REl - 0600634-10.2020.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/10/2022 às 14:00

VOTO

Da Tempestividade

Conforme relatado, trata-se de recurso eleitoral em prestação de contas de campanha interposto pela candidata MILENA MARIA MARTINS DOS REIS em face da sentença que desaprovou as contas apresentadas e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia equivalente aos valores de origem não identificada utilizados.

Entretanto, na linha deduzida no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, o apelo é manifestamente intempestivo.

Com efeito, nos termos do art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97 e art. 85 da Resolução TSE n. 23.607/19, o prazo para interposição de recurso contra a sentença que julgar as contas de campanha é de 3 (três) dias.

No caso dos autos, o ato de intimação da sentença foi publicado no Diário da Justiça Eletrônico do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul em 23.02.2021 (quarta-feira – ID 44942766 – fl. 44), encerrando-se o tríduo legal em 26.02.2022 (sábado).

Como o prazo encerrou-se no sábado, restou prorrogado para o primeiro dia útil seguinte, qual seja, dia 02.03.2022 (quarta-feira), em virtude do feriado de carnaval.

No entanto, o apelo somente foi protocolado em 09.3.2022 (ID 44942758), configurando a sua intempestividade, motivo pelo qual não deve ser conhecido.

DESTACO

 

(DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo não conhecimento do recurso.)

 

Dos documentos juntados com o recurso

A recorrente apresentou documentos juntamente com o recurso, consistentes em demonstrativo de rescisão contratual, declaração e recibos emitidos para comprovar prestação de serviços.

Observo que, no âmbito dos processos de prestação de contas, este Tribunal Regional tem concluído, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos acostados com a peça recursal, ainda que não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando, a partir de sua simples leitura, primo ictu oculi, seja possível esclarecer as irregularidades, sem a necessidade de nova análise técnica.

Na hipótese, os documentos juntados atendem aos requisitos e podem ser conhecidos.

Por essas razões, conheço dos documentos juntados com o recurso.

 

Do Mérito

Eminentes Colegas, trata-se da prestação de contas de MILENA MARIA MARTINS DOS REIS, candidata ao cargo de vereadora no Município de Santo Antônio do Planalto nas eleições do ano de 2020.

A sentença recorrida julgou desaprovadas as contas da recorrente (ID 44942755) devido à utilização de recursos de origem não identificada pela candidata, de irregularidades referentes a despesas realizadas com indícios de ausência de capacidade operacional de fornecedores e de divergências entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e a verificada nos extratos eletrônicos enviados pelas instituições financeiras ao TSE.

 

a) Dos Recursos de Origem Não Comprovada

Na instância a quo, o examinador técnico, em seu parecer conclusivo, apontou que a candidata aplicou em campanha recursos próprios cujo montante supera o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura

Na sentença, o magistrado assim enfrentou a questão (ID 44942755):

Compulsando os autos verifica-se que não há comprovação, na forma exigida no parágrafo único do art. 61 da Res. 23.607/2019, da origem e da disponibilidade dos recursos próprios utilizados na sua campanha eleitoral. Tampouco justificativa ou documentação que modifique as conclusões da análise técnica quanto as demais irregularidades apontadas no relatório preliminar do id 98401755.

Relativamente à hipótese de utilização de recursos próprios para financiamento de campanha, verificada a ausência da capacidade econômica para dispor do valor declarado como sendo de recursos próprios, resta evidenciada falha comprometedora da transparência e confiabilidade das contas de campanha da candidata, em prejuízo à fiscalização da origem dos recursos por esta justiça especializada. Patente assim a utilização de verba de origem não identificada.

Na hipótese, a candidata declarou não possuir patrimônio por ocasião do registro de candidatura e utilizou, em campanha, recursos próprios no valor de R$ 440,00.

Registro que a jurisprudência se consolidou no sentido de que a utilização de recursos financeiros próprios em campanha em montante superior ao patrimônio declarado no registro de candidatura não é motivo suficiente para, de per si, desaprovar as contas, quando compatível com a realidade financeira do candidato e com a ocupação por ele exercida, consoante ilustra o seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVAÇÃO. USO DE RECURSOS FINANCEIROS PRÓPRIOS EM CAMPANHA EM MONTANTE SUPERIOR AO PATRIMÔNIO DECLARADO. COMPATIBILIDADE. REALIDADE FINANCEIRA E OCUPAÇÃO DO CANDIDATO. VALOR ÍNFIMO. DESPROVIMENTO.

1. O uso de recursos financeiros próprios em campanha em montante superior ao patrimônio declarado no registro de candidatura não é motivo suficiente, por si só, para desaprovar contas, quando compatível com a realidade financeira de candidato que declara sua ocupação. Precedentes.

2. No caso dos autos, embora o TRE/CE tenha assentado a existência de outras irregularidades que ensejaram a rejeição do ajuste contábil, consignou, especificamente quanto ao tema, que a renda mensal do candidato, declarada no valor de R$ 2.000,00, possibilitou a doação de recursos próprios no montante de R$ 2.500,00, e que a hipótese não cuida de recursos de origem não identificada.

3. Concluir em sentido diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 35885, Acórdão, Relator Min. Jorge Mussi, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 61, Data: 29.3.2019, pp. 64-65.) (Grifei.)

Caberia à prestadora, portanto, demonstrar a sua capacidade econômica ou a origem dos recursos aplicados na campanha, de modo a sanar a ausência de declaração de bens no registro da candidatura, conforme admitido em julgados deste Tribunal Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS SEM A CORRESPONDENTE DECLARAÇÃO DE BENS NO REGISTRO DE CANDIDATURA. COMPROVADA A CAPACIDADE ECONÔMICA. DEPÓSITO EM ESPÉCIE DIRETAMENTE NA CONTA DE CAMPANHA. VALOR ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. NECESSIDADE DE TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. DEMONSTRADA A ORIGEM DA DOAÇÃO. INFORMAÇÕES PRESTADAS. PROVIMENTO PARCIAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. Apresentação de novos documentos com o recurso. Possibilidade. Providência que contribui para o esclarecimento da movimentação financeira sem prejudicar o procedimento. Utilização de recursos próprios sem declaração de bens no registro de candidatura. Suspeita de ausência de capacidade. Irregularidade suprida pela apresentação da declaração de imposto de renda. Doação acima de R$1.064,10 mediante depósito em espécie, sem transferência eletrônica. Documentos comprovando saque de valor idêntico à doação um minuto antes do depósito. Prova que afasta a irregularidade. A divergência na identificação de doador, limitada à falta de preenchimento de seu nome completo, constitui mera inconsistência formal, incapaz de prejudicar a regularidade das contas. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 17411 PORTO ALEGRE - RS, Relator: MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Data de Julgamento: 29/06/2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 116, Data 03/07/2018, Página 6.) (Grifei.)

No caso em comento, tenho que os documentos apresentados com o recurso, cotejados com o montante de recursos próprios utilizados em campanha, são suficientes para afastar a irregularidade reconhecida na sentença.

Em especial, o recibo de rescisão contratual (ID 44942764), que indica o cargo de professora, emitido pelo Município de Santo Antônio do Planalto, e que aponta o recebimento do valor líquido de R$ 2.123,52 e a data do pagamento, em 17.08.2020, corrobora as alegações constantes no recurso.

Assim, tenho por comprovado que, embora a candidata não possuísse renda ou emprego formal por ocasião do registro de candidatura, teria condições de desempenhar sua profissão – professora – no decorrer do período e perceber renda, ainda que informalmente, e aportar, em sua campanha, recursos modestos como os que aqui se verificam (R$ 440,00).

Assim, afasto a configuração de utilização de recursos de origem não identificada e, por consequência, a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

 

b) Ausência de capacidade operacional de fornecedores e Divergências no registro da movimentação financeira

O parecer técnico apontou que foi identificada a realização de despesas junto a fornecedores cujos sócios ou administradores estão inscritos em programas sociais.

Trata-se da contratação de BERGMANN MANN COM. GRAFICO LTDA., no valor de R$ 140,00, e de THOR ENRIQUE CORREA DA SILVA, de R$ 100,00, sendo que um sócio da primeira empresa e o próprio fornecedor, no segundo caso, foram beneficiários do Auxílio Emergencial em 2020.

A análise técnica também indicou a existência de divergências entre a movimentação financeira consignada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos (art. 53, inc. I, al. "g" e inc. II, al. "a", da Resolução TSE n. 23.607/19).

As irregularidades foram reconhecidas na sentença, que concluiu que:

A utilização de recursos de origem não identificada pela candidata, acrescida das irregularidades referentes a despesas realizadas com indícios de ausência de capacidade operacional de fornecedores e a divergências entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e a registrada nos extratos eletrônicos enviados pelas instituições financeiras ao TSE, caracteriza falha grave geradora de potencial desaprovação das contas, nos moldes do art. 74, III, da Res. TSE n.º 23.607/2019 […].

O recurso não desafiou o reconhecimento dessas irregularidades, de forma que deve ser mantida a sentença nesses pontos.

Em conclusão, considerando que ficou consignado nos autos que não houve recebimento de verbas financeiras originárias do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas - FEFC ou do Fundo Partidário - FP (ID 98402706), que a arrecadação total de campanha atingiu o montante de R$ 440,00, provenientes exclusivamente de recursos da própria candidata, e que as irregularidades não superadas não foram mensuradas na decisão recorrida, tenho que as máculas remanescentes constituem apenas erros de natureza formal que autorizam a aprovação das contas com ressalvas.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto por dar provimento ao recurso para aprovar com ressalvas as contas de campanha de MILENA MARIA MARTINS DOS REIS, candidata ao cargo de vereadora no Município de Santo Antônio do Planalto nas eleições 2020.