REl - 0600397-87.2020.6.21.0075 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/11/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

No mérito, as contas dos recorrentes foram desaprovadas em virtude da aplicação de recursos próprios no total de R$ 13.146,18, na campanha dos candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito, extrapolando em R$ 838,44 o limite para o autofinanciamento na campanha eleitoral estabelecido no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Cabe salientar que o teto de gastos definido pelo TSE para o pleito de 2020 na municipalidade foi de R$ 123.077,42, tendo como limite para a aplicação de recursos próprios na campanha 10% deste total, ou seja, R$ 12.307,75.

Em sua defesa, os candidatos sustentam a boa-fé na aplicação dos recursos, pois seguiram estritamente o parecer de sua equipe de contabilidade de campanha, cujo trecho a seguir transcrevo:

Consideramos que não foi excedido este limite pois foi somado aos gastos o valor estimado atribuído ao veículo usado pelo candidato. Sendo que em nosso entendimento os valores estimados não deveriam somar ao percentual de 10% permitido para os gastos próprios. Também consideramos que o valor estimado não deve ser considerado como indício de irregularidade, uma vez não houve movimentação financeira ultrapassando o limite de gastos próprios.

 

Contudo, não assiste razão aos recorrentes.

A matéria objeto de análise encontra-se disciplinada pela Resolução TSE n. 23.607/19, em seu art. 27, verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no art. 23, § 2º-A, da Lei n. 9.504/17.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 3º). (Grifei.)

 

Veja-se que o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 trata do autofinanciamento de campanha, estabelecendo que o candidato somente poderá empregar recursos próprios no valor máximo de 10% do limite previsto para gastos atinentes ao cargo em que concorrer, não havendo exceção a tal preceito.

Infere-se, pois, que o limite para custeio da campanha com recursos próprios é objetivo, aferido a partir de simples equação matemática em relação ao limite legal de gastos relacionados ao cargo em disputa.

E como bem pontuado pelo douto Procurador Regional Eleitoral, “a cessão de automóvel de propriedade do próprio candidato para uso durante a campanha eleitoral deve ser registrada na prestação de contas, justamente para que se possa verificar a observância do limite para o autofinanciamento, segundo disciplina o art. 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19”.

A razão de ser da inclusão, no limite do autofinanciamento com recursos próprios, das doações estimáveis em dinheiro é assegurar o princípio da isonomia entre os candidatos. Caso assim não fosse, por exemplo, um candidato que não possuísse veículo automotor teria incluído, para o cômputo dos seus limites de gastos, as despesas realizadas com recursos próprios com aluguel de carro, enquanto o candidato que possuísse veículo não teria qualquer gasto incluído para aferição do mesmo limite legal, para a realização de idêntica atividade de campanha.

Desse modo, tendo os candidatos ultrapassado o limite permitido para utilização de recursos próprios, não merece reparo a decisão de primeiro grau, no ponto em que considerou irregular o excesso de arrecadação na ordem de R$ 838,44.

Por outro lado, na esteira do parecer ministerial, entendo razoável e proporcional às circunstâncias do caso em comento reduzir o percentual da multa aplicada para o patamar de 30%, haja vista que o excesso não chegou a ser significativo, pois o autofinanciamento alcançou 10,68% do limite de gastos, não se justificando o sancionamento no grau  máximo prescrito em lei (100%).

Assim, readequado o percentual, os prestadores devem recolher o valor de R$ 251,53 ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Por fim, o valor da falha (R$ 838,44) possui diminuta expressividade econômica, sendo inferior, inclusive, ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, dispensando o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), bem como representa 5,91% do total das receitas de campanha dos recorrentes (R$ 14.169,12), atraindo a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade invocados na fundamentação recursal para que a escrituração contábil seja aprovada com ressalvas, como colho das seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016.).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/16".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator(a) Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 29.9.2017.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.7.2020.) (Grifei.)

 

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas dos recorrentes, reduzindo a penalidade de multa ao valor de R$ 251,53, correspondente a 30% do aporte considerado excessivo, o qual deve ser destinado ao Fundo Partidário.

É como voto, senhor Presidente.