PCE - 0602477-84.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/11/2022 às 16:00

 

VOTO 

Trata-se de prestação de contas apresentada por CLAUDIO MAXIMILIANO BRANCHIERI, candidato eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

No parecer conclusivo, o órgão de análise de contas deste Tribunal apontou indício de recebimento de fonte vedada de arrecadação, nos termos do art. 31, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, discriminado da seguinte forma:

 

INDÍCIO DE RECURSO RECEBIDO DIRETAMENTE DE FONTE VEDADA

Data

CNPJ/CPF

DOADOR

VALOR (R$)

VEDAÇÃO PROCEDENTE DE

22/08/22

19.540.550/0001-21

ASAAS GESTÃO FINANCEIRA S.A.

438,62

PESSOA JURÍDICA

 

Em seus esclarecimentos, o candidato afirma que contratou a empresa Democratize Tecnologia Ltda., prestadora de serviços de financiamento coletivo mediante sítios eletrônicos, possibilitando o recebimento de doações de pessoas físicas por meio da internet, a qual repassou ao candidato os recursos recebidos na conta aberta na empresa ASAAS Gestão Financeira Instituição de Pagamentos S.A., em conformidade com nota técnica apresentada pela contratada (ID 45205857).

A questão restou assim relatada no parecer conclusivo:

O candidato apresentou “Nota Técnica” da Democratize (ID 45205857), empresa de financiamento coletivo cadastrada pelo prestador de contas, declarando que:

“...a DEMOCRATIZE abriu conta … junto à ASAAS GESTÃO FINANCEIRA INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTOS S.A. (CNPJ nº 19.540.550/0001-21),“uma instituição de pagamento autorizada pelo Banco Central do Brasil”

(...)

“A DEMOCRATIZE, por outro lado, é a entidade arrecadadora (Lei nº 9.504/97, art. 23, § 4º, IV) detentora do know-how, do sistema de informática e da responsabilidade pelo serviço de arrecadação, sendo a ASAAS o banco digital onde a DEMOCRATIZE mantém conta de pagamentos, pela qual são processados os repasses dos valores arrecadados”.

 

Além da “Nota Técnica” da Empresa Democratize, também são apresentadas imagens da conta de pagamento e do sistema de arrecadação da Democratize (ID 45205857).

O candidato contratou a Democratize, CNPJ 35.492.333/0001-60, empresa de financiamento coletivo regularmente cadastrada pelo TSE. Ainda, as doações captadas no financiamento coletivo foram individualizadas nesta prestação de contas, conforme determina o art. 22, inciso II da Resolução TSE 23.607/2019. No Anexo I, disponibiliza-se os documentos de credenciamento disponibilizados pela empresa e a autorização realizada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Em que pese as declarações da Democratize, o Procedimento Técnico de Exame do Tribunal Superior Eleitoral trouxe a falha referente à identificação de doação proveniente de pessoa jurídica na conta bancária do candidato, identificada com o CNPJ 19.540.550/0001-21, pertencente a ASAAS Gestão Financeira, intermediária de pagamento, que não é instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil, conforme a exigência do art. 24, §2º da Resolução TSE 23.607/2019. Cabe referir que, como base de pesquisa, foi consultada a Lei 12.865/2013, que dispõe sobre os arranjos de pagamentos, e Resoluções 80/2021, 81/2021 e 96/2021 do Banco Central do Brasil, que disciplinam o funcionamento das instituições de pagamentos. No Anexo II, disponibiliza-se o CNPJ da empresa ASAAS, que nas atividades identifica-se como “Holding de instituição não financeira”.

Destaca-se também o §2º do art. 6º da Lei 12.865/2013:

Art. 6º § 2º É vedada às instituições de pagamento a realização de atividades privativas de instituições financeiras, sem prejuízo do desempenho das atividades previstas no inciso III do caput.

 

A conta intermediária que a Democratize possui na ASAAS, instituição não financeira, não é uma conta bancária de depósito a vista, como prevê o art. 24, §2º da Resolução TSE 23.607/2019, assim o crédito bancário na conta do candidato não ocorreu conforme previsto na resolução de prestação de contas.

Como consequência, o crédito bancário na conta do candidato não ocorreu dentro dos padrões definidos pelo TSE, com as verificações e cruzamentos automatizados efetivados pelo Procedimento Técnico de Exame do TSE. Não é possível determinar que e receita creditada na conta bancária do prestador de contas é originada da arrecadação de financiamento coletivo captada pela Democratize, pois o crédito que seria esperado teria como identificação o CNPJ da Democratize (CNPJ 35.492.333/0001-60), e não da empresa ASAAS Gestão Financeira Instituição de Pagamentos S/A. (CNPJ nº 19.540.550/0001-21).

Cabe referir, ainda, um dos principais regramentos das prestações de contas eleitorais: os créditos bancários de doações recebidas devem ser obrigatoriamente identificados como previsto no art. 7º, §1º da Resolução TSE 23.607/2019:

Art. 7º § 1º As doações financeiras devem ser comprovadas, obrigatoriamente, por meio de documento bancário que identifique o CPF/CNPJ das doadoras ou dos doadores, sob pena de configurar o recebimento de recursos de origem não identificada de que trata o art. 32 desta Resolução.

 

Assim, o montante de R$ 438,62, referente ao item 2.1, configura-se como recurso de fonte vedada, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme disposto no art. 31, §4º e §10 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

Pois bem.

A empresa Democratize Tecnologia Ltda. consiste em uma empresa de arrecadação de recursos pela modalidade de financiamento coletivo via internet, com cadastro deferido pelo TSE, para a prestação de serviços a partidos e candidatos no pleito de 2022 (https://financiamentocoletivo.tse.jus.br/fcc.web/#!/publico/lista-empresa), nos exatos termos estipulados pelo art. 22, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 22. O financiamento coletivo, se adotado, deverá atender aos seguintes requisitos:

I - cadastro prévio na Justiça Eleitoral pela instituição arrecadadora, observado o atendimento, nos termos da lei e da regulamentação expedida pelo Banco Central do Brasil, dos critérios para operar arranjos de pagamento;

 

Logo, ao selecionar a empresa arrecadadora entre aquelas cadastradas no TSE, deve-se entender que o candidato agiu com probidade e boa-fé, presumindo a regularidade da constituição e o funcionamento da prestadora de serviços, de acordo com a legislação eleitoral e com as normas expedidas pelo Banco Central do Brasil.

Em consulta ao sítio eletrônico da Democratize (https://democratize.com.br/), inclusive, vê-se em destaque o anúncio de ser uma plataforma “homologada pelo TSE”, destacando-se os dizeres: “fomos umas das primeiras plataformas aprovadas para prestar o serviço de arrecadação. Poderá verificar diretamente no site do TSE https://financiamentocoletivo.tse.jus.br/fcc.web/”.

Ainda, as informações divulgadas no sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/consulta/doadores-fornecedores/2040602022) registram que a Democratize foi contratada por 1.489 candidatos nas eleições de 2022, em todo o território nacional, a exemplo dos candidatos Jair Bolsonaro, Antônio Hamilton Mourão, Fernando Haddad e João Edegar Pretto, de modo que seus serviços não se circunscreveram a uma região específica ou a determinado grupo.

Ocorre que a empresa se utilizou de uma conta intermediária para captação de recursos, a qual foi aberta na ASAAS Gestão Financeira, que, embora realize serviços de cobranças e outras atividades congêneres, não é instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil, razão pela qual o órgão técnico indicou o descumprimento do art. 24 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 24. Havendo conta intermediária para a captação de doações por financiamento coletivo, a instituição arrecadadora deve efetuar o repasse dos respectivos recursos à conta bancária de campanha eleitoral da candidata ou do candidato ou do partido político (conta "Doações para Campanha").

§ 1º No momento do repasse à candidata ou ao candidato ou ao partido político, que deverá ser feito obrigatoriamente por transação bancária identificada, a instituição arrecadadora deverá identificar, individualmente, as doadoras ou os doadores relativas(os) ao crédito na conta bancária da destinatária ou do destinatário final.

§ 2º A conta intermediária de que trata o caput deste artigo, uma vez aberta, deve observar a modalidade de conta bancária de depósito à vista, em instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil.

§ 3º Os créditos recebidos na conta intermediária de que trata o caput deste artigo devem ser realizados por meio de transação bancária na qual o CPF da doadora ou do doador seja obrigatoriamente identificado. (Grifei.)

O candidato, após emissão do parecer conclusivo e da manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, juntou aos autos declaração da empresa Democratize na qual esclarece que foi aberta conta no Banco Inter, empresa que atenderia aos requisitos da Resolução, explicando o seguinte (ID 45338512):

Conforme fluxograma acima, todas as doações quando processadas, são custodiadas nesta conta mantida junto ao Banco Inter, até que o(a) candidato(a) cliente solicite o saque dos recursos arrecadados na Democratize, para a sua conta de campanha.

Feito isso, automaticamente o sistema da Democratize programa a transferência no sistema do Banco Digital Asaas – Asaas Gestão Financeira Instituição de Pagamentos S.A., para posterior crédito na conta bancária de campanha indicada pelo(a) candidato(a) cliente.

Após feita esta programação, a Democratize, manualmente, totaliza o montante das transações do dia e transfere estes recursos, em uma única remessa, da conta do Banco Inter (conta intermediária, modalidade conta de depósitos à vista) para a Conta Digital PJ mantida no Asaas, Agência 0001, Conta 1439583-4, para posterior repasse automatizado ao(à) candidato(a) cliente. (Anexo 2)

Esta dinâmica se dá, em suma, pois o Banco Inter não disponibiliza integração para com o sistema financeiro da Democratize, o que obrigaria esta à proceder de maneira manual cada transferência eletrônica, para cada saque comandado por seus clientes.

Já com a utilização da Conta PJ do Asaas, por haver conexão entre os sistemas Democratize e Asaas, todo o processo acontece de maneira 100% automatizada, eletronicamente, garantindo assim maior agilidade e precisão para as transações.

 

Assim, não é razoável imputar qualquer responsabilidade por eventual falha da empresa ao candidato, uma vez que, consoante exposto, a Democratize detinha cadastro deferido junto ao TSE e efetivamente captou recursos para os mais diversos concorrentes, induzindo à firme convicção de sua qualificação e idoneidade para o serviço contratado.

O atendimento, por parte das instituições arrecadadoras, aos requisitos previstos no art. 24 da Resolução TSE n. 23.607/19 deve ser analisado em procedimento específico por parte do TSE, competente para o deferimento de seu cadastro prévio.

Além disso, as pessoas físicas doadoras originárias estão declaradas e identificadas pelo nome, CPF e discriminação das respectivas operações (ID 45144769), conforme repassado pela própria Democratize (ID 45205856):

 

Diante disso, o órgão técnico bem atestou que “as doações captadas no financiamento coletivo foram individualizadas nesta prestação de contas, conforme determina o art. 22, inciso II da Resolução TSE 23.607/2019”, cujo teor transcrevo:

Art. 22. O financiamento coletivo, se adotado, deverá atender aos seguintes requisitos:

[…].

II - identificação obrigatória, com o nome completo e o número de inscrição no cadastro de pessoas físicas (CPF) de cada pessoa doadora, o valor das quantias doadas individualmente, a forma de pagamento e as datas das respectivas doações;

Nessa esteira, não havendo quaisquer outros indícios de fontes vedadas ou recursos de origem não identificada, os apontamentos resumem-se ao fato de a conta intermediadora não ser mantida por instituição bancária e, consoante descreveu o parecer conclusivo, “o crédito que seria esperado teria como identificação o CNPJ da Democratize (CNPJ 35.492.333/0001-60), e não da empresa ASAAS Gestão Financeira Instituição de Pagamentos S/A. (CNPJ nº 19.540.550/0001-21)”.

Contudo, a partir dos esclarecimentos e documentos acostados, julgo que as incongruências relatadas estão devidamente saneadas, representando, no escopo dos presentes autos, meras falhas formais e externas à esfera de responsabilidade do candidato.

Logo, a aprovação das contas é medida que se impõe.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação das contas de CLAUDIO MAXIMILIANO BRANCHIERI, relativas ao pleito de 2022, com fundamento no art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.