MSCiv - 0603485-96.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/10/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas.

 

O mandado de segurança é remédio constitucional colocado à disposição do jurisdicionado quando seu direito líquido e certo estiver sendo violado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, na esteira do que dispõe o art. 5º, inc. LXIX, da CF/88.

No caso, o presente mandamus foi impetrado contra decisão do Juízo da 51ª Zona Eleitoral que determinou o recolhimento e, após, indeferiu pedido de restituição da propaganda de campanha irregular apreendida por ordem de autoridade coatora, ao fundamento de que os wind banners apresentariam irregularidade em sua base móvel, bem como, aparentemente, estariam acima das medidas definidas pela norma eleitoral.

Transcrevo, com grifos meus, as decisões impugnadas:

“Vistos.

Trata-se de denúncias através do aplicativo pardal por propagandas irregulares (RS202209231224040824, RS202209231222030881, RS202209231211560852) contra o candidato a deputado federal MARCELO AMARO BUZ (PSDB) no município de São Leopoldo, por faixas/banners, fincados em via pública e, aparentemente, acima das dimensões permitidas pela Resolução TSE 23610/2019.

Notificado, por telefone e aplicativo whatsapp, para adequação dos materiais de propaganda eleitoral irregulares através, o candidato informou que aguardaria a notificação através de procedimento judicial específico para eventuais correções necessárias.

É o breve relato. Decido.

Considerando as evidências apresentadas nas denúncias no aplicativo pardal acima relacionadas, entendo como pertinente e urgente a necessidade de cessar as propagandas irregulares do candidato Marcelo Buz no seguinte endereço: av. João Correia/av. Teodomiro Fonseca, canteiro central, próximo a APAE, já que as dimensões da propaganda e a irregularidade na base móvel contrariam o disposto na referida Resolução do Tribunal Superior Eleitoral.

Isto posto, com base no artigo 6º e seguintes da Resolução TSE 23610/2019, notifique-se o departamento municipal de limpeza urbana para providenciar a retirada dos materiais de propaganda eleitoral irregulares do candidato Marcelo Buz no endereço mencionado ou em outro endereço dentro dos limites do município de São Leopoldo, devendo manter depositados de forma intacta e sem inutilização até nova decisão judicial.

Notifique-se o candidato, por meio eletrônico, para, querendo, apresentar contestação.

Com ou sem manifestação do candidato no prazo de 48 horas, retornem conclusos.

São Leopoldo, 23 de Setembro de 2022.

Letícia Michelon

Juíza Eleitoral”

 

E a resposta ao pedido de reconsideração:

Vistos.

Indefiro a petição ID 109534043 (pedido de reconsideração sobre a decisão ID109472472), visto que a decisão está amparada nos parágrafos 2º e 3º do artigo 6 da Resolução TSE 23610/2019 e este Juízo possui competência formal designada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul para as práticas de poder de polícia nas Eleições Gerais de 2022.

Pelo que dispõe a legislação eleitoral, constatada irregularidade em propaganda eleitoral, não é necessária notificação prévia do candidato ou de qualquer procurador para que o Juízo Eleitoral possa atuar preventivamente para cessar atos ou divulgação irregular de materiais de campanha eleitoral. No presente caso, ainda, o candidato (maior interessado) foi notificado em seu telefone pessoal sobre a necessidade de regularização da propaganda antes da abertura deste expediente, mas informou que aguardaria nova notificação sobre o fato.

Cabe mencionar também que em todas as denúncias de propaganda irregular apresentadas pelo aplicativo pardal em São Leopoldo nestas eleições, todos os candidatos seguiram imediatamente as orientações da Justiça Eleitoral, cessando as irregularidades constatadas, após as notificações prévias através de mensagens ou ligações pelo aplicativo whatsapp.

Ainda, em análise formal sobre o pedido ID 109534043 entendo que, segundo dispõe o parágrafo 3º do artigo 54 da Resolução TSE 23608/2019, o mandado de segurança é a via jurisdicional cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia. Considerando que a decisão foi proferida pelo Juízo Eleitoral de 1º grau, cabe Mandado de Segurança ao Tribunal Regional Eleitoral, caso o candidato queira derrubar o ato jurisdicional referido.

Por fim, resumidamente, o entendimento sobre a irregularidade do material recolhido está baseado no parágrafo 1º do artigo 20 da Resolução TSE 23.610/2019. Dispõe a norma do TSE:

Art. 20. Não é permitida a veiculação de material de propaganda eleitoral em bens públicos ou particulares, exceto de (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 2º) :

I - bandeiras ao longo de vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas, inclusive daquelas que utilizem cadeiras de rodas ou pisos direcionais e de alerta para se locomoverem, e veículos; II - adesivo plástico em automóveis, caminhões, bicicletas, motocicletas e janelas residenciais, desde que não exceda a 0,5m2 (meio metro quadrado).

§ 1º A justaposição de propaganda cuja dimensão exceda a 0,5m² (meio metro quadrado) caracteriza publicidade irregular, em razão do efeito visual único, ainda que se tenha respeitado, individualmente, o limite previsto no inciso II deste artigo.

Isto posto, mantenho a decisão ID 109472472 para cessar a veiculação das faixas do candidato Marcelo Amaro Buz denunciadas pelo aplicativo pardal em 23/09/2022.

Notifique-se pelos e-mails dos procuradores do candidato, conforme solicitação.

São Leopoldo, 27 de Setembro de 2022.

Letícia Michelon

Juíza Eleitoral

 

Como se depreende, ficou consignado nas decisões que os engenhos publicitários não atendiam às regras eleitorais e que, notificado via whatsapp sobre a inadequação dos artefatos, o impetrante quedou-se inerte, optando, em detrimento da necessária conformação à norma, por aguardar nova notificação.

No que toca à utilização de wind banner, não desconheço que seu uso tem sido reconhecido pela jurisprudência como regular na propaganda eleitoral, desde que não criem o vedado efeito outdoor, art. 20, § 1º, e sejam veiculadas dentro do permissivo legal, disposto nos §§ 4º e 5º do art. 18, ambos da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 18. São vedadas na campanha eleitoral confecção, utilização, distribuição por comitê, candidata, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem a eleitora ou eleitor, respondendo a infratora ou o infrator, conforme o caso, pela prática de captação ilícita de sufrágio, emprego de processo de propaganda vedada e, se for o caso, pelo abuso de poder (Lei nº 9.504/1997, art. 39, § 6º ; Código Eleitoral, arts. 222 e 237 ; e Lei Complementar nº 64/1990, art. 22) .

§ 4º É permitida a colocação de mesas para distribuição de material de campanha e a utilização de bandeiras ao longo das vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 6º) .

§ 5º A mobilidade referida no § 4º deste artigo estará caracterizada com a colocação dos meios de propaganda às 6 (seis) horas e sua retirada às 22 (vinte e duas) horas, ainda que nesse intervalo os aparatos estejam fixados em base ou suporte ( Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 7º ). (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

 

Art. 20 Não é permitida a veiculação de material de propaganda eleitoral em bens públicos ou particulares, exceto de:

Lei n. 9.504/1997, art. 37, § 2º

I - bandeiras ao longo de vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos;

[...]

§ 1º A justaposição de propaganda cuja dimensão exceda a 0,5m² (meio metro quadrado) caracteriza publicidade irregular, em razão do efeito visual único, ainda que se tenha respeitado, individualmente, o limite previsto no inciso II deste artigo.

 

Na hipótese, o material irregular foi recolhido quando do comando exarado pela autoridade coatora.

Em juízo perfunctório, indeferi o pedido de restituição das peças ao impetrante, visto que não colacionado ao feito acervo probatório suficiente a amparar a concessão da tutela de urgência.

A autoridade impetrada, em cumprimento às determinações do art. 7º, inc. I, da Lei n. 12.016/09, informou que foi apresentado, pelo procurador do candidato, novo modelo de propaganda, dentro do permissivo legal, motivo pelo qual passou a autorizar seu uso pelo impetrante, nos seguintes termos:

10. Em 29/09/2022, os procuradores do candidato apresentaram em Cartório novo modelo de “windbanner”, nos mesmos moldes dos materiais de campanha utilizados pelos demais candidatos em diversos municípios no Rio Grande do Sul. Foi solicitada autorização para a divulgação desse novo modelo de propaganda eleitoral.

11. Em decisão no mesmo dia, foi autorizada a divulgação do novo modelo de windbanner, pois, aparentemente, estava de acordo com o artigo 19, parágrafo 4º e com o artigo 20, parágrafo 1º da Resolução TSE 23610/2019, com semelhança aos materiais dos demais candidatos. Foi determinada, ainda, a notificação da Prefeitura de São Leopoldo para cessar o recolhimento do novo material do candidato Marcelo Buz. A notificação foi realizada na noite de 29/09/2022, através de aplicativo whatsapp.

 

Ou seja, o impetrante, ao adequar a propaganda aos parâmetros da norma, recebeu autorização para divulgar sua campanha nas vias públicas, recuperando a almejada paridade de armas com os demais concorrentes.

Entrementes, ainda que adequada aos parâmetros legais a propaganda e escoada a eleição quanto ao pleito proporcional, entendo que se trata de caso de denegação da segurança, e não de perda do objeto da presente demanda, no sentido de que a concessão, ou não, de medida liminar não afasta a necessidade de manifestação jurisdicional no que diz respeito ao provimento definitivo. Nesse sentido, ementas de arestos do STJ e TRE/RN:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. IMPORTAÇÃO DE LEITE. RISCO DE CONTAMINAÇÃO. ACIDENTE NUCLEAR DE USINA EM CHERNOBIL. PRODUTORES DE PAÍSES EUROPEUS. VIOLAÇÃO A NORMATIVOS FEDERAIS. CONCESSÃO DE LIMINAR SATISFATIVA. INEXISTÊNCIA DE PERDA SUPERVENIENTE DE INTERESSE DE AGIR. PRECEDENTES. ATO NORMATIVO INFRALEGAL. INADEQUAÇÃO RECURSAL. CERTEZA DO PROVIMENTO JURISDICIONAL. SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA. AUSÊNCIA DE SUJEIÇÕES CONDICIONAIS.

1. O deferimento de tutela provisória ou de medida liminar, por ostentar caráter precário, não implica a perda de objeto por falta de interesse de agir na hipótese de eventual satisfatividade. Precedentes. 2. Ato normativo infralegal, como portarias e resoluções, não configuram lei federal, para efeito da caracterização da hipótese de cabimento do art. 105, inciso III, alínea "a", da Constituição da República. Precedentes. 3. Tampouco se admite o apelo extremo quando o exame das teses levantadas pelo recorrente não prescinde do revolvimento fático-probatório. Incidência da Súmula 07/STJ. 4. Ao solver a controvérsia e pôr fim à lide, o provimento do juiz deve ser certo, ou seja, não pode deixar dúvidas quanto à composição do litígio, nem pode condicionar a procedência ou a improcedência do pedido a evento futuro e incerto. Ao contrário, deve declarar a existência ou não do direito da parte, ou condená-la a uma prestação, deferindo-lhe ou não a pretensão.

(REsp 164.110/SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado em 21/03/2000, DJ 08/05/2000, p. 96). 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (RECURSO ESPECIAL n. 1670267/SP (2017/0104711-5) Rel. Min. MAURO CAMPBELL)


 

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINAR DE PERDA DO OBJETO. REJEIÇÃO. ATO DE JUIZ ELEITORAL. APREENSÃO DE CRACHÁS DE IDENTIFICAÇÃO DE DELEGADOS E FISCAIS DA COLIGAÇÃO IMPETRANTE. ART. 152 DA RESOLUÇÃO TSE N.º 23.554/2017. AUSÊNCIA DE RESTRIÇÃO QUANTO AO USO DE CORES NOS CRACHÁS. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. Mandado de segurança contra ato da Juíza da 12ª Zona Eleitoral. 2. Na lição da doutrina, o interesse de agir está ligado à necessidade e utilidade (ou adequação, para alguns) do provimento judicial, podendo vir a desaparecer no curso do processo (art. 492 do CPC), ainda que configurado no início da demanda, o que se convencionou chamar de perda superveniente do interesse de agir ou perda do objeto. Ausente o interesse de agir, o órgão julgador deve extinguir o feito sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC. 3. Ainda que terminado o primeiro turno das Eleições 2018, é possível e mesmo necessário o julgamento do mérito, com a sua consequência óbvia de revogação/confirmação da decisão liminar que concedeu a tutela provisória de urgência requerida pela impetrante, a servir, ainda, como parâmetro para a atuação dos juízes eleitorais no exercício do poder de polícia no segundo turno da eleição. 4. Não só isso, seja de natureza satisfativa, seja de natureza cautelar, a tutela provisória concedida incidentalmente tem de ser confirmada ou revogada no mérito, consoante art. 4º do CPC, plenamente aplicável ao rito do mandado de segurança, por respeitar a um princípio geral processual. Reforça isso o dado, inclusive, de que a não confirmação da tutela provisória pode até mesmo ensejar responsabilidade da parte prejudicada pela efetivação da tutela (art. 302, I do CPC). 5. Rejeição da preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral. 6. O mandado se segurança, ação de natureza constitucional, está previsto no art. 5º, LXIX, da CRFB/88, que estabelece ser ele cabível para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. 7. Tratando-se de ato administrativo proferido por juiz eleitoral, no exercício do poder de polícia, cabível a interposição do recurso previsto no art. 265 do Código Eleitoral, que, todavia, não possui efeito suspensivo, a possibilitar a interposição de mandado de segurança para a garantia de direito eventualmente violado, nos termos do art. 5º, I, da Lei n.º 12.016/2009. 8. O art. 152 da Resolução TSE n.º 23.544/2018, estabelece o uso obrigatório de crachá de identificação pelos fiscais dos partidos políticos e das coligações, vedada a padronização de vestuário. O crachá deverá ter medidas que não ultrapassem 10cm (dez centímetros) de comprimento por 5cm (cinco centímetros) de largura e conterá apenas o nome do fiscal e o nome e a sigla do partido político ou da coligação que representa, sem referência que possa ser interpretada como propaganda eleitoral. 9. A legislação eleitoral não traz nenhuma regulamentação, vedando a padronização de crachá, conquanto o tenha feito quanto ao vestuário. A única especificação refere-se ao tamanho dos crachás, que deve atentar para as medidas previstas no dispositivo regulamentar, e à necessidade de identificação do nome do fiscal e da sigla do partido ou da coligação que representa. 10. O uso de determinada cor, nos crachás de identificação dos fiscais, ainda que gere imediata associação a partido ou coligação, não acarreta violação à legislação eleitoral, porquanto não desvirtuada a finalidade da norma, de permitir a correta identificação dos representantes de partidos e coligações. 11. Conquanto entendido o zelo da autoridade coatora, que, no caso concreto, preocupada em conter o acirramento político existente no interior do Estado, não há restrição quanto ao uso de cores no já citado art. 152 da Resolução TSE n.º 23.554/2017. É regra comezinha de hermenêutica que as restrições devem ser interpretadas restritivamente, sobretudo na hipótese concreta, onde a norma não tratou de restringir, fazendo-se necessária a confirmação da medida liminar concedida pelo Tribunal. 12. Concessão da ordem.

(TRE-RN - MS: 060146334 NOVA CRUZ - RN, Relator: FRANCISCO GLAUBER PESSOA ALVES, Data de Julgamento: 26/10/2018, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 26/10/2018)

 

Assim, indeferida a tutela de emergência para manter a decisão que determinou o recolhimento do material de campanha irregular, com a posterior conformação à regra eleitoral dos artefatos, tendo, a partir de então, sua veiculação autorizada pela impetrada, a anulação do ato da autoridade coatora não se sustenta, visto que exarada em consonância com a legislação eleitoral.

 

Diante do exposto, VOTO para, confirmando o indeferimento da tutela de urgência, denegar a segurança.

É como voto, senhor Presidente.