MSCiv - 0603438-25.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/10/2022 às 16:00

VOTO

Registro a viabilidade da impetração do mandado de segurança em face das decisões proferidas no âmbito do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, as quais não ostentam caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo.

O entendimento está consolidado no art. 54, § 3º, da Resolução TSE n. 23.608/19, que estabelece o mandado de segurança como a via cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia, in verbis:

Art. 54. A competência para o processamento e julgamento das representações previstas no Capítulo II não exclui o poder de polícia sobre a propaganda eleitoral e as enquetes, que será exercido pelas juízas ou pelos juízes eleitorais, por integrantes dos tribunais eleitorais e pelas juízas ou pelos juízes auxiliares designados.

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral é restrito às providências necessárias para inibir ou fazer cessar práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas e das matérias jornalísticas ou de caráter meramente informativo a serem exibidos na televisão, na rádio, na internet e na imprensa escrita.

§ 2º No exercício do poder de polícia, é vedado à magistrada ou ao magistrado aplicar sanções pecuniárias, instaurar de ofício a representação por propaganda irregular ou adotar medidas coercitivas tipicamente jurisdicionais, como a imposição de astreintes (Súmula nº 18/TSE).

§ 3º O mandado de segurança é a via jurisdicional cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia.

(Grifei.)

Na hipótese, a partir de notícia de irregularidade em propaganda eleitoral, autuada sob o NIP n. 0600066-89.2022.6.21.0090, o Juiz Eleitoral da 90ª Zona, no exercício do poder de polícia, determinou a remoção do outdoor instalado no Município de Guaíba, em decisão assim lavrada (ID 45130101):

Vistos.

Trata-se de Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral recebido pelo Aplicativo Pardal, em virtude da instalação de outdoor localizado na Rua Bento Gonçalves, 156, Centro, Guaíba, com os dizeres "Bolsonaro 22. Deus. Pátria. Família." conforme se verifica no documento de ID 109433065.

Determinada abertura de vista ao Ministério Público Eleitoral foi juntada manifestação no ID 109481806.

É o sucinto relatório.

DECIDO.

Inicialmente, necessário destacar que este Juízo não detém competência para processar, julgar e punir as infrações às regras que disciplinam o exercício da propaganda eleitoral nas Eleições Gerais de 2022, competindo aos Juízos Eleitorais de 1º Grau tão somente o exercício do poder de polícia (art. 249 do Código Eleitoral e art. 41, § 1º da lei 9.504/97).

Assiste razão ao Ministério Público Eleitoral.

Com efeito, os fatos trazidos ao conhecimento desta Especializada, acompanhados de comprovação (ID 109433065), estão a exigir o exercício do poder de polícia por este Juízo para fazer cessar a prática ilegal, no caso, a realização de propaganda eleitoral em formato não permitido pela legislação eleitoral (outdoor).

O referido outdoor apresenta mensagem de natureza tipicamente eleitoral, na medida em que promove a recandidatura do atual Presidente da República, e também candidato à reeleição, Jair Messias Bolsonaro, indicando a realização de propaganda eleitoral.

O meio de propaganda utilizado é irregular, uma vez que o art. 39, § 8º, da Lei 9.504/1997, veda a divulgação de candidatos por meio de outdoors, in verbis:

Art. 39

[...]

§ 8º É vedada a propaganda eleitoral mediante outdoors, inclusive eletrônicos, sujeitando-se a empresa responsável, os partidos, as coligações e os candidatos à imediata retirada da propaganda irregular e ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

Pelos motivos aqui expostos, inafastável o reconhecimento da irregularidade apontada na propaganda eleitoral realizada por meio do outdoor denunciado.

Isso posto, no exercício regular do poder de polícia conferido aos Juízos Eleitorais, determino a notificação do responsável pela afixação da propaganda para, no prazo de 48 horas, remover o outdoor localizado na Rua Bento Gonçalves, 156, Bairro Centro, neste Município de Guaíba.

Nomeio como oficial de justiça “ad hoc” a servidora Daniela Rezende Kiraly para o cumprimento dos atos.

Intime-se o Ministério Público Eleitoral.

DL.

Guaíba, datado e assinado eletronicamente.

CRISTIAN PRESTES DELABARY

Juiz Eleitoral

A peça publicitária sob análise está assim materializada (ID 45130097):

No outdoor há exaltação da figura do candidato, utilizando a faixa presidencial, e referência a um de seus reconhecidos slogans de campanha.

A simples reprodução da imagem do candidato é suficiente para a promoção de sua candidatura à reeleição.

Logo, o artefato se amolda ao conceito de propaganda eleitoral, entendida como "aquela que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública" (AgR-Respe n. 167-34/RN, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 10.4.2014, e Respe n. 41395, Acórdão, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. designado Min. Rosa Weber, DJE de 27.6.2019).

Outrossim, o disposto no art. 36-A da Lei das Eleições ou o decidido neste Tribunal nos autos do MSCiv n. 0600192-21.2022.6.21.0000, referido na peça inicial, não socorrem o impetrante, uma vez que envolvem a análise do tema em período de pré-campanha.

Sobrevindo o período de propaganda eleitoral, torna-se incabível a análise da questão por meio dos critérios trazidos na legislação e na jurisprudência para a aferição da propaganda eleitoral antecipada.

Isso porque, ainda que o art. 36-A da Lei das Eleições permita, durante a pré-campanha, a divulgação de mensagens de apoio e agradecimentos a prováveis concorrentes ao pleito, desde que não envolvam pedido explícito de voto, sua incidência se exaure com o advento das campanhas propriamente ditas.

Com o início do período eleitoral, por imposição do art. 39, § 8º, da Lei das Eleições, ingressamos em um momento de vedação total a outdoors que promovam candidaturas, o que se evidencia com a foto estampada do candidato.

Assim, comprovada a colocação de artefato medindo 4 m², com evidente impacto visual de outdoor, está configurada a propaganda eleitoral irregular, nos termos do art. 26, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, in verbis:

Art. 26. É vedada a propaganda eleitoral por meio de outdoors, inclusive eletrônicos, sujeitando-se a empresa responsável, os partidos políticos, as federações, as coligações, as candidatas e os candidatos à imediata retirada da propaganda irregular e ao pagamento de multa no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) a R$15.000,00 (quinze mil reais), nos termos do art. 39, § 8º, da Lei nº 9.504/1997. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

§ 1º A utilização de engenhos ou de equipamentos publicitários ou ainda de conjunto de peças de propaganda, justapostas ou não, que se assemelhem ou causem efeito visual de outdoor sujeita a pessoa infratora à multa prevista neste artigo.

No mesmo sentido do exposto, colaciono julgado deste Tribunal Regional: 

MANDADO DE SEGURANÇA. ELEIÇÕES 2022. PROPAGANDA ELEITORAL. LIMINAR INDEFERIDA. ARTEFATO PUBLICITÁRIO. OUTDOOR. DEFLAGRADO PERÍODO PERMITIDO DE PROPAGANDA ELEITORAL. VEDAÇÃO. CONCEDIDA A SEGURANÇA. 1. Mandado de segurança impetrado em face de decisão proferida pelo Juízo da Zona Eleitoral que, no exercício do poder de polícia, indeferiu pedido para remoção de artefato publicitário relativo à propaganda eleitoral. Liminar indeferida. 2. Viabilidade de impetração do presente mandado de segurança, uma vez que a decisão do juízo eleitoral fora proferida em exercício de poder de polícia, atividade administrativa, conforme assentado por esta Corte. 3. Deflagrado o período permitido de propaganda eleitoral em 16.08.2022, não remanesce dúvida quanto à vedação do meio outdoor para veiculação de imagem de candidato à Presidência, fixados em rodovias de intenso trânsito. Concessão da segurança.

(TRE-RS – MS n. 0600423-48.2022.6.21.0000; Relator: DES. ELEITORAL AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Julgamento: 29.08.2022) (Grifei.)

Assim, diante da deflagração do período permitido de propaganda eleitoral, tornou-se inviável reconhecer o direito líquido e certo à manutenção do engenho publicitário em tela durante o período de campanha eleitoral.

Por fim, registro que, conforme constou nas informações da autoridade impetrada, foi constatada e certificada a remoção do outdoor em 26.9.2022 (ID 45131921).

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela denegação da segurança.