REl - 0600220-35.2020.6.21.0072 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/11/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão de despesas com combustível na quantia total de R$ 1.000,00 sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Compulsando os autos, verifica-se que foram registradas seis notas fiscais emitidas pelo Posto de Gasolina e Lubrificantes Bolinha Ltda., na soma de R$ 550,00, e cinco notas fiscais emitidas pelo  Posto de Combustível da Figueira Eireli, no montante de R$ 450,00, tendo como contraparte o CNPJ da campanha do candidato, no total de R$ 1.000,00.

Intimado sobre a irregularidade, o candidato declarou que a despesa de combustível foi utilizada com veículo de sua propriedade. E, nas razões recursais, o candidato alega que o veículo era de sua propriedade, mas não foi usado por ele mesmo na sua campanha, e defende que não há prova nos autos de que ele próprio tenha utilizado seu veículo diretamente.

Importa destacar que na ocasião do Requerimento de Registro de Candidatura o candidato declarou não possuir bens, conforme consta no site do TSE: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/89630/210001127367. Conquanto tenha feito a alegação de que utilizou o combustível em  carro próprio, não trouxe aos autos o comprovante de propriedade do veículo utilizado na campanha.

Embora o art. 60, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispense a cessão de automóvel de propriedade do candidato e do seu cônjuge para utilização em benefício da candidatura, permanece a obrigação de registro na prestação de contas da campanha.

A ausência do registro na prestação de contas infringe o art. 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.
§ 4º Ficam dispensadas de comprovação na prestação de contas: 
(…) III - a cessão de automóvel de propriedade do candidato, do cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha. 
§ 5º A dispensa de comprovação prevista no § 4º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I a III do referido parágrafo.

Ademais, verifica-se que o pagamento de combustíveis realizado pelo candidato com recursos da campanha (FEFC) desrespeita o disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece que não configura gasto eleitoral e não pode ser pago com recursos de campanha o valor despendido em combustível usado pelo candidato:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

Ainda que o recorrente tenha alegado o uso do veículo por outrem, para considerar os gastos com combustíveis como gastos eleitorais, como requer o candidato, deveria ter sido atendido o que dispõe o art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece as condições em que o gasto havido com combustível durante a campanha será considerado gasto eleitoral:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução : (Lei nº 9.504/1997, art. 26)

(…) 
§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de: 
I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;
II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:
a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e
b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim
; e
III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

Portanto, a tese do recorrente de que o veículo de sua propriedade foi utilizado por terceiro em sua campanha, sem o devido registro, não o socorre, pois não há nos autos documento comprobatório da posse ou propriedade do veículo, nem da cedência do mesmo, permanecendo o apontamento da irregularidade.

Nesse mesmo sentido, a manifestação da douta Procuradoria Regional Eleitoral, litteris:

“Dessa forma, os recursos da campanha somente poderiam ter sido utilizados para o pagamento de despesas com combustíveis se o veículo a elas relacionado fosse objeto de cessão ou locação e tivesse sido devidamente declarado na prestação de contas. Quanto ao automóvel de propriedade do candidato utilizado na campanha, as despesas com combustíveis são consideradas gastos pessoais, estando vedado o seu custeio com recursos da campanha na forma do art. 35, §6º, acima citado.”

Em conformidade com o já decidido por este Tribunal:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. CANDIDATO. VEREADOR. RECURSOS PRÓPRIOS APLICADOS EM CAMPANHA QUE SUPERAM O TETO PERMITIDO. DESPESA IRREGULAR COM COMBUSTÍVEL. VALOR IRRISÓRIO. MANTIDA A MULTA APLICADA. CORREÇÃO DE OFÍCIO. DESTINAÇÃO DA PENALIDADE AO FUNDO PARTIDÁRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que desaprovou a prestação de contas referente às eleições municipais de 2020, em razão do excesso de doação de recursos próprios, fixando multa equivalente a 100% da irregularidade, e de despesa irregular com combustível.
2. Extrapolação de recursos próprios. O art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, além de limitar as doações de pessoas físicas em 10% sobre seus rendimentos no ano anterior, condiciona o uso de recursos próprios do candidato até o mesmo percentual, calculado sobre o valor do teto de gastos estabelecido para o cargo em disputa. Tal regramento foi recentemente incluído pela redação da Lei n. 13.878/19, que acrescentou o § 2º-A ao art. 23 da Lei das Eleições. No caso dos autos, a norma restou descumprida.
3. Despesa eleitoral com combustível. Incontroverso o gasto eleitoral com combustível, demonstrado por meio de nota fiscal com CNPJ de campanha. Alegado uso de veículo próprio, adquirido por meio de contrato de compra e venda – acostado aos autos, mas não transferido junto ao órgão competente. O veículo em questão não foi declarado originariamente na prestação de contas. Assim, o caso concreto não se enquadra em nenhuma das hipóteses autorizativas previstas no § 11 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 para o gasto de recursos eleitorais com combustíveis, permanecendo a falha assinalada.
4. A soma das irregularidades corresponde a 33,30% das receitas declaradas pela candidata, mas, em termos absolutos, ostenta valor irrisório, inferior à importância de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) adotada pela Corte Superior e por este Tribunal como uma espécie de "tarifação do princípio da insignificância", considerando a quantia o máximo absoluto entendido como diminuto.
5. A determinação de multa é consequência específica da extrapolação do limite de doação de recursos próprios para campanha estabelecido no § 4º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, sendo devida mesmo no julgamento pela aprovação das contas com ressalvas.
6. Correção, de ofício, de erro material na sentença quanto à destinação da penalidade de multa ao Tesouro Nacional, devendo ser recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), nos termos do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.
7. Provimento. Aprovação com ressalvas.

(Processo n. 0600399-90.2020.621.0064RE - Recurso Eleitoral n 060039990 - Ametista Do Sul/RS ACÓRDÃO de 18.11.2021 Relator FRANCISCO JOSÉ MOESCH - Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.)

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas. Na hipótese, houve descumprimento das regras contábeis aplicáveis a todos os candidatos.

Assim, permanece a irregularidade no valor de R$ 1.000,00, o qual, apesar de representar 34,48% das receitas declaradas (R$ 2.900,00), se situa dentro do parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Assim, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, mantendo a determinação de recolhimento ao erário.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para reformar a sentença e aprovar as contas com ressalvas, mantendo a determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.000,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.