REC no(a) Rp - 0603389-81.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/10/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente. Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, comporta conhecimento.

Cuida-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO TRABALHO E PROGRESSO, NÁDIA RODRIGUES SILVEIRA GERHARD, RICARDO GOLIN e ARMINDO FERREIRA DE JESUS, dado que, julgada parcialmente procedente representação por propaganda negativa na internet, mediante impulsionamento, os três últimos representados foram condenados ao pagamento individual de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

No caso, a Coligação FRENTE DA ESPERANÇA atribuiu aos representados a divulgação de propaganda eleitoral negativa, impulsionada entre os dias 11 e 13 de setembro, na medida em que indica que o PT quer acabar com a Brigada Militar.

A vedação ao impulsionamento de propaganda negativa na internet vem lastreada no art. 29, caput e §§ 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19, verbis:

 

Art. 29. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, federações, coligações, candidatas, candidatos e representantes (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, caput). (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

(...)

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita a(o) responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, a pessoa beneficiária, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 2º).

§ 3º O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de internet com sede e foro no país, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecida(o) no país e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatas e candidatos ou suas agremiações, vedada a realização de propaganda negativa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 3º).

(…)

 

Com efeito, a propaganda eleitoral, mesmo com o emprego de discurso duro e contundente aos candidatos, que se propõem a desempenhar mandatos conferidos pela população, não pode ser cerceada, sob pena de vulneração do próprio princípio democrático.

Entrementes, é defeso o impulsionamento na internet de crítica a adversários no pleito eleitoral.

Em sua irresignação, os recorrentes sustentam não se tratar de propaganda negativa, mas sim de divulgação voltada ao campo ideológico. Alegam que a publicidade tem por propósito divulgar as linhas adotadas pela ex-candidata Nádia e pelo PT quanto à desmilitarização das forças policiais. Defendem que a peça publicitária visa beneficiar a recorrente, sem ostentar crítica a outros candidatos. Aduzem, ainda, que a postagem não acarretou prejuízo ao pleito, não devendo ser objeto de cerceamento, motivos pelos quais postulam a improcedência da representação.

Na hipótese dos autos, é incontroverso que a representada NÁDIA RODRIGUES SILVEIRA GERHARD (“COMANDANTE NÁDIA”) publicou a peça impugnada em seu perfil do Facebook (https://www.facebook.com/ComandanteNadia/videos/5388439391242410/?extid=CL-UNK-UNK-UNK-AN_GK0T-GK1C) e promoveu o impulsionamento do vídeo, conforme se verifica da Biblioteca de Anúncios da mesma rede social (https://www.facebook.com/ads/library/?active_status=all&ad_type=political_and_issue_ads&country=BR&view_all_page_id=469210766483304&sort_data%5bdirection%5d=desc&sort_data%5bmode%5d=relevancy_monthly_grouped&search_type=page&media_type=all).

Segue, abaixo, a transcrição da publicação impugnada:

 

Locução Masculina: Agora é Comandante Nádia Senadora! (00” até 02”)

Jingle: Bora lá, tchê! (03” até 04”)

Locução Feminina: Você ligou para a Brigada Militar. No momento não podemos atendê-lo. É, nem no momento e nem nunca mais. (04” até 14”) Comandante Nádia: É isso que o PT quer fazer: acabar com a Brigada Militar e deixar a tua família sem proteção. Comigo no Senado, com o apoio do Bolsonaro, isso não vai acontecer. Bora lá, tchê! (15” até 27”)

 

Não obstante as razões expostas pelos recorrentes, compreendo pela manutenção da decisão recorrida.

A meu ver é nítido o caráter de crítica política e o conteúdo de propaganda negativa, no vídeo impulsionado.

E aqui, cabe abrir um parêntese para um breve esclarecimento. No pedido de Direito de Resposta DR 0603318-79.2022.6.21.0000, no qual proferi decisão monocrática e, posteriormente, fui Relatora do respectivo recurso, manifestei-me pela improcedência da representação, não concedendo a resposta pleiteada. Contudo, embora se trate do mesmo fato, a normatização a ser aplicada traz resultado diverso. Para a concessão do Direito de Resposta é necessário que se conclua pela difusão de fato sabidamente inverídico, constituindo inverdade flagrante, que não apresente controvérsia. E, naquele feito, concluí pela ausência deste requisito. Agora, a análise objetiva apenas verificar a ocorrência, ou não, de crítica apta a configurar a propaganda negativa, cujo impulsionamento é vedado pelo art. 29, caput e § 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19.

No vídeo impugnado, a propaganda eleitoral da representada NÁDIA divulga a ideia de que os oponentes pretendem a supressão do serviço de policiamento preventivo, dando a entender que o atendimento de segurança pública não será mais prestado “no momento e nem nunca mais”, pois o PT quer “acabar com a Brigada Militar”.

Inviável, no caso, afastar a conclusão de que se trata, sim, de propaganda negativa.

A corroborar, segue escólio de Rodrigo Lopez Zílio (Direito Eleitoral. / Rodrigo López Zilio – 8. ed. rev. ampl. e atual. – São Paulo: Editora Juspodivm, 2020.):

A propaganda eleitoral na internet por impulsionamento pode ser realizada “com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações” (art. 57-C, §3º, da LE), ou seja, a licitude dessa forma de propaganda vincula-se a um conteúdo necessariamente positivo. Por outras palavras, é vedada a realização de propaganda eleitoral negativa mediante impulsionamento de conteúdo. Nesse sentido, aliás, o TSE tem anotado que “para a configuração da propaganda eleitoral antecipada do art. 57-C ,§3º, LE, basta a divulgação de mensagem ou fato que busque incutir no eleitor a ideia de “não voto” (AgR-REspe nº 060337225/PR – j . 12.12.2019 – DJe 23.03.2020). Contudo, não se pode desprezar que o impulsionamento empregado para beneficiar determinado candidato pode, em situações limítrofes, prejudicar seus concorrentes, tudo a depender do contexto utilizado naquela propaganda eleitoral. Porque o conteúdo positivo é condição de licitude da propaganda por impulsionamento, é vedado contratar a priorização paga de conteúdos mediante a inclusão de conteúdos que se configurem como sabidamente inverídicos ou que se traduzam em ofensa a honra de partidos e candidatos. (Grifei.)

 

E na mesma linha é a doutrina de Edson de Resende Castro, ao afirmar que “esse impulso só poderá repercutir anúncios, postagens, comentários, etc, para ‘promover ou beneficiar candidatos ou partidos’ e coligações, nunca para difundir críticas ou conteúdos que prejudiquem a imagem ou o desempenho eleitoral de adversários” (Curso de Direito Eleitoral. 9. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2018. p. 336).

No mesmo norte são os ensinamentos de Flávio Cheim Jorge, destacando que a legislação eleitoral “impede a utilização de impulsionamento para a realização de propaganda negativa, isto é, de ataque ou críticas a adversários”, concluindo que “o impulsionamento, é, assim, exceção que reafirma a regra do sistema, qual seja, a proibição de propaganda paga na internet” (Curso de Direito Eleitoral. 3. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, p. 384-385).

E o entendimento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral é nesse sentido, ao compreender que o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral é permitido apenas para a finalidade de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, sendo de rigor a aplicação de multa, se a propaganda tiver o objetivo de criticar candidatos a cargo eletivo:

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO SEM INDICAÇÃO DO CPF/CNPJ. ARTS. 57-C DA LEI 9.504/1997 E 29, § 5º, DA RES.-TSE 23.610/2019. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. AUSÊNCIA. MENSAGEM DIVULGADA COM TEOR NEGATIVO EM RELAÇÃO A CANDIDATOS ADVERSÁRIOS. DESCONFORMIDADE COM O ART. 57-C, § 3º, DA LEI 9.504/1997. ILÍCITO CONFIGURADO. MULTA. VALOR. LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

1. Recorrente que realizou impulsionamento de 3 (três) postagens na rede social facebook, entendendo a Corte Regional configurada propaganda eleitoral irregular, com a consequente imposição de multa, em razão i) da ausência de indicação, de forma clara, do CNPJ do contratante e ii) do conteúdo negativo das publicações em relação a outros candidatos.

(...)

3. As exigências previstas na Resolução editada pelo TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL no exercício de sua competência regulamentar não representam inovação na ordem jurídica nem violam o princípio da legalidade, tendo em vista que a imposição de multa pelo descumprimento do art. 29, § 5º, da Res.-TSE 23.610/2019 decorre do próprio art. 57-C, § 2º, da Lei 9.504/97. Precedentes.

4. O contexto fático delimitado nos pronunciamentos das instâncias ordinárias demonstra que as postagens impulsionadas veiculam conteúdo negativo em relação a outros candidatos. A jurisprudência do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL firmou-se no sentido de que "o art. 57-C, § 3º, da Lei das Eleições permite o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral apenas para a finalidade de “promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações’” (Rp. 0601861-36, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe de 7/10/2021).

5. Conduta praticada pelo Recorrente que não se insere na autorização legal para a realização do impulsionamento e, dessa forma, caracteriza propaganda eleitoral irregular, ensejando a aplicação de multa, nos termos do § 2º do art. 57-C da Lei 9.504/1997.

6. O valor da multa foi estabelecido de forma fundamentada, a partir das circunstâncias concretas do caso, revelando-se inviável sua redução.

7. Recurso Especial desprovido.

(AREspE n. 0600161-80.2020.6.06.0002/CE n. 060016180, Acórdão, Relator Min. Carlos Horbach, Relator designado Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 145, Data 02.8.2022). (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO A AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. REDE SOCIAL. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO NEGATIVO. VEDAÇÃO LEGAL. ART. 57–C, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. MULTA. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA Nº 30/TSE. DESPROVIMENTO.

1. Nos termos do art. 57–C, § 3º, da Lei nº 9.504/97, é vedado o impulsionamento de conteúdo negativo na internet. Precedentes.

2. A Corte de origem assentou que críticas e comentários negativos foram feitos acerca da administração pública municipal à época, notadamente à gestão do então prefeito e candidato a reeleição.

3. De acordo com a jurisprudência do TSE, “é de rigor a multa prevista no § 2º do art. 57–C da Lei nº 9.504/97 se a propaganda eleitoral por meio de impulsionamento de conteúdo na internet tiver o objetivo de criticar candidatos a cargo eletivo” (AgR–AI nº 0608882–40/SP, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 18.6.2019).

4. As limitações impostas à propaganda eleitoral não afetam os direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de informação. Precedentes.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgR-AREspE n. 0600384-93.2020.6.16.0183/PR, Acórdão, Relator Min. Carlos Horbach, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 85, Dat:a 11.5.2022). (Grifei.)

 

Registro, por fim, que, conforme consignado na decisão hostilizada, a crítica no debate eleitoral não é proibida, é intrínseca ao processo de escolha dos que se oferecem a desempenhar postos de poder na sociedade. A vedação é objetiva, quanto à impossibilidade de propagação de críticas pagas na internet, no pleito eleitoral, de forma que é defeso o impulsionamento de mensagem, com conteúdo crítico a concorrentes.

Assim, não vislumbro razões para alterar o convencimento que firmei em relação à matéria, no sentido de que a postagem configura propaganda impulsionada com conteúdo negativo, bem como quanto à aplicação de multa.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.