RvE - 0600123-86.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/10/2022 às 14:00

VOTO

Cuida-se de requerimento de revisão do eleitorado apresentado pelo PROGRESSISTAS - PP DE CASEIROS, no Município de Caseiros, jurisdição da 28ª Zona Eleitoral – Lagoa Vermelha, sob a alegação genérica de ocorrência de fraude, porquanto muitas pessoas que não teriam vínculo algum com a cidade efetuaram transferência e inscrição para essa localidade, de forma indevida.

O requerente aponta a existência de fraude na inscrição de eleitores em 2020 e argumenta que impugnou pedidos de transferência de eleitores em ocasiões que identificou o agir articulado para insuflar artificialmente o número de votantes do município.

A fraude, no entender do requerente, restaria consubstanciada pelo uso de endereços iguais, que, segundo alega: “observa o frequente uso das mesmas casas para abrigar eleitores, cuja rotação servia apenas para atender o critério temporal de 3 meses, em grave prejuízo ao exercício liberto do voto”.

O pedido contido na inicial, reforçado nos Memoriais apresentados pelo interessado, é relacionado à existência de fraude que autorizaria o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul ordenar a revisão do eleitorado (art. 104 da Resolução TSE 23.659/21).

Ocorre que a fraude que autorizaria a realização de correição e revisão do eleitorado seria a aquela no alistamento ou transferência do domicílio eleitoral, tipificada no art. 289 do Código Eleitoral. As inscrições de eleitores nas quais haveria o uso de endereços iguais, denotando o voto de pessoas sem vínculo com o Município, caso existam indícios nesse sentido, podem ser apuradas em ação própria, mediante observação do contraditório e da ampla defesa.

É de se reconhecer que o partido diligenciou no sentido de comprovar suas alegações, em especial, impugnando pedidos de transferência de eleitores para o Município de Caseiros. Foram juntadas aos autos cópias das decisões proferidas nos processos n. 0600024-03 (CRISTÃO BORDÃO FLORES), 0600027-55 (KELEN BETANIA ALVES), 0600026-70 (CLÁUDIO ANDRE ALVES), 0600022-33 (MARCILINO BARBOSA RODRIGUES), todas julgadas por esta Corte no sentido de reconhecer que havia dúvida quanto à documentação apresentada por ocasião do pedido de transferência de domicílio (ID 44937856).

Veja-se: em nenhum desses processos foi reconhecida fraude; apenas se declarou que os documentos apresentados não eram aptos a comprovar o domicílio eleitoral e a transferência foi indeferida. Nas decisões, está descrito que foi enviada correspondência aos eleitores que tiveram suas movimentações no cadastro eleitoral questionadas e que estas notificações foram retiradas pelos interessados na agência local do Correio. Também consta que o oficial de justiça não localizou os endereços declarados pelos eleitores.

Embora se constatem indícios de irregularidades, a insuficiência de documentação apresentada no pedido de alistamento eleitoral declarada nos processos mencionados não constitui fraude para fins de convocação, por este Tribunal Regional, de revisão do eleitorado.

De qualquer sorte, prossigo, é de se dizer que o Município de Caseiros apresenta discrepância entre o eleitorado e a sua população.

Com efeito, atualizando-se as informações apresentadas pelo requerente, observa-se que o município possui, de acordo com a base de dados da Justiça Eleitoral, 3.094 (três mil e noventa e quatro) eleitores e, em consulta à página do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE - https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/rs/caseiros.html?), a população estimada de Caseiros para o ano em curso é de 3.228 (três mil, duzentos e vinte e oito) pessoas. Em síntese, tais dados demonstram que o número de eleitores alistados no município corresponde a mais de 95% da população.

A Procuradoria Regional Eleitoral distinguiu bem a situação (ID 45078022):

Destaca-se que a correição prevista no art. 92 da Lei n. 9.504/71, de competência do TSE, deverá se operar ante determinadas formas de alterações quantitativas do eleitorado, e não se confunde com aquela a que se refere o § 4º do art. 71 do Código Eleitoral, de competência dos tribunais regionais, que se dá ante elementos concretos indicativos de fraude nos alistamentos, ausentes no caso em tela (por exemplo a nominata de eleitores e as circunstâncias fáticas relativas às aludidas informações falsas para a transferência de domicílio eleitoral ou outros indícios hábeis a demonstrar as irregularidades nos alistamentos).

No caso concreto, a ausência de comprovação de fraude afasta a competência do TRE-RS. Contudo, firma-se a competência do Tribunal Superior Eleitoral para apreciação da matéria, pois eventual revisão poderá esclarecer se as transferências foram regulares, cabendo salientar que, por se tratar de município com pequeno colégio eleitoral, a existência de transferências de inscrições fraudulentas, em tese, tem o condão de comprometer a legitimidade do pleito municipal, sendo apta a mudar o resultado das eleições, em afronta ao princípio da soberania popular. (Grifei.)

 

Dessa maneira, na esteira do parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral e da análise dos dados retrorreferidos, mostra-se cabível, em tese, a revisão do eleitorado, mas a competência para apreciação da matéria, quando o fundamento da revisão é a desproporcionalidade entre eleitores e habitantes, é do Tribunal Superior Eleitoral, conforme prescreve o art. 92, inc. III, da Lei das Eleições, verbis:

O Tribunal Superior Eleitoral, ao conduzir o processamento dos títulos eleitorais, determinará de ofício a revisão ou correição das Zonas Eleitorais sempre que:

(…)

I - o total de transferências de eleitores ocorridas no ano em curso seja dez por cento superior ao do ano anterior;

II - o eleitorado for superior ao dobro da população entre dez e quinze anos, somada à de idade superior a setenta anos do território daquele Município;

III - o eleitorado for superior a sessenta e cinco por cento da população projetada para aquele ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

 

Igualmente dispõe a Resolução TSE n. 23.659/21:

 

DA REVISÃO DE ELEITORADO

DOS REQUISITOS E DA COMPETÊNCIA PARA DETERMINAR A REVISÃO DE ELEITORADO

Art. 104. Se na correição do eleitorado for comprovada a fraude em proporção que comprometa a higidez do cadastro eleitoral, o Tribunal Regional Eleitoral, comunicando a decisão ao Tribunal Superior Eleitoral, ordenará a revisão do eleitorado, obedecidas as instruções contidas nesta resolução e as recomendações que subsidiariamente baixar.

§ 1º A execução da revisão de eleitorado com fundamento no caput deste artigo dependerá da existência de dotação orçamentária, a ser avaliada após já destacados os recursos para as revisões de ofício.

§ 2º Compete ao Tribunal Regional Eleitoral autorizar a alteração do período e/ou da área abrangidos pela revisão a que se refere este artigo, comunicando a decisão ao Tribunal Superior Eleitoral.

 

Art. 105. O Tribunal Superior Eleitoral poderá, de ofício, determinar a revisão do eleitorado do município, observada a conveniência e a disponibilidade de recursos, quando:

I – o total de transferências ocorridas no ano em curso seja 10% superior ao do ano anterior;

II – o eleitorado for superior ao dobro da população entre dez e quinze anos, somada à de idade superior a setenta anos do território daquele município; e

III – o eleitorado for superior a 80% da população projetada para aquele ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Parágrafo único. Os tribunais regionais eleitorais indicarão previamente os municípios que preenchem os requisitos do caput deste artigo, cabendo ao Tribunal Superior Eleitoral determinar a execução das revisões de eleitorado de ofício com observância aos prazos estabelecidos em normas específicas e a disponibilidade orçamentária. (Grifei.)

 

Trago à colação, por pertinente, decisão do Colendo Tribunal Superior Eleitoral de 30.6.2022, originária deste Egrégio TRE-RS, corroborando esse entendimento:

ACÓRDÃO REVISÃO DE ELEITORADO (11546) Nº 0000014–29.2019.6.21.0000 (PJe) – VESPASIANO CORRÊA – RIO GRANDE DO SUL RELATOR: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI INTERESSADO: TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL REVISÃO DE ELEITORADO. TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL. MUNICÍPIO DE VESPASIANO CORRÊA. DISCREPÂNCIA ENTRE NÚMERO DE ELEITORES E TOTAL DE HABITANTES. REVISÃO DE OFÍCIO. ART. 92 DA LEI 9.504/1997. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. REVISÃO BIOMÉTRICA REALIZADA EM 2013. CONCEITO DE DOMICÍLIO ELEITORAL. ABRANGÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. REVISÕES DE ELEITORADO SUSPENSAS. RESOLUÇÃO TSE N. 23.667/21. PEDIDO INDEFERIDO.

1. A Corte regional submete à apreciação e à decisão, por este Tribunal Superior, pedido de revisão do eleitorado do Município de Vespasiano Corrêa/RS, sob o argumento de suposta fraude eleitoral, em razão de discrepância entre o número de eleitores e o total de habitantes.

2. Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, realizada a revisão de eleitorado na municipalidade em 2013, mediante a utilização de identificação biométrica, e devido à abrangência do conceito de “domicílio eleitoral”, não se pode afirmar, de imediato, que haja irregularidade no eleitorado do município que enseje a realização do procedimento de revisão de eleitorado. Precedente: RvE 0600099–13/PI, Rel. Min. Alexandre de Moraes.

3. Na espécie, também não há previsão orçamentária, na Lei Orçamentária Anual de 2021, para a revisão de eleitorado, naquele exercício, e seria necessária a realocação de recursos caso o referido procedimento fosse realizado. Soma–se a isso, ainda, o rol de restrições imposto pela Resolução TSE n. 23.667/21, que estabelece diretrizes e medidas preventivas ao contágio pelo Novo Coronavírus (Covid–19), a qual suspendeu a execução de revisões de eleitorado enquanto não retomada a possibilidade de coleta de dados biométricos de eleitoras e eleitores (art. 4º, § 4º).

4. Pedido indeferido.

(TSE - RvE: 00000142920196210000 VESPASIANO CORREA - RS 000001429, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 30.6.2022, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 147) (Grifei.)

 

Outra não é a direção, repisa-se, do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45078022), o qual também adoto como razões de decidir:

 

No contexto, e em que pese a situação exposta, cabe reprisar que a competência para determinar a revisão do eleitorado é do TSE e, salvo situação excepcional, não será realizada em ano eleitoral, como o ano corrente.

Com efeito, assim dispõe o art. 107 da Resolução TSE nº 23.659/2021:

Art. 107. Não será realizada revisão de eleitorado:

I - em ano eleitoral, salvo se iniciado o procedimento revisional no ano anterior ou se, verificada situação excepcional, o Tribunal Superior Eleitoral autorizar que a ele se dê início; e

(...)

Acerca desses pontos, já se manifestou o TSE:

REVISÃO DE ELEITORADO - ALEGADA DESPROPORÇÃO ENTRE NÚMERO DE HABITANTES E ELEITORES - CRITÉRIO OBJETIVO - COMPETÊNCIA DO TSE PARA DETERMINAR A REVISÃO - AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE FRAUDE – IMPROCEDÊNCIA. A determinação da revisão de eleitorado com fundamento em critérios objetivos é de competência originária do Tribunal Superior Eleitoral, cabendo a este Tribunal tão somente indicar àquele Tribunal os municípios prioritários para realização dessa revisão, preenchidos os requisitos legais. No caso de denúncia fundamentada de fraude, critério subjetivo, cabe aos tribunais regionais eleitorais a determinação de providências. O art. 58, § 2º, da Resolução n.º 21.538-TSE, dispõe que não se pode realizar a revisão de eleitores em ano eleitoral, salvo em situação excepcional e devidamente autorizada pelo Tribunal Superior Eleitoral. Ausentes indícios de fraude no alistamento, não se caracteriza situação excepcional que permita o deferimento do pedido.

ELEITORAL. REVISÃO DO ELEITORADO. ANO DE ELEIÇÃO. AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DA REVISÃO. SOBRESTAMENTO DO PROCESSO.1. Quando o número de eleitores cadastrados supera 65% da população projetada pelo IBGE, cabe, ao menos em tese, a revisão do eleitorado (art. 58, § 1º, III, Resolução/TSE n. 21.538/2003).2. Tratando-se de ano eleitoral, tal medida somente pode ser adotada se houver situação excepcional que a justifique (art. 58, § 2º, Resolução/TSE n. 8 Revisão de Eleitorado nº 2238, Acórdão n 213/2016 de 25/07/2016, Relator: ALCEU JOSÉ CICCO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 28/07/2016, Página 03. Grifo nosso. Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 800 – 9º Andar – Fone (51) 3216-2000 – CEP 90010-395 – Porto Alegre - RS - http://www.prers.mpf.mp.br MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL NO RIO GRANDE DO SUL 21.538/2003).3. Caso em que não existe excepcionalidade, visto que o excesso de eleitores supera em menos de 6% o percentual previsto no art. 58, § 1º, da Resolução/TSE n. 21.538/2003 e serão realizadas apenas eleições para cargos eletivos das esferas federal e estadual. 4. Sobrestamento do feito até janeiro de 2011, quando deverão ser renovadas as providências anteriormente determinadas.

REVISÃO DE ELEITORADO. TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO AMAPÁ. MUNICÍPIO DE FERREIRA GOMES. ALEGAÇÃO DE FRAUDE NO ALISTAMENTO DE ELEITORES. 1. Trata-se requerimento de reanálise do pedido de revisão do eleitorado do Município de Ferreira Gomes, no Estado do Amapá, constante no Processo RvE nº 0600167-32.2018.6.00.0000, de minha relatoria, o qual restou indeferido por esta Corte Superior, na Sessão de 24.4.2018, tendo em vista a ausência, à época, da excepcionalidade do art. 58, § 2º, da Res.- TSE nº 21.538/2003, a justificar a sua realização em ano eleitoral. 2. Constatado que o eleitorado da municipalidade corresponde a 98% do número de habitantes, a revisão do eleitorado é medida que se impõe, com base no art. 58, § 1º, III, da Res.-TSE nº 21.538/2003. 3. Requerimento de reanálise de revisão de eleitorado recebido como pedido de reconsideração e deferido para o Município de Ferreira Gomes, no Estado do Amapá, a realizar-se no período de 11.02.2019 a 1º.3.2019, condicionado à existência de disponibilidade orçamentária.10

Assim, não olvidando se tratar de ano eleitoral, entende esta Procuradoria Regional que a competência para análise e decisão sobre a adoção da medida revisional é do Tribunal Superior Eleitoral, razão pela qual cabível a remessa dos autos àquele Tribunal.

 

Assim, restando evidenciada a competência do Tribunal Superior Eleitoral para apreciação e deliberação acerca da revisão do eleitorado requerida pelo PROGRESSISTAS - PP DE CASEIROS, declino da competência para aquela Colenda Corte.

DIANTE DO EXPOSTO, voto por declinar da competência para exame do pedido ao Tribunal Superior Eleitoral.