PC-PP - 0600115-46.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/11/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O Diretório Estadual do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB/RS e seus dirigentes apresentaram suas contas relativas ao exercício financeiro de 2020, disciplinado pela Resolução TSE n. 23.604/19.

Em parecer conclusivo, a unidade técnica considerou superada a maioria das irregularidades apontadas no exame inicial, relatando subsistir na contabilidade apenas mácula relativa ao recebimento de recursos de fontes vedadas (doações provenientes de pessoas físicas não filiadas ao partido e exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário).

Passo à análise.

O art. 31 da Lei dos Partidos Políticos arrola as fontes vedadas e indica, dentre elas, aquelas que a legislação eleitoral convencionou chamar de “autoridades públicas” (inc. V). Vejamos:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - entidade ou governo estrangeiros;

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações referidas no art. 38 desta Lei e as proveniente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha; (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

III - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

IV - entidade de classe ou sindical.

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. (Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017)

 

No mesmo sentido vai a Resolução TSE n. 23.604/19, que regulamenta a prestação de contas partidária para o exercício financeiro que aqui se examina:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - origem estrangeira;

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações orçamentárias do Fundo Partidário e do FEFC;

III - pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de permissão; ou

IV - autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Assim, como regra, o partido político é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive mediante publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário.

No caso dos autos, o exame da prestação de contas relacionou os doadores que seriam considerados autoridades públicas, bem como o cargo ocupado, a instituição a que estiveram vinculados quando da doação, o valor e a data da contribuição para os cofres da agremiação. Também constou do documento (ID 44955598):

Item 2

Irregularidade: Recebimento de Fonte Vedada

Base legal: artigo 12 da Resolução TSE 23.604/19 e art. 31, inc. V, da Lei 9.096/95.

2. Quanto à receita de outros recursos verificada nos extratos bancários (c/c n. 1229850, agência 1889, Banco do Brasil e c/c n. 060517710, agência 0839, Banrisul), constatou-se a existência de créditos provenientes de doadores não filiados ao partido Republicanos. Por meio de diligências a órgãos públicos (SEI 0011992-25.2020.6.21-8000), restou identificado tratarem-se de pessoas físicas que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2020, as quais se enquadram na vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei 9.096/95, conforme a tabela abaixo:

[…]

Assim, o montante de R$ 11.109,41, conforme relacionado acima, configura recursos de fontes vedadas, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional conforme disposto no art. 14, §1º da Resolução TSE n. 23.604/2019.

 

Com sua resposta, o DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB, ANSELMO PIOVESAN, MARIO SANDER BRUCK e LUIZ VICENTE DA CUNHA PIRES apresentaram certidões de filiação e comprovante de devolução de valores, a fim de afastar a mácula apontada (ID 44988684-44988699).

No parecer conclusivo, o órgão técnico considerou que os doadores não estavam filiados ao partido que recebeu a doação ou que a data da vinculação informada foi anterior ao seu registro no sistema de controle de filiação da Justiça Eleitoral, mantendo o apontamento, nesses termos:

Irregularidade: Recebimento de Fonte Vedada

Base legal: artigo 121 da Resolução TSE 23.604/19 e alterações do artigo 31, inc. V, da Lei 9.096/95.

1. Conforme o item 2 do relatório de Exame da Prestação de Contas, quanto à receita de outros recursos verificada nos extratos bancários (c/c n. 1229850, agência 1889, Banco do Brasil e c/c n. 060517710, agência 0839, Banrisul), constatou-se a existência de créditos provenientes de doadores não filiados ao partido Republicanos. Por meio de diligências a órgãos públicos (SEI 0011992-25.2020.6.21-8000), restou identificado tratarem-se de pessoas físicas que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2020, as quais se enquadram na vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei 9.096/95, no montante de R$ 11.109,41.

[…]

Nas certidões de filiação emitidas pelo sistema Filia juntadas pelo partido (ID 44988695) constam as datas de filiação informadas acima. Contudo, com relação à Aline, Cláudia, Evandro, Mateus, Renata, Rudi e Sandra as certidões atestam que tais registros foram efetuados no sistema em data posterior à informada para a filiação.

Destaca-se que a filiação deve ser lançada no sistema Filia na data do evento, de modo que o registro da filiação tenha a mesma data da ficha de filiação. Embora seja possível efetuar o lançamento no sistema em data posterior à filiação, o registro do evento em data diversa ao da filiação não assegura que a data informada no Filia seja efetivamente a data da filiação no partido.

Com relação às certidões referentes à Letícia e Viviane, demonstram que na data em que efetuaram as doações apontadas não estavam filiadas ao PSB, e sim, ao DEM, consistindo em receitas de fontes vedadas.

Conforme constou na manifestação, as contribuições consideradas irregulares pelo partido foram recolhidas à União, no total de R$ 3.916,18, mais atualização e juros (IDs 44988696 a 44986898), devendo ser subtraído do valor inicial apontado como irregular.

Assim, o montante de R$ 7.193,23 (R$ 11.109,41 - R$ 3.916,18) configura-se como recursos de fontes vedadas, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional conforme disposto no art. 14, § 1º da Resolução TSE n. 23.604/2019.

 

Anoto que a norma restritiva ao recebimento de recursos oriundos de autoridades públicas vem acompanhada de uma exceção, a qual, justamente por se tratar de uma salvaguarda, deve ser interpretada restritivamente. Quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação, o aporte deve ser considerado lícito.

Este é o entendimento adotado por esta Corte, conforme resposta apresentada à Consulta n. 0600076-83.2020.6.21.0000, de relatoria do Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, julgada em 08.6.2020, na qual questionada a licitude de doações oriundas de filiados a agremiação diversa daquela destinatária dos recursos, proferida nos seguintes termos:

CONSULTA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO REGIONAL. QUESTIONAMENTO ACERCA DA LICITUDE DE DOAÇÕES ORIUNDAS DE FILIADOS EM PARTIDO DIVERSO DA AGREMIAÇÃO DESTINATÁRIA DOS RECURSOS. VEDADO. CONSULTA CONHECIDA E RESPONDIDA.

1. Indagação formulada por partido político, diretório regional, referente à licitude de doações oriundas de filiados a agremiação diversa daquela destinatária dos recursos.

2. O art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 estabelece a vedação ao recebimento de doações, pelas agremiações partidárias, advindas de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. Norma que institui exceção no ordenamento jurídico eleitoral, devendo receber interpretação restritiva, especialmente por ter sido editada em razão de situação peculiar, não podendo ser ampliada de forma extensa, sob pena de contrariar o próprio sentido da norma geral. Nesse contexto, cabe excluir de seu sentido toda e qualquer interpretação que possibilite que filiados a uma agremiação possam doar recursos financeiros a partido político diverso daquele ao qual estão ligados pelo vínculo de filiação. Cumpre ainda destacar a disposição do art. 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95, que veda a coexistência de mais de uma filiação partidária, a corroborar a congruência argumentativa.

3. Consulta conhecida e respondida: "Nos termos do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação."

 

Observo que, no processo em análise, a própria agremiação apontou que Leticia Hehn Soares e Viviane de Barros Tiburscki estavam filiadas a outro partido, não havendo como reconhecer a ressalva da fonte vedada.

Da mesma forma, a análise técnica considerou na glosa tão somente os valores repassados pela agremiação em datas anteriores ao cadastro da inscrição no Sistema de Filiação Partidária, como se depreende do cotejo entre as informações constantes no exame de contas (ID 44955598 – pag. 5 e 6) com aquelas contidas nas certidões trazidas aos autos (ID 44988695). Aponto a data da última contribuição considerada irregular e a data do registro da filiação: Aline Araujo Carvalho 02/03/2020-18/03/2020; Claudia Lunkes Bayer 27/04/2020-29/04/2020; Evandro Durr 06/03/2020-29/04/2020; Mateus Filipe Silva dos Santos 02/03/2020-25/03/2022; Renata Dionisio Postigo – 03/03/2020, 04/04/2020; Rudi Bagnara – 24/04/2020, 29/04/2020; Sandra Regina Haas Pacheco – 04/03/2020-29/04/2020.

Assim, reconheço como proveniente de fonte vedada, em afronta ao disposto no art. 12, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.604/19, e no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, o montante de R$ 11.109,41.

Conforme previsto no § 1º do art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19, os recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Nestes autos, os prestadores de contas comprovaram o recolhimento de R$ 3.916,18 (mais atualização e juros) à União (IDs 44988696 a 44986898), o que foi reconhecido pela Secretaria de Auditoria Interna, devendo tal montante ser subtraído do total a recolher.

Os recursos oriundos de fontes vedadas, no montante de R$ 11.109,41 (irregularidades sem a dedução dos valores recolhidos durante a tramitação desse processo), representam 0,6% do total de recursos recebidos (R$ 1.820.557,18), mostrando-se razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas. Embora o percentual das falhas não seja o único critério para a aferição da regularidade das contas, anoto que a postura dos prestadores de contas nestes autos se guiou pela transparência, lisura e comprometimento em cumprir a obrigação constitucional de prestar contas de maneira efetiva, tudo a autorizar que a aprovação com ressalvas seja a medida adequada para o caso.

Ademais, tenho também por satisfeitos os três requisitos indicados na jurisprudência do TSE para aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade: a) falhas que não comprometam a higidez do balanço; b) percentual irrelevante do montante irregular; c) ausência de má–fé da parte (PC 245–80, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE de 12.3.2021).

Entende-se possível a simples aposição de ressalvas na contabilidade quando a baixa representação percentual das irregularidades não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário.

A previsão de sanção de suspensão do repasse de recurso públicos deve ser interpretada de forma sistemática, na linha do que vem entendendo este Tribunal Regional Eleitoral, conforme exposto no precedente que transcrevo:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. UTILIZAÇÃO INCORRETA DO SISTEMA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. PERCEPÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FALHA EQUIVALENTE A 9,08% DO TOTAL DE RECURSOS AUFERIDOS NO PERÍODO EM EXAME. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INVIABILIDADE DA APLICAÇÃO DE MULTA E DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO.

[...]

3. O art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15 veda expressamente a possibilidade de doação de pessoa jurídica a partidos políticos. Quantia que deve ser considerada como procedente de fonte vedada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o disposto no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

 4. Créditos de recursos pelo diretório municipal sem a indicação do doador originário e doação efetuada sem a identificação do CPF ou CNPJ dos doadores, em inobservância às disposições contidas nos arts. 5º, inc. IV, 7º e 11, inc. III, todos da Resolução TSE n. 23.464/15. Montante que deve ser considerado como de origem não identificada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o disposto no art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

 5. O recolhimento do valor indevidamente recebido ao Tesouro Nacional é mera consequência jurídica relacionada à vedação do enriquecimento ilícito e não possui natureza de penalidade.

 6. Falhas que representam 9,08% dos recursos auferidos no exercício financeiro. Hipótese que, na esteira da jurisprudência firmada no Tribunal Superior Eleitoral, viabiliza a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar a severa penalidade de desaprovação das contas, admitindo o juízo de aprovação com ressalvas quando a baixa representação percentual das irregularidades não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário.

 7. O art. 36 da Lei n. 9.096/95 trata das sanções aplicadas aos partidos quando constatada  a violação de normas legais ou estatutárias, enquanto o art. 37 da mesma lei estabelece o regramento para o caso de desaprovação das contas. Trata-se de normas distintas, independentes entre si e que não se confundem.  O primeiro artigo vige até os dias atuais com a mesma redação da data da promulgação e nunca sofreu alterações, ao contrário do segundo, que  foi sucessivamente modificado pelo Congresso Nacional por meio das Leis n. 9.693/98 e n. 13.165/15. A nova redação do art. 37 da Lei n. 9.096/95 dispõe que a desaprovação das contas enseja, como única penalidade, a devolução da quantia apontada como irregular acrescida de multa, circunstância que prejudica eventual interpretação de que, no caso de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, poder-se-ia aplicar pena mais severa. Desde a edição da Lei dos Partidos Políticos, ao interpretar o art. 36, o TRE-RS assentou que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não há fixação da pena de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário aos partidos políticos, nada obstante a previsão legal disponha a cominação dessa sanção. Diretriz alinhada ao entendimento do TSE no mesmo sentido. A sanção é desconsiderada por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente, situação incompatível com a fixação de penalidade.

 8. Aprovação com ressalvas.

(Prestação de Contas n 060028875, ACÓRDÃO de 15/06/2020, Relator GERSON FISCHMANN, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 23/06/2020)

Por fim, registro que a aprovação com ressalvas não dispensa o recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores glosados nestes autos.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela aprovação com ressalvas das contas do Diretório Estadual do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB/RS, relativas ao exercício financeiro de 2020, e determino o recolhimento da quantia de R$ 7.193,23 (sete mil, cento e noventa e três reais e vinte e três centavos) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.