REl - 0600497-35.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/11/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que aprovou com ressalvas as contas de LEANDRO FERNANDES DE OLIVEIRA, referentes às eleições municipais de 2020, em virtude de (1) atraso na abertura da conta bancária, (2) omissão de gastos eleitorais e (3) falta de comprovação de regular utilização do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Observo que a tese recursal lançada não se insurge contra o reconhecimento das falhas concernentes às irregularidades de atraso de um dia na abertura de conta bancária e à omissão de gasto eleitoral, no valor de R$ 20,04, as quais efetivamente estão identificadas nos autos, devendo permanecer a anotação e a determinação de recolhimento da quantia paga na despesa omitida, pois configura recurso de origem não identificada.

Quanto à ausência de documentos comprobatórios relativos às despesas com verbas do FEFC, reproduzo o parecer conclusivo:

No item 3 do Relatório de Exame de Contas, foram examinados os documentos apresentados na prestação de contas, tendo sido identificada a ausência dos documentos comprobatórios relativos às despesas bem como dos respectivos comprovantes de pagamento (copia do cheque nominal ao fornecedor ou transferência bancária identificando a contraparte) realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (arts. 35, 53, II, alínea "c" e 60, da Resolução TSE nº 23.607/2019). Devidamente intimando, o prestador apresentou cópias dos cheques emitidos – ID 91841373, sanando parcialmente as irregularidades apontadas, apenas o cheque número 850003 comprova o pagamento da despesa registrada na prestação de contas. Da análise dos documentos apresentados verificou-se divergências entre as informações prestadas:

Cheque Valor Nominal a Favorecido na prestação de contas

850001 R$ 120,00 Izabel C. Maciel Marcos Vinicíus dos Santos Lemos

850002 R$ 240,00 Arlindo Rodrigues Marcos Vinicíus dos Santos Lemos

850010 R$ 100,00 Leandro F. de Oliviera (o próprio candidato) Francine Branco

850008 R$ 220,00 Co. Comb. Londero Ltda. Jordana Copetti Pereira

Os cheques número 850009 (R$ 100,00) e 850011 (R$ 100,00) não estão nominais e cruzados.

Cumpre ao prestador comprovar a despesa com documentos fiscais e o pagamento com cheque nominal cruzado ou comprovante de transferência bancária, conforme art. 38 da Resolução TSE 23.607/2019, sob pena de recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores não comprovados. Os documentos entregues não comprovam o regular pagamento das despesas.

 

A situação é regulamentada pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto (que recebem previsão específica), só podem ser efetuados mediante cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta ou cartão de débito da conta bancária.

Em recurso, o prestador alega que o cheque n. 850001 foi emitido para pagamento de Isabel C. Maciel e o cheque n. 850002, para Marcos Vinícius Santos Lemos, mas houve equívoco na entrega dos títulos – o primeiro para Marcos Vinícius e o segundo para Isabel.

Não é possível acolher a tese defensiva.

Explico.

Verifico, nas imagens das cártulas trazidas aos autos pelo próprio recorrente, que o cheque  de n. 850002 foi preenchido de forma nominal a Arlindo Rodrigues, e não para Marcos Vinicius Santos Lemos (em contrário ao alegado) e, ademais, o contrato em nome de Marcos Vinicius Santos Lemos não apresenta valor fixado para os serviços objeto do contrato, não se prestando como prova nos autos.

No referente ao cheque n. 850010, no valor de R$ 100,00, sustenta que foi dado em pagamento a Francine Branco, assistente de divulgação de campanha, mas sacado pelo próprio candidato em razão de Francine não possuir conta bancária. Acosta contrato de prestação de serviço e recibo para corroborar o alegado.

Igualmente não procede.

Destaco que o cheque foi emitido nominal ao candidato. Quanto ao contrato e ao recibo referidos, são insuficientes a comprovar o real destino da verba, pois somente a forma de pagamento conforme previsão legal permitiria a fiscalização da Justiça Eleitoral sobre as quantias que transitaram nas contas de campanha.

Mesma razão pela qual não é possível acolher a alegação de regularidade nos pagamentos realizados por meio dos cheques n. 85009, n. 850011 e n. 850008, aqueles de R$ 100,00 (cada) e este de R$ 220,00, preenchidos de modo não nominal, e alegadamente atrelados os primeiros ao contrato de trabalho e ao recibo emitidos em nome de Elaine Paiva de Vargas e, o último, à nota fiscal emitida pela empresa Jordana Copetti Pereira.

No caso em tela, a vinculação não foi demonstrada porque não há segurança mínima relativamente ao destino dos recursos com os quais os compromissos foram supostamente adimplidos, restando evidente a desobediência aos meios estabelecidos para pagamento das despesas eleitorais.

Nessa linha, transcrevo excerto do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, por pertinente, e o expressamente agrego às presentes razões de decidir: 

Porém, cumpre ressaltar que os meios de pagamento previstos no art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos e, por consequência, da veracidade do gasto correspondente.

Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento, para que se possa apontar, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo, pois, necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi ele quem efetivamente recebeu o referido valor.

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE nº 23.607/2019, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se trata de aplicação de recursos públicos.

Ademais, a obrigação para que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta), como se dá com o cheque cruzado (art. 45 da Lei nº 7.357/85), assegura que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

Finalmente, ao não ser cruzado o cheque, permitindo o saque sem depósito em conta, resta prejudicado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e gastos de campanha, uma vez que impossibilitada a alimentação do sistema Divulgacandcontas com a informação sobre o beneficiário, inviabilizando o controle por parte da sociedade.

Enfatizo que, acertadamente, a sentença determinou recolhimento dos valores, pois consistentes em recursos de origem não identificada, R$ 20,04, e oriundos de verba pública, R$ 880,00.

Ou seja, permanecem as ressalvas identificadas na origem.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso, mantendo a aprovação das contas com ressalvas e a determinação de recolhimento de R$ 900,04 ao Tesouro Nacional.