MSCiv - 0603421-86.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/10/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

De início, sublinho o cabimento hipotético de mandado de segurança contra decisão de juízo eleitoral proferida em exercício de poder de polícia, atividade administrativa, conforme já assentado por esta Corte. Exemplificativamente, trago ementa de decisão recente no Recurso Eleitoral n. 0600185-73, Rel. Des. Francisco José Moesch, julgado em 03.5.2022:

RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. DETERMINADA A REMOÇÃO DE OUTDOOR. EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NÃO CONHECIDO.

1. Insurgência contra decisão que acolheu o pedido do órgão ministerial e determinou a remoção de outdoor, por considerar caracterizada a propaganda eleitoral antecipada por meio vedado pela legislação. O juízo sentenciante, após descumprimento da ordem de retirada da propaganda, determinou que o Município realizasse a remoção do outdoor, autorizando a cobrança de valores dispendidos com a retirada do artefato. Acolhido ainda, pedido para a extração de cópia integral da representação e instauração de expediente criminal, para análise da eventual prática de crime de desobediência.

2. O parágrafo 3º do artigo 54 da Resolução TSE n. 23.608/19, estabelece que o mandado de segurança é a via cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia.

3. No caso dos autos, trata-se de procedimento administrativo em que o Ministério Público Eleitoral invocou o exercício do poder de polícia pela Juíza Eleitoral do local do fato para a remoção de propaganda eleitoral antecipada por meio de outdoor. As decisões prolatadas no âmbito do poder de polícia, conferido aos juízes eleitorais, não têm caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo, de modo que devem ser judicialmente impugnadas por meio de mandado de segurança.

4. Recurso manifestamente incabível para o controle jurisdicional dos atos praticados no exercício do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, razão pela qual é inviável o seu conhecimento.

5. Não conhecido.

 

FERNANDA MELCHIONNA E SILVA e LUCIANA KREBS GENRO, candidatas aos cargos de deputada federal e de deputada estadual, respectivamente, impetram MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de concessão de medida liminar contra ato do Magistrado Titular da 5ª Zona Eleitoral, sediada em Alegrete.

A decisão hostilizada foi proferida nos autos da Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral n. 0600055-24.2022.6.21.0005 (45129584, p. 2-3), que indeferiu, no exercício do poder de polícia, a retirada de painel externo fixo de alegada propaganda eleitoral em benefício do candidato Jair Bolsonaro.

Na origem, o pedido recaia sobre três peças publicitárias, e houve determinação de retirada de duas delas, enquanto a terceira, objeto dos presentes autos, foi mantida ao entendimento do juízo de não haver “pedido explícito de voto, menção a candidatura, número de candidato, partido político, proposta de governo, frase de apoio, nem mesmo imagem de candidato” e, ainda, “a Bandeira do Brasil é um dos símbolos da República Federativa do Brasil e não tem vinculação com nenhum candidato ou partido político”.

Passo à análise, e antecipo que mantenho os termos de fundamentação já exarados por ocasião do exame do pedido de concessão de medida liminar:

Vistos.

FERNANDA MELCHIONNA E LUCIANA GENRO, candidatas respectivamente aos cargos de deputada federal e de deputada estadual, impetram MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de concessão de medida liminar contra ato do Magistrado Titular da 5ª Zona Eleitoral, sediada em Alegrete.

A autoridade tida como coatora indeferiu pedido de retirada de um outdoor, do total de três remoções requeridas em exercício do poder de polícia relativo à propaganda eleitoral (Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral n. 06000-55-24.2022.6.21.0005), decisão a qual as impetrantes entendem ferir direito líquido e certo. Relativamente a outros dois outdoors, houve a determinação de retirada de parte do juízo impetrado.

Aduzem, em síntese, que há veiculação de propaganda eleitoral irregular do artefato mantido, localizado na ponte Borges de Medeiros (Av. Ibicuí), Alegrete, no qual há a frase “O Brasil está no caminho certo” acompanhada da imagem da bandeira do Brasil.

Sustentam haver “evidente campanha dissimulada”, e que não há outra interpretação razoável que não a de apoio ao Presidente da República em um contexto eleitoral. Indicam que o TRE-RS já firmou posicionamento unânime para a retirada de todo e qualquer outdoor de Bolsonaro “sem que haja necessariamente um pedido explícito de voto ou alguma inscrição específica”, e que o “mero outdoor com foto ou nome do presidente da República, ou ainda fazendo alguma alusão eleitoral, é o suficiente para a determinação de sua retirada”.

Citam legislação que entendem adequada ao caso posto.

Requerem, ao que importa de momento, a concessão da medida no sentido de determinar a remoção da propaganda irregular em até 24 horas, sob pena de multa diária.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, registro a possibilidade de cabimento de mandado de segurança contra ato judicial, com suporte no art. 19 da Resolução TSE n. 23.478/2016, o qual preconiza a irrecorribilidade das decisões interlocutórias (ou aquelas sem caráter definitivo) proferidas nos feitos eleitorais, conforme já assentado por esta Corte – exemplificativamente, o MS n. 19.498, Rel. Des. El. Hamilton Langaro Dipp, e o MS n. 30.573, Rel. Des. El. Ingo Wolfgang Sarlet.

O exame ora realizado é aquele típico das decisões em que a parte requer a concessão de medida liminar e, antecipo, o pedido é de ser indeferido.

A decisão não se mostra, à primeira vista, ilegal ou teratológica. Ao contrário, a autoridade tida como coatora proferiu decisão suficientemente adequada, que não desobedece a jurisprudência deste Tribunal Regional Eleitoral, até mesmo porque o outdoor em questão se trata de caso ainda não julgado pela Corte.

Explico.

Como relatado pelas impetrantes, o expediente de poder de polícia n. 06000-55-24.2022.6.21.0005 continha requerimento para a retirada de três artefatos, e o Magistrado Titular da 005ª ZE determinou a retirada de dois deles, em decisão, repito, alinhada às recentes decisões deste Tribunal, pois presentes a foto do candidato à reeleição Jair Bolsonaro, dizeres vinculados a slogan de campanha (“Deus” e “Família”), ou afirmações como “Fechados com Bolsonaro”, pois todos os precedentes deste Tribunal em que houve a determinação de retirada, inclusive alguns de minha relatoria, analisaram casos em que ao menos um desses elementos compunham o conteúdo da publicidade.

Não é, decididamente, o caso do presente mandado de segurança em que, a rigor, há a bandeira do Brasil ocupando parte do lado direito, acompanhada da frase “O Brasil está no caminho certo”. Transcrevo trecho da decisão impetrada, que bem pontua a distinção relativamente ao outdoor sob análise:

O referido outdoor contém o seguinte: a bandeira do Brasil e a expressão: "O Brasil está no caminho certo." No outdoor não há pedido explícito de voto, menção a candidatura, número de candidato, partido político, proposta de governo, frase de apoio, nem mesmo imagem de candidato. Ainda, a Bandeira do Brasil é um dos símbolos da República Federativa do Brasil e não tem vinculação com nenhum candidato ou partido político.

Em outras ocasiões, já referi que entendo devam ser utilizadas, pelo julgador, dois grupos de balizas para a solução de casos como o posto. O primeiro grupo é principiológico, seja porque no Estado Democrático de Direito a liberdade de expressão é regra, e seu tolhimento, exceção (art. 5º, inc. IV e inc. IX da Constituição Federal), seja porque à Justiça Eleitoral incumbe sempre uma postura minimalista (Recurso Especial Eleitoral n. 16996, Ac., rel. Min. Luiz Fux, DJE de 08.03.2018, p. 28-30), e o segundo grupo é composto pelas regras positivadas específicas sobre o tema.

E é exatamente porque não existe sequer menção periférica às eleições é que a decisão do juízo impetrado não se mostra ilegal ou teratológica como querem fazer crer as impetrantes. Trata-se de um indiferente eleitoral – há apenas a bandeira do Brasil e o indicativo de que o país está “no caminho certo”.

Ademais, houve atenta fundamentação de parte do juízo impetrado, com o apontamento das distinções nas características dos três outdoors e correta aplicação dos precedentes deste Tribunal, pois como as próprias impetrantes indicam, o TRE-RS tem determinado a retirada de publicidades irregulares vinculadas a candidaturas.

No caso, não há vinculação ou alusão eleitoral.

Diante do exposto, indefiro o pedido de concessão de medida liminar.

Nesse norte, entendo que os elementos apresentados no artefato publicitário apontado nos autos, que se limitam à imagem da bandeira do Brasil e à expressão “O Brasil está no caminho certo”, não caracterizam propaganda eleitoral, pois não trazem pedido explícito de voto, nem remetem ao pleito do corrente ano ou à tema específico de algum candidato em particular.

Tais circunstâncias impedem concluir pela vinculação do outdoor ao candidato Jair Bolsonaro, como pretendem as impetrantes, haja vista a ausência de conteúdo com finalidade eleitoral, sequer indireta ou subliminarmente.

Nessa linha, a Procuradoria Regional Eleitoral consigna no parecer que “a dinamicidade e a imprevisibilidade do quadro eleitoral, evidenciadas nos resultados do 1º turno das eleições de 2022, podem fazer com que mensagens genéricas, tal como a que alude a um caminho certo, ganhem novos sentidos, com constante alteração de supostos beneficiados”.

Portanto, no concernente ao conteúdo da propaganda e ao meio de publicidade, entendo que se trata de um indiferente eleitoral, a merecer a confirmação da decisão que indeferiu o pedido de concessão liminar.

Diante do exposto, VOTO pela denegação da segurança, tornando definitiva a decisão liminar e afastando a caracterização de propaganda irregular.