MSCiv - 0603381-07.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/10/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas, de início, cumpre verificar a presença das condições da ação, em atenção aos argumentos lançados na manifestação da douta Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer, cujos fundamentos a seguir transcrevo:

A impetrante objetivava a concessão da ordem para suspender decisão do juízo eleitoral, proferida em sede de poder de polícia e que determinou a remoção de estandarte/windbanner da candidata, assegurando-lhe a continuidade da veiculação de propaganda eleitoral mediante os artefatos então utilizados.

Ocorre que, na presente data, finda a eleição para o cargo proporcional pleiteado pela impetrante, a concessão da ordem não se faz mais necessária, pois já encerrados os atos de propaganda eleitoral.

Verificada a ausência superveniente do interesse processual, a ensejar a extinção do feito sem resolução do mérito, impõe-se a denegação da segurança, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC c/c o art. 6º, § 5º, da Lei do Mandado de Segurança.

Assim, resta prejudicada a análise do mérito do presente mandamus diante da manifesta ausência superveniente de condição da ação.

Na linha das decisões da Corte nos casos examinados nos últimos dias, a tese de que, finda a eleição para o cargo proporcional pleiteado pela impetrante, a concessão da ordem não se faria mais necessária, pois já encerrados os atos de propaganda eleitoral, não encontra abrigo.

A concessão de medida liminar satisfativa não afasta a necessidade de manifestação jurisdicional no que diz respeito ao provimento definitivo, conforme se explicitou no julgamento do mandado de segurança cível n. 0603382-89.2022.6.21.0000, de relatoria do Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli, apreciado em 07.10.2022.

Como bem exposto na decisão do TRE-RN transcrita pelo relator naquele julgamento, ainda que realizado o primeiro turno das eleições, é devida a revogação ou confirmação da decisão liminar, o que deve servir como parâmetro para a atuação dos juízes eleitorais no exercício do poder de polícia no segundo turno do pleito, mesmo que para outros cargos.

Ademais, a “concessão de liminar satisfativa, em sede de mandado de segurança, não implica em perda do objeto, tendo em vista que o interesse de agir é verificado quando da impetração, bem como por ser necessário aferir, no mérito, a legalidade do ato violador de direito líquido e certo” (TRF4, Remessa Necessária Cível n. 5032903-73.2018.4.04.7000, SEGUNDA TURMA, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, 10/12/2019).

Deste modo, prossigo na análise do pedido contido no presente mandamus.

A publicidade retratada nos autos, mediante a utilização de wind banner, foi realizada com observância das normas eleitorais, daí por que merece ser mantida a tutela liminar deferida, a qual também examinou a tese de incompetência do juízo, tendo sido lançada nos seguintes termos:

Decido.

O mandado de segurança é remédio constitucional colocado à disposição do jurisdicionado quando seu direito líquido e certo estiver sendo violado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, na esteira do que dispõe o art. 5º, inc. LXIX, da CF/88.

Na hipótese, ficou demonstrado nas cópias juntadas aos autos que o Ministério Público Eleitoral propôs representação por propaganda irregular em face da candidata em razão de estandarte localizado em bem de uso comum do povo, que seja, praças e calçadas (ID 45125686).

A ação foi autuada como notícia de irregularidade em propaganda eleitoral e, na mesma decisão que determinou a retirada do material publicitário, constou que “Nada sendo requerido pelo MPE, desde já, determino o arquivamento deste expediente”.

Pois bem, a teor do que dispõe o art. 96, inc. II, da Lei das Eleições, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento, o que inclui as questões relativas à propaganda eleitoral, devem dirigir-se aos Tribunais Regionais Eleitorais nas eleições federais, estaduais e distritais.

O art. 41 da mesma lei autoriza, no entanto, que os juízes eleitorais exerçam poder de polícia, o qual se se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais.

Considerando que a decisão combatida neste mandado de segurança foi proferida em ação autuada como “notícia de irregularidade” e que o procedimento adotado pela autoridade coatora, em princípio, não se coaduna com o rito das representações, em análise perfunctória, tenho que admissível a hipótese que o nomen iuris eleito pelo parquet tenha sido desconsiderado e que providência impugnada tenha sido determinada no exercício do poder de polícia.

Assim, não é possível reconhecer, de plano, que a determinação teria caráter teratológico em razão da incompetência do juízo e declarar a sua nulidade.

Prossigo, considerando, então, que a atuação do Juízo da 49ª Zona Eleitoral se deu no exercício do poder de polícia.

É pacífico no âmbito deste Tribunal que as decisões prolatadas no âmbito do poder de polícia conferido aos juízes eleitorais não têm caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo, de modo que devem ser impugnadas por meio de mandado de segurança.

No mesmo sentido, o parágrafo 3º do artigo 54 da Resolução TSE n. 23.608/19 estabelece que “o mandado de segurança é a via jurisdicional cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia”.

O ato indicado como coator na presente ação é a decisão de 17.09.2022, proferida pela Dra. Juliana Neves Capiotti, Juíza Eleitoral da 49ª Zona, nos autos da Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral n. 0600058-41.2022.6.21.0049, nos seguintes termos:

DECISÃO

Vistos.

Trata-se de representação ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra KAREN LANNES, candidata ao cargo de Deputada Federal, pelo Partido PODEMOS, por propaganda eleitoral irregular, veiculada por meio de estandarte, localizada em bem de uso comum do povo.

Em sede liminar, considerando a relevância do direito invocado e a possibilidade de prejuízo de difícil reparação ao pleito eleitoral, requer seja determinada à candidata, inaudita altera pars, a remoção da propaganda ora veiculada no local indicado na inicial.

Além disso, que seja notificada para, querendo, apresentar defesa, no prazo de 48 horas (art. 96, § 5º, da Lei n.º 9.504/97), bem como para que se abstenha de novamente veicular a propaganda no local indicado até o término do pleito eleitoral.

Ainda, a produção de todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente a prova documental e pericial, bem como o depoimento pessoal da representada, sob pena de confissão.

Por fim, que seja julgada procedente a representação para confirmar os termos da liminar, determinando à Representada que se abstenha de novamente colocar propaganda eleitoral irregular até o término do pleito eleitoral.

É o breve relato.

Decido.

Presentes os requisitos legais, recebo a inicial.

Com efeito, da análise dos autos, verifico, em tese, que a mencionada propaganda está em desacordo com o disposto no art. 19 da Resolução TSE nº 23.610/2019, e que a sua permanência pode acarretar prejuízo de difícil reparação ao pleito eleitoral.

Deste modo, DEFIRO a liminar, determinando a notificação de KAREN LANNES, candidata ao cargo de Deputada Federal, pelo Partido PODEMOS, para providenciar a retirada do estandarte, colocado na Rua Barão do Cambay, nº 454, Centro, neste município, apresentando comprovação do cumprimento da medida, manifestando-se, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, bem como para que se abstenha de novamente veicular a referida propaganda, em bem público, até o término do pleito eleitoral.

Decorrido o prazo legal, com ou sem manifestação, intime-se o Ministério Público Eleitoral.

Nada sendo requerido pelo MPE, desde já, determino o arquivamento deste expediente.

Do contrário, retornem conclusos.

Pois bem, a utilização de estandartes como o dos autos na propaganda eleitoral vem sendo admitida por este Tribunal Regional Eleitoral desde as Eleições 2018.

Menciono que, nos autos da Representação n. 0603220-36.2018.6.21.0000, o Des. Eleitoral Jorge Alberto Schreiner Pestana, em 02.10.2018, reconheceu a regularidade do uso de estandartes, desde que se respeitem as mesmas regras previstas na legislação para uso de bandeiras.

Da mesma forma, na I Jornada de Direito Eleitoral, promovida pelo Tribunal Superior Eleitoral, foi aprovado enunciado no sentido de que “A mobilidade das bandeiras mencionada no art. 37, § 2º, I, da Lei n. 9.504/1997 dispensa a ação humana, desde que observados os horários para colocação e retirada entre as seis horas e as vinte e duas horas” (CT03 – PE07).

Constou na justificativa da proposta que

A Lei das Eleições determina que não é permitida a veiculação de material de propaganda eleitoral em bens públicos ou particulares, porém autoriza o uso de bandeiras ao longo de vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos. Na práxis eleitoral, percebe-se uma criatividade avassaladora nos meios de veiculação das bandeiras, através de vários mecanismos publicitários, gerando diversas ações na justiça eleitoral que poderiam ser evitadas, caso houvesse uma conceituação clara e objetiva quanto à mobilidade citada no dispositivo legal. Segundo José Jairo Gomes (220, p. 558), “quanto às bandeiras, o que ocorre em geral é serem seguradas por pessoas ao longo das vias”. Contudo, na prática, não é somente esse mecanismo de mobilidade existente. Para que candidatos e partidos políticos possam ter respaldo jurídico durante a propaganda eleitoral, necessita-se de esmiuçar as formas de garantia da mobilidade. Sendo assim, a mobilidade das bandeiras mencionada no artigo 37, § 2º, I da Lei das Eleições poderá ocorrer por meios mecânicos, ação humana – como já ocorre de praxe - ou fixada em aporte que permita sua colocação e retirada entre as seis horas e as vinte e duas horas, tais como ocorre com os windbanner ou windflag. (Disponível em https://eadeje.tse.jus.br/mod/resource/view.php?id=13411) (Grifei.)

O artefato objeto da presente ação, portanto, deve receber o mesmo tratamento relativo às bandeiras na propaganda eleitoral, disciplinado no inc. I do § 2º e nos §§ 6º e 7º, todos do art. 37 da Lei n. 9.504/97, ou seja, seu uso é permitido ao longo de vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos.

Considerando que a decisão impetrada não fez qualquer referência a desrespeito ao horário de colocação e retirada do material ou de perturbação ao trânsito de pessoas e veículos, o que também não se depreende da análise das imagens constantes nos autos, fica evidenciado o direito líquido e certo da impetrante em não ser compelida a retirar o material publicitário.

DIANTE DO EXPOSTO, defiro o pedido de tutela liminar para suspender a decisão que determinou a retirada de estandarte em razão de ausência de indícios de inobservância das normas eleitorais.

Notifique-se a autoridade apontada como coatora para que preste as informações que entender pertinentes no prazo previsto no art. 7°, inc. I, da Lei n. 12.016/09.

Dê-se ciência do feito à Advocacia-Geral da União, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito, no prazo de 5 (cinco) dias, na forma do art. 7º, inc. II, da Lei n. 12.016/09.

Após, abra-se vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral nos termos do art. 12 da Lei n. 12.016/09.

Cumpra-se.

 

Na linha do que consta na decisão transcrita, embora o Ministério Público Eleitoral tenha nominado seu pedido como “representação”, a autuação como “notícia de irregularidade” e o procedimento adotado pela autoridade coatora confirmam a hipótese que o nomen iuris indicado na inicial foi desconsiderado, vindo a ser tratada a notícia de irregularidade nos limites do poder de polícia conferido aos juízes eleitorais.

Assim, não há incompetência do juízo ou nulidade a ser reconhecida na decisão impetrada por usurpação da competência deste Tribunal Regional Eleitoral.

Para além, respeitadas as condições legais para o uso dos wind banners vertidas no art. 37, §§ 2º, 4º, 6º e 7º, da Lei das Eleições e replicadas na Resolução TSE n. 23.610/19 em seu art. 19, §§ 4º e 5º, deve ser mantida a autorização de seu proveito na propaganda eleitoral.

DIANTE DO EXPOSTO, voto por confirmar a liminar deferida e por conceder parcialmente a segurança para, assentando a competência da autoridade coatora para o exercício do poder de polícia, reconhecer a legalidade do meio de propaganda utilizado pela impetrante, respeitados os parâmetros indicados na Lei n. 9.504/97.