REl - 0600775-75.2020.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/10/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento. 

No mérito, a sentença combatida reconheceu que Orlei Azeredo confeccionou 38 camisetas com sua propaganda eleitoral, as quais promoviam a sua candidatura, estampando sua imagem, nome, número, partido e cargo.

Resta incontroverso que as camisetas tiveram o custo unitário de R$ 30,00, perfazendo o valor total de R$ 1.140,00, o qual foi quitado com recursos de campanha, por meio do cheque n. 850001, emitido por ELEIÇÃO 2020 ORLEI AZEREDO VEREADOR (CNPJ 38.699.343/0001-69), tendo sido a respectiva nota fiscal lançada na prestação de contas do candidato (PCE n. 0600670-98.2020.6.21.0032).

A petição inicial expõe, ainda, imagens extraídas das redes sociais de campanha, nas quais é possível visualizar eleitores vestindo as camisetas em apoio à candidatura. Tais eleitores são identificados pelo Ministério Público Eleitoral como sendo “Valdocir Caurio (cunhado), Schaiane Azeredo Caurio (sobrinha), Fernanda B. Azeredo (sobrinha), Alessandra Azeredo Caurio (sobrinha), Valentina Azeredo (Sobrinha), Anthony Azeredo (sobrinho), Orlei Azeredo, Valdir Azeredo (irmão), Daniele Belmonte (vizinha), Lezormina Azeredo (irmã) e (na segunda foto) Thayana Otero (amiga)”, ou seja, familiares ou apoiadores próximos do candidato.

Diante disso, defende o recorrente que o candidato infringiu o art. 39, § 6º, da Lei n. 9.504/97, consoante o qual “é vedada na campanha eleitoral a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor”.

Conforme constou na sentença, “foram produzidas apenas 38 camisetas, um número consideravelmente reduzido frente a um eleitorado de mais de 23 mil eleitores, além de terem sido utilizadas por um breve período de tempo, pelo candidato e seus apoiadores, segundo consta nos autos, familiares do candidato, tendo sido recolhidas após se ter conhecimento que sua confecção era irregular”.

Ocorre que a confecção de camisetas não está, por si só, proibida, mas, sim, a distribuição que beneficie os eleitores, ou seja, a produção de artigos que sejam destinadas à distribuição ao eleitorado na forma de brindes ou presentes.

Por outro lado, é assente na jurisprudência que a entrega de camisetas com propaganda eleitoral com o intuito de organizar e identificar apoiadores próximos e a equipe de cabos eleitorais não se enquadra na vedação do art. 39, § 6º, da Lei n. 9.504/97, uma vez que não caracteriza vantagem ao eleitor.

Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA ROBUSTA. AUSÊNCIA. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Consoante jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a condenação por captação ilícita de sufrágio exige prova robusta e não pode ser baseada em mera presunção. Precedentes.

2. Na espécie, a distribuição pontual de 50 camisetas a cabos eleitorais e à equipe de campanha não configura vantagem oferecida a eleitor. Isso porque se trata de "mecanismo de organização de campanha" (RO 1507, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 1º.10.2010).

3. Desse modo, também não se configura o suposto abuso de poder econômico, que exige comprovação da "utilização excessiva, antes ou durante a campanha eleitoral, de recursos materiais ou humanos que representem valor econômico,

buscando beneficiar candidato, partido ou coligação, afetando a normalidade e a legitimidade das eleições" (AgRg no RCED 580, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 1º.11.2011).

4. Agravo regimental não provido.

(TSE - Recurso Ordinário nº 167589, Acórdão, Relator(a) Min. João Otávio De Noronha, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 204, Data: 27/10/2015, Página 55/56.) (Grifei.)

 

Agravo regimental. Recurso especial. Ação de investigação judicial eleitoral. Abuso de poder. Uso indevido dos meios de comunicação social. Distribuição de camisetas e bonés.

1. A Corte Regional Eleitoral concluiu que camisetas e bonés não foram distribuídos a eleitores, mas utilizados por cabos eleitorais que trabalharam na campanha dos candidatos investigados, razão pela qual não ficou caracterizada a prática de abuso do poder econômico - conclusão que, para ser revista, exigiria o reexame de fatos e provas, vedado nesta instância especial.

2. O TSE já decidiu que “a distribuição de camisetas unicamente a cabos eleitorais não caracteriza concessão de vantagem a eleitor, mas mecanismo de organização de campanha” (RO nº 1.507, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE de 1º.2.2010).

3. A demonstração da divergência jurisprudencial (artigo 276, I, b, do Código Eleitoral) exige a transcrição dos trechos dos acórdãos que a configurem, mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral nº 53674, Acórdão, Relator(a) Min. Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Data: 09/04/2014.) (Grifei.)

 

Na mesma senda, o seguinte precedente deste Tribunal Regional:

Prestação de contas. Eleições 2010. Parecer técnico pela aprovação e pronunciamento ministerial nos autos pela rejeição. Discutida a confecção de camisetas, consubstanciando, em tese, o ilícito de produção e distribuição de bens que beneficiem o eleitor (artigo 39, § 6°, da Lei n. 9.504/97).

Inexistência, na legislação eleitoral, de proibição a candidatos de fornecerem uniforme ou outra forma de identificação aos cabos eleitorais remunerados. Número de camisetas e valor gasto compatível com a campanha em nível estadual.

Aprovação.

(TRE-RS - Prestação de Contas n 712919, ACÓRDÃO de 07/12/2010, Relator: DES. MARCO AURÉLIO DOS SANTOS CAMINHA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 07/12/2010.) (Grifei.)

 

Na hipótese, a prova dos autos demonstra que as camisetas foram oferecidas a familiares, apoiadores próximos e cabos eleitorais do candidato, para utilização em campanha, o que se compatibiliza com a produção de 38 peças, quantidade razoável e proporcional ao uso alegado.

Por outro lado, não existem elementos mínimos para se concluir pela distribuição indiscriminada e graciosa a eleitores, da qual se pudesse cogitar em abuso ou alguma forma ilícita de captação de votos.

Eventual ilicitude decorrente da estampa das camisetas poderia ser avaliada em representação por propaganda irregular, ficando desde já clara a inaplicabilidade do art. 18, § 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19, incluído pela Resolução n. 23.671/2021, então inexistente à época dos fatos.

No que se refere, especificamente, ao enquadramento do fato no art. 30-A da Lei das Eleições, o recorrente sustenta que, na prestação de contas, o valor despendido com as camisetas foi declarado de forma dissimulada, constando na Nota Fiscal n. 031.730.788, emitida por Débora Magalhães Rodrigues, a expressão genérica “produto eleitoral 1”, no valor de R$ 1.140,00, e “produto 2”, na monta de R$ 255,00 (ID 44872523, fl. 38), com o objetivo de ocultar a natureza do gasto.

De seu turno o candidato nega qualquer tentativa de ocultar a compra, alegando que o preenchimento da nota fiscal é responsabilidade do fornecedor, não do cliente. Ressalta, também, que se pretendesse ocultar a despesa, não teria apresentado a nota fiscal com o seu CNPJ de campanha e nem pago despesas com cheque de sua conta eleitoral.

Ouvida como testemunha compromissada, a empresária Débora Magalhães Rodrigues, fornecedora dos produtos, declarou que as camisetas foram encomendadas pelo candidato Orlei, acompanhado da sua filha (Camila), e pagas com cheque da conta eleitoral. Esclareceu que as notas fiscais foram elaboradas com a discriminação de “produto 1” e “produto 2” a pedido da filha do candidato, a qual disse ter recebido orientação do contador da campanha para tanto (ID 44872553).

Embora, de fato, a nota fiscal emitida não descreva adequadamente os produtos, representando irregularidade capaz de macular a transparência das contas eleitorais, isso não significa, necessariamente, que houve arrecadação ou gasto ilícito de campanha, os quais possuem contornos diversos, abrangendo o recebimento de recursos de fonte vedada, movimentação de “caixa 2” ou gastos ilícitos com gravidade sobre a legitimidade do pleito, o que não se verifica na espécie.

Ademais, a procedência da demanda reclama a demonstração inequívoca da “existência de ilícitos que extrapolem meras irregularidades na prestação de contas do candidato” (TSE – RO 194710/AC, Relator: Min. José Antônio Dias Toffoli, DJE de 11.10.2013), porquanto, “na conformação da conduta ao art. 30-A da Lei n. 9.504/1997, deve-se levar em consideração a relevância jurídica do ilícito no contexto da campanha, orientada pelo princípio da proporcionalidade” (TSE - AC: 39481/MT, Relator: Min. Gilmar Ferreira Mendes, DJe de 11.9.2015).

Na mesma direção, ainda, colho as seguintes ementas:

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÃO 2010. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. LEI Nº 9.504/97, ART. 30-A. DIPLOMA. CASSAÇÃO. PROVIMENTO.

1. O recurso cabível contra a decisão que envolve a perda do diploma em eleições federais e estaduais é o ordinário. Na espécie, é admissível o recebimento do recurso especial como ordinário, por aplicação do princípio da fungibilidade. Precedentes.

2. Na linha da jurisprudência firmada por esta Corte, para a incidência do art. 30-A, § 2º, da Lei nº 9.504/97, é necessária a aferição da relevância jurídica do ilícito, porquanto a cassação do mandato ou do diploma deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão ao bem jurídico protegido pela norma.

3. In casu, a quantia movimentada irregularmente corresponde a apenas 2,7% (dois vírgula sete por cento) do total de recursos, utilizados na campanha eleitoral, não sendo suficiente para ensejar a cassação do diploma.

4. Recurso ordinário provido."

(TSE - REspe nº 6-82/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 14/3/2014) (Grifei.)

 

Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilícita de recursos. Abuso do poder econômico.

1. Segundo a jurisprudência do Tribunal, para que seja imposta a sanção de cassação em razão da prática do ilícito previsto no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, faz-se necessária a comprovação da proporcionalidade da conduta em relação à penalidade a ser imposta.

2. Ademais, para a configuração do abuso do poder econômico, faz-se necessária, em se tratando de eleições municipais de 2008, a comprovação do requisito de potencialidade.

3. Ainda que reconhecida a utilização de linha de telefone pertencente a sindicato - cujo número foi informado para fins de comunicações processuais da Justiça Eleitoral -, não ficaram evidenciadas outras circunstâncias a indicar a gravidade ou potencialidade da conduta, de modo a configurar os ilícitos dos arts. 30-A da Lei das Eleicoes ou 22, caput, da Lei Complementar nº 64/90.

Agravo regimental não provido."

(TSE - AgR-REspe nº 9565164-06/CE, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 9/10/2012) (Grifei.)

 

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÃO 2010. REPRESENTAÇÃO. LEI Nº 9.504/97. ART. 30-A. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. CASSAÇÃO. DIPLOMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PROVIMENTO.

1. Na representação instituída pelo art. 30-A da Lei nº 9.504/97,

deve-se comprovar a existência de ilícitos que possuam relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição.

2. No caso dos autos, as omissões relativas a determinados gastos de campanha não possuem gravidade suficiente para ensejar a cassação do diploma do recorrente, na medida em que não ficou comprovada a utilização de recursos de fontes vedadas ou a prática de caixa dois.

3. Recurso ordinário provido.

(TSE - RO 39322/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 21/8/2014) (Grifei.)

 

Nesse norte, ainda que admitida a suposta finalidade de distribuição de brindes, o fato teria beneficiado, no máximo, 38 eleitores, dentre os quais estão vários parentes e amigos do candidato, em um universo de 18.867 votantes, no qual o recorrido alcançou 539 votos.

Logo, é evidente a ausência de gravidade das circunstâncias, as quais estão despidas de força suficiente para interferir na liberdade do voto e desequilibrar a disputa eleitoral.

Outrossim, independentemente da discussão sobre a licitude do produto e ainda que se tome o valor global da Nota Fiscal n. 031.730.788, a despesa em questão envolveu apenas R$ 1.395,00, que representa cerca de 9,1% do total de recursos arrecadados em campanha (R$ 15.257,40).

Dessa forma, a reduzida expressão percentual dos fatos sequer autorizaria a desaprovação das contas, tendo em vista a diretriz jurisprudencial estabelecida no TSE e nesta Corte Regional no sentido de que falhas inferiores a 10% dos recursos manejados não têm o condão de macular a integridade e fidedignidade da contabilidade como um todo.

Desta forma, constata-se a fragilidade do acervo probatório carreado aos autos para comprovar a gravidade e a relevância jurídica dos fatos a atrair a incidência das gravosas sanções previstas no art. 30-A da Lei n. 9.504/97 e no art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90, impondo-se a confirmação da sentença que julgou improcedente a ação.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.