comprovar tal circunstância, juntaram o vídeo gravado no momento em que, em tese, Volmir teria tentado impedir Irma de votar (ID 52277937).

Os requerentes arrolaram as testemunhas/informantes Leidiane Ferreira Gomes, Naiara Michael Dos Santos, Sonia Maria Favaretto. Já os requeridos arrolaram o informante Rodrigo Barea.

A testemunha SONIA MARIA FAVARETTO disse que presenciou os fatos envolvendo Irma de Carvalho e Volmir Antonio da Silva, Coração. Disse que estava trabalhando na frente da escola quando Dona Irma e uma outra mulher chegaram para votar. Logo em seguida, chegou Coração e segurou Irma pelo braço para tentar impedi-la de votar. Disse que pegou o telefone para acionar a Brigada Militar, quando Coração passou a ofendê-la, gritando palavras de baixo calão, chamando-a de lixo. Coração dizia para Irma “não, depois nós vamos conversar, lembra que nós pensamos, que nos tínhamos combinado com o Segalla, depois a gente conversa isso, não vai agora”. Disse que Coração não ameaçava Irma, mas tentava impedi-la de votar naquele momento, que era para ir mais tarde, conforme tinham combinado com o genro dela. Referiu que não interviu, apenas pegou o telefone para ligar para a Brigada Militar. Junto com Coração estava Rodrigo, que é seu ex-marido. Contou que outras pessoas estavam presentes no local, sendo que Rodrigo segurou Coração pelo braço, por várias vezes, para que ele não fizesse o que fez. Afirmou que Coração estava alterado. Disse ter ouvido conversas de compra de votos, referindo que chegou a presenciar, pois mora em frente a casa de Clayton (filho de Segalla), muita movimentação de pessoas que entravam e saiam da casa, citando Tarciso, Edegar, Rui Viapiana, João Frandaloso e Jasieli, definindo como sendo uma movimentação anormal. Contou que Rodrigo trabalha na prefeitura como CC e estava apoiando Segalla. Questionada, disse que Rodrigo trabalhou alguns períodos na Prefeitura Municipal de Trindade do Sul, como motorista no transporte de alunos escolares. Disse acreditar que Irma não é uma pessoa normal, acha que ela tem alguma deficiência. Referiu que acredita que Irma tenha conseguido entrar para votar, mas não sabe com exatidão. Indagada, disse que imaginava que a movimentação na casa de Clayton, filho de Elias Miguel, fosse compra de votos, referindo que “todo mundo falava que tava tendo compra de votos, era uma falação na cidade inteira, que tavam comprando voto”. Contou que viu Segalla chegando com uma caminhonete e tinha um outro carro do lado da rua, sendo que Segalla teria passado um envelope para o caroneiro que, por sua vez, repassou para a pessoa que estava no outro carro. Seu namorado teria gravado um vídeo desse acontecimento, chegando a postar referido vídeo, mas apagado no dia seguinte a seu pedido.

A informante LEIDIANE FERREIRA GOMES (filiada ao PSDB que compõe a coligação autora) contou que no dia das eleições presenciou o fato envolvendo a Sra. Irma de Carvalho e o Senhor Volmir Antonio da Silva, o Coração. Disse que tinha ido votar e dona Irma teria lhe pedido informações se votava no local, pois ela tem problemas, razão pela qual a conduziu até a porta para ver se era ali que ela votava, mas Coração veio e lhe pegou pelo braço e não quis deixar Irma entrar. Disse que Coração puxou Irma pelo braço dizendo “ele puxou ela pelo braço, dizendo que ela tinha que ir para casa, né, e daí me empurrava eu, daí eu falei para ele, a única coisa que eu disse pra ele, que ele não tinha direito de empurra ela e nem de me impedir de levar, que eu ia levar ela lá só para ela pegar informação se ela votava ali ou não, e ela se agarrou em mim, daí começou chorar, né”. Referiu que estava no local, pois ia votar. Disse que tinha muitas pessoas no local, sendo que Volmir ameaçou de atear fogo em sua casa e xingou os demais presentes. Afirmou que Coração estava trabalhando (cabo eleitoral) para Elias, mas enquanto falava com Irma não mencionou o nome do referido candidato. Disse que Coração ameaçou de lhe bater, e puxava Irma, a qual segurava em seu braço, só chorava e dizia que não iria com ele. Questionada, disse que fez campanha para Eliane, só para ela, mas para Prefeito, não fez campanha. Confirmou que fez postagens no facebook, referindo que não sabe se isso é campanha. Disse não saber se Irma votou naquele momento e não sabe para onde ela foi depois do que ocorreu.

A informante NAIARA MICHAEL DOS SANTOS (filiada ao PSDB que compõe a coligação autora) confirmou que presenciou os fatos envolvendo Irma de Carvalho e Volmir Antonio da Silva (Coração) no dia das eleições, dizendo ter sido ela quem fez a filmagem. Contou que Irma estava indo votar e, como tem uma deficiência, tem direito a um acompanhante, sendo que Coração tentou impedi-la de ir votar. Afirmou que Coração tentou puxar Irma, falando que era para ir na casa do genro. Disse que Coração teria dito que era para Irma ir na casa do genro, pois Segalla estaria lá para conversar com ela. Assinalou que no momento que viu que estava sendo filmado, Volmir teria dirigido palavras de baixo calão às pessoas que estavam ali. Disse que ninguém tentou intervir, apenas a moça que estava acompanhando Irma. Referiu que no mesmo dia, Itamar Basso, que era candidato a vereador, pediu para apagar o vídeo para evitar problemas. Disse que Itamar é do partido do Segalla. Afirmou que ouviu falar sobre compra de votos no município de Trindade do Sul, sendo que em relação aos candidatos de Segalla e Tarciso aconteceu bastante. Referiu como sendo os principais cabos eleitorais: Parlamentar, Itamar Basso, Coração, Edegar Krummenauer e Rui Viapiana. Confirmou que trabalha na APAE e Irma tem deficiência mental. Disse que Irma estava fora do colégio quando Coração tentou impedi-la de votar, mas que depois ela entrou no local de votação.

O informante RODRIGO BAREA (filiado ao PTB que compõe a coligação autora) referiu que estavam caminhando, fazendo campanha e viram que Dona Irma estava sendo levada, induzida, para a votação. Esclareceu que é motorista da APAE e conhecia Irma, pois a mesma é aluna daquela instituição. Referiu que Irma “não tem muita noção”. Disse que “Coração”, que também é conhecido de Irma e da filha dela, tentou impedir que a levassem para votar, pois ela iria com a família, com a filha. Afirmou que mesmo assim conseguiram levar ela para dentro para votar. Mencionou que Leidiane, que trabalhou na campanha eleitoral, conduziu Dona Irma até o portão. Referiu que “Dona Irma” é uma pessoa inocente, que o que falar ela aceita, que ela “não tem uma noção do que vai fazer”, que tem problemas. Volmir (Coração) estava tentando impedir que a levassem para dentro, pois estavam induzindo ela a ir votar. Relatou que sua ex-esposa, fazia campanha direto para Claudinei e Zé. Referiu que Elis Daniela Pereira da Silva também fazia campanha para tais candidatos, sendo que chegou a encontrar com ela nas casas que ia para pedir votos, quando ela tentava atrapalhar a campanha. Mencionou que Naiara, fisioterapeuta da APAE também era a favor do Dr. Claudinei. Assinalou que a atitude de Coração foi de defender a Dona Irma. Acredita que a filha da Dona Irma é casada com um irmão de “Coração”. Confirmou que estava acompanhando Coração fazendo campanha para Segalla e Tarciso. Confirmou que Volmir ficou alterado, sendo que pediu para ele se acalmar, pois na frente da Seção poderia dar problema. A filha de Irma já tinha pedido que se acaso encontrassem Dona Irma, deveriam levá-la, pois Irma precisava ir votar com ela (com a filha). Referiu que não estavam procurando Irma, mas que como sabiam do caso viram que estavam levando ela. Mesmo que Irma falasse que não queria ir para casa, Coração queria levá-la, pois ela estava sendo “induzida” a ir com eles, quando deveria ir com a filha, já que tem problemas. Negou que tivessem ido buscar Irma, mas estavam andando e viram que Irma não estava indo de livre e espontânea vontade e por isso interviram. Disse que não sabia da vinculação da filha de Irma com Segalla na campanha. Foi Coração quem mencionou que a filha de Dona Irma teria pedido para que, caso a vissem, deveriam levá-la para casa.

Após a solenidade, os requeridos juntaram aos autos documentos (Ids 94215880, 94215881 e 94215882) para fins de comprovar o apoio à Coligação autora manifestado em rede social (Facebook) por Sonia, Leidiane e Naiara.

Assim, embora Sônia tenha sido ouvida como testemunha, o fato de ter aportado prova de que a mesma manifestava apoio aos autores enseja uma análise com ressalvas do seu depoimento.

As afirmações da depoente Sônia Maria Favaretto no sentido de que estaria ocorrendo compra de votos baseiam-se em meros comentários de “diz que” / “ouviu falar”, sem qualquer elemento concreto (Sônia disse que imaginava que a movimentação na casa de Clayton, filho de Elias Miguel, fosse compra de votos, referindo que “todo mundo falava que tava tendo compra de votos, era uma falação na cidade inteira, que tavam comprando voto”). Inclusive a própria depoente Sônia não relatou ter presenciado nenhuma entrega de bem ou dinheiro para compra de votos.

Da análise do vídeo acostado com a inicial verifica-se que, de fato, Volmir (Coração) segura Irma pelo braço dizendo que a filha desta quer falar com ela.

Inobstante as alegações contidas na inicial, no sentido de que Volmir tentou impedir Irma de ingressar no Colégio Santa Lucia, Bairro São José para exercer o sufrágio, nenhuma das testemunhas confirmou que Volmir teria efetivamente impedido Irma de exercer o sufrágio. Aliás, o próprio vídeo demonstra que, diante da negativa de Irma em acompanhá-lo, Volmir deixa-a sair do local onde estavam.

Destaca-se, ademais, que a informante Naiara (quem registrou a cena) foi taxativa ao afirmar que Irma estava fora do colégio quando Coração tentou impedi-la de votar, mas que depois ela entrou na sala de votação.

Ademais, da prova produzida não se extrai qualquer indício de que os candidatos Elias e Tarciso tenham qualquer participação ou anuência quanto ao fato.

É de conhecimento deste magistrado que a Sra. Irma de Carvalho exerceu seu direito de voto e que dentro da seção eleitoral não houve registro de qualquer incidente na ata da mesa receptora.

Deste modo, considerando que Irma exerceu seu direito ao sufrágio, em que pese a intervenção de Volmir (“Coração”) ocorrida do lado de fora da escola/seção sem participação e anuência dos candidatos Elias e Tarciso, não se verifica, no caso em análise qualquer circunstância que enseje a anulação da votação, na forma pretendida pelos requerentes.

Com a devida venia, não se pode presumir que no dia da eleição todas as confusões que surgem num município sejam determinadas, comandadas ou de conhecimento dos candidatos, criando uma responsabilidade objetiva de tudo o que ocorre no dia do pleito.

O fato de Volmir (vulgo “Coração”) ser apoiador dos requeridos Elias e Tarciso e do PT não pode conduzir a conclusão automática de que os candidatos determinaram qualquer conduta daquele.

Como foi dito anteriormente a Sra. Irma entrou na escola Santa Lucia e votou, sem que qualquer incidente dentro da sessão eleitoral. Assim, sua vontade foi manifestada livremente no voto.

Não houve qualquer impugnação/arguição de nulidade tempestiva à votação da Sra. Irma, nos termos do art. 223 do Código Eleitoral.

Com base em todos estes fundamentos rejeito as arguições do fato 3.2.6 da peça exordial.

 

Os argumentos invocados no recurso são insuficientes para infirmar essa conclusão.

 

f) “3.2.9” - Oferecimento e entrega de vantagem a eleitores por parte de Rudimar Girardi, em conluio com Elias Miguel Segalla e Tarciso Rossato, caracterizador de abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio

Neste fato, afirma-se que, de acordo com vídeo contendo gravação ambiental de imagens, um dia antes da eleição, o sr. Alcione Rodrigues confessa ao sr. Rodrigo Viapiana que estaria praticando compra de votos para Segalla (briques), em conjunto com Rudimar Girardi.

No que refere à gravação ambiental, realizada por um dos interlocutores sem o consentimento dos demais e sem autorização judicial, em ambiente público ou privado, mantenho a posição desta Corte que concluiu pela ausência de ilegalidade ou nulidade da prova.

No sentido da licitude da prova, cito os seguintes julgados: REl AIME n. 0600707-22, relator: Des. Federal Luis Alberto D’Azevedo Aurvalle, DJE 23.9.2022, REl 0600469-75, relator: Des. Federal Luis Alberto D’Azevedo Aurvalle, julgado na sessão de 28.11.2021; REl n. 0600412-08, de minha relatoria, julgado em 10.08.2021; REl n. 0600581-56, relator: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, da sessão de 20.10.2021, dentre outros.

Quanto à aplicabilidade do Tema n. 979 do STF ao caso, segundo o qual é ilícita na seara ambiental a prova obtida por meio de gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, observa-se que o precedente não se amolda à hipótese dos autos, pois no julgado paradigma - RE 1040515 RG/SE, o Ministro Relator Dias Toffoli reputou como ilícita a prova colhida no processo eleitoral mediante gravação ambiental clandestina obtida no interior de um veículo, ilicitude essa aplicável a partir das eleições de 2022, por isonomia e segurança jurídica. 

No caso ora em análise, a gravação ambiental foi produzida em estabelecimento  aberto ao público, sem expectativa de privacidade.

Os recorrentes também apresentaram fotografias registradas no local, que retratam a presença dos candidatos recorridos Elias Segalla e Tarciso Rossatto arregimentando pessoas e aguardando chegada de Rudimar Girardi.

A captação ilícita de sufrágio também aqui não restou suficientemente comprovada, pois, conforme refere a Procuradoria Regional Eleitoral, “além das incertezas que pairam sobre a data e horário em que realizada a gravação ambiental e sobre a efetiva identidade dos interlocutores, tem-se ainda que, como bem ressalvado na sentença, nenhuma entrega de dinheiro/bens para compra de voto foi efetivamente presenciada, fotografada ou filmada/gravada pela testemunha Rodrigo Viapiana”. Consta, ainda, do parecer, a bem-lançada ponderação de que “Além de Rodrigo Viapiana ter afirmado em seu depoimento que não conhecia Alcione Rodrigues, chamou a atenção no seu depoimento, como bem destacado pelo MPE (ID 44866638), de como a testemunha teria visto o entra e sai no local se tal fato teria se dado após a testemunha ter saído do local (…)”.

Ademais, do exame do vídeo (ID 44866187) não se verifica o conhecimento ou a anuência dos candidatos com o ilícito imputado, e as fotos apresentadas não apresentam qualquer irregularidade.

Destarte, o único indício de prova da alegação é o depoimento de Rodrigo Viapiana que, na forma do art. 368-A do Código Eleitoral, não serve de fundamento para a condenação:

Art. 368-A. A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato.

 

g) “3.2.10” - Oferecimento e entrega de vantagem à sra. Elis Daniela Pereira da Silva e ao sr. Moisés Pereira da Silva

Conforme síntese contida na sentença, a inicial afirma que Alceu Fiel Pedroso, candidato a vereador, teria comparecido em 1º.11.2020 nas residências da sra. Elis Daniela Pereira da Silva e do sr. Moisés Pereira da Silva, oferecendo e prometendo o valor de R$ 300,00 (trezentos reais) para que cada eleitor, cada familiar e cada amigo votasse nele e nos candidatos Elias Miguel Segalla e Tarciso Rossatto.

Para provar o fato, foi juntado vídeo de Daniela retirando os adesivos da campanha dos candidatos adversários de seu carro e Boletins de Ocorrência Policial da situação ocorrida, registrados por Moisés Pereira da Silva e Elis Daniela Pereira da Silva.

Ocorre que, nos termos da conclusão de piso, não está devidamente comprovada a acusação, seja porque o vídeo retratando a retirada de adesivos não demonstra com segurança a data da gravação, seja porque o depoimento da eleitora Elis Daniela foi colhido na condição de informante, uma vez ter sido verificado que ela estava apoiando a candidatura dos recorrentes, sendo incabível a condenação somente com base no testemunho de Moisés, por força do já citado art. 368-A do Código Eleitoral.

Foi também observado pelo juízo sentenciante que os Boletins de Ocorrência foram registrados bem depois da eleição, em 02.12.2020, merecendo ser transcrita a sentença:

Note-se que inobstante Elis Daniela tenha referido que votou em Alceu e em Elias Miguel e Tarciso, os fatos, de acordo com a ocorrência policial por ela registrada teriam ocorrido em 02/11/2020, sendo que todas as postagens (em favor dos candidatos da coligação autora) foram feitas em datas posteriores ao suposto fato.

Chama atenção, inclusive, que na postagem feita no dia 16/11/2020 Elis Daniela manifesta apoio aos candidatos não eleitos “Claudinei e Zé”, tratando-os como “meus candidatos”.

Registra-se, ademais, que inexistem nos autos elementos que demonstrem a data em que os adesivos do carro de Elis Daniela foram removidos, cabendo destacar, inclusive, que a referida retirada pode ter sido efetuada em momento posterior às eleições, se considerado o teor da postagem datada de 16/11/2020.

Calha mencionar, por fim, que para além das declarações de Elis Daniela e Moisés, nada foi juntado aos autos para fins de comprovar o suposto fato.

A ocorrência policial lavrada tanto tempo após o suposto fato aliada às publicações de Elis em redes sociais apoiando os candidatos autores demonstra a fragilidade das suas declarações e de Moisés.

A prova é frágil em relação ao requerido Alceu Fiel Pedroso.

Ainda, inexiste prova de participação ou anuência dos requeridos Elias e Tarciso no suposto fato.

Conforme já referido anteriormente, de acordo com o Art. 368-A do Código Eleitoral “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Diante de tal cenário, não se vislumbra a existência de situação que possa macular o pleito eleitoral no que tange ao fato ora analisado.

 

h) “3.2.11” - Oferecimento e entrega de vantagem ao sr. Moisés Pereira da Silva, configuradores de abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio cometidos por Alceu Fiel Pedroso e Nelson Flores da Rosa e ELIAS MIGUEL SEGALLA, em prol de suas próprias candidaturas e da candidatura de TARCISO ROSSATO

Os recorrentes afirmam que Paulo Maurício de Almeida esteve na residência do eleitor Moisés Pereira da Silva e lhes ofereceu latas de tinta para a pintura do imóvel em troca de votos nos candidatos recorridos e no candidato a vereador Nelson Flores da Rosa, tendo sido entregues os galões de tinta pela empresa Polleto Materiais de Construção, conforme fotografias e Boletim de Ocorrência Policial.

Todavia, acompanho a bem-lançada sentença e o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral no sentido de que a prova apresentada é extremamente limitada, especialmente porque, quanto a esse fato, Moisés Pereira da Silva foi ouvido na condição de informante, merecendo serem transcritos os fundamentos da decisão recorrida:

Note-se que a prova produzida nos autos não tem o condão de comprovar a captação ilícita de sufrágio.

Conforme antes mencionado, para fins de comprovar tal fato, foram juntadas imagens das latas de tinta que supostamente teriam sido entregues em troca de voto, bem como arrolado o informante Moisés, pessoa que supostamente teria recebido a referida vantagem. Nenhuma outra prova foi produzida para comprovar as alegações dos requerentes.

Destaca-se, outrossim, que chama atenção o fato do informante ter referido que se arrependeu (motivado pela Doutrina Religiosa que segue) e por isso, decorrido mais de um mês da data do suposto fato e depois de já conhecido o resultado da eleição municipal, teria registrado ocorrência policial em relação ao suposto fato.

Também chama atenção o fato da testemunha ter registrado imagens das tintas que diz ter recebido, sob a alegação de que a finalidade era registrar o selo.

Ademais, ao ser indagado por este juízo no sentido de alguém ter ido até sua casa para tirar fotos das latas de tinta, respondeu afirmativamente referindo (14min:04seg: perguntado se esteve gente na sua casa para tirar fotos das latas de tinta disse “teve”), por outro lado, que foi ele mesmo quem fez o registros e os encaminhou, pelo que lembra, para a irmã.

Ora, se de fato a intenção de Moisés seria “registrar o selo” das latas de tinta, as imagens seriam armazenadas em seu celular, não havendo a mínima necessidade de encaminhamento dos referidos arquivos para outra pessoa.

Diante de tal cenário, referida justificativa cai por terra.

Destaca-se, ainda, que para além das declarações do referido informante, inexistem outros depoimentos, gravações ou vídeos que demostrem por quem (e a mando de quem) as tintas supostamente teriam sido entregues à Moisés.

A prova é frágil em relação ao requerido Nelson Flores da Rosa.

Ainda, inexiste prova de participação ou anuência dos requeridos Elias e Tarciso no suposto fato.

Ademais, conforme já referido anteriormente, de acordo com o Art. 368-A do Código Eleitoral “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Deste modo, improcede a ação em relação ao ponto, uma vez que não foi comprovada a captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico.

 

Ademais, conforme consta da sentença, Moisés afirmou na audiência que em função de ser evangélico registrou a ocorrência somente em dezembro, passadas as eleições, pois se arrependeu, achou errado, e “que foi por essa razão que se arrependeu e foi registrar a ocorrência em relação aos fatos ocorridos no início de novembro”.

Portanto, a decisão merece mantida também quanto a esse fato.

 

i) “3.2.14” – Oferecimento de cargo na Prefeitura pra a filha do sr. Irineu Filipini, em prol da candidatura de ELIAS MIGUEL SEGALLA

O último fato objeto do recurso refere-se a dois vídeos filmados pelo eleitor Irineu Filipini no qual o candidato a vice-prefeito, recorrido Tarciso Rossatto, em visita realizada ao sr. Irineu, teria se comprometido em conseguir um emprego para a filha do eleitor em troca de votos.

Todavia, o depoimento do eleitor e o vídeo gravado não servem de prova da alegação, tendo o magistrado apontado que Tarciso “queria, tipo, quase que a gente meio votasse assim, vamo dize assim, meio obrigado, que daí ajeitava serviço para a minha filha”, mas que tal relato “não traz a certeza de que o referido candidato, de fato, ofereceu emprego em troca do voto. A defesa dos requeridos sustenta que os mesmos durante as visitas em atos de campanha mencionavam sobre os programas de geração de emprego e renda que pretendiam implantar no município, caso fossem eleitos.”

Conforme bem aponta a sentença, no início do depoimento judicial Irineu afirmou que na sua casa somente estava ele, sua esposa e o vizinho Dirceu dos Santos (vulgo Gringo), mas na gravação do vídeo aparecem duas vozes masculinas dizendo “Fechou né? Fechou!”.

Nenhuma outra prova foi produzida e, após ser alertado sobre o crime de falso testemunho, Irineu confessou que o vídeo juntado na inicial foi gravado na presença de duas pessoas de Porto Alegre, sendo que um dos vídeos foi filmado após as eleições.

Desse modo, também aqui, a manutenção da sentença é medida impositiva, cujas razões cumpre reproduzir:

A testemunha IRINEU FILIPINI disse que conhece Tarciso, o qual lhe visitou na campanha oferecendo emprego para sua filha, em troca de voto. Disse que Tarciso “queria, tipo, quase que a gente meio votasse assim, vamo dize assim, meio obrigado, que daí ajeitava serviço para a minha filha, tudo beleza, mas daí peguei, na verdade votemo contra”. Confirmou que gravou um vídeo a respeito desse fato, dizendo que não foi intimidado ou ameaçado para gravar. Referiu que gravou o vídeo para um amigo “que comprava criação” e que ele deve ter repassado para outras pessoas. Disse que no dia das eleições, antes de ir votar, foi num posto de gasolina, pois não sabia onde era o local para votação, era a primeira vez que estava indo. Relatou que pediu informações, sendo que a pessoa que lhe passou as informações pediu para quem votaria e se queria “uns trocos”, tendo recusado. A oferta “dos trocos” era para votar em Tarciso. Disse não recordar qual posto de gasolina se tratava. Confirmou que votou para Claudinei. Indagado, disse que quem gravou o vídeo foi Dirceu dos Santos (Gringo), o qual reside na Linha Campininha de Pedra e era ele mesmo quem fazia as perguntas. Não sabe a razão pela qual seu amigo Dirceu quis gravar o vídeo. Indagado sobre a finalidade do vídeo referiu que era dizer para quem votou. Referiu que no momento em que o vídeo foi gravado estavam na sala ele, Dirceu e sua família. Deferida a exibição do vídeo que teria sido gravado pela testemunha (anexado à petição inicial da AIJE), foi questionado sobre de quem era voz do interlocutor, disse que era Gringo que falava. Indagado pelo Ministério Público, disse que não foi mencionado o cargo que seria oferecido para sua filha, apenas que “eles iam ajeitar um serviço”, dizendo que foi o Tarciso que lhe ofereceu. Mencionou que sua filha não chegou a ser contratada. Indagado pelo Ministério Público Eleitoral, disse que o vídeo foi gravado depois das eleições. Disse que seu amigo pediu para gravar o vídeo sendo que concordou. Mencionou nunca ter visto os advogados dos autores e que não conversou com advogado ou pessoa do partido antes da audiência. Questionado pelo juízo, disse que o vídeo exibido durante a solenidade foi gravado na presença de duas pessoas, supostamente, de Porto Alegre, descrevendo-os como sendo dois homens morenos e encorpados: “acontece o seguinte, falar o pouco e o certo mesmo, nós fizemo isso daí com o Gringo, só que depois chegou dois cara, veio dos homens”. Indagado sobre eventual ameaça para gravar o vídeo, respondeu: “acontece o seguinte, que falar como to falando, na verdade era meio-dia, eu tocava de ir trabalhar, que eu to trabalhando, e não saiam de lá sem, né, eu dizer pra quem votei, pronto”. Disse não lembrar quando o vídeo gravado esse segundo vídeo e nem consegue reconhecer e dar características de quem foi até sua casa dizendo que “não tinha número da placa de carro, nada, porque daí tinham botado um negócio, me pegaram por surpresa, na verdade, sei lá eu”.

Ao ser ouvido em juízo Irineu, referiu que Tarciso “queria, tipo, quase que a gente meio votasse assim, vamo dize assim, meio obrigado, que daí ajeitava serviço para a minha filha”, ou seja, o próprio relato da testemunha não traz a certeza de que o referido candidato, de fato, ofereceu emprego em troca do voto. A defesa dos requeridos sustenta que os mesmos durante as visitas em atos de campanha mencionavam sobre os programas de geração de emprego e renda que pretendiam implantar no município, caso fossem eleitos.

Embora ao início do depoimento Irineu afirme que na sua casa somente estava ele, sua esposa e o vizinho Dirceu dos Santos (vulgo Gringo), residente na linha Campininha de Pedra, interior de Trindade do Sul, com quem tinha costume de negociar gado, observa-se bem ao final da gravação do vídeo duas vozes masculinas (“(…) fechou né? Fechou!”).

Durante a audiência foi exibido o vídeo anexado à inicial (ID 55317123) ao depoente, no qual se constata que o sotaque de quem lhe faz as perguntas (inclusive tratando o depoente como “Sr.”) não é de uma pessoa do interior de Trindade do Sul, mas sim um típico sotaque porto alegrense.

Não foram produzidas outras provas para fins de comprovar referido fato, cabendo destacar, que ao ser alertado sobre a possibilidade de responder por falso testemunho e indagado por este juízo sobre a razão pela qual teria resolvido gravar o inusitado vídeo (com seu relato sobre o suposto fato), o informante acabou confidenciando (aos 10min:39seg do segundo vídeo do depoimento) que o registro do vídeo juntado na inicial foi feito na presença de duas pessoas de Porto Alegre (circunstância que se confirma pelo inconfundível sotaque dos moradores da região metropolitana de Porto Alegre de dois dos interlocutores) e que tais pessoas não saíram de lá até que seu relato fosse registrado (12min:15seg). Relatou que o segundo vídeo gravado na presença das pessoas de Porto Alegre ocorreu após as eleições (12min:50seg), sendo que tais pessoas “(…) tinham botado um negócio, me pegaram por surpresa, na verdade”.

Ao que tudo indica alguns dias após o resultado da eleição municipal a testemunha Irineu Filipini sofreu constrangimento por parte de pessoas estranhas à sua comunidade, com sotaque porto alegrense, para gravar o vídeo juntado na inicial.

Destaca-se que situação semelhante à do Sr. Irineu Filipini também teria ocorrido com o Sr. João da Rosa (fato 3.2.13 analisado anteriormente) e também com a Sra. Rosa Maria Balest (fato 3.2.15 da inicial, que será analisado na sequência), que registrou ocorrência policial nº 1606/2020 no sentido de que teria sido coagida por pessoas estranhas a gravar um vídeo dizendo que seu voto foi comprado com telhas brasilit. A referida ocorrência teria sido registrada no mesmo dia da coação, às 15h53min (ID 78772659), sendo que a Sra. Rosa recebeu atendimento médico da Dra. Karize Fardin da Rosa às 14h51min do dia 02/12/2020 (ID 78772661).

As visitas de pessoas estranhas em casas de pessoas humildes no interior de Trindade do Sul para coagi-los a gravar vídeos também foram relatadas pelos informantes Ezequiel da Rosa Camargo e Jaime Lizzi.

Segundo bem destacado pelo Representante do Ministério Público Eleitoral em seu parecer final: “o vídeo que instrui a inicial não traz credibilidade necessária para os efeitos a que se propõe. Antes do início da fala de Irineu Filipini, alguém fala “foi” para que Irineu possa começar a falar, e, ao final do vídeo, as duas pessoas que fazem a gravação conversam entre si e dizem “fechou né? Fechou”, dando a entender que conseguiram o vídeo como queriam. Além disso é explicito o nervosismo de Irineu durante a gravação do vídeo, e ele, ao dar as respostas às perguntas formuladas, olha para o outro lado e não para quem fez a pergunta a ele, o que também retira a credibilidade das frases ditas por Irineu.”

Segundo já decidiu o TSE: “para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, exige-se prova robusta de pelo menos uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97, da finalidade de obter o voto do eleitor e da participação ou anuência do candidato beneficiado” (RESPE nº 36335/AC – j. 15/02/2011).

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CANDIDATO A VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 41-A DA LEI DAS ELEIÇÕES. MÉRITO. CARACTERIZAÇÃO DO ILÍCITO ELEITORAL. INSUFICIÊNCIA DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. EXIGÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS E INCONTESTES. NECESSIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 24 DO TSE. MANUTENÇÃO DO DECISUM. DESPROVIMENTO.

1. A captação ilícita de sufrágio, nos termos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, aperfeiçoa-se com a conjugação dos seguintes elementos: (i) a realização de quaisquer das condutas típicas do art. 41-A (i.e., doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor, bem como praticar violência ou grave ameaça ao eleitor), (ii) o fito específico de agir, consubstanciado na obtenção de voto do eleitor e, por fim, (iii) a ocorrência do fato durante o período eleitoral (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, p. 725).

2. A demonstração de prova robusta e inconteste da ocorrência do ilícito eleitoral é pressuposto indispensável à configuração da captação ilícita de sufrágio. Precedentes desta Corte.

3. In casu, o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, ao reformar a sentença e afastar a condenação, assentou ser frágil o conjunto probatório acostado aos autos, não sendo possível reconhecer a configuração da captação ilícita de sufrágio por meras ilações e presunções, tampouco o abuso do poder econômico.

4. O reexame do arcabouço fático-probatório, que não se confunde com o reenquadramento jurídico dos fatos, revela-se inadmissível na estreita via do recurso especial eleitoral.

5. No caso sub examine,

a) o Tribunal de origem consignou ser insuficiente o conjunto probatório para caracterizar o ilícito do art. 41-A da Lei nº 9.504/97 e o abuso do poder econômico;

b) a simples apreensão de camisetas de determinada cor no veículo, onde se encontrava a então candidata a vereadora Joelma Aparecida Gomes de Oliveira, não demonstra, de modo imperativo, que as aludidas camisetas seriam distribuídas aos eleitores. Sequer há nos autos prova do valor do material apreendido.

Aliás, o conjunto probatório dos autos resume-se aos seguintes documentos: (i) Registro de Ocorrência de fls. 17/18, no qual consta a informação quanto à apreensão de 'camisas azuis (em média duas mil)'; (ii) o auto de apreensão do veículo e de '1.656 camisas de malha de cor azul, sem qualquer ilustração'; (iii) fotocópia da Carteira Nacional de Habilitação da Recorrente. Consta, ainda, uma cópia de uma nota fiscal emitida pela Empresa Scarlett Modas à Empresa Maria da Conceição de Lima Paula - ME, cuja veracidade foi questionada e da qual foi feita extração de cópias à Secretaria do Estado de Pernambuco - SEFAZ/PE, para as providências que julgar cabíveis.

Assim, não há elementos suficientes a demonstrar a prática do ilícito eleitoral, até porque as camisetas não possuem qualquer identificação de candidatos ou símbolos, nem há qualquer indício de que seriam distribuídas a eleitores ou cabos eleitorais;

c) superar tal conclusão demandaria a reapreciação das provas acostadas aos autos. Incidência do Enunciado da Súmula nº 24 do TSE.

6. Agravo regimental desprovido. (Recurso Especial Eleitoral n. 13187, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 238, Data 16/12/2016, Página 23) (grifei)

O depoimento da testemunha Irineu Filipini e respectivo vídeo juntado na inicial mostram-se contraditórios e frágeis para amparar uma condenação.

Não foram juntados aos autos outros elementos probatórios.

Ademais, de acordo com o Art. 368-A do Código Eleitoral “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Deste modo, diante da fragilidade da prova produzida não merece passagem a alegação de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico em relação ao fato 3.2.14 da peça exordial.

 

Dessa forma, o acervo probatório não fornece elementos mínimos acerca de eventual abuso de poder ou mercantilização do voto no contexto narrado.

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar, julgo extinto o feito em relação ao recorrido Edegar Krummenauer, com fundamento no art. 485, inc. VI, do CPC, e, no mérito, VOTO pelo desprovimento do recurso, ao efeito de manter integralmente a sentença de improcedência da ação.