ED no(a) REl - 0600707-22.2020.6.21.0034 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/10/2022 às 14:00

 

VOTO

 

Os embargos são regulares, tempestivos e comportam conhecimento.

Quanto ao cabimento, os embargos de declaração servem para afastar obscuridade, omissão, contradição ou erro material, nos termos do art. 275, incs. I e II, do Código Eleitoral e art. 1.022 do CPC.

Adianto que não assiste razão aos embargantes, pois em ambos os recursos a matéria trazida em sede de aclaratórios já foi suficientemente enfrentada no acórdão.

Senão vejamos.

O embargante José Sizenando dos Santos Lopes entende que a decisão padece de omissão pertinente à gravação ambiental trazida aos autos e sobre a jurisprudência do TSE quanto à possibilidade de enfrentamento da matéria de preclusão e a decadência. Quanto à aludida prova, as alegações são de: a) erro judicial por ausência de inovação; b) omissão quanto à ilicitude da gravação ambiental à luz da atual jurisprudência do TSE e à luz do art. 926 do NCPC; c) omissão quanto ao agir da interlocutora e à quebra da cadeia de custódia da prova; e d) omissão quanto à jurisprudência do STJ e da Justiça Eleitoral sobre o tema dos prints.

Ocorre que a matéria ora trazida em sede de embargos já foi analisada por este Juízo quando da prolação do acórdão, verbis:

Em 29.8.2022, o recorrido apresentou petição manifestando-se quanto à ilicitude da gravação ambiental e a alegação de preclusão e decadência quanto à apresentação do rol de testemunhas, esta última somente trazida em memoriais.

Passo a analisar as alegações de ilicitude da gravação ambiental (memoriais e petição de ID 45055391) e intempestividade do rol de testemunhas.

O recorrente manifestamente inova em sua peça recursal, matérias que, independentemente de sua natureza jurídica (pública ou privada), restam preclusas, nos termos da reiterada jurisprudência do TSE:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. VEREADOR. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97). AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. DISCUSSÃO ACERCA DA VEDAÇÃO DE INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO NA SEARA ELEITORAL. ART. 105-A DA LEI Nº 9.504/97. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE DESPROVIMENTO.

1. O agravo regimental reclama, para o seu provimento, que os fundamentos da decisão agravada sejam especificamente infirmados, sob pena de subsistirem suas conclusões.

2. A tese assentada na ilicitude das provas por alegada inadmissibilidade de instauração de inquérito civil público na esfera eleitoral, nos termos do art. 105-A da Lei das Eleicoes, foi ventilada pela vez primeira nas razões do agravo regimental, configurando inovação recursal inadmitida pela jurisprudência desta Corte.

3. Agravo regimental desprovido e consequente prejuízo da Ação Cautelar nº 9451/RN vinculada a este processo, cujas ordens liminares de concessão de efeito suspensivo ao recurso especial e de manutenção do ora Agravante no cargo de vereador tornam-se insubsistentes.

(TSE - RESPE: 00002003720126200061 PEDRO VELHO - RN, Relator: Min. Luiz Fux, Data de Julgamento: 01/12/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 052, Data 16/03/2016, Página 29/30) (Grifo nosso)

Como cediço, cumpria ao recorrente alegar as aventadas nulidades ainda perante o juízo de primeiro grau.

Nessa linha, confiram-se ainda os seguintes julgados da Corte Superior:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). REPRESENTAÇÃO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ARRECADAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS DE CAMPANHA. ARTS. 22 DA LC 64/90, 41-A E 30-A DA LEI 9.504/97.

[...]

3. Todavia, a matéria foi suscitada apenas em sede de terceiros embargos declaratórios opostos perante a Corte a quo, tendo-se operado a preclusão, porquanto incabível conhecer de nulidade tardiamente aduzida, sem que houvesse óbice anterior para sua oportuna arguição, ainda que envolva matéria de ordem pública. Precedentes.

4. Assim, não se admite que o agravante, em notória afronta ao princípio da boa-fé objetiva (art. 5º do CPC/2015), se utilize de reserva tática com o propósito de se beneficiar posteriormente de sua própria omissão no processo – a conhecida nulidade “de algibeira” ou “de bolso”.

[…]

12. Agravos internos a que se nega provimento.

(TSE - AI: 69359201660900000132 APARECIDA DE GOIÂNIA - GO, Relator: Min. Og Fernandes, Data de Julgamento: 24/09/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 216, Data: 27/10/2020.)

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2014. PRESTAÇÃO DE CONTAS. APRESENTAÇÃO POR ADVOGADO SEM PROCURAÇÃO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PRECLUSÃO. IRREGULARIDADES QUE CONTAMINARAM PERCENTUAL ELEVADO DAS CONTAS. VALOR NOMINAL SIGNIFICATIVO. APLICAÇÃO LIMITADA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. REITERAÇÃO DE ARGUMENTOS ENFRENTADOS EM DECISÃO INDIVIDUAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 26 DO TSE.

1. A nulidade processual só pode ser pronunciada quando estiver demonstrado o efetivo prejuízo para a parte, devendo ser suscitada na primeira oportunidade que couber ao interessado se manifestar nos autos, sob pena de preclusão.

[...] Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE: AgR-REspe n. 1266-92/MS, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 8.11.2016, DJe de 21.11.2016)

Sob outro enfoque, é sólida a jurisprudência eleitoral no sentido de que não se declara a nulidade de ato processual sem a demonstração de efetivo prejuízo, na forma prescrita pelo art. 219 do Código Eleitoral, verbis: “Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo”.

A esse respeito, o seguinte julgado do TSE:

ELEIÇÕES 2016. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VII, DA LEI Nº 9.504/97. PREFEITO. CANDIDATO A REELEIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PEDIDO DE DESTAQUE. JULGAMENTO DO AGRAVO REGIMENTAL MEDIANTE VOTAÇÃO EM LISTA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. REJEIÇÃO.

[…]

5. Vigora nos feitos eleitorais o princípio pas de nullité sans grief, consagrado no art. 219 do Código Eleitoral, segundo o qual o reconhecimento de eventual nulidade de ato processual é condicionado à demonstração de real e efetivo prejuízo, o que não ocorre nestes autos. 6. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - REspEl: 06000573020196240000 SOMBRIO - SC, Relator: Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Data de Julgamento: 15/10/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 221, Data 03/11/2020)

 

Note-se que finalizo a introdução do voto asseverando: “Não conheço, portanto, das alegações aduzidas por consubstanciarem inovação recursal (intempestividade do rol e ilicitude da gravação ambiental).”

Assim, não há que se falar em erro, obscuridade ou omissão da decisão ao tratar dos temas trazidos, uma vez que o acórdão não conheceu das alegações suscitadas.

Já o tema central dos embargos declaratórios interpostos por Cauê Fuhro Souto Martins é a destinação dos votos recebidos pelo vereador cassado em virtude de corrupção eleitoral.

Não há obscuridade, contradição, omissão e sequer erro material a ser invocado, pois o decisum descreve explicitamente que os votos devem ser considerados nulos, para todos os fins, ou seja, não devem ser reaproveitados, verbis:

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso para manter a sentença relativamente ao segundo fato, determinando a cassação do diploma, restando nulos, para todos os fins, os votos atribuídos ao recorrente, devendo ser realizado o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, por força do disposto no art. 198, inc. II, al. "b", da Resolução TSE n. 23.611/19, dispositivo que foi objeto inclusive de confirmação pelo TSE no RO n. 603900-65.2018.6.05.0000, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJE de 26.11.2020. (grifo nosso)

 

A matéria objeto dos aclaratórios encontra-se regulamentada nos arts. 222 e 237 do Código Eleitoral:

 

Art. 222. É também anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei.

 

Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos.

§ 1º O eleitor é parte legítima para denunciar os culpados e promover-lhes a responsabilidade, e a nenhum servidor público, inclusive de autarquia, de entidade paraestatal e de sociedade de economia mista, será lícito negar ou retardar ato de ofício tendente a esse fim.

§ 2º Qualquer eleitor ou partido político poderá se dirigir ao corregedor-geral ou regional, relatando fatos e indicando provas, e pedir abertura de investigação para apurar uso indevido do poder econômico, desvio ou abuso do poder de autoridade, em benefício de candidato ou de partido político.

§ 3º O corregedor, verificada a seriedade da denúncia procederá ou mandará proceder a investigações, regendo-se estas, no que lhes for aplicável, pela Lei nº 1.579 de 18 de março de 1952.

 

Em suas razões, o embargante aduz que os arts. 222 e 237, ambos do Código Eleitoral, os quais se referem à anulabilidade dos votos conferidos pelo abuso do poder econômico ou desvio de autoridade, não revogaram o preceito contido no art. 175, § 4º, do Código Eleitoral e que, ao votar, o eleitor estará escolhendo ser representado por determinado partido e, preferencialmente, pelo candidato por ele escolhido, de modo que, caso o candidato não seja eleito ou tenha seu diploma cassado, o voto será somado aos demais votos da legenda, compondo a votação do partido ou coligação.

Quanto ao ponto, o ilustre doutrinador Rodrigo López Zilio leciona a impossibilidade de aproveitamento dos votos para a legenda na hipótese sob exame:

A AIME não visa a declaração de nulidade dos votos. No entanto, a nulidade dos votos também é efeito anexo da sentença de procedência, na forma preconizada pelos artigos 222 e 237 do Código Eleitoral. Vale dizer, não é possível o aproveitamento dos votos para a legenda na hipótese de procedência de AIME, como já decidiu o c. TSE. (grifei)

(Rodrigo López Zilio, Direito Eleitoral, 8.ed.rev.ampl. e atual. - São Paulo: Editora Juspodivum, 2022, p.725)

 

No mesmo sentido é a jurisprudência do TSE, de 18.12.2007, no MS n. 3649: “Os arts. 222 e 224 devem ser interpretados de modo que as normas neles contidas se revistam de maior eficácia [...] para contemplar, também, a hipótese dos votos atribuídos aos cassados em AIME para declará-los nulos, ante a descoberta superveniente de que a vontade manifestada nas urnas não foi livre […]”. (grifo nosso)

No caso dos autos, mostra-se evidente a ausência dos requisitos para a oposição de ambos os embargos. O que pretendem os embargantes é rever a justiça da decisão, entendendo possuir argumentos suficientes para alterar o resultado do julgamento. Ocorre que os embargos de declaração não servem para rediscutir o mérito do julgado, sendo “incabível a inovação de teses recursais no âmbito dos embargos de declaração” (TSE-EDAgR-AI n. 69-63/RS – j. 08.05.2014 – Dje 09.06.2014).

Dessarte, as omissões/contradições apontadas não estão presentes na decisão embargada, pois não expressa dissonância flagrante entre a vontade do julgador e a sua exteriorização.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração opostos por JOSÉ SIZENANDO DOS SANTOS LOPES e CAUÊ FUHRO SOUTO MARTINS.